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O MPMAESNOBAMUL­HER DE CÉSAR E NINGUÉM TEM NADA COM ISSO.

Escrito por Abdon Mar­inho

O MPMAESNOBAMUL­HER DE CÉSAR E NINGUÉM TEM NADA COM ISSO.

Por Abdon Marinho.

DEVE­MOS a Pom­peia Sula, segunda mul­her de Júlio César, a expressão: “À mul­her de César não basta ser hon­esta, deve pare­cer hon­esta”.

A história, com mais de dois milênios, conta que no 1º de maio de 62 A.C., na casa do imper­ador, estava acon­te­cendo o fes­tejo da Buona Deusa (Deusa mãe), evento orga­ni­zado por Pom­peia, des­ti­nado uni­ca­mente as mul­heres. Acon­tece que um jovem da sociedade romana, rico e destemido, disfarçou-​se de mul­her e pen­etrou no recinto, sendo descoberto em seguida. O inci­dente, entre­tanto, fora sufi­ciente para César dec­re­tar o seu divór­cio da esposa. Lev­ado o caso a jul­ga­mento e tendo o imper­ador sido arro­lado como teste­munha, este declarou nada saber sobre o sac­rilé­gio cometido por Pub­lius Clodius, ficando, inclu­sive, do seu lado para o espanto dos senadores que inda­garam: – Então, por que, decre­tou o divór­cio de sua esposa? Ao que César respon­deu com a frase céle­bre que atrav­essa milênios: “A mul­her de César deve estar acima de qual­quer suspeita”.

Muito além do gosto pela história da antigu­idade clás­sica, remem­oro o acon­te­cido diante da con­tro­vér­sia que tomou conta do Min­istério Público Estad­ual.

Estran­hamente – e com trata­mento abso­lu­ta­mente dis­tinto –, Pom­peia Sula, a esposa de César e o nosso MPMA se encon­tram, sendo a história da primeira solen­e­mente “esnobada” pelo segundo.

Há mais de dois mil anos todos sabiam que a mul­her de César nada devia, que não tivera qual­quer culpa pelo com­por­ta­mento imper­ti­nente do mancebo e que jamais pre­varicara con­tra seu marido.

Ape­sar de tudo isso, con­forme César jus­ti­fi­cou no decreto de divór­cio, a mul­her de César dev­e­ria estar acima de qual­quer sus­peita.

Bem difer­ente de Pom­peia é a situ­ação do MPMA sobre o qual há mais de um mês pairam duas acusações con­tra seu bom nome, que, suposta­mente, teriam sido cometi­dos pelo seu rep­re­sen­tante máx­imo, o sen­hor procurador-​geral.

O fato já de todos con­heci­dos, pois ampla­mente divul­gado na mídia, acusa o chefe do órgão de haver vio­lado a ordem con­sti­tu­cional, ao des­cumprir a Súmula Vin­cu­lante nº. 13, do Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF, que veda a nomeação de aparentes até o ter­ceiro grau, inclu­sive por afinidade. Mas, pior que isso, teria, pelo menos em tese, cometido crime de fal­si­dade ide­ológ­ica, ao efe­t­uar a nomeação da par­ente por afinidade com o nome de solteira quando sabia ser a mesma casada com o sobrinho.

Decerto que o sen­hor procurador-​geral, emb­ora não o con­heça – assim como a mul­her de César –, é uma pes­soa hon­esta, inca­paz de come­ter qual­quer crime ou de incor­rer em pre­var­i­cações, daí não enten­der os motivos de se guardar – e por tanto tempo –, esse silên­cio sepul­cral a respeito do que foi e vem sendo veic­u­lado pela mídia do nosso estado, e, segundo soube, até motivou uma rep­re­sen­tação de um advo­gado de Brasília junto ao Con­selho Nacional do Min­istério Público.

