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O PAÍS DO PUXAD­INHO CONTA E CHORA SEUS MORTOS.

Escrito por Abdon Mar­inho

O PAÍS DO PUXAD­INHO CONTA E CHORA SEUS MOR­TOS.

Por Abdon Mar­inho.

NADA talvez seja mais rep­re­sen­ta­tivo do país do que aquele “puxad­inho” no Cen­tro de Treina­mento do Fla­mengo, onde se hospe­davam, e mor­reram dez ado­les­centes num incên­dio ocor­rido nos últi­mos dias.

Aqui não se procura – não agora –, imputar respon­s­abil­i­dades a quem quer que seja. Este é o papel das autori­dades que, diante da tragé­dia ocor­rida, devem, final­mente, abrir os olhos e apu­rar as cir­cun­stân­cias e as respon­s­abil­i­dades pelo perec­i­mento de tan­tos jovens em tão tenra idade.

Ape­nas reg­istro: aquele puxad­inho ali era o Brasil, era o retrato de um país que não liga – ou onde ninguém liga –, para as responsabilidades.

O puxad­inho estava ali, à vista de todos e, segundo todos, em condições ade­quadas para hospedar os jovens, ninguém viu nada demais ou de errado. Entre­tanto, após o ocor­rido o que mais aparece são espe­cial­is­tas para dizer que aquele tipo de con­strução não era ade­quada.

Se nada tivesse acon­te­cido, ainda hoje estaria lá abri­g­ando os jovens. Assim como devem exi­s­tir mil­hares de out­ros Brasil afora.

Dias antes do incên­dio no CT do clube foi o rompi­mento da bar­ragem de Bru­mad­inho, MG, que ceifou a vida de mais de trezen­tas pes­soas.

Depois do acon­te­cido revelou-​se ao país que o aci­dente era anun­ci­ado desde sem­pre, que o tipo de con­strução de bar­ra­gens ado­tado era o mais barato e, tam­bém por isso, o mais perigoso.

Ainda assim, uma das maiores empre­sas do mundo – segu­ra­mente a segunda maior min­er­adora do mundo –, adota esse tipo de con­strução em Minas Gerais e em diver­sos out­ros lugares do país.

Nem mesmo a tragé­dia de Mar­i­ana, ocor­rida três anos antes, motivou a min­er­adora a mudar as práti­cas, tudo con­tin­uou como antes: nada fez. Ou fez bem pior: man­teve um restau­rante e o seu setor admin­is­tra­tivo abaixo da bar­ragem, no cam­inho do “mar de lama”.

Já cam­in­hando para o franco desafio à leg­is­lação penal, foram além, nos dias ante­ri­ores à tragé­dia humana e ambi­en­tal tomaram con­hec­i­mento do risco imi­nente e ainda assim nada fiz­eram para impedir ou mino­rar os efeitos da tragé­dia, pelo con­trário, segundo depoi­mento, “foçaram a barra” para obterem um cer­ti­fi­cado de esta­bil­i­dade da bar­ragem.

Emb­ora tudo apon­tando em sen­tido dis­tinto, custo acred­i­tar que tivessem a intenção “delib­er­ada” de matar seus empre­ga­dos, assim como as demais víti­mas. Então, por que nada fiz­eram? Por que não avis­aram a ninguém dos riscos? Sim­ples, porque falta profis­sion­al­ismo; porque acred­i­tam que nada acon­te­cerá.

Por isso assumi­ram o risco de causar a tragé­dia que provo­caram.

E não é de agora, não é de hoje. Há vinte anos que as estru­turas estavam ali, na posição de risco com todos fin­gindo que estava tudo bem. Sabiam que mais cedo ou mais tarde – e sabiam ser cedo –, a bar­ragem ruiria. Ainda assim, pagaram para ver. Ou, sim­ples­mente, como é tão comum, deixaram “nas mãos de Deus”.

Mesmo depois de Mar­i­ana per­manece­ram cegos à real­i­dade, ao óbvio.

Na mesma sem­ana, um ou dois dias antes do incên­dio, uma tem­pes­tade provo­cou enormes pre­juí­zos e per­das de vidas, no Rio de Janeiro.

