UM BODE INVISÍVEL NA ALEMA.
Por Abdon Marinho.
NO ANO DE 2013 o deputado inglês Chris Huhne renunciou ao cargo após se declarar culpado de haver ocultado a verdade para evitar uma multa de trânsito que havia cometido dez anos antes, e que pedira sua esposa que a assumisse.
Também, no mesmo país, agora em 2018, foi a vez de Michael Bates, que tem o título de barão, renunciar ao cargo no Departamento de Desenvolvimento Internacional, um órgão do governo britânico que auxilia países pobres, por ter chegado alguns minutos atrasados para o início de uma sessão onde responderia a perguntas sobre sua atuação frente ao órgão.
Há poucos dias escrevi sobre o mau começo da atual legislatura na Assembleia Legislativa do Maranhão, com graves acusações mútuas entre os deputados (um imputando a outro, e vice-versa, práticas de corrupção, extorsão, chantagem, traficância de influência, etc.); ou um acusando o outro de plágio de projetos de lei; outros se engalfinhando pelo apoio ou não a um time de futebol do interior; ou, se anulando na prática de negar aprovação a requerimentos de informação; ou, ainda, sendo desrespeitados publicamente por auxiliares de outros poderes.
Isso, para não falar nas graves denúncias – as quais recuso o crédito –, de venda de emendas ou mesmo de cargos.
Na minha ingenuidade e mania de duvidar do óbvio, jamais poderia imaginar que pudesse piorar. Estava errado.
Dias depois daquele texto um deputado estadual, na capital do estado vizinho, após fazer uso excessivo de bebidas alcoólicas e, segundo o mesmo, medicamentos, envolveu-se em uma monumental confusão com direito à lesão corporal de outras pessoas, desacato, ameaça de morte aos policiais que o deteve, detenção, saindo da delegacia de polícia, por fim, após “intensas conversas”, com um Termo Circunstanciado de Ocorrência — TCO.
Segundo dizem, não foi a primeira vez que sua Excelência “aprontou”. Noutra ocasião, aqui mesmo, na capital do estado onde exerce o mandato, o deputado estadual, também, após fazer uso de bebidas alcóolicas (e sabe-se lá que outros “medicamentos”), envolveu-se num acidente de trânsito causando danos materiais a diversas pessoas. Ainda segundo dizem, a polícia militar estadual ao invés de adotar as medidas legais cabíveis, fez foi conduzir o deputado até em casa, ou seja, deu-lhe uma “carona”.
Pois bem, no mesmo dia do ocorrido na capital do estado vizinho, o deputado emitiu uma nota nas suas redes sociais assumindo-se como dependente químico e pedindo desculpas públicas.
Achei simpática a atitude do deputado – e até me solidarizo com o seu problema. É fato que a dependência química é uma doença que merece ser tratada.
Em toda minha vida sempre tive muita simpatia pelos enfermos, idosos, crianças, por todos os desvalidos de uma forma geral, até porque tive poliomielite, sou deficiente, e sempre que podem os xerimbabos do governo estadual, fazem questão de estampar que sou “aleijado”, que sou manco, que sou “doidão”.
E vejam que esse é um governo que se diz “inclusivo”.
Sigamos. O fato do deputado ser dependente químico a dispensar tratamento médico o que fez e, sobretudo, o que disse é algo muito grave a não comportar o silêncio das autoridades.
Disse sua Excelência: “Vocês são polícia, né? A gente mata gente”. Mais: “Eu sou, eu sou mais que tu. Eu sou deputado, e sou rico. Vou mandar te matar, vagabundo. Vou te pegar, eu te mato. Sou filho do ****. Pergunta quem é ****. Eu vou te matar. Vou mandar te matar”. E ainda: “Tá morto ele. Pergunta quem é ****. Esse cara tá morto”, completou.
Não me recordo ter ouvido coisas tão graves da boca de um parlamentar, em todos esses anos. Cinicamente alguns aduladores retiram da boca do parlamentar as palavras que disse, para colocá-las na boca de outro cidadão chamado: Walker, Johnnie Walker.
Independente do deputado ser dependente químico, de está alcoolizado, suas ações e suas próprias palavras não podem ser ignoradas. Até por que, aquilo que disse (ou confessou?) é o que se comenta no estado inteiro.
