SEMOSTRAÇÃO IMBERBE.
Por Abdon Marinho.
— POR QUE ele faz isso? Está ficando feio. Parece coisa de grêmio estudantil do século passado. Coisa de “patota”.
Foi assim, meio à queima roupa, que um amigo abordou-me outro dia: ao tempo em que indagava, já externava sua contrariedade e opinava.
Tomei um susto. Ele, a quem se referia esse amigo, o governador do Maranhão, Senhor Flávio Dino. O “ele”, no caso, pode ser pluralizado dado ao fato de não apenas o governador, mas todo o seu entorno, não apenas reproduzir, como também emitir opinião que distam de suas responsabilidades como servidores públicos pagos pelos contribuintes para bem cuidarem dos interesses do estado e não fazerem proselitismo político dia e noite.
Não foi a primeira pessoa de quem cultivo a intimidade a mostrar-se incomodado com o fato de sua Excelência ter esse pendão pela semostração: ato de se mostrar, de se exibir. 2 Mania de ostentação (de grandeza, inteligência, conhecimento, dinheiro, luxo etc.).
Se, durante a campanha eleitoral poder-se-ia debitar os excessos aos calores próprios da disputa, passado o pleito, com o governador reeleito, ainda em primeiro turno, o falatório de cunho ideológico perde qualquer sentido.
Pior, ainda, quando sua Excelência – e os seus aliados, na maioria servidores públicos –, se volta contra um presidente eleito e, portanto, possuidor da legitimidade conferida pelas urnas.
O país passa por uma de suas maiores crises de todos os tempos – legado de gestões desastradas –, os estados da federação, praticamente todos, sem exceção, falidos.
Não faz sentido algum, que o governador do Maranhão, estado atrás em quase tudo que é indicador econômico e/ou social, junto com outros próceres nordestinos, façam coro contra um governo democraticamente eleito e até se recusem a participar de reuniões com os demais governadores eleitos para trocarem ideias e encontrarem pontos em comuns no enfrentamento da crise, como vimos recentemente, quando um único governador da região nordeste, o do Piauí, compareceu a uma reunião com o presidente eleito.
A repercussão da descortesia foi tão mal recebida pelos eleitores que uma semana depois estavam todos em Brasília tentando uma agenda com o futuro governo que, desta vez, não lhes deu “bola”, fazendo-os voltar para seus estados sem ter falado com ninguém de relevância do governo a se instalar a partir de janeiro.
Nada é mais saudável à democracia que uma oposição consciente e consistente, entretanto, o que temos visto, com o nosso governador à frente é que os derrotados no projeto nacional não “desceram” do palanque e se “armam” para pedir o impeachment do futuro governo tão logo ele se instale em 1º de janeiro.
Não se trata apenas de um comportamento de “patota” de grêmio do século passado, de movimentos sectários, ou tolice pura e simples, estamos diante de atitudes tresloucadas, que o governador do estado faz “tudo” para vender-se como líder, embora sem muito êxito, tanto que foi “representado” pelo governador do Piauí.
Um amigo, exagerando na caricatura, disse-me recentemente, na esteira desta discussão, que para “aparecer” só estava faltando a sua Excelência amarrar uma melancia no pescoço e sair sem roupas pela Praça Benedito Leite durante a feira do domingo.
Sem dá azo a tamanho exagero, até porque não acredito que cheguem a tanto, forçoso não reconhecer que vem existindo um excesso de exposição nas condutas dos atuais mandatários do estado, com, infelizmente, o governador à frente.
Tamanha exposição, inclusive, chega a macular a dignidade do cargo ocupado, ferindo o respeito que se deve ter pela liturgia do poder, o que certa vez, quando presidente da República, cobrou o ex-presidente José Sarney.
Outro dia tomei conhecimento que um secretário do governo, deputado federal eleito, reclamara que o governador vem sendo “injustificadamente” atacado.
Ora, o secretário identifica o efeito porém passa ao largo da causa.
Se sua Excelência vem sendo “injustificadamente” atacado a culpa é exclusivamente sua, do excesso de exposição, da tentativa vã de querer se promover a “líder” da oposição ao futuro governo.
Esse desejo incontido de “herdar” o espólio do lulismo, do petismo e das esquerdas (se é que algum dia existiu isso no Brasil), tem suas consequências.