Uma tem­pes­tade, emb­ora pre­visível, não tem como se impedir que ocorra, mas os seus efeitos podem e devem ser mino­ra­dos.

Não é o que ocorre. Nas últi­mas décadas, tam­bém con­fiando na providên­cia div­ina, as autori­dades car­i­o­cas per­mi­ti­ram todo tipo de ocu­pação des­or­de­nadas em todos os lugares da cidade e, prin­ci­pal­mente, nas encostas dos mor­ros.

O resul­tado foi aquele que se viu, mais sete mortes víti­mas das chu­vas? Não. Víti­mas da improvidên­cia. Do “é assim mesmo”; do “Deus quis assim”.

Só para com­ple­men­tar a sucessão de tragé­dias que ocor­reram no país neste começo de ano, um aci­dente de helicóptero tirou a vida do jor­nal­ista Ricardo Boechat e do piloto da aeron­ave em que via­javam. Detalhe: a empresa não tinha autor­iza­ção para fazer táxi aéreo. Ape­sar disso, exer­cia a ativi­dade sem ser molestada por ninguém.

Assim como todo mundo via – e sabia –, que o “puxad­inho” do Fla­mengo era irreg­u­lar, mas nunca ninguém disse nada – segundo noticia-​se o clube car­i­oca rece­beu mais de trinta mul­tas pelo sei Cen­tro de treina­mento, nen­huma por conta do alo­ja­mento impróprio ou irreg­u­lar dos jovens atle­tas.

O mesmo acon­te­ceu com a bar­ragem de Bru­mad­inho. Todos, pelos agora, dizem que sabiam dos riscos, que o perigo era imi­nente – e era. Tanto que um engen­heiro respon­sável por uma das das vis­to­ria, disse, em depoi­mento, que se tivesse um filho tra­bal­hando lá man­daria que saísse, e, ainda assim, ninguém fez ou disse nada para impedir a tragé­dia que suced­e­ria dias depois.

E os fil­hos dos out­ros, mari­dos, esposas, ami­gos, etc.?

Todos preferi­ram o silên­cio, a o omis­são, a cumpli­ci­dade, man­ter os volu­mosos con­tratos com a gigante da min­er­ação em detri­mento das vidas humanas e dos pre­juí­zos ambi­en­tais.

Há, ainda, a omis­são cúm­plice das autori­dades que silen­ciam e acoitam todos os malfeitos e até coon­es­tam com eles em troca de alguns tro­ca­dos ou de out­ras van­ta­gens.

Ninguém liga para os “puxad­in­hos” que vão se for­mando em todo o país; ninguém liga para as suas respon­s­abil­i­dades; ninguém quer pare­cer “chato” ou se indis­por com pes­soas ou empresas.

É essa “cegueira cole­tiva” que faz sur­gir as con­struções irreg­u­lares nas encostas; que oculta o alo­ja­mento “clan­des­tino”, onde todos achavam ser uma garagem; a empresa de táxi aéreo pirata ou os “Bru­mad­in­hos” da vida.

Essa é a cul­tura do puxad­inho, capaz de con­t­a­m­i­nar um dos maiores clubes de fute­bol do mundo; a segunda maior min­er­adora do mundo; uma pequena empresa de trans­porte aéreo ou mesmo o cidadão que, com des­culpa de não ter onde morar, con­strói, ante a omis­são das autori­dades, em lugares inde­v­i­dos.

Todos sabem que fazem o errado, mas ninguém liga, con­fiam na providên­cia div­ina para que o pior não acon­teça.

Só que o pior acon­tece. Deus “can­sou” de segu­rar a barra de tanta irresponsabilidade.

Enquanto con­tin­uar­mos tolerando todo tipo de malfeitos, falta de com­pro­misso com o certo, cor­rupção e ban­dal­heira, con­tin­uare­mos con­tanto os nos­sos mor­tos de cada dia.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

DE 1989 A 2019: O QUE FOI ISSO, COMPANHEIRO?

Escrito por Abdon Mar­inho

DE 1989 a 2019: O QUE FOI ISSO, COMPANHEIRO?

Por Abdon Marinho.

