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UM ESTADO A SERVIÇO DE UM PRO­JETO POLÍTICO?

Escrito por Abdon Mar­inho

UM ESTADO A SERVIÇO DE PRO­JETO POLÍTICO?

Por Abdon Marinho.

DURANTE muitos anos na década pas­sada o saudoso advo­gado Pedro Leonel Pinto de Car­valho fez uma série de rep­re­sen­tações ao Min­istério Público Estad­ual denun­ciando o que, segundo ele, seria um abuso ou pro­moção pes­soal dos gestores munic­i­pais.

A situ­ação denun­ci­ada dizia respeito à divul­gação em jor­nais – à época as mídias dig­i­tais ainda engat­in­havam –, de even­tos daque­les municí­pios com a pre­sença do prefeito, vereadores, secretários, etc.

Um exem­plo clás­sico de tais rep­re­sen­tações era a divul­gação nos matuti­nos da imagem do prefeito cor­tando o bolo de aniver­sário da urbe, com uma mate­ri­az­inha sobre o fato.

O Min­istério Público Estad­ual “com­prou” a tese da suposta impro­bidade – e out­ras vezes por ini­cia­tiva própria –, e rep­re­sen­tou dezenas, talvez cen­te­nas de gestores ou ex-​gestores. Os cus­tos da denom­i­nada “pro­moção pes­soal”, da “impro­bidade admin­is­tra­tiva”, na maio­ria das vezes não chegava a um salário mín­imo, estourando dois. Não raro os gestores, sequer, haviam “encomen­dado” a divul­gação. Quase sem­pre estava por ocasião do evento algum “esperto” que tirava a foto, a man­dava para o jor­nal e depois apare­cia para cobrar.

Inad­ver­tida­mente (ou ape­nas para se livrar da cobrança) o gestor autor­izava ou deter­mi­nava o paga­mento a algum secretário.

Como disse, os val­ores eram ínfi­mos, duzen­tos, trezen­tos, quin­hen­tos reais, no máx­imo mil reais, ou, em casos excep­cionais, dois mil reais.

Algo tão insignif­i­cante que não jus­ti­fi­caria movi­men­tar a máquina judi­ciária do estado. Que se resolve­ria com uma recomen­dação para que os gestores se abstivessem, a par­tir de então, a faz­erem aquela pro­moção com recur­sos públi­cos.

Em casos extremos poder-​se-​ia acor­dar com os gestores para que fizessem uma doação de igual valor ou até o dobro para um fundo qual­quer de pro­teção à infân­cia, de com­bate à vio­lên­cia, à pobreza, etc.

O MPMA, entre­tanto, preferiu acionar por impro­bidade admin­is­tra­tiva os gestores munic­i­pais, que, como disse, na maio­ria das vezes, nunca encomen­daram pro­moção pes­soal nen­huma – e até seria risível falar-​se em pro­moção pes­soal com um gasto, no pior dos casos, de dois mil reais –, e nem con­hec­i­mento tiveram do que estava acon­te­cendo, pedindo que fos­sem con­de­na­dos nas penas gravís­si­mas da lei que trata do assunto.

Pior foi que o judi­ciário maran­hense, na sua grande maio­ria, embar­cou na tese e con­de­nou os gestores nas penal­i­dades da lei de impro­bidade admin­is­tra­tiva por, suposta­mente, come­terem a pro­moção pes­soal, que nos refe­r­i­mos.

Assim, dezenas, talvez cen­te­nas, de ex-​prefeitos estão como ímpro­bos, por terem apare­cido numa fotografia divul­gada em um jor­nal cor­tando um bolo de aniver­sário da cidade, por terem dilap­i­dado o patrimônio público em duzen­tos, trezen­tos, quin­hen­tos, mil ou dois mil reais.

Poucos sabem, mas a con­de­nação por impro­bidade admin­is­tra­tiva orig­i­nal que levou a cas­sação do mandato do fale­cido ex-​prefeito José Vieira Lins, de Baca­bal, foi uma desta natureza. Ninguém sabe o quanto a parte ou mesmo o Estado gas­tou na movi­men­tação dos proces­sos que tiveram como origem o ex-​gestor, no seu primeiro ou segundo mandato como prefeito, ter “cor­tado o bolo” de aniver­sário da cidade e isso ter sido divul­gado em um jor­nal.

