Parlamentarismo – Um debate necessário.
Por Abdon C. Marinho.
Cumprindo determinação constitucional, em 1993, os brasileiros fomos chamados a decidir entre República e Monarquia e, entre, Presidencialismo e Parlamentarismo. Por larga maioria, saíram vitoriosos o regime republicano com o sistema presidencialista de governo.
Mais de três décadas depois, debater o sistema de governo, entendo, tornou-se uma urgência nacional.
É sabido que ao longo dos anos o Congresso Nacional (Câmara e Senado) foi assumindo a responsabilidade pela destinação de partes do orçamento da União, chegando ao ponto de possuir mais recursos para “investimentos” que o poder executivo. Alguns ministérios, inclusive, quase que a totalidade de suas verbas “pertenceram” aos parlamentares.
O governo federal, talvez desavisado sobre o poder de mando nessa etapa da República, mandou um projeto de lei ou medida provisória realinhando (ou aumentando) determinados tributos, e as lideranças das Casas Parlamentares, mais que de repente, deram-lhe um ultimato: ou modifica a proposta ou eles aprovam um decreto legislativo sustando as medidas.
O Brasil é hoje um país inadministrável. O Poder Executivo – seja por suas ações ou suas omissões – não consegue mais conduzir a administração pública. Sequer alcançará o final do ano com recursos suficientes para custear suas despesas correntes. Qualquer tipo de investimento novo é impossível de ser realizado.
Na outra parte da praça, no Congresso Nacional, os parlamentares podem dispor, livremente, e quase sem nenhum controle, de uma fortuna que chega a passar de 60 bilhões anuais, através das mais variadas emendas.
O sistema de governo atual – que acredito ser invenção brasileira –, chamado “presidencialismo de coalizão”, se exauriu, não tem mais (se é que teve algum dia) as condições de apresentar as respostas que o país precisa.
A preponderância financeira do legislativo em relação ao executivo é tanta que não faz muito tempo um deputado federal foi convidado para ser ministro de estado – cargo político que outrora era até motivo para briga de foice –, e recusou, percebeu que no parlamento poderia dispor de uma fatia do orçamento, e portanto do poder, muito superior ao que poderia dispor em qualquer Ministério da República.
Veja, é disso que se trata, quem manda no orçamento é quem, efetivamente, manda no governo.
A discrepância do sistema de governo atual é que os parlamentares “mandam” no orçamento, qualquer um deles (seja de oposição ou situação) tem mais verbas do que qualquer ministro do governo, e o “melhor”, para eles, claro, sem a responsabilidade pela execução.
O Brasil não vive sob um sistema de governo “presidencialista de coalizão”, o atual sistema é uma “invenção” brasileira que chamo de “parlamentarismo irresponsável”, onde o parlamento manda sem o ônus da responsabilidade.
Acredito que não dá mais para continuarmos a insistir nesse modelo presidencial fajuto, uma espécie de “viúva Porcina” à que era sem nunca ter sido. Urge, portanto, que o Brasil adote o parlamentarismo ao invés de sermos parlamentaristas envergonhados.
No parlamentarismo clássico teremos o presidente da República como o chefe do Estado, com suas funções de representar o país e o primeiro-ministro escolhido pelos representantes da maioria no parlamento com a responsabilidade de chefiar o governo.
Acredito que o governo chefiado pelo partido ou coalizão majoritária terá um melhor aproveitamento dos recursos, pois terá que assumir as responsabilidades pelo emprego dos gastos públicos.
A maioria governa com os ônus e os bônus do poder enquanto a minoria aguarda a sua vez de tornar-se maioria.
Mais dirão: com o parlamento governando os “esquemas corruptos” irão aumentar, farão acordos entre eles para desviarem os recursos do povo, etcetera.
Ora, ao meu sentir, a situação mais danosa para a população brasileira é o atual modelo de governo onde temos um Poder Executivo que não tem poder (ou os recursos) enquanto temos um Poder Legislativo com o poder (e os recursos) mas sem a responsabilidade pela execução orçamentária.
A persistir o modelo atual, teremos o parlamento no melhor dos mundos: com dinheiro e poder, mas sem qualquer comprometimento do seu “CPF”.
Entendo que já passa da hora de buscarmos uma correção de rumos: os que dispõem de recursos dos contribuintes precisam assumir perante os donos do dinheiro a responsabilidade por sua utilização.
O parlamentarismo é, na minha opinião, o caminho mais adequado para ser seguido nas condições atuais.
Devemos aproveitar a eterna discussão da “reforma política” para colocar tal assunto na “ordem do dia”, assim como a necessária redução da representação parlamentar e os excessos de benefícios agregados aos mesmos.
Acho que o Brasil tem muito a ganhar com isso.
Abdon C. Marinho é advogado.
P.S. Um amigo querido alerta para o fato de que um deputado ou senador não tem mais recurso que um ministro. É verdade. A minha colocação se refere a recursos livres para investimentos. O ministro da Educação tem 20% do orçamento; o da saúde tem 15% do orçamento. Mas tal orçamento já está todo comprometido ou como se diz está engessado. O Executivo tem muito “dinheiro” mas quanto é mesmo que sobra quando se tira todas as despesas?