A tal rep­re­sen­tação foi arquiv­ada de plano pelo cor­rege­dor do CNMP que bus­cou guar­ida no artigo 1595 do Código Civil para dizer que o par­entesco por afinidade se limita aos ascen­dentes, descen­dentes, aos irmãos do côn­juge ou com­pan­heiro, reg­is­trando que a “afinidade” seria um vín­culo pes­soal.

O rela­tor, pelo que tomei con­hec­i­mento, pas­sou ao largo da suposta fal­si­dade ide­ológ­ica, con­sis­tente na nomeação de alguém com nome de solteira quando a sabia casada, bem como deixou de enfrentar com o dev­ido cuidado as out­ras questões lev­an­tadas na rep­re­sen­tação.

Bem difer­ente da “mul­her de César” a quem não bas­tava ser hon­esta, no caso do MPMA, apega-​se a minús­cula fil­igrana jurídica para emprestar legal­i­dade ao ato que frontal­mente con­traria ao que disse a Súmula Vin­cu­lante 13, ver­bis: “A nomeação de côn­juge, com­pan­heiro ou par­ente em linha reta, colat­eral ou por afinidade, até o ter­ceiro grau, inclu­sive, da autori­dade nomeante ou de servi­dor da mesma pes­soa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou asses­so­ra­mento, para o exer­cí­cio de cargo em comis­são ou de con­fi­ança ou, ainda, de função grat­i­fi­cada na admin­is­tração pública direta e indi­reta em qual­quer dos poderes da união, dos esta­dos, do dis­trito fed­eral e dos municí­pios, com­preen­dido o ajuste medi­ante des­ig­nações recíp­ro­cas, viola a Con­sti­tu­ição Federal”.

Pela inter­pre­tação do Con­selho Nacional do Min­istério Público — CNMP, tal a parte que diz: “ ou por afinidade, até o ter­ceiro grau …”, não con­traria a Con­sti­tu­ição pois o Código Civil limita o par­entesco por afinidade as situ­ações postas acima.

Vale dizer, o prefeito lá de Muzam­binho não pode nomear o tio, mas está “lib­er­ado” para nomear a mul­her do tio, ou a mul­her do sobrinho, etc.

A questão posta aqui, mais que o ato em si ou a sua legal­i­dade, é o bom exem­plo. Ao nosso sen­tir, o MPMA é bem mais que a “Mul­her de César”, não lhe basta ser hon­esto e casto, tem que pare­cer assim e não se ocul­tar atrás de um fil­igrana jurídico ou uma inter­pre­tação duvi­dosa para fugir às suas respon­s­abil­i­dades.

Como disse, já faz mais de mês que o assunto cir­cula, que a mídia ques­tiona e o rep­re­sen­tante do Min­istério Público Estad­ual não se vexa em fazer um pro­nun­ci­a­mento ou, pelo menos, fazer uma nota pública, não a imprensa, mas a sociedade, não deixando quais­quer dúvi­das sobre os fatos questionados.

Porém, até pior que o silên­cio do procurador-​geral – que seria com­preen­sível diante da impli­cação pes­soal –, é a omis­são de todos os demais inte­grantes do MPMA. Ninguém diz uma palavra, não existe um posi­ciona­mento da insti­tu­ição sobre os fatos, como se estivesse pouco lig­ando para o que pode pen­sar a sociedade.

Desde o dia que foi veic­u­lado a primeira noti­cia até o momento em que escrevo esse texto não há uma linha no sitio do MPMA infor­mando a pat­uleia que nada do que está dito tem fundo de ver­dade ou no caso de ter fundo de ver­dade, as providên­cias que serão ado­tadas com a final­i­dade de pro­te­ger o bom nome da insti­tu­ição.

Uma situ­ação com essa não com­porta o silên­cio ou, mesmo, a ausên­cia de transparên­cia sobre que providên­cias serão ado­tadas ou a inter­pre­tação que darão a questão do nepo­tismo daqui para frente.