Muitos casos de igual natureza ou semel­hantes, de valor irrisório, já tran­si­taram em jul­gado levando a con­de­nação de diver­sas pes­soas que, a despeito dos peca­dos que ten­ham, estes estão longe de serem os mais graves.

Pois bem, faço todo esse reg­istro para dizer que sem mesmo um pedido de esclarec­i­mento por parte do MPMA, pelo menos, que se saiba pub­li­ca­mente, o gov­erno do estado já executou com a sua comu­ni­cação social perto de meio bil­hão de reais (ou que sejam 400 mil­hões, 300 mil­hões), nos últi­mos cinco anos. Só em 2017, foram mais de 90 mil­hões; em 2018, foram mais 60 mil­hões e a pre­visão para este ano de 2019, é de mais de 60 mil­hões de reais.

Com o avanço da tec­nolo­gia, são recur­sos que, cer­ta­mente, pode­riam ser mel­hor empre­ga­dos em bene­fí­cio da pop­u­lação do nosso estado.

O que os órgãos de con­t­role – não ape­nas o Min­istério Público, mas tam­bém a Assem­bleia Leg­isla­tiva e o Tri­bunal de Con­tas, sem­pre tão valentes quando se trata de prefeitos –, pare­cem não enx­er­gar é que o estado pas­sou a despender seus recur­sos (recur­sos do povo) em bene­fí­cio de um pro­jeto político pes­soal do gov­er­nador.

Desde que chegou ao poder, em 2015, um sonho obses­sivo persegue sua excelên­cia: virar pres­i­dente da República. Nada con­tra, é um dire­ito dele e son­har não custa nada. Quer dizer, não cus­tava.

Em tem­pos de comu­ni­cação instan­tânea pelas mais diver­sas mídias dig­i­tais parece-​me um ver­dadeiro acinte o que o gov­erno estad­ual vem gas­tando com a comu­ni­cação de suas ações, sobre­tudo, quando sabe­mos que essa din­heirama toda faz falta em out­ras áreas, como saúde, edu­cação e infraestru­tura.

Mas quem liga para isso? Os dep­uta­dos estad­u­ais? O Min­istério Público? O Tri­bunal de Contas?

Outro dia alguém me disse que a pro­pa­ganda do gov­erno estad­ual estava sendo veic­u­lada, em horário nobre, em outro estado da fed­er­ação; tam­bém a vi sendo veic­u­lada em jor­nais de cir­cu­lação nacional (inclu­sive na Folha de São Paulo) além de veic­u­lada nas diver­sas mídias dig­i­tais com alcance transna­cional.

Sabe­mos que a pub­li­ci­dade dos atos públi­cos é uma imposição con­sti­tu­cional con­tida no artigo 37 da CF: “Art. 37. A admin­is­tração pública direta e indi­reta de qual­quer dos Poderes da União, dos Esta­dos, do Dis­trito Fed­eral e dos Municí­pios obe­de­cerá aos princí­pios de legal­i­dade, impes­soal­i­dade, moral­i­dade, pub­li­ci­dade e efi­ciên­cia e, tam­bém, ao seguinte:”.

Ape­sar disso, dever-​se-​ia per­gun­tar o que cidadão de São Paulo, do Paraná ou do Ceará tem a ver com o fato do gov­erno do Maran­hão ter con­struído uma “estrad­inha” que se for olhada com cuidado se ver­i­fica o barro, de tão fina a camada asfáltica; ou ter con­struída uma escol­inha digna de uma sala ao custo de mais de trezen­tos mil reais em uma reserva indí­gena.

Quer me pare­cer que nada. Quer me pare­cer que se trata de mera pro­moção pes­soal do gov­er­nante.

Não sei se é ver­dade – mas não tenho razão para duvi­dar, até porque nunca des­men­ti­ram –, que existe uma empresa encar­regada de “cuidar” da imagem do gov­er­nador ao custo anual de mais de seis mil­hões de reais. Seria essa empresa a respon­sável por “cavar” espaços e entre­vis­tas na grande imprensa nacional onde sua excelên­cia “se vende” como a solução taba­jara para os prob­le­mas nacionais.

