A PÁTRIA ENVERGONHADA.
Por Abdon Marinho.
NO FERIADO da pátria acordei especialmente pesaroso.
O país parado. Mais um feriado. Talvez só um feriado. O que festejam? O que temos a festejar?
Refletia sobre o nosso Brasil e o que fizeram com ele.
Estamos apenas a quatro anos do bicentenário da Independência do Brasil.
O que iremos dizer à história duzentos anos depois de nos tornarmos uma nação independente?
Que nos tornamos uma republiqueta de bananas?
Que viramos um ajuntamento de arrivistas onde os recursos da nação, que deveriam servir a todos, servem a uns poucos?
Que desde muito vivemos uma permanente guerra civil que ceifa anualmente a vida de 60 mil cidadãos de morte “matada” e quase o mesmo número em acidentes de trânsito – sem contar os milhares que ficam incapacitados?
Que o pais, também, desde muito passou a ser conduzido por quadrilhas disfarçadas de partidos políticos que ao invés de conduzir os destinos do povo rumo ao desenvolvido social e humano o espolia de todas as formas?
Penso que nada reflita melhor o que fizemos a este país do que o incêndio do Museu Nacional, na Quinta da Boa Vista, Rio de Janeiro.
O museus criado por D. João VI, há duzentos anos, possuía um acervo com mais de 20 milhões de itens. Em poucas horas tudo virou cinzas, escombros. Peças únicas, impossíveis de serem substituídas, uma grande parte delas reunidas pela própria Família Real e Imperial do Brasil, deixaram de existir.
O próprio palácio, sede do museu, que testemunhou importantes momentos da vida nacional, inclusive a própria assinatura do decreto da independência, pela Imperatriz D. Leopoldina, ruiu pela negligência, incompetência, desleixo e incúria dos responsáveis esses anos todos.
Chega a ser emblemático que enquanto muitas peças do museu foram reunidas pelos pais da pátria por ocasião da sua fundação e nos anos posteriores, desde os anos cinquenta nenhum presidente da República se dignou a visitá-lo.
Quase toda a história do país ali reunida e nenhuma autoridade com interesse sequer em conhecer.
Nem mesmo para o aniversário de 200 anos da instituição apareceram ou mandaram representantes para fazerem os discursos protocolares.
Agora, tudo findo, correm com medidas e recursos públicos para recuperar aquilo que nunca deveria ter sido descuidado; correm, como se fosse possível recuperar o que não tem mais recuperação.
Isso tem haver com a ideia de nação de cada um. Ou a falta desta ideia.
Às vésperas de eleições gerais não lembro de ter assistido ou estudado a nação tão dividida e radicalizada, como se os interesses das ideias que representam os grupos fossem maiores que os interesses da pátria.
Apenas para citar o principal dos pleitos: o presidencial, já tivemos ameaças de toda sorte. Ainda que como figura de retórica já ouviu-se ameaças de eliminação física de adversários; de outro lado, as referências menos graves é a atribuição de comportamentos facistas e por aí vai.
No clima de acirramento, do ódio de uns alimentando o ódio de outros e vice-versa já tivemos ataques à bala a um grupo e um candidato afastado da campanha a golpe de faca.
Voltamos ao velho coronelismo onde as eleições paroquiais eram decididas pela força física ou das armas dos capangas dos coronéis?
Como podem acreditar que ideias e comportamentos tão extremos serão capazes de pacificar a nação? Quem vencer imporá a “paz de cemitérios”? Só assim para calar a ala perdedora da contenda eleitoral.
Gostaria de expressar algum otimismo, mas, pelo andar da carruagem, acredito que daqui a quatro anos, quando festejaremos o bicentenário da independência do Brasil, teremos avançado muito pouco, continuaremos numa guerra política que só serve aos interesses dos contendores, mas não os interesses da nação.
Uma guerra que não aponta um rumo que não seja o do atraso.
Este é o legado dos últimos tempos para os próximos anos.
Outro dia alguém, com os dados sobre a educação do país, o principal pilar do desenvolvimento, informou que, para alcançarmos as nações desenvolvidas levaremos mais de setenta anos, na disciplina matemática e, bem mais de duzentos anos, no caso de leitura e compreensão de textos – isso se as nações desenvolvidas “resolverem” parar e esperarem por nós.
Antes acreditávamos que o Brasil era uma nação em desenvolvimento, bem próxima do primeiro “time” de nações. Os dados de hoje, em educação revelam um atraso civilizatório.
Uma vez, se não me falha a memória escrevi sobre o assunto, disse que o Brasil pela sua negligência corria o risco de voltar a ser colônia de alguma nação desenvolvida, assentando que talvez isso não viesse a acontecer pelo desinteresse de algum possível colonizador.
Mas o que esperar de uma nação que se encontra tão atrasada no que se refere à educação (nem falemos no atraso cultural) que às vésperas de pleito decisivo para o seu futuro, não enxerga nos contendores (ou nas suas propostas) um projeto de desenvolvimento para país, preferindo acreditar nas mesmos soluções que experimentadas anteriormente nos levaram ao desastre que assistimos?
Como iremos nos apresentar para o futuro sem um pacto consensual mínimo em torno de um projeto comum com soluções reais aceitáveis e no interesse da maioria da população?
Diante de tanto que assistimos, pelo exemplo do ocorrido no Museu Nacional, estes duzentos anos de independência foram perdidos e, pelo que principia, melhor sorte não terão os próximos duzentos anos.
A pátria que deveria ser maior que todos, estará sempre curvada aos interesses de guerras menores.
Abdon Marinho é advogado.