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O PAS­SADO QUE TEIMA EM NÃO PASSAR.

Escrito por Abdon Mar­inho

O PAS­SADO QUE TEIMA EM NÃO PAS­SAR.

Por Abdon Marinho.

HAVIA prometido não me envolver nesta intem­pes­tiva dis­cussão sobre os fatos ocor­ri­dos em 1964: golpe, chama­mento pop­u­lar, rev­olução, ditadura e tan­tas out­ras coisas.

Um leitor de pouco mais de 20 anos – ou seja, nascido bem depois, não ape­nas dos even­tos de 64, mas, da própria rede­moc­ra­ti­za­ção do país –, pediu-​me que falasse sobre isso.

A solic­i­tação foi feita já tem alguns dias, acred­ito que logo depois do pres­i­dente da República ter deter­mi­nado, com dire­ito a nota ofi­cial lida pelo general-​porta-​voz, que se comem­o­rasse, em todos os quar­téis do país o golpe mil­i­tar de 1964.

A par­tir de então a pauta do país foi tomada por esse debate, a ponto da grande mídia até encomen­dar pesquisas sobre a opinião dos cidadãos brasileiros sobre o assunto, com dire­ito a divul­gação em todos demais veícu­los de comu­ni­cação.

Achei desde a proposi­tura do pres­i­dente ao debate que se alas­trou pelo país, tudo um grande despropósito.

Ora, desde aquele evento que mer­gul­hou o Brasil num régime de exceção que durou vinte um anos, a data, com maior ou menor dis­crição, sem­pre foi fes­te­jada.

Setores mil­itares sem­pre acharam que fiz­eram um enorme bem a nação e que livrou nosso povo do “comunismo”.

Dito isso, por qual razão se traz para o debate tal assunto, a ponto de se reviver tan­tas paixões?

Maior despropósito, ainda, que tal “pauta” tenha sido trazida pelo próprio pres­i­dente da República.

Em um texto ante­rior disse achar isso um absurdo e, ques­tion­ado por um amigo, fiquei lhe devendo uma expli­cação com­ple­tar: a ini­cia­tiva do pres­i­dente (e do gov­erno) foi absurda porque é papel do man­datário maior ten­tar paci­ficar o país diante de tamanha divisão, e não, pelo con­trário, ten­tar acir­rar, ainda mais, os âni­mos.

O pres­i­dente pre­side para todos os brasileiros, os de esquerda, os de dire­ita, os bran­cos, os negros, os índios, os asiáti­cos, os het­eros­sex­u­ais, os homos­sex­u­ais, os demais inte­grantes da sopa de letrin­has, os ricos, os pobres, os mis­eráveis, todos, todos brasileiros e os de out­ras nacional­i­dades que aqui residem.

A respon­s­abil­i­dade do pres­i­dente da República é, pos­suindo suas próprias con­vicções e opiniões pes­soais, respeitar os demais cidadãos e admin­is­trar o país.

Isso implica, obvi­a­mente, em não aumen­tar, incen­ti­var ou fomen­tar as divisões nat­u­rais já exis­tentes em um país het­erogê­neo e de dimen­sões con­ti­nen­tais.

Lem­bro que quando saiu o resul­tado do primeiro turno das eleições pres­i­den­ci­ais escrevi um texto inti­t­u­lado: “DEU PT. E AGORA?”.

Dizia naquela opor­tu­nidade que o resul­tado do primeiro turno, inde­pen­dente do Par­tido dos Tra­bal­hadores — PT, sagrar-​se vito­rioso ou não, era o resul­tado por ele bus­cado, pois per­dendo ou gan­hando as eleições, per­manece­ria vivo no debate político nacional. Leiam lá que verão fazer todo o sen­tido.

Não sou pro­feta, mas já vivi o sufi­ciente para fazer uma leitura da real­i­dade na qual estou inserido.

Até aqui – torço para que mude –, o atual gov­erno vem admin­is­trando o país como o PT, só que com o sinal tro­cado.

Ninguém fra­cio­nou tanto a sociedade para gov­ernar quanto os qua­tro gov­er­nos petis­tas, nem mesmo os gov­er­nos mil­itares, com toda sua carên­cia de legit­im­i­dade, sobre­tudo, nos últi­mos gov­er­nos do régime.