Infelizmente, o governador, além de não atentar para fato de que a vitrine política é um lugar que se sujeita a questionamentos e ataques, tem colocado os seus interesses políticos pessoais à frente dos interesses do estado, conforme já reclamou, mais de uma vez, o Jornal Pequeno, aliado de primeira hora do atual governo.
O governador, assim como qualquer cidadão, tem direito de ter “lado” político, de possuir interesse legítimo de algum dia vir a ser presidente da República, o que não pode é ignorar suas atribuições funcionais, pois antes de ser político, de ter interesses eleitorais, ele tem um estado para administrar e que precisa dos bons préstimos do governo federal.
O próprio governador, ao lançar mão de um tardio decreto de austeridade, é o primeiro a reconhecer que a situação financeira do Maranhão não é confortável, em grande parte devido aos equívocos da sua própria administração.
Lembro de ter escrito, logo no início do governo, que deveriam (e poderiam) ser austeros pois estava a suceder uma estrutura de quase cinquenta anos, poderia exonerar muita gente, rever todos os contratos, corrigir muitos dos “malfeitos”.
Sentira-se agredidos, não apenas mantiveram quase todos servidores enraizados dos governos anteriores, como trataram de nomear um grande número de novos servidores, na maioria das vezes escolhendo-os mais pelos critérios políticos que de competência comprovada; com relação aos contratos, aos invés de reduzi-los, fizeram foi ampliar, no quesito aluguel de imóveis, tidos pelos adversários como “camaradas”, o governo não fica devendo as maiores imobiliárias da cidade; quantos aos “malfeitos” o noticiário, vez ou outra, não deixa esquecer o quanto se fazem presente.
Uma administração trôpega que não apresenta resultados minimamente satisfatórios nas áreas essenciais como educação, saúde, infraestrutura e que reduziu a possibilidade de crescimento econômico do estado se torna vulnerável às críticas sejam elas justas ou não.
Outro dia amigo – não digo o nome para evitar fuxico –, fazia troça com a política econômica do governo estadual.
Dizia: “— Abdon, a principal característica deste governo em relação à economia é o saudosismo”.
Olhei intrigado ante a assertiva. Ele continuou: “— lembra que quando chegastes aqui, em meados dos anos oitenta, as pessoas não “faziam” supermercado e, sim, Lusitana? Pois é, a política econômica do governo, favorecendo um único grupo, “quebrou” todos os demais supermercados, agora, como nos anos oitenta, as pessoas não estão mais “fazendo” supermercado, fazem Mateus”.
Pois bem, com pouco ou quase nada de positivo a mostrar, com um “dever de casa” longe cumprido a primeira linha, sua Excelência, veste-se de professor de Deus nas redes sociais, opinando sobre tudo e todos, atraindo para si – e para o governo –, os questionamentos e críticas.
Tanta exposição – do governador, secretários e aduladores –, não faz bem nem aos expostos e muito menos ao governo, pois as pessoas acabam por perder o “respeito” pela autoridade.
É dizer, se as próprias autoridades, como dizia papai, não se dão o respeito, como exigir que outros o façam.
Na atual quadra, tenho visto coisas inéditas, provocadas por esse excesso de exposição. Nas próprias Redes Sociais do governador, já vi cidadãos chamando-o de “nigrinha” (à toa, vadia, vagabunda; pessoa que não presta, que não vale nada. Apesar de ser uma palavra feminina também pode ser aplicada a homens); na mesma linha, já vi um outro apelando para que pare com a “nigrinhagem”; e, ainda, um outro “pedindo” que deixasse de “fuleragem” (falta de seriedade; modo de agir sem refinamento).
Embora sejam termos comuns do vocabulário maranhense, vamos combinar, não fica bem quando aplicados a um governador, secretários ou outras autoridades de alto escalão, não tanto pelas pessoas em si, mas pelos próprios cargos que ocupam por delegação da maioria da população.
Se nas redes sociais do próprio governador – e dos seus aliados –, lê-se algo como o referido acima, dá para imaginar o que “rola” noutras redes, sobretudo, nos grupos de WhatsApp. Pois é, são críticas terríveis e de todos os cunhos, passando pela compleição física à insinuações de conteúdo sexual, que por decoro próprio, deixo de relatar.
O secretário ao reclamar de “ataques injustificados”, talvez devesse reconhecer que tais “ataques” nada mais são do que as consequências da semostração – implantada como estratégia política –, e a “fulanizacão” das instituições decorrentes de um estilo de governo que inauguraram.
Creio que estejam equivocados, mas quem sou eu para achar algo?
Abdon Marinho é advogado.