Aliás, essas entre­vis­tas em rede nacional, tam­bém, pas­sam “bati­das” aos olhos dos fis­cais da lei. A ninguém socorre a ideia de per­gun­tar a razão de um servi­dor público, em pleno horário de expe­di­ente, se ausen­tar do tra­balho para ir con­ceder entre­vis­tas no Rio de Janeiro, São Paulo ou Brasília. O ato em si, fal­tar ao serviço público para tratar de inter­esse pri­vado, já dev­e­ria mere­cer à atenção dos órgãos de con­t­role. Mais: quem está “ban­cando” tais via­gens e hospeda­gens? O par­tido? O próprio gov­er­nador? O con­tribuinte maran­hense? São feitas em voos de car­reiras ou em jat­in­hos fre­ta­dos pelo estado?

Ape­nas como parâmetro, se o pres­i­dente dos EUA, nação tida pelos comu­nistas como o grande satã do norte, recebe alguém para jan­tar na Casa Branca que não seja do inter­esse do país, o pres­i­dente tem que arcar até com água servida.

Por isso mesmo é justo que se indague quem está pagando a conta de sua excelência.

Nes­tas entre­vis­tas sua excelên­cia não está tratando de assun­tos de inter­esse do estado, mas sim da sua “pauta” como pré-​candidato à presidên­cia da República. Não é só, antes, durante e depois de tais incursões midiáti­cas o que vemos são os xerim­ba­bos do gov­er­nador, muitos deles remu­ner­a­dos pelo con­tribuinte, ampli­f­i­cando as per­for­mances do gov­er­nante diante das telas.

Entre­vis­tado por jor­nal­is­tas que pouco con­hecem da real­i­dade maran­hense, o gov­er­nador, esperto como um camelô paraguaio, “vende” a solução para todos os prob­le­mas da nação, quando não con­segue resolver os prob­le­mas do nosso estado con­de­nado mis­éria per­pé­tua.

Para os seus adu­ladores isso pouco importa e até dizem que o gov­er­nador é tão “sabido”, mas tão “sabido”, que no dia em acorda cedo nem sol se lev­anta no fir­ma­mento.

Sem negar-​lhe o mérito de ser “bom de papo”, é fato que a grande maio­ria dos seus entre­vis­ta­dores – por descon­hec­i­mento ou por sim­pa­tia ao pro­jeto esquerdista –, lhe tem sido dócil a ponto de engolir como ver­dades tudo que o gov­er­nador lhes têm dito.

Os exem­p­los estão aí, como quando diz que não tem nada com fato de ter aumen­tado a mis­éria no estado, quando sabe­mos que foram seus equívo­cos os respon­sáveis por parte do aumento em quarenta por cento no número de mis­eráveis; como quando diz que o gov­erno não teve nada a ver com o despejo das famílias do Cajueiro para aten­der a uma empresa que foi con­tribuinte de sua cam­panha, quando sabe­mos que foi o próprio gov­er­nador que desapro­priou a área e deixou a comu­nidade ao léu e depois seu gov­erno reprimiu os man­i­fes­tantes na porta do palá­cio; como quando diz que não tem nada com o fato do estado estar que­brado, quando sabe­mos que foi este gov­erno o respon­sável pelo inchaço da máquina pública, o aumento de impos­tos, para afu­gen­tar investi­dores, as agressões gra­tu­itas ao gov­erno cen­tral, etc.

Como disse ante­ri­or­mente, é legí­timo que sua excelên­cia tente realizar seu sonho de ser pres­i­dente. Mas esse pro­jeto é dele. Não é do con­tribuinte que já passa mais da metade do ano tra­bal­hando para pagar impos­tos.

Ora, se sua excelên­cia quer “se vender” como alter­na­tiva às eleições de 2022, já a par­tir de agora, que renun­cie, que se licen­cie e caia em campo. Faça isso às suas expen­sas ou do seu par­tido ou custeado pelos seus adu­ladores, mas não às cus­tas e em pre­juízo do estado que já se encon­tra “que­brado” por sua própria inap­tidão para gestão.

Encerro reg­is­trando o meu espanto com o fato dos órgãos de con­t­role nada enx­er­garem de anor­mal em tudo isso, prin­ci­pal­mente o MPMA que levou às bar­ras da justiça tan­tos prefeitos sob o pálido argu­mento de terem se pro­movido ao apare­cerem numa página de jor­nal cor­tando um bolo de aniver­sário.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

HOMENS E ARMAS.