O PT fomen­tou – como fazem todos os regimes total­itários, fas­cismo, nazismo, comu­nismo, maoísmo –, o mantra do “nós con­tra eles”. Os “nós”, somos os bons, os mel­hores, nos­sos defeitos são nos­sas qual­i­dades, e por aí vai.

Como pre­visto, o atual gov­erno envereda pelo mesmo cam­inho ao incen­ti­var práti­cas divi­sion­istas (ou dis­crim­i­natórias) no país.

Mas volte­mos à polêmica cri­ada sobre o régime mil­i­tar.

Vejam, a rup­tura da ordem insti­tu­cional ocor­reu a 55 anos. O debate sobre se foi ou não foi golpe mil­i­tar, afora o aspecto histórico é irrel­e­vante para a sociedade depois dos dois pactos soci­ais cos­tu­ra­dos depois daquele evento.

O de 1979, com o acordo pela Lei da Anis­tia, que foi ampla geral e irrestrita; e, em 1988 com a pro­mul­gação da Con­sti­tu­ição Fed­eral. Isso sem con­tar com o fim do régime mil­i­tar ocor­rido com a eleição do sen­hor Tan­credo Neves em janeiro de 1985, colo­cando fim ao régime dos generais/​presidentes.

Não estou dizendo que se deva igno­rar a história do país. Longe disso, pelo con­trário a história é a nossa bús­sola para evi­tar­mos os erros do pas­sado.

Acon­tece que na atual quadra política ninguém está dis­cutindo fatos históri­cos. Estão sim, fazendo pros­elit­ismo político de suas próprias con­vicções. E fazendo isso fal­si­f­i­cando a história.

O Brasil sofreu uma rup­tura na sua ordem insti­tu­cional em 1964, porque não se sub­sti­tui um pres­i­dente nos moldes como foi feito pelos mil­itares. É ver­dade.

Assim como é ver­dade que o “golpe” teve amplo apoio pop­u­lar, e o primeiro pres­i­dente do régime, gen­eral Castelo Branco foi empos­sado pelo Con­gresso Nacional, legit­i­ma­mente eleito pelo povo.

O Brasil viveu uma ditadura com os mil­itares. Sim, é ver­dade. A edição do Ato Insti­tu­cional nº. 5, que per­mi­tiu o fechamento do Con­gresso Nacional, cercea­mento das liber­dades indi­vid­u­ais, cas­sação de par­la­mentares, min­istros de tri­bunais, prisões sem for­mação de culpa, sus­pen­são do habeas cor­pus, etc., são incom­patíveis com qual­quer ideia de democ­ra­cia. Tanto assim que o min­istro Jar­bas Pas­sar­inho, naquele 13 de dezem­bro de 1968, disse man­dar às favas os escrúpu­los de con­sciên­cia.

Sim, todos sabiam que estavam mer­gul­hando o país na fase mais autoritária de um régime de exceção. Nesta fase que durou, pelo menos dez anos, tive­mos assas­si­natos de opos­i­tores, tor­turas, seque­stros e tan­tos out­ros crimes igual­mente con­sid­er­a­dos hedion­dos.

E ninguém tem o dire­ito de querer rel­a­tivizar crimes como a tor­tura ou assas­si­natos por moti­vações políti­cas sob o argu­mento que no Brasil essas práti­cas não se deram com a mesma inten­si­dade do ocor­rido noutros países da América do Sul, como a Argentina (com 30 mil mortos/​desaparecidos) ou o Chile (com cerca de 6 mil mortos/​desaparecidos).

Argu­men­tar que para a ditadura brasileira se aprox­i­mar das ditaduras daque­les países teríamos que ter entre mor­tos e desa­pare­ci­dos cerca de 100 mil cidadãos é de um cin­ismo atroz.

A ditadura brasileira é respon­s­abi­lizada pela morte/​desaparecimento de 400 pes­soas e, sabe-​se lá, quan­tos tor­tu­ra­dos, isso não a torna menos “ditadura”, ainda que use o cínico argu­mento de que estes mor­tos e/​ou tor­tu­ra­dos “mere­ce­ram”. Ainda que fosse um, ainda que “mere­cessem”, o Estado – nen­hum Estado –, tem esse dire­ito, e isso não torna o ato menos vil.