A inér­cia, o silên­cio, a omis­são e/​ou a falta de transparên­cia passa à sociedade a ideia de que as cen­te­nas de pro­mo­tores e procu­radores con­seguem enx­er­gar o cisco no olho alheio, mas não a trava que cega os próprios olhos – para citar um céle­bre ensi­na­mento de Jesus Cristo no famoso Ser­mão da Mon­tanha, quando disse: “Não julgueis, para que não sejais jul­ga­dos; porque o juízo com que jul­gais, sereis jul­ga­dos; e a medida do que usais, dessa usarão con­vosco. Por que vês o argueiro no olho do teu irmão, porém não reparas na trave que tens no teu? Ou como poderás dizer a teu irmão: Deixa-​me tirar o argueiro do teu olho, quando tens a trave no teu? Hipócrita, tira primeiro a trave do teu olho, e então verás clara­mente para tirar o argueiro do olho do teu irmão.” (Mateus 7:15).

Com palavras diver­sas, mas no mesmo sen­tido, é isso que tenho ouvido de algu­mas pes­soas, den­tre as quais alguns mag­istra­dos: – Com qual moral podem nos pedir para con­denar alguém por, muitas das vezes, tolices, se nada dizem sobre os próprios “malfeitos”?

O Min­istério Público é insti­tu­ição per­ma­nente, essen­cial à função juris­di­cional do Estado, incumbindo-​lhe a defesa da ordem jurídica, do régime democrático e dos inter­esses soci­ais e indi­vid­u­ais indisponíveis. (CF, artigo 127).

Por tamanha respon­s­abil­i­dade não pode fazer a opção pelo silên­cio ou pela falta de transparên­cia, ou seja, não pode “esno­bar” a mul­her de César, como vem fazendo até agora.

Repetindo: a ten­ta­tiva de ocul­tar um ele­fante em baixo do tapete é a única que não serve ao MPMA, pelo con­trário, induz que a sociedade pen­sar “não” dos demais mem­bros do órgão.

Reforça este sen­ti­mento o fato de não ter havido, até o momento, sequer, uma man­i­fes­tação da enti­dade que rep­re­senta os inte­grantes do Min­istério Público Estad­ual.

Além do MPE quem parece achar que está tudo con­forme são as demais enti­dades lig­adas ao tema.

Nos sítios da OAB/​MA e da Asso­ci­ação dos Mag­istra­dos — AMMA, não se ler uma not­inha de rodapé com um pedido de esclarecimento.

Agem como se não tivessem nada com isso. Como não cara-​pálida?

Os mag­istra­dos estad­u­ais todos os dias são chama­dos a decidir sobre diver­sas ações de impro­bidade admin­is­tra­tiva e/​ou mesmo ações crim­i­nais envol­vendo gestores e ex-​gestores – con­de­nando diver­sos deles –, a par­tir das proposi­turas dos mem­bros do MPMA pela prática de nepo­tismo segundo a Súmula do STF, que agora todos fin­gem não exi­s­tir.

Há uma lei ou entendi­mento dis­tinto para deter­mi­nadas pessoas?

Outro silên­cio, talvez, mais con­strange­dor, é que faz a minha OAB/​MA, no sitio da enti­dade exis­tem notí­cias sobre tudo, menos sobre um assunto tão rel­e­vante quanto este.

A Ordem dos Advo­ga­dos do Brasil — OAB, não pode­ria – e não dev­e­ria –, se calar uma vez que nos ter­mos da Con­sti­tu­ição Fed­eral “o advo­gado é indis­pen­sável à admin­is­tração da justiça, sendo invi­o­lável por seus atos e man­i­fes­tações no exer­cí­cio da profis­são, nos lim­ites da lei”. CF, art. 133).

Logo, cobrar lisura, pos­tura e transparên­cia dos órgãos e insti­tu­ições essen­ci­ais à função juris­di­cional do Estado é, tam­bém, uma imposição à rep­re­sen­tação dos advo­ga­dos.