CHOVEU naquele dia de 1989 quando o ex-​operário Lula esteve em São Luís para um ato público na Praça Deodoro. Choveu, inclu­sive, durante o evento político. Estava lá, anôn­imo, como ainda sou, no meio da mul­ti­dão. Alba Maria Rodrigues estava comigo, era minha com­pan­heira de son­hos e até se recorda de um texto que escrevi por ocasião do evento. Éramos tão jovens. Éramos tão sonhadores.

Engraçado que não lem­bro o dia ou mesmo mês, minha lem­brança é ape­nas que choveu bas­tante naquele fim de tarde.

Chovia, tam­bém – e forte –, numa destas tardes de 2019 enquanto me ocu­pava da leitura da sen­tença pro­ferida pela juíza Gabriela Hardt con­de­nando o ex-​presidente Lula a uma pena de doze anos e onze meses de prisão pelos crimes de cor­rupção e lavagem de dinheiro.

Já é o segundo decreto con­de­natório que, acrescido ao primeiro, já somam um quarto de século atrás das grades.

Pior que isso – se é que pode exi­s­tir algo pior –, só a certeza que out­ras con­de­nações advirão, algu­mas até mais robus­tas que estas duas primeiras.

Os enfáti­cos protestos após a primeira con­de­nação, turbina­dos pela dis­cur­seira eleitoral, deram lugar a cho­chas e incon­sis­tentes man­i­fes­tações nas redes soci­ais. Algu­mas delas, meras retrans­mis­sões de out­ras.

Mes­mos os opor­tunistas de sem­pre, inter­es­sa­dos mais em “virarem” herdeiros do baú de votos dos ingên­uos, não se “ras­garam” na defesa da inocên­cia do bi-​condenado. Inocên­cia, esta, que só eles fin­gem acred­i­tar.

Jogam para plateia com os chavões, os argu­men­tos pré-​fabricados que nada dizem – porque nada são –, além de pros­elit­ismos toscos.

Ainda os poucos mux­oxos pas­sam longe de ofus­car os fun­da­men­tos da sen­tença da mag­istrada – expos­tos em 360 pági­nas –, onde enfren­tou e demon­strou as razões do seu con­venci­mento para con­de­nação dos impli­ca­dos no processo.

Não voltare­mos à velha dis­cussão sobre o que acon­te­ceu ou que fiz­eram nos dezes­seis verões passados.

O certo, é que divul­gada a sen­tença numa quinta-​feira, já no sábado/​domingo, ninguém mais dava “bola” para a con­de­nação do ex-​presidente, que aos poucos vai sendo esque­cido no cárcere ou vira motivo de cha­cota entre seus próprios ali­a­dos: “— Lula está preso, babaca”, disse o senador Cid Gomes (PDT/​CE), ainda durante o segundo turno das eleições pres­i­den­ci­ais.

No mesmo dia que foi divul­gada a segunda con­de­nação, se não me falha a memória, foi a vez do ex-​candidato à presidên­cia, Ciro Gomes (PDT/​CE), repe­tir o “mantra”, desta vez num encon­tro ou con­gresso da “juven­tude” vin­cu­lada ao Par­tido Comu­nista do Brasil — PCdoB: “— Lula está preso, babaca”.

Fal­tou acres­cen­tar que está preso em “prisão per­pé­tua”, pois, a menos que lhe con­cedam um indulto human­itário, ale­gando idade avançada e/​ou enfer­mi­dades diver­sas, que todos fin­girão acred­i­tar, não lhe virá a soltura antes da extinção.

Ape­nas trinta anos sep­a­ram aquela chuva de 1989 desta de 2019, enquanto leio a segunda sen­tença con­de­natória do ex-​presidente Lula.

E, trinta anos é quase a soma dos anos de “cana”, até aqui – anal­is­tas expe­ri­entes dizem que a soma de todas as penas nos proces­sos em curso alcançará mais de cem anos –, que terá de cumprir o out­rora depositário de tan­tos son­hos e con­fi­ança.

O que foi isso, com­pan­heiro?

Em 1989, o mote de todas as dis­cussões era a cor­rupção desen­f­reada que tomava de conta do país e era retratada com quase toda sua crueza no fol­hetim global “Vale Tudo”, do nov­el­eiro Aguinaldo Silva.