Como disse ante­ri­or­mente ninguém tem o dire­ito de rel­a­tivizar o sofri­mento de quem foi tor­tu­rado ou daque­les que foram pri­va­dos do con­vívio dos seus pais, fil­hos, irmãos ou qual­quer ente querido. Essas pes­soas têm todo o dire­ito de car­regarem para sem­pre a sua dor e jamais per­doarem os que tiveram par­tic­i­pação na mesma.

Não é legí­timo, sequer, que cobre­mos outro posi­ciona­mento destas pes­soas e, muito menos, que se faça pouco caso da sua dor.

Quem faz isso ape­nas rev­ela traços de psi­co­pa­tia.

Mas, feita tal pos­tu­lação, aque­les que hoje “puxam o coro” con­tra o régime mil­i­tar de 64, con­tra o golpe, con­tra a ditadura, estão longe, muito longe de serem inocentes ou de assim agirem por respeitarem os dire­tos humanos, a liber­dade e a segu­rança dos cidadãos, muito pelo con­trário.

Enquanto, ainda hoje, protes­tam con­tra os fatos ocor­ri­dos no Brasil em 1964, há, por­tanto, cinquenta e cinco anos, simul­tane­a­mente a isso, defen­dem as ter­ríveis ditaduras da Cor­eia do Norte, de Cuba e da Venezuela, que destruíram seus países e matam diari­a­mente, através de tor­turas e assas­si­natos, mil­hares de seus con­ci­dadãos.

Logo ali na fron­teira norte do Brasil, temos, segundo dados das Nações Unidas, mais de um mil­hão de cri­anças sendo tor­tu­radas pela fome, pelas doenças; temos cen­te­nas de cidadãos pre­sos por crimes políti­cos e out­ros mil­hões exi­la­dos e pri­va­dos de sua pátria.

Os que protes­tam con­tra o régime de mil­i­tar brasileiro, não ape­nas silen­ciam, eles apoiam for­mal­mente o régime de Nicolás Maduro.

Um caso, talvez seja o mais ilus­tra­tivo desta visão caolha com a qual muitos enx­ergam os fatos ocor­ri­dos há cinquenta e cinco anos em detri­mento dos fatos atu­ais, o caso Cesare Bat­tisti.

O mundo inteiro sabia do envolvi­mento de Cesare Bat­tisti com os assas­si­natos de alguns de seus con­ci­dadãos e por ter deix­ado alei­jado um jovem de tenra idade à época.

As instân­cias da justiça ital­iana com­pro­varam sua cul­pa­bil­i­dade, assim como out­ros tri­bunais inter­na­cionais.

Ape­sar disso tudo, Cesare Bat­tisti veio para o Brasil com sta­tus de “herói” e foi fes­te­jado e “tietado” por todos esses que ainda hoje protes­tam con­tra a ditadura brasileira.

Igno­rando os diver­sos ape­los do gov­erno e de todos os cidadãos ital­ianos, os gov­er­nos petis­tas do país (repisasse: estes mes­mos que estão nas ruas prote­s­tando con­tra a ditadura de 64), deram-​lhe guarda e lhe con­ced­eram o título de perseguido político.

Pois bem, preso no começo deste ano, na Bolívia, e depor­tado para Itália, onde cumpre pena de prisão per­pé­tua, Cesare Bat­tisti con­fes­sou que, de fato, fora o respon­sável pelos crimes pelos quais foi con­de­nado e, mais, que sem­pre negou tais fatos para con­tar com a sim­pa­tia de gov­er­nos e pes­soas “ditas” de esquerda. Não pre­cisava con­fes­sar, as provas eram patentes.

Ape­sar da con­fis­são do criminoso/​torturador, até agora não apare­ce­ram – den­tre aque­les que foram para as ruas no Brasil car­regando faixas “Bat­tisti Livre” –, ninguém para se des­cul­par com os brasileiros, e com os ital­ianos, pelo vex­ame de terem “acoitado” o ter­ror­ista por tanto tempo em ter­ritório nacional. Pior, ainda tem os que dizem que ele foi “tor­tu­rado” para confessar.

Ora, que moral têm essas pes­soas para revolver os fatos do nosso pas­sado se não têm o dis­cern­i­mento sequer de enx­er­gar o pre­sente?