Ainda mais quando sabe – ou dev­e­ria saber –, que diver­sos advo­ga­dos sofrem abu­sos, são proces­sa­dos (inclu­sive crim­i­nal­mente) pelo exer­cí­cio reg­u­lar de suas obri­gações profis­sion­ais, seja por ter par­tic­i­pado de um processo lic­i­tatório, seja por ter dado um pare­cer com o qual algum mem­bro do Min­istério Público tenha dis­cor­dado.

As enti­dades rep­re­sen­ta­ti­vas dos mem­bros do min­istério público, dos mag­istra­dos, dos advo­ga­dos exi­girem ou cobrarem trata­mento igual­itário diante da lei não é afronta, não é revanche é, sim, zelar pelos princí­pios con­sti­tu­cionais que a todos os cidadãos obriga. Silen­ciar, omitir-​se é, por sua vez, negar tais princí­pios ou, pior, seg­re­gar deter­mi­nadas pes­soas a um sta­tus que as tor­nam mais iguais que os out­ros cidadãos.

Talvez isso seja mais com­preen­sível nas palavras do meu pai (que era anal­fa­beto por parte de pai, mãe e parteira): — Meu filho, o que está errado é da conta de todo mundo.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

BURO­C­RA­CIA E “INFORMALIDADE”.

Escrito por Abdon Mar­inho

BURO­C­RA­CIA E “INFORMALIDADE”.

Por Abdon Marinho.

EMB­ORA dirigindo muito pouco ou quase nada, por estes dias fui ao Depar­ta­mento Estad­ual de Trân­sito — DETRAN/​MA, ren­o­var minha carteira de habil­i­tação. Tenho CNH há vinte anos. Por ser defi­ciente e usar ócu­los a minha carteira pos­sui duas obser­vações A e D.

Emb­ora achando tudo isso uma maçada quedei-​me à exigên­cia da buro­c­ra­cia e dirigi-​me ao órgão que atendeu-​me com presteza e pri­or­i­dade. Cobrou-​me a taxa dev­ida – que paguei lá mesmo através de um aplica­tivo – dev­i­da­mente recol­hida ao caixa da Sec­re­taria de Fazenda do Estado — SEFAZ, con­forme apare­ceu no recibo bancário.

Feito isso o servi­dor me fotografou, recol­heu mais uma vez min­has impressões dig­i­tais — a quarta fez que faço isso – ou seja, em todas as renovações.

Até ai tudo bem, tudo nor­mal a exceção do abor­rec­i­mento de ter que cumprir esse rit­ual a cada cinco anos.

O que chamou minha atenção nesta incursão pelo DETRAN foi a quan­ti­dade de oper­ações finan­ceiras em “din­heiro vivo” que ocor­rem por lá.

Explico. Após meu atendi­mento no órgão o servi­dor emi­tiu uma guia de encam­in­hamento para os exames médi­cos e sendo gen­til, recomen­dou: – Ah, doutor, o paga­mento dessa taxa é em din­heiro.

Estran­hei, mas como estava “pre­venido” já sep­a­rei os R$ 70,00 (setenta reais) para o paga­mento da ben­dita taxa – que no meu caso por ser uma sim­ples CNH cat­e­go­ria B, saiu por 68 e uns tro­ca­dos. Chegando a clin­ica a recep­cionista rece­beu o din­heiro e, como recibo, carim­bou um “pago” com duas mãoz­in­has de “pos­i­tivo”, na guia que recebi no DETRAN.

O médico examinou-​me e viu que estava “tudo con­forme”, entre­tanto não con­seguiu reg­is­trar as min­has obser­vações na CNH (A e D) ou fazia uma ou fazia a outra.

Gen­til e querendo resolver pediu a recep­cionista que lig­asse ao DETRAN, pois, segundo ele, uma vez que se tratava de uma ren­o­vação e não havendo qual­quer alter­ação nas min­has condições físi­cas, dev­e­ria poder fazer o registro.

Não pode. A sen­hora que o aten­deu no órgão infor­mou que no ano pas­sado mudaram o pro­ced­i­mento e que nos casos como o meu, teria que pas­sar por nova peri­cia da junta médica do Estado.