Na política, o operário Lula da Silva fazia, por onde pas­sava, suas pre­gações con­tra a cor­rupção e con­tra o gov­erno Sar­ney. Travava uma “dis­puta” par­tic­u­lar con­tra o Col­lor de Melo, ex-​governador de Alagoas – e can­didato como ele –, para saber quem acusaria mais o ex-​presidente Sar­ney de cor­rupto.

Numa das mais bison­has iro­nias do des­tino, trinta anos depois, o ex-​presidente Sar­ney nunca foi molestado pelas autori­dades judi­ciárias, pelo con­trário, mesmo um inquérito aberto por ocasião da Oper­ação Lava Jato, foi arquiv­ado, a pedido do Min­istério Público, por ausên­cia de provas; o ex-​presidente Col­lor de Mello “enro­lado” até onde não mais poder em tudo que é escân­dalo, vai se safando, escon­dido no bio­mbo do mandato de senador e con­tando com a lentidão do Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF; já o ex-​presidente Lula, como fazem questão de enfa­ti­zar seus próprios ali­a­dos, “está preso, babaca”.

Esta­mos falando do marco tem­po­ral de trinta anos – quando ocor­reu a primeira eleição pres­i­den­cial direta depois dos vinte e anos do régime mil­i­tar e mais os cinco anos do gov­erno Sar­ney –, poderíamos lim­i­tar bem mais, a par­tir de 2003, quando teve iní­cio a “era lulopetista” e seu estilo de gov­ernar. A par­tir daí, temos 16 anos, onde o ex-​operário que se fez pres­i­dente da República, saiu da condição de artí­fice de uma nova era de com­bate à cor­rupção e a todos os male­fí­cios dela decor­rentes, para a condição de con­de­nado e preso por … cor­rupção e lavagem de din­heiro. Tudo aquilo que jurou de pés jun­tos combater.

Ainda que ven­ham com a dis­cur­seira sem fim de que está havendo “perseguição” ao ex-​presidente, tal argu­mento não con­vence ninguém – exceto os que querem se con­vencer –, mera retórica. As provas dos deli­tos estão aí, à vista de todos, e foram ampla­mente expostas pelo juiz Moro na primeira con­de­nação (o caso do triplex do Guarujá) e, agora, pela juíza Hardt no caso do sitio de Ati­baia.

Os incau­tos querem acred­i­tar, mesmo após a segunda con­de­nação, que o Lula é inocente; os opor­tunistas querem “vender” a ilusão da inocên­cia para con­quis­tar os votos destes incau­tos; os cor­rup­tos pre­cisam acred­i­tar pois temem ser este o seu des­tino.

Trinta anos e parece que foi ontem. Quanta ale­gria, quanta esper­ança nos trouxe aquele ano de 1989. Nossa primeira cam­panha pres­i­den­cial com votação direta, o primeiro voto de inúmeros brasileiros e vemos, todos nós, depois de tanto tra­balho, o sím­bolo de tudo aquilo restar encar­cer­ado.

Trinta anos em ter­mos históri­cos não é nada, entre­tanto, no caso pre­sente, foi tempo que sep­a­rou a esper­ança da desilusão, o sonho do pesadelo, a liber­dade do cárcere.

O que foi isso, companheiro?

Esta­mos em 2019, chove em São Luís, chove em Curitiba…

Abdon Mar­inho é advo­gado.

O DRAMA DA SAÚDE PÚBLICA (PARTE I).

Escrito por Abdon Mar­inho

O DRAMA DA SAÚDE PÚBLICA (Parte I).

Por Abdon Mar­inho.

DEPOIS da tragé­dia de Bru­mad­inho (MG), que ceifou, quase que instan­ta­nea­mente, a vida de cen­te­nas de pes­soas, tudo pare­ceu menor ou irrel­e­vante. O próprio termo “tragé­dia”, parece haver gan­hado uma maior ampli­tude. Aguardo cor­agem para escr­ever um texto sobre o tema, ape­sar do “tudo” que já foi dito.

Antes de Bru­mad­inho, porém, uma cena me chamou a atenção. Acho que um ou dois dias antes daquela tragé­dia que os canais de tele­visão exibi­ram o drama pri­vado de uma sen­hora tendo que deslo­car em uma maca pelas ruas da cidade o seu pai enfermo.