Em um texto ante­rior, dizia que ditadura nen­huma, de dire­ita ou de esquerda, mere­cem o respeito dos cidadãos de bem.

Diante do atual debate, sobre­tudo, por quem faz o debate é hora dos cidadãos de bem – que nunca mataram, tor­tu­raram ou defend­eram assas­si­nos e tor­tu­radores –, igno­rarem os tolos e seguirmos em frente, tra­bal­hando para con­stru­irmos um país mais justo e humano para todos.

É o que apelo. Vamos deixar o pas­sado pas­sar.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

NO DIA DA MEN­TIRA, CON­SID­ER­AÇÕES SOBRE A VERDADE.

Escrito por Abdon Mar­inho

NO DIA DA MEN­TIRA, CON­SID­ER­AÇÕES SOBRE A VER­DADE.

Por Abdon Marinho.

DESDE que voltei a escr­ever, há cerca de seis anos – e fiz isso por sug­estão de um amigo jor­nal­ista que me propôs ter uma col­una em um jor­nal local –, me deparo com uma con­statação: o medo e, tam­bém, o incô­modo, que a ver­dade causa.

Tanto assim, que já escrevi sobre este fato, por baixo, uma dúzia de vezes.

Penso, por vezes, que isso se deve àquela velha lenda – já con­tada aqui –, mas que sem­pre é bom repetir.

Conta a lenda que certa vez andava a Ver­dade por uma estrad­inha bucólica do inte­rior quando avis­tou a Men­tira tomando um refres­cante banho em um ria­cho.

— Bom dia, Ver­dade! Dia quente, não é?

A Ver­dade sen­tido o calor que lhe tomava o corpo, concordou:

— Sim. O dia está, de fato, muito quente.

A Men­tira, então, prosseguiu:

— Pois é, dev­ido a isso resolvi parar e me refres­car neste arroio. A água límp­ida está uma delí­cia. Venha se refres­car um pouco.

A Ver­dade, vendo a limpi­dez da água e o seu fres­cor, con­cor­dou em nadar um pouco a fim de fazer pas­sar o calor. Despiu-​se e entrou na água.

Era um ardil da Men­tira. Já nas primeiras braçadas da Ver­dade, aquela (a Men­tira) pegou-​lhe as roupas e vestiu-​se, saindo por aí propagando-​se com as vestes da Verdade.

Já a Ver­dade, por sua vez, recusou-​se a vestir as roupas da Men­tira e pas­sou a andar nua.

E assim foi. Por isso que muitos (senão a maio­ria), pref­erem enganar-​se com a Men­tira vestida com as roupas da Ver­dade a ter que con­viver com a Ver­dade nua e crua.

O anôn­imo que con­tou, pela primeira, vez tal lenda não pode­ria ter sido mais feliz.

Com o pas­sar dos anos – a cul­mi­nar com os dias atu­ais –, assis­ti­mos as pes­soas preferirem a men­tira, o engodo, a empul­hação a ter que con­viver com a ver­dade na sua inteireza; preferirem a adu­lação desaver­gonhada ao con­selho sincero.

Na quadra atual uma das vestes da men­tira atende pelo nome de “pós-​verdade”, um emaran­hado de infor­mações des­en­con­tradas que longe de serem ver­dades são “ven­di­das” como tais.

Como se a ver­dade pudesse ser rel­a­tivizada, como se a men­tira ou o engodo fos­sem uma “ver­são” da ver­dade, quando não é, aliás, nunca foi. Nada mais é do que outro ardil da men­tira.

Para nossa tris­teza, con­stata­mos que o mundo – dito –, civ­i­lizado atual é dos enganadores, dos fal­sos, dos adu­ladores e dos hipócritas. E, tam­bém, dos tolos e ingên­uos que gostam – e pref­erem – a enganação, a mentira.

Queres perder um amigo? Seja sin­cero com ele. Diga-​lhe, sem reser­vas, o que efe­ti­va­mente pen­sas.

Pou­cas são as amizades que resistem ao escrutínio da ver­dade.

Essa é a con­statação que fiz desde que come­cei a externar pub­li­ca­mente min­has posições sobre os temas colo­ca­dos per­ante a sociedade, nestes anos.