Cheguei a brin­car com o médico: – doutor, será que curei essa poliomielite adquirida há cinquenta anos e ninguém me avisou?

Gen­til­mente a recep­cionista pas­sou o tele­fone e pediu que agen­dasse com a junta. O que fiz de lá mesmo, mar­cando para a sem­ana seguinte no DETRAN.

No dia e hora mar­cada lá estava eu de volta ao DETRAN, na recepção da Junta Médica, por estar cheia aguardei do lado de fora. Era o décimo quarto. Quando esvaziou um pouco voltei a recepção e fui abor­dado por um senhor:

– o sen­hor já pagou a taxa?

Sur­preso retruquei: – que taxa?

O sen­hor então esclare­ceu: – o sen­hor terá que pagar uma taxa de R$ 210,00 (duzen­tos e dez reais) para a real­iza­ção da perí­cia.

A minha sorte é que dis­punha desta quan­tia no bolso.

O sen­hor esclare­ceu que a taxa era em “espé­cie” não admitindo outra forma de pagamento.

Depois de alguns min­u­tos na recepção pude perce­ber out­ras pes­soas (uma ou duas) que “despre­venidas” foram emb­ora sem fazer a peri­cia médica. Vi, ainda, out­ras recla­mando da quan­ti­dade de taxas que já tin­ham desem­bol­sado no órgão. As típi­cas con­ver­sas de recepção: uns dizendo que gas­taram muito, out­ros recla­mando que já pagaram taxas disso ou daquilo.

No meu caso, especi­fico, não sei se have­ria neces­si­dade de mais uma peri­cia – tem­pos atrás já pas­sara por uma –, ou se era ape­nas para a arrecadar.

Mas o que ver­dadeira­mente me chamou a atenção, repito, foi a “infor­mal­i­dade” com que lidam com din­heiro den­tro da repar­tição pública ou nas suas cre­den­ci­adas.

Ora, será que o Estado ou os municí­pios têm algum con­t­role destes recur­sos? Destas taxas qui­tan­das através de carim­bos de “pago” ou reci­bos de papelaria? Há o recol­hi­mento do ISS dev­ido aos municí­pios?

Não se trata de pouco din­heiro.

Segundo dados do DETRAN temos atual­mente quase dois mil­hões de motoris­tas habil­i­ta­dos, cada um destes, pelo menos uma vez a cada cinco anos tem que pagar suas taxas junto ao DETRAN e suas cre­den­ci­adas.

Se cada um só pagar a taxa sim­ples – que paguei, motorista cat­e­go­ria B –, esta­mos falando de mais R$ 130 mil­hões de reais. E quan­tos não são os motoris­tas sub­meti­dos à perí­cia médica pagando cada um R$ 210,00 (duzen­tos e dez)?

Exis­tem as infini­tas taxas “infor­mais” para reg­u­lar­iza­ção de veícu­los? De quan­tos mil­hões de reais esta­mos falando?

Segundo o DETRAN, temos bem mais de um mil­hão de veícu­los cadastra­dos no órgão. Quanto em reais cada um deles teve que “mor­rer” para poder cir­cu­lar? Quanto foi pago em taxas “informais”?

Assisto os municí­pios pade­cerem com a falta de recur­sos.

Fiquei pen­sando no quanto estão deixando de arrecadar só junto a essa fonte.

Por mais que me esforce não con­sigo acred­i­tar que esteja havendo algum con­t­role, mesmo do Municí­pio de São Luís – em tese, o mais estru­tu­rado –, não tem como con­tro­lar esses serviços. E se tem, se não está havendo nen­hum de tipo sone­gação de receita, por que não emitem as guias de arrecadação para serem pagas junto aos ban­cos? Ficaria muito mais seguro para todos os envolvi­dos.

Não con­segui cap­tar a razão de um órgão público lidar com “din­heiro vivo”.

Acho que vou per­gun­tar a algum amigo que tra­balha na Receita Fed­eral do Brasil.

Alguém saberia o motivo?

Abdon Mar­inho é advogado.