Escrito por Abdon Mar­inho

HOMENS E ARMAS.

Por Abdon Marinho.

COMO ESPER­ADO o assunto do final de sem­ana foi a rev­e­lação do desejo homi­cida do ex-​procurador-​geral da República, Rodrigo Janot que, deduz-​se, para turbinar a venda de um livro de memórias sobre seu período à frente da Procuradoria-​Geral, rev­elou que foi armado ao Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF e, por muito pouco, não matou o min­istro Gilmar Mendes.

Ainda descon­tando as infini­tas piadas e “memes”, o assunto “bom­bou”, como dizem atual­mente, ofus­cando, até mesmo, o último capí­tulo da estraté­gia do “pacto das elites” para colo­car fim ao com­bate à cor­rupção, anu­lar proces­sos, par­al­isar inves­ti­gações e soltar os cor­rup­tos já pre­sos. Não teve para “ninguém” só se falou no tiro não dado nas dependên­cias da Corte Suprema. Todos falando do assunto, anal­isando suas con­se­quên­cias e tirando suas “casquin­has”. Por certo que é uma pauta inter­es­sante e dela tratare­mos, tam­bém, em um texto especí­fico.

Por estas pla­gas, até o ex-​presidente Sar­ney, na sua col­una sem­anal, tra­tou do assunto trazendo à memória uma crônica de Odilo Costa, filho, sobre episó­dio sim­i­lar ocor­rido no Tri­bunal de Justiça do Piauí, do qual par­ticipou o seu pai, então desem­bar­gador Odilo Costa.

Na sua col­una Sar­ney aproveita para tirar um “sarro” com o ex-​procurador-​geral – talvez como uma pequena vin­gança –, ao colocá-​lo na mesma condição do facínora com múlti­plas con­de­nações, Fer­nando Beira-​mar. Foi sutil, mas per­cep­tível.

Episó­dios envol­vendo homens e armas são infini­tos.

Conta a lenda que aqui mesmo, no nosso Maran­hão ocor­reu um fato pitoresco com temática semel­hante.

Segundo dizem, o então juiz de dire­ito, José Maria Mar­ques, aguar­dava ansioso seu ingresso como desem­bar­gador do Tri­bunal de Justiça do Maran­hão.

Como não era muito querido pelos desem­bar­gadores nunca con­seguiu o ingresso por merec­i­mento, sem­pre preterido por um ou outro.

Aguardou pacien­te­mente a vaga por antigu­idade. Quando chegou a data em que o desem­bar­gador da vez dev­e­ria aposentar-​se ficou intri­gado, pas­sou um mês, dois meses e nada. Dirigiu-​se ao TJMA e indagou na secretaria-​geral: — O desem­bar­gador fulano de tal (omito o nome para não causar embaraços) não dev­e­ria ter se aposen­tado dia tal?

O secretário olhou os arquivos e respon­deu: — Olha Dr. José Maria, aqui con­sta o desem­bar­gador fulano de tal só entra na com­pul­sória daqui a dois anos.

O juiz ficou fulo pois sabia que não tinha se enganado nas suas con­tas. Mas o que fazer diante de um doc­u­mento ofi­cial?

Certa tarde estava o mag­istrado tomando uma cerve­jinha em uma das mesas na calçada do antigo Hotel Cen­tral, na Praça Bened­ito Leite, quando passa jus­ta­mente o filho do desem­bar­gador que dev­e­ria ter se aposen­tado que, inad­ver­tida­mente, o cumpri­men­tou e indagou: —Boa tarde, Dr. José Maria! Quando vamos à desem­bar­gatória?

Como estava o mag­istrado retru­cou: — Ire­mos a ela no dia que o sen­hor seu pai decidir com­ple­tar setenta anos.

O tempo pas­sou, o desem­bar­gador se aposen­tou e, final­mente, o surgiu a vaga por antigu­idade, por dire­ito, do mag­istrado.

Passou-​se uma sem­ana, duas, nada de chamarem o juiz para ser empos­sado.