Nos mais de mil tex­tos que escrevi – e que faço questão que sejam lon­gos, na intenção que as pes­soas, de fato, parem para ler –, ninguém aponta uma men­tira, uma incor­reção, uma mal­dade. Ape­nas ver­dades e opiniões pes­soais as quais sem­pre se pode – e se deve –, ques­tionar, faz parte do debate. Mas, são min­has opiniões, meus ques­tion­a­men­tos, min­has inquietações.

A ver­dade é a matéria-​prima dos tex­tos que escrevo. Não me ocupo de escr­ever sobre pes­soas, mas sim, sobre fatos, situ­ações e ideias, por isso mesmo, só cito qual­quer nome próprio quando isso é impre­scindível para a com­preen­são do texto.

Ape­sar disso – talvez por isso –, incomodam-​se tanto. Não pelo texto em si. O que causa o descon­tenta­mento é a ver­dade nua e crua. É a falta do que ques­tionar.

É um defeito que tenho. Aprendi, ainda menino, que a ver­dade “cabe” em qual­quer lugar e que o “errado” é “da conta” de todo mundo.

Assim, ao meu sen­tir, apon­tar equívo­cos, dis­cor­dar de posi­ciona­men­tos, cobrar o que enten­demos cor­reto, nada mais é que um ato de cidada­nia.

Infe­liz­mente, causa estran­hamento, parece não ser mais assim, isso foi noutros tem­pos, antes da mar­gin­al­iza­ção da ver­dade, antes que a mesma fosse colo­cada na clan­des­tinidade ou tida por blas­fêmia.

Hoje, se dizes algo já pen­sam que é movido por algum inter­esse: aten­dido ou con­trari­ado. Ninguém com­preende a man­i­fes­tação livre e des­im­pe­dida como um ato de indig­nação cidadã.

Outro dia alguém me per­gun­tou se tinha algum inter­esse por escr­ever o que escrevo; outro, o que eu “gan­hava” com isso; um ter­ceiro, mais inco­modado ou com o desejo de “prestar serviço” ou só adu­lar, par­tiu para a difamação.

Quando retomei a escrita como um ato de exer­cí­cio de cidada­nia – lá por volta de 2012 –, diziam que era por conta da oposição ao grupo político de então, donatários do poder de lon­gas datas. Nunca foi. Ape­nas achava (e acho) errado muitas práti­cas empreen­di­das por aque­les gov­er­nantes.

Agora, já no quinto ano do gov­erno comu­nista (oposição(?) ao antigo grupo, mas sim­i­lar nas práti­cas) dizem a mesma coisa: que sou “de oposição”, “do con­tra”, “revoltado”, “doidão”, e tan­tas out­ras adje­ti­vações.

Isso quando não partem para a agressão mais rasteira ou o ataque vul­gar.

A estes não socorre a ideia que ape­nas exerço uma con­quista legí­tima e pela qual tanto luta­mos, e com a qual me iden­ti­fico, desde sem­pre: o dire­ito de expor meus pen­sa­men­tos, chamada liber­dade de expressão.

Out­rora, quando escas­sos os meios de comu­ni­cação, dizia-​se que a liber­dade de pen­sa­mento era priv­ilé­gio de alguns, dos ricos, das elites pro­pri­etárias dos veícu­los de comu­ni­cação. Hoje, quando qual­quer um pode dizer e difundir o seu pen­sa­mento, nunca se viu tanta indigên­cia int­elec­tual, tanta pobreza de ideias, tanto mal­trato a ver­dade.

Certa vez per­gun­tei a um amigo da mídia a razão de ninguém “ligar” para a ver­dade, questionando-​o para o fato de ter­mos uma “imprensa” tão pouco com­pro­metida com o seu papel social.

Respondeu-​me de forma cor­tante: — Abdon, metade dela (imprensa) anda em “car­rões”, mora em man­sões. Escrevem ape­nas para agradar os que estão lhes pagando. A isso dão o nome de “parce­ria”. A outra metade esta “doida” para andar em “car­rões” e morar em man­sões.

Deu por encer­rado o assunto.

Decerto, deve­mos rel­e­var o exagero daquele amigo. Não é pos­sível que “todos” este­jam mais com­pro­meti­dos com a “sua” ver­dade – ou inter­esses –, do que com a ver­dade real. E, talvez, seja bem mais que a exceção, para jus­ti­ficar a regra.