Não sei o nome da sen­hora ou do seu pai que, tomei con­hec­i­mento, veio a óbito.

As cenas de pro­fundo deses­pero, entre­tanto, me vieram à lem­brança após rece­ber áudios e ima­gens de um protesto que ocor­ria no Municí­pio de Matões do Norte que inter­di­tou por um bom tempo a BR 135, prin­ci­pal via de acesso a cap­i­tal.

O fechamento do hos­pi­tal regional naquela urbe, sem qual­quer aviso aos profis­sion­ais e/​ou mesmo aos munícipes os levaram a pen­sar tratar-​se do encer­ra­mento defin­i­tivo das ativi­dades da unidade o que, segundo os mes­mos, traria sérios pre­juí­zos ao atendi­mento médico-​hospitalar de dezenas de municí­pios e econômi­cos àquele, em par­tic­u­lar.

Ainda segundo os moradores e alguns servi­dores o que os respon­sáveis da Empresa Maran­hense de Serviços Hos­pi­ta­lares — EMSERH, infor­maram foi que estavam, de fato, fechando o hos­pi­tal, razão pela qual ocor­reu a revolta pop­u­lar.

A nar­ra­tiva de que haverá ape­nas uma par­al­iza­ção por curto período e que os protestos não tin­ham qual­quer sen­tido, sendo mais o fruto da “doidice” ou de uma his­te­ria cole­tiva, pas­sou a cir­cu­lar somente quando o movi­mento revoltoso já provo­cava estra­gos palpáveis e um engar­rafa­mento de quase 5 km na BR.

Em todo caso, até agora, seja no site do gov­erno ou da própria Sec­re­taria de Estado da Saúde — SES, não con­sta um esclarec­i­mento obje­tivo sobre os motivos do fechamento da unidade e por quanto tempo ela per­manecerá fechada “para refor­mas”.

Quem sou eu para perquirir qual­quer coisa, mas não deixa de ser curioso que um gov­erno tão afeito a pro­pa­gan­dear, até com certo exagero, “inau­gu­ração de ordem de serviço” e disponha em orça­mento uma pequena for­tuna para a comu­ni­cação, deixe de esclare­cer a pop­u­lação sobre assun­tos rel­a­tivos às suas reais angús­tias.

A maior angús­tia da pop­u­lação hoje é a saúde pública – ou a sua falta –, pois sabem, os cidadãos, que dela depende suas vidas.

Não faz muito tempo fui abor­dado em Luís Domingues por um cidadão: — doutor, o sen­hor está sabendo que vão munic­i­palizar o Hos­pi­tal Regional de Caru­ta­pera? Doutor, se fiz­erem isso será um caos para nós desta região, ‘Caru­ta­pera’ não dá conta nem de aten­der sua pop­u­lação, como vai aten­der toda região? Muita gente vai mor­rer por falta de atendi­mento. É ruim, não tem ‘nada’, mas será pior se deixarem por conta do municí­pio.

Até hoje não sei se há fundo de ver­dade na suposta munic­i­pal­iza­ção do Hos­pi­tal Regional de Caru­ta­pera e, caso tenha havido, se se con­fir­mou o “caos” vatic­i­nado por aquele senhor.

O que se sabe é que o Estado não tem con­seguido man­ter sua rede pública de saúde com um padrão mín­imo de qual­i­dade, bem como pagar a pro­dução das unidades sob respon­s­abil­i­dade dos municí­pios.

Outro dia o prefeito de Bequimão me recla­mava que Estado não vem hon­rando com o paga­mento reg­u­lar da pro­dução do hos­pi­tal local­izado naquele municí­pio e que atende toda a região, há muito tempo, o que tem “estran­gu­lado” as finanças munic­i­pais para man­ter o hos­pi­tal aberto, cal­cu­lando em alguns mil­hões seu crédito junto a SES.

É certo tam­bém que muitos hos­pi­tais con­struí­dos nos municí­pios estão fechando e out­ros nem seque chegaram a ser aber­tos. Os que “teimam” em man­ter as por­tas aber­tas não recebem de forma reg­u­lar o que foi acor­dado com o gov­erno estadual.