SOBRE FIL­TROS, SENTI­NAS E A EXPLO­RAÇÃO DA MISÉRIA.

Escrito por Abdon Mar­inho

SOBRE FIL­TROS, SENTI­NAS E A EXPLO­RAÇÃO DA MIS­ÉRIA.

Por Abdon Marinho.

A IMAGEM do prefeito de Paço do Lumiar, sen­hor Domin­gos (PCdoB), com parte de seu sec­re­tari­ado fazendo a entrega de um fil­tro de barro numa comu­nidade do municí­pio gan­hou o mundo (pelo menos o dig­i­tal), este fim de sem­ana.

A fotografia, difun­dida ini­cial­mente pelo próprio prefeito – e por seus ali­a­dos –, foi, pos­te­ri­or­mente, explo­rada pelos seus adver­sários como exem­plo cristal­izado do atraso a que se encon­tra sub­metido o municí­pio de Paço do Lumiar, na região met­ro­pol­i­tana.

Por fim, o próprio prefeito “esclare­ceu” a história da fotografia entre­gando o fil­tro. Segundo ele, não se tra­tou uni­ca­mente da entrega de um fil­tro de barro, mas tam­bém, de uma “cas­inha” com louça san­itária e pia para aque­les que nada têm.

Pronto, tudo esclarecido!

O retrato do prefeito entre­gando um fil­tro de barro junto com a expli­cação de que não se tratava ape­nas de um fil­tro mas, tam­bém, de um con­junto com uma “sentina” é o ver­dadeiro retrato do Maran­hão neste, já avançado, século vinte um. E não é uma imagem glo­riosa como son­hada e prometida, mas sim, da ver­gonha e do atraso.

Acred­ito que o gov­er­nador do estado, sen­hor Flávio Dino, do mesmo par­tido do prefeito, vá chamá-​lo para uma sessão de admoes­tação, não por ter exibido nos­sas ver­gonhas para todo mundo, mas sim, por ter se ante­ci­pado a ele, o gov­er­nador, no pro­ceder, pois já tinha anun­ci­ado, nas suas redes soci­ais, que faria a entrega de algu­mas cen­te­nas de “cas­in­has” ao longo deste ano que prin­cipia.

Como o prefeito ousou “queimar” a largada de tanto “progresso”?

Peço des­cul­pas aos leitores pelo tom irônico das colo­cações, mas não con­sigo me con­ter diante de tais fatos, a menos que sub­sti­tuísse a iro­nia pela cólera.

Esta­mos em pleno século vinte um, bem avançado, até, e vejo um gov­er­nador de Estado anun­ciar que vai mel­ho­rar a situ­ação san­itária do Maran­hão com a entrega de mil­hares de senti­nas e, depois, vejo um prefeito da região met­ro­pol­i­tana “queimando” a largada e já fazendo a entrega de alguns “sinais” de tal pro­gresso. Isso na região met­ro­pol­i­tana, quando se esper­ava, água encanada, esgoto e ban­heiros den­tro das residên­cias.

Aqui não estou recla­mando que façam essa entrega, pelo con­trário. Faz pouco tempo que um pro­grama da Rede Globo, o Globo Rural, em edição espe­cial sobre as que­bradeiras de coco do estado, exibiu as pés­si­mas condições san­itárias do nosso povo, com as pes­soas tomando banho em ban­heiros de meia-​parede de palha e fazendo as demais “neces­si­dades” no mato, como bem disse uma enver­gonhada cidadã para a repórter que a entre­vis­tara. Senti­nas, por­tanto, são mais que necessárias.

O que me causa hor­ror é que autori­dades não sin­tam qual­quer con­strang­i­mento em explo­rar e fazer pros­elit­ismo político com este tipo de situ­ação, com essa mis­éria que ainda agride nos­sos irmãos.