O certo é que os cidadãos de bem não podemos nos con­for­mar com o império da men­tira. Não deve­mos nos calar e per­mi­tir que men­tira con­tinue a levar van­tagem em detri­mento dos inter­esses maiores da sociedade.

E deve­mos fazer isso sem qual­quer receio, sem qual­quer medo de retal­i­ação, e movi­dos ape­nas pelo inter­esse do tri­unfo da ver­dade.

Por fim, meus ami­gos, a ver­dade tornou-​se tão rara e inusi­tada que ao invés de se ter um dia ded­i­cado à men­tira dev­eríamos ter­mos um ded­i­cado à ver­dade. Seria mais justo.

Abdon Mar­inho é advo­gado

A POLÍ­CIA POLÍTICA E O SILÊN­CIO OBSEQUIOSO.

Escrito por Abdon Mar­inho

A POLÍ­CIA POLÍTICA E O SILÊN­CIO OBSEQUIOSO.

Por Abdon Marinho.

A POLÊMICA do momento no Brasil é a deter­mi­nação do pres­i­dente da República para que os quar­téis comem­o­rem a golpe mil­i­tar de 1964. Enti­dades e famil­iares das víti­mas do régime mil­i­tar entraram na justiça e o min­istério público fed­eral fez recomen­dações para que isso não ocorra.

A ditadura foi o mais triste período da história recente do país, encer­rado ofi­cial­mente em março de 1985, com eleição de Tan­credo Neves, pelo Colé­gio Eleitoral e, defin­i­ti­va­mente sepul­tado, com a pro­mul­gação da Carta Con­sti­tu­cional de 1988, opor­tu­nidade em que o pres­i­dente da Assem­bleia Nacional Con­sti­tu­inte, Ulysses Guimarães, externou, em nome do povo brasileiro, a repulsa aos regimes de exceções.

Pas­sa­dos tan­tos anos, no Maran­hão, exper­i­men­ta­mos um clima de retro­cesso democrático que jamais imag­iná­va­mos que fosse ocor­rer.

Pior que isso, sem que as insti­tu­ições e as autori­dades se dêem conta da gravi­dade dos fatos.

Há dias cir­cu­lam nos veícu­los de comu­ni­cação notí­cias de que um del­e­gado de polí­cia – registre-​se, apan­hando em “malfeitos” diver­sos –, declarou, em juízo, ter sido ori­en­tado pelo secretário de segu­rança para inves­ti­gar qua­tro desem­bar­gadores do estado.

Poder-​se-​ia dizer – e a acred­ito que as autori­dades usarão tal argu­mento –, que se trata de alguém que, apan­hado nos seus próprios deli­tos, como vin­gança e para enlamear e enfraque­cer as inves­ti­gações, tenta desviar o foco para out­ros assun­tos. Pode ser.

O argu­mento, entre­tanto, falece de sus­ten­tação quando lem­bramos não ser a primeira vez que noti­cias deste tipo cir­cu­lam.

Ano pas­sado tive­mos notí­cias de um expe­di­ente encam­in­hado a mil­itares lota­dos no inte­rior, alertando-​os a faz­erem lev­an­ta­men­tos sobre lid­er­anças políti­cas para “fins eleitorais”.

Naquela opor­tu­nidade o gov­erno disse tratar-​se de um equiv­oco, que jamais coon­es­taria com tais práti­cas, prom­e­teu inves­ti­gação, proces­sos, etc. Até hoje, pelo menos eu, não tomei con­hec­i­mento de qual­quer punição aos envolvi­dos e se de fato isso ocor­reu.

Além deste fato, sem­pre foi voz cor­rente nos meios políti­cos, notí­cias sobre supos­tos “lev­an­ta­men­tos”, bis­bil­ho­tices sobre os cidadãos maran­henses, políti­cos, empresários, lid­er­anças, jor­nal­is­tas e qual­quer um que rep­re­sente alguma importân­cia para os atu­ais donatários do poder.

Ainda na leg­is­latura pas­sada, uma par­la­men­tar chegou a me con­fi­den­ciar que deter­mi­nada pes­soa que já havia lhe declar­ado apoio, foi chamada “em palá­cio”, onde usaram argu­men­tos “fortes” para obrigá-​la a repen­sar a decisão – o que, de fato, acon­te­ceu.

A imprensa já noti­ciou diver­sas vezes a avalanche de proces­sos que sofr­eram, ou estão sofrendo, jor­nal­is­tas no estado, por criti­carem o gov­erno, inclu­sive, na esfera criminal.

Assim, a con­fis­são de alguém que até bem pouco tempo ocu­pava cargo de tanto relevo na estru­tura estad­ual, chegando a ser con­dec­o­rado “por bons serviços” pelo atual gov­erno – ainda que se façam ressal­vas –, não pode ser igno­rada.

Caso ver­dade, todas essas práti­cas são incom­patíveis com a democ­ra­cia e a liber­dade dos cidadãos.

A manutenção de uma “polí­cia política” é uma prática crim­i­nosa a afrontar o Estado Democrático de Dire­ito.

Diante de tudo isso, causa-​me estu­pe­fação que mesmo diante da infor­mação de que desem­bar­gadores (e sabe-​se lá mais quem) foram, ile­gal e crim­i­nosa­mente, inves­ti­ga­dos pela “poli­cia polit­ica do estado”, tal fato não tenha, até agora, des­per­tado indig­nação das autori­dades e dos setores orga­ni­za­dos da sociedade.

Não sei se estou ficando louco, mas acred­ito que não é todo dia que se divulga infor­mações dando conta que desem­bar­gares estão sofrendo inves­ti­gação clan­des­tina com o propósito de intimida-​los ou “prendê-​los”.

Ape­sar da gravi­dade da infor­mação, estam­pada em blogues e jor­nais, do depoi­mento do del­e­gado, em vídeo, rela­tando tais fatos, o sitio do gov­erno estad­ual – e mesmo da Sec­re­taria de Segu­rança –, não con­sta uma nota de esclarec­i­mento, um des­men­tido.

Agem como se nada estivesse ocor­rendo. Com­preen­sível. Devem pen­sar: se não falar­mos sobre o assunto, ele não existe. Trata-​se, por óbvio, de uma lóg­ica “torta”, mas com­preen­sível.

Incom­preen­sível é o Tri­bunal de Justiça, até agora, repito, não ter feito uma man­i­fes­tação, cobrado um esclarec­i­mento do gov­erno estad­ual, emi­tido um protesto, solic­i­tado uma providên­cia aos tri­bunais supe­ri­ores diante da gravi­dade da noti­cia.

No sitio do tri­bunal, não con­sta sequer uma nota de sol­i­dariedade aos desem­bar­gadores suposta­mente inves­ti­ga­dos.

O tri­bunal pode­ria dizer que a palavra do del­e­gado – que foi apan­hado em “malfeitos” –, não merece qual­quer crédito. Ou, que aceitam a “não resposta” do gov­erno estad­ual como argu­men­tação sufi­ciente de sua inocên­cia à imputação feita.

O silên­cio diante da infor­mação de um crime cometido con­tra o tri­bunal passa à sociedade a impressão que ninguém no estado está seguro.

Se têm a ousa­dia de inves­ti­garem de forma clan­des­tina e ile­gal os desem­bar­gadores do estado, o que será de nós, pobres mortais?

Se o silên­cio do Tri­bunal de Justiça diante de tão graves notí­cias – envol­vendo seus próprios mem­bros –, já causa pre­ocu­pação, o que dizer do mutismo do Min­istério Público Estad­ual do mesmo fato?

O Min­istério Público, nos ter­mos da Con­sti­tu­ição Fed­eral, artigo 127, “é insti­tu­ição per­ma­nente, essen­cial à função juris­di­cional do Estado, incumbindo-​lhe a defesa da ordem jurídica, do régime democrático e dos inter­esses soci­ais e indi­vid­u­ais indisponíveis”.

Além disso, nos ter­mos da Con­sti­tu­ição, cumpre-​lhe “exercer o con­t­role externo da ativi­dade poli­cial”.

Ape­nas uma leitura de tais dis­posições já é o sufi­ciente para saber que o MPE tem o dever de bus­car a ver­dade, apu­rar tais fatos, cobrar expli­cações e esclare­cer a sociedade se os mes­mos são ver­dadeiros ou não, bem como, perseguir a respon­s­abi­liza­ção dos cul­pa­dos, se exi­s­tirem.