Apesar disso, não foi o que se viu. As autoridades maranhenses, começando pela ALEMA parece que tomou “um porre” de perder a memória. Por isso mesmo ninguém lembrou do ocorrido com um dos seus membros no final de semana anterior.
Pelo site da Casa de Manoel Bequimão – e por suas redes sociais (Facebook) –, acompanhei os trabalhos na casa do povo durante toda a semana.
Não vi uma nota oficial sobre o triste episódio, um posicionamento de qualquer dos deputados. Não se tem notícia, pelo menos no seu canal de notícias oficial, de uma reunião da Mesa para tratar do assunto.
Apesar do presidente da Assembleia, instado a se manifestar para uma matéria televisiva, dizer que o Conselho de Ética iria apurar os fatos, tal assunto passou foi longe dos debates das excelências estaduais durante toda a semana.
Simplesmente fingiram que nada aconteceu, que o fato de um deputado estadual dizer “a gente mata gente”, que é mais que as demais pessoas, por ser deputado e ser rico, além de dizer textualmente que vai mandar matar um policial, não tem relevância alguma.
Como, aliás, já tinham procedido na legislatura passada.
Tenho dificuldades com o silêncio. Ainda mais quando o silêncio se opera em uma situação de tamanha gravidade.
A Assembleia Legislativa, composta por representantes do povo, no mínimo deveria ter dado uma nota oficial a ser reproduzida em todos os veículos de comunicação, principalmente no estado vizinho, indicando que providências iria tomar ou para se “solidarizar” com o deputado ou, dizer que concorda com o que ele fez e disse ou, ainda dizer que ele estava certíssimo ao dizer “a gente mata gente” e ameaçar mandar matar o policial que estava cumprindo seu dever.
O silêncio, este sim, não combina com a situação.
Não é aceitável que se tenha uma casa de representantes do povo agindo como se não devesse satisfação alguma à patuleia.
Nada. O silêncio como resposta.
A mesma resposta, ou seja, o silêncio, também foi adotada pelo partido do parlamentar que desde sua fundação sempre “se vendeu” como defensor dos interesses da sociedade, dos direitos humanos, do respeito ao próximo.
Quando a situação exigiu um esclarecimento público à sociedade fingiu que não era com ele, que “não conhece” o deputado.
Vejam, se tanto a ALEMA quanto o partido tratou do assunto intramuros – e não duvido que tenha feito –, não interessa, ambos devem esclarecimentos, posicionamentos claro, perante à sociedade de dois estados, para dizer o mínimo, entretanto, já tendo se passado uma semana não foi o que se viu.
Apostaram no esquecimento do “patrão”, o povo.
As autoridades do Poder Executivo, também, parecem terem tomado “todas”, ficado esquecidos. Elas que “palpitam” sobre tudo, até sobre “briga de vizinhos”, sobretudo, nas redes sociais, diante de um fato de tamanha gravidade não disseram, oficialmente e publicamente, nada.
Ora, talvez fosse importante o próprio governador esclarecer que um aliado seu “de primeira hora”, na verdade ‚não disse o que disse, ou se disse o que disse, como autoridade máxima, iria determinar rigorosa apuração sobre a “inconfidência” do parlamentar de que “a gente mata gente”, sem contar que se escudou no pai para “arrotar” toda valentia.
O pai do “valente” foi (não sei se ainda é) apoiador do atual inquilino dos Leões desde pretéritas campanhas. Na época, não sei se com verdade, os adversários diziam que sua Excelência recebeu apoio incondicional do cidadão a quem filho (com desconto que se atribui ao alcoolismo) aponta como “chefe” dos que “matam gente”, “pergunta quem é ***. Esse cara está morto”.
A família do “valente” priva da confiança do governador, com um irmão, “até ontem” ocupando uma pasta do primeiro escalão do governo.
Como é que ninguém, nem Assembleia Legislativa, nem partidos que apoiam o governo, nem o governador têm explicações alguma a dar a sociedade? Esse é o novo Maranhão que nos prometeram? Isso é o que querem para o Brasil caso cheguem à Presidência da República?
O bode está na sala, ainda que finjam não vê-lo não tem como disfarçar o cheiro.
Abdon Marinho é advogado.