Falta pudor as autori­dades, falta-​lhes noção de civil­i­dade e respeito à mis­éria alheia. Lem­bro do tempo em que as pes­soas tin­ham ver­gonha de con­vi­dar alguém às suas casas pelo fato das mes­mas, emb­ora asseadas, não pos­suírem um ban­heiro. Hoje a autori­dade “invade” os quin­tais para mostrar a “sentina” que deu a família.

Tratar-​se de um total desre­speito – e isso não vem de hoje.

Lem­bro que ainda no gov­erno ante­rior, durante uma crise de abastec­i­mento de água na cap­i­tal, o secretário de saúde, tam­bém respon­sável pela admin­is­tração da empresa dis­tribuidora do líquido pre­cioso anun­ciou com pompa e cir­cun­stân­cia que iria resolver o prob­lema: per­furaria alguns poços arte­sianos para aten­der uma parte da pop­u­lação e a outra parte seria abaste­cida com carros-​pipas.

Uma solução extraordinária.

O pior foi ver, alguns dias depois, o secretário “pas­sando os carros-​pipas em revista”.

Isso mesmo, os veícu­los enfileira­dos e o secretário, com seu porte avan­ta­jado, passando-​os em revista, como fazem os ofi­ci­ais mil­itares com seus comandados.

A cena, fes­te­jada e can­tada por muitos, sobre­tudo, pela mídia “amil­hada”, ao meu sen­tir, até aquele momento, me pare­ceu patética e ridícula, tanto que escrevi sobre.

Então a solução para o abastec­i­mento de água era distribuí-​la em carros-​pipas, talvez colo­car os mes­mos em pon­tos estratégi­cos para que as pes­soas fos­sem bus­car o líquido como mod­er­nas latas, baldes ou bacias?

Não socor­ria a autori­dade a neces­si­dade de mel­ho­rar o sis­tema de cap­tação, inclu­sive com a recu­per­ação dos rios, e fazer a água chegar nas torneiras dos cidadãos, tratada e com qual­i­dade, como é feito no mundo civ­i­lizado? Talvez impedir a ocu­pação des­or­de­nada nas mar­gens dos rios da ilha e recu­perar o Sis­tema Butantã?

O tempo pas­sou, um novo gov­erno se instalou e aquilo que à época já me pare­cia ridículo, patético e uma explo­ração da mis­éria dos cidadãos, ao invés de deixar de exi­s­tir, parece-​me, que fez foi aumen­tar ou alguém con­segue imag­i­nar algo mais “extrav­a­gante” que o anún­cio, pelo próprio gov­er­nador, autori­dade máx­ima do estado, registre-​se, que vai dis­tribuir cen­te­nas, talvez, mil­hares, de “senti­nas”?

Pois é, o gov­er­nador não só anun­ciou como fez questão de mostrar a fotografia da “cas­inha” na sua rede social.

Emb­ora a inau­gu­ração de “senti­nas” seja a primeira vez que veja – e olhe que no caso do gov­er­nador, ele “inau­gurou a intenção”, com dire­ito a foto e tudo mais –, o atual gov­erno estad­ual tem sido “useiro e vezeiro” nes­tas práticas.

Há um tempo, acho que na quadra final de 2017, assisti estar­recido, o gov­er­nador suando “em bicas” inau­gu­rando um poço arte­siano no Municí­pio de Santo Amaro, um dos mais pobres do estado. Até reg­istrei nas min­has redes soci­ais.

Claro que não reclamei da inau­gu­ração de poço, assim como não reclamei da “inau­gu­ração da intenção de se entre­gar senti­nas”, o que causa-​me espé­cie é ver­i­ficar que as autori­dades não sen­tem nen­huma ver­gonha e até fes­te­jam diante de tamanha miséria.

Lá estava o gov­er­nador tomando um “banho” ao abrir a chave e fazer jor­rar a água que tanto servirá aquela comu­nidade.

A minha curiosi­dade é saber se o gov­er­nador, a exem­plo do prefeito de Paço do Lumiar, vai fazer, pes­soal­mente, a entrega das “senti­nas” que anun­ciou.

A título de sug­estão, pode fazer a inau­gu­ração lit­eral do san­itário e puxar a cordinha da descarga para o “clique” e deleite dos xerim­ba­bos. Será o ápice em matéria de realização.

Mais uma vez peço des­cul­pas pelo tom irônico mas não con­sigo me con­ter diante de tanta mesquin­haria, com prefeitos e até o gov­er­nador se ocu­pando da inau­gu­ração de poço arte­siano aqui, uma sentina ali é por aí vai.

Mesmo o pro­jeto “Escola Digna” que apre­sen­tam como a jóia da redenção do Maran­hão, está muito longe disso, é ape­nas a sub­sti­tu­ição das “taperas” por “escol­in­has” com um pouco mais de estru­tura, mas que não resolverá o grave prob­lema edu­ca­cional no estado, esta­mos com sécu­los de atraso.

Qua­tro anos depois da posse era para ver­mos inau­gu­ração de empreendi­men­tos que trouxessem riquezas e empre­gos para o nosso povo; esco­las grandes com edu­cação de qual­i­dade; obras estru­tu­rantes que aju­dassem a desen­volver o estado, etc.

Tanto tempo depois e com tris­teza, vejo pes­soas chorarem de emoção ao par­tic­i­par da inau­gu­ração de uma escol­inha, de um poço arte­siano ou mesmo de “kit san­itário”.

As pes­soas acred­i­tam que aque­les bene­fí­cios as lib­er­tarão da sede, da falta de edu­cação e mesmo da mis­éria.

Só que quem “arma o circo” sabe que não é nada disso, trata-​se ape­nas da manutenção dos “cativos” numa situ­ação de mel­hor con­forto para poder man­ter a explo­ração sec­u­lar.

— Ah, foi prefeito fulano que trouxe essa sentina; — Ah, foi o gov­er­nador bel­trano que “trouxe” esse poço e essa escola.

Já se pas­saram qua­tro anos desde a rup­tura do “antigo régime” e grande mudança é a mão que segura o chicote.

Por vezes, sinto que parece exi­s­tir a intenção delib­er­ada de man­ter o Maran­hão encravado no atraso.

Vejam, temos um dos mel­hores por­tos do mundo, temos um Cen­tro de Lança­mento, temos, ainda, um grande poten­cial hídrico, riquezas min­erais diver­sas, um solo quase todo agricultável, mas, ape­sar de tudo isso, con­tin­u­amos “pati­nando” nas últi­mas colo­cações nos rank­ings inter­na­cionais de desen­volvi­mento econômico, social, humano, edu­ca­cional e tudo mais.

Não pode ser só incom­petên­cia geren­cial, só pode ser de propósito. Aos gov­er­nantes deve “sobrar” alguma “van­tagem” em man­ter nosso povo tão mis­erável a ponto de aplaudir e agrade­cer pela inau­gu­ração de um poço, de uma escol­inha e, até mesmo, de uma sentina.

Por estes dias, na sua cruzada obses­siva para insere-​se no cenário político nacional e “vender-​se” como alter­na­tiva de can­di­datura das forças de esquerda, o gov­er­nador, “cavou” uma entre­vista à Globo News, onde recon­heceu que a mis­éria aumen­tou no estado – na ver­dade não teve como con­tornar os números –, mas, como se tornou praxe, a culpa é sem­pre dos out­ros, agora foi a vez da con­jun­tura econômica des­fa­vorável.

A ninguém socor­reu a ideia de per­gun­tar se não seria, tam­bém, falta de habil­i­dade e ideias para fazer avançar eco­nomi­ca­mente um estado com tan­tas poten­cial­i­dades. Como os jor­nal­is­tas, pare­cem igno­rantes quanto às poten­cial­i­dades do Maran­hão – só con­hecem os pés­si­mos indi­cadores –, deixaram o gov­er­nador vender como ver­dade seus próprios mitos.

O pior é que você olha para o hor­i­zonte e não enx­erga qual­quer pos­si­bil­i­dade de mudança. Isso, sim, é ver­dadeira­mente triste.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

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