Em todo caso, não pode se omi­tir, não pode deixar de prestar con­tas à sociedade.

Ape­sar disso, com os vídeos cir­cu­lando nos blogues, notí­cias em jor­nais, rela­tando fatos tão graves – e out­ras mais graves ainda, como manip­u­lação de inves­ti­gações crim­i­nais –, até agora, pelo menos no sitio do Min­istério Público Estad­ual, não con­sta qual­quer infor­mação sobre as providên­cias que estão sendo ou que serão ado­tadas em relação aos mes­mos.

O MPMA vai aceitar o silên­cio das autori­dades do gov­erno estad­ual como expli­cação sufi­ciente? Ou será que, per­di­dos em suas quere­las inter­nas, ninguém se deu ao tra­balho de ver­i­ficar as noti­cias que cir­cu­lam nos meios de comunicação?

Outra insti­tu­ição que, tam­bém, guarda obse­quioso silên­cio é a Assem­bleia Leg­isla­tiva, nen­hum dos dep­uta­dos fez um protesto for­mal ou cobrou uma providên­cia – pelo menos não con­sta no seu sitio na inter­net –, nem a ala gov­ernista (ainda para defender o gov­erno, óbvio) ou da oposição, em sen­tido con­trário. Mas isso era de se esperar.

Não faz muito tempo, um dos seus inte­grantes, detido após abuso de bebida alcoólica e out­ras sub­stân­cias, e por agressão a um can­tor e ameaças a poli­ci­ais, em um estado viz­inho, tendo declar­ado naquela opor­tu­nidade, den­tre out­ras coisas: “a gente mata gente”, até a pre­sente data, nen­huma das excelên­cias com assento na Casa de Manuel Bequimão, disse qual­quer coisa sobre o assunto ou tomou alguma iniciativa.

Aliás, o mesmo com­por­ta­mento das demais insti­tu­ições, inclu­sive do Min­istério Público, a quem reputo, teria a respon­s­abil­i­dade de apu­rar se de fato o dep­utado e seus famil­iares, como ele próprio declarou “mata gente”, “manda matar gente”.

A impressão que fica é que existe um vazio insti­tu­cional no estado, com as autori­dades – pelo menos do ponto de vista de se pro­nun­cia­rem pub­li­ca­mente –, se omitindo diante de fatos graves; fatos gravís­si­mos, frise-​se.

São fatos que, diante do vazio e/​ou omis­são das insti­tu­ições, recla­mariam uma inter­venção fed­eral no estado.

Um dia o dep­utado diz que ele e a família “matam gente”; outro dia, um del­e­gado informa à justiça que inquéri­tos foram manip­u­la­dos aten­dendo a esse ou aquele inter­esse (escuso); outra vez, que até desem­bar­gadores foram ou estão sendo inves­ti­ga­dos de forma ile­gal e clan­des­tina pelo gov­erno estad­ual, etcetera.

Quem mais estaria sendo? Juizes? Advo­ga­dos? Jor­nal­is­tas? Cidadãos comuns? Lid­er­anças políti­cas? Quais out­ros inquéri­tos estariam sendo manipulados?

Nen­huma autori­dade tem nada a dizer sobre tais fatos? Esta­mos vivendo uma democ­ra­cia ou o prenún­cio de uma ditadura?

Vejam, isso tudo pode ser men­tira, mas as autori­dades devem esclarec­i­men­tos sobre estes fatos. A sociedade não pode viver na inse­gu­rança de ser ou de já está sendo a vitima da vez.

É mín­imo que nos deve!

Diante da deter­mi­nação (ao meu sen­tir, absurda) do pres­i­dente da República, para fes­te­jarem nos quar­téis o 31 de março, cel­e­brando a rup­tura da democ­ra­cia e a inau­gu­ração do régime de exceção, assisto aos jus­tos protestos de parte da sociedade, de algu­mas enti­dades e instituições.

Diante de fatos tão graves que estariam acon­te­cendo no pre­sente, em nosso estado, assisto ao impávido silên­cio de todos.

Os mes­mos que protes­tam pela “hom­e­nagem” aos fatos do pas­sado são os mes­mos que silen­ciam diante dos graves fatos do pre­sente e que ameaçam o futuro de nossa gente.

Abdon Mar­inho é advogado.