Na ter­ceira sem­ana ele foi ao tri­bunal, aguardou acabar a sessão e dirigiu-​se à sala do lanche, atrás do Plenário. Lá sacou seu Smith-​Wesson .38 e disse aos desem­bar­gadores: — Olha, vocês estão poster­gando para me chamarem para assumir uma vaga que é minha por dire­ito. Um vaga. Aqui eu tenho seis balas, se con­tin­uarem a me “sacanearem” na próx­ima sessão abrirei, não só uma, mas seis vagas.

Na sessão seguinte con­vo­caram o Dr. José Maria Mar­ques para assumir sua vaga de desem­bar­gador.

Mas isso, tam­bém, é uma lenda. Faz parte da história não con­tada da sociedade maran­hense.

O ex-​presidente Sar­ney pode­ria ter ilustrado sua crônica com tal episó­dio ou um outro que o envolveu pessoalmente.

Nos efer­ves­centes meses que ante­ced­eram a mudança do régime mil­i­tar para o civil, o senador Sar­ney era o pres­i­dente do PDS (Par­tido Democrático Social) e colo­cara os três fil­hos para apoiarem cada um, um can­didato dis­tinto do par­tido, Fer­nando apoiou Maluf, com a des­culpa ou argu­mento de ter fir­mado amizade quando estu­dara em São Paulo na década ante­rior; Zequinha foi de Mário Andreazza; e Roseana de Aure­liano Chaves, que era vice-​presidente República.

Como sabe­mos, Maluf acabou “con­ven­cendo” as lid­er­anças par­tidárias, der­ro­tou os opo­nentes, e gan­hou a indi­cação do par­tido para ir à dis­puta no Colé­gio Eleitoral.

A vitória de Maluf, sobre­tudo, por seus méto­dos abriu uma séria dis­sidên­cia no par­tido, que iria forma um movi­mento chamado “frente lib­eral”, lid­er­ado por Aure­liano Chaves, Marco Maciel, entre out­ros, que apoiou Tan­credo Neves, e depois viraria o Par­tido da Frente Lib­eral — PFL.

O ex-​presidente Sar­ney era um dos dis­si­dentes e, por conta disso, teve que deixar o comando do par­tido. Estava con­fortável, eleito em 1978, ainda tinha mandato de senador até 1986.

Pois bem, segundo foi noti­ci­ado e, se não me falha a memória, dito pelo próprio ex-​presidente, em uma entre­vista a um jor­nal ou revista, para aquela tensa reunião onde iria comu­nicar que estava deixando a presidên­cia do par­tido (e o par­tido), ele foi armado.

Comu­ni­cou a sua renún­cia à presidên­cia do par­tido, pouco depois deixou o par­tido e já no começo do seguinte estava no Movi­mento Democrático Brasileiro — MDB, como can­didato a vice-​presidente na chapa de Tan­credo Neves no Colé­gio Eleitoral e, em março daquele ano assumiria pro­vi­so­ri­a­mente e no mês seguinte, em defin­i­tivo, à presidên­cia da República.

Até hoje não se sabe o que o ex-​presidente pre­tendia fazer ao ir armado a uma reunião do par­tido: rea­gir à bala caso hou­vesse algum xinga­mento? Ati­rar em alguém especificamente?

Eram os tur­bu­len­tos anos oitenta. Eram out­ros tem­pos. Por­tar armas ainda era sím­bolo de cor­agem e deste­mor.

Para a ale­gria (ou tris­teza) de muitos nem Sar­ney, nem Jonot chegaram a fazer uso de suas armas.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

O MARAN­HÃO E AS HISTÓRIAS NÃO CONTADAS.

Escrito por Abdon Mar­inho

O MARAN­HÃO E AS HISTÓRIAS NÃO CON­TADAS.

Por Abdon Mar­inho.

VÉSPERA DE FERI­ADO à tarde, com o escritório prati­ca­mente vazio recebo a visita do amigo ex-​deputado estad­ual Ader­son Lago. Nos con­hece­mos desde 1991 quando assumiu o primeiro mandato como dep­utado e eu tra­bal­hava na Assem­bleia Leg­isla­tiva na asses­so­ria do dep­utado Juarez Medeiros.

Ao longo dos anos tive­mos a opor­tu­nidade de tra­bal­har­mos jun­tos em alguns pro­je­tos: as duas cam­pan­has de Cafeteira, 1994 e 1998; e, depois, já como advo­gado, em diver­sas ações, como Ação Pop­u­lar con­tra a pri­va­ti­za­ção do Banco do Estado, as ações rela­cionadas ao escân­dalo da estrada Paulo Ramos/​Arame, dois pedi­dos de impeach­ment de Roseana Sar­ney; ação a favor de uma difer­ença do FUN­DEF que o estado não repas­sava aos municí­pios e tan­tas out­ras em defesa do povo do Maranhão.

Nos dezes­seis anos que pas­sou como dep­utado foi dos mais ativos e prepara­dos se desta­cando como prin­ci­pal dep­utado de oposição na assem­bleia leg­isla­tiva

Após tratar­mos do assunto que o levou ao escritório começamos a tro­car ideias sobre o quadro político local, o nacional e as nos­sas deses­per­anças com tudo que esta­mos assistindo.

O formidável de con­ver­sar com Ader­son é que ele tem uma memória extra­ordinária, lem­bra detal­hes como se os fatos tivessem ocor­ri­dos ontem.

Quando falá­va­mos do sarneísmo a propósito deste pacto “camaleônico” com o gov­erno comu­nista do Maran­hão Ader­son provo­cou:

— Sabes como foi eleição de Sar­ney, em 1965, Abdon?

O meu con­hec­i­mento é o dos livros esco­lares, que­ria ouvir dele. Disse-​lhe: — Não!

Aí ele pas­sou a me con­tar a história não escrita, a par­tir de suas lembranças.

Diz-​me ele: em 1965 o prefeito de Baca­bal era Benu Lago (Bened­ito de Car­valho Lago, seu tio e o trigésimo primeiro prefeito de Baca­bal).

Inter­rompe para con­tar um pouco sobre Benu Lago. Fala que Benu ficou órfão muito cedo, com 17 anos, e ape­sar da pouca idade, virou arrimo de família assu­mindo a respon­s­abil­i­dade pela edu­cação dos demais irmãos, den­tre os quais seu pai, o pai de Jack­son Lago den­tre out­ros. Ressalva que ape­sar do avô, José Luís Teix­eira do Lago, ter deix­ado posses, o mérito de Benu Lago não pode ser descar­tado, tanto assim que em 1950 elegeu-​se dep­utado fed­eral, elegeu o irmão, pai de Jack­son, Zé Lago, dep­utado estad­ual, além de out­ros três dep­uta­dos estad­u­ais, Zeca Branco, Jose Mar­ques Teix­eira e Clementino Bez­erra, todos do municí­pio de Pedreiras.

Cer­ta­mente Pedreiras, que pos­suía a segunda ou ter­ceira econo­mia do estado, nunca mais repetiu tal feito.

Aí retorna à eleição de 1965: Pois bem, estava Benu em seu gabi­nete quando entra um de seus secretários de nome Zé San­tos, que depois foi vereador em Baca­bal: — Seu Benu tem um “gen­eral” aí fora querendo falar com o senhor.

— Pois mande o homem entrar, retruca o prefeito.

O homem que que­ria falar com o prefeito não era (ainda) gen­eral, era o coro­nel Dil­er­mando Mon­teiro (que depois viraria gen­eral e coman­daria o Segundo Exército, em São Paulo).

O coro­nel estava em mis­são, dev­i­da­mente far­dado, fora des­ig­nado pelo Marechal Castelo Branco, então pres­i­dente da República, para, em seu nome, pedir o apoio dos prefeitos maran­henses para a cam­panha do dep­utado José Sar­ney ao gov­erno estad­ual.

Ader­son acres­centa: — quem tam­bém esteve por aqui com a mesma mis­são foi, entre out­ros, o (ainda) coro­nel João Bap­tista Figueiredo, que veio a ser o último pres­i­dente do Régime Mil­i­tar.

Benu rece­beu o coro­nel Dil­er­mando mas disse-​lhe: — Coro­nel, lamento não poder aten­der o pedido do pres­i­dente, meu par­tido que é o mesmo par­tido gov­er­nador já tem um can­didato, o ex-​prefeito de São Luís, além disso, o gov­er­nador é sogro da minha filha. Até tenho uma boa relação como dep­utado Sar­