Aliás, uma das prin­ci­pais recla­mações dos municí­pios em relação a Atenção Básica é a falta da con­tribuição do estado. Relatam que a Atenção Básica é man­tida uni­ca­mente com os recur­sos fed­erais e dos municí­pios.

Não bas­tasse isso, por conta da nossa lig­ação com o setor, nos chegam infor­mações dando conta do fechamento de diver­sas out­ras unidades e/​ou serviços.

Só nos últi­mos dias me deram conta que na UTI Car­dio­pe­diátrica do Hos­pi­tal Car­los Macieira, os médi­cos “entre­garam” o serviço dev­ido a falta de paga­mento e/​ou redução do con­trato, o que cul­mi­nará com fim do serviço de cirur­gias cardía­cas de cri­anças, caso não se chegue a solução do impasse.

Antes já tinha sido infor­mado do fechamento da UPA de Cha­pad­inha; da redução do número de médi­cos nas UPA’s de São Luís; do fim do serviço de orto­pe­dia da UPA Araçagy; do fechamento do Cen­tro de Espe­cial­i­dades Médi­cas — CEMESP; do fechamento da Mater­nidade Maria do Amparo, em São Luís; do fechamento da UTI neona­tal e pediátrica do hos­pi­tal macror­re­gional de Coroatá e out­ros prob­le­mas menores (mais graves)m como a falta de condições mín­i­mas para os profis­sion­ais exercerem sua mis­são de sal­var vidas e diminuir ou elim­i­nar sofri­men­tos.

E nem vamos falar na já crônica falta de medica­men­tos espe­ci­ais nas unidades públi­cas e na far­má­cia do estado.

Isso só as infor­mações que me chegam, que se forem ver­dadeiras, já causam uma enorme defi­ciên­cia nos serviços públi­cos de saúde do Maran­hão.

Não faz muito tempo, um lití­gio com os médi­cos que ameaçavam com par­al­iza­ção de suas ativi­dades por falta de paga­mento só foi resolvido na Justiça, com aque­les profis­sion­ais cedendo e aqui­escendo em esperar um pouco mais para rece­ber seus salários.

Diante de todos estes fatos, me parece fora de ordem que gov­er­nador venha, mais uma vez, fazer pros­elit­ismo com a propal­ada inau­gu­ração do can­teiro de obras do futuro hos­pi­tal de urgên­cias de São Luís – uma promessa de cam­panha do seu ali­ado, Edi­valdo Holanda Júnior, desde a cam­panha de 2012, que na época, e na pro­pa­ganda, até deram o nome de Jack­son Lago –, quando não con­segue man­ter a rede ou serviços já exis­tentes.

É con­strange­dor para as pes­soas de bem ter que assi­s­tir ao “fes­tejo” de uma promessa cujo o iní­cio chega com meia década de atraso enquanto teste­munha o vem ocor­rendo em todos os can­tos do estado com a saúde pública.

Não temos a menor dúvida da neces­si­dade deste novo hos­pi­tal de urgên­cias e emergên­cias para a cap­i­tal, isso é pací­fico, entre­tanto, quer me pare­cer que o gov­erno atual acha mais fácil e con­ve­niente tra­bal­har em cima de um sonho que nem sabe se será con­cretizado no seu gov­erno do que enfrentar a dura real­i­dade de man­ter em fun­ciona­mento reg­u­lar a rede hos­pi­ta­lar e os serviços já exis­tentes sob sua respon­s­abil­i­dade.

Só posso achar que para as autori­dades faz mais sen­tido, e deve ser mais inter­es­sante, a foto ao lado da maquete — e com todos os recur­sos dig­i­tais –, que a dura real­i­dade dos pacientes em macas ou no chão frio dos corre­dores, da falta de atendi­mento, das macas cir­cu­lando pelas ruas ou da pro­cis­são de ambulân­cias que tanto prom­e­teram extin­guir.

O drama da saúde pública no estado está longe de acabar, é uma tragé­dia silen­ciosa que vai ceifando a vida mil­hares de maran­henses pela falta de atendi­mento médico ou porque falta “tudo” nas unidades onde são aten­di­dos.

No próx­imo texto explanarei sobre uma das ideias para mino­rar essa tragé­dia anun­ci­ada.

Abdon Mar­inho é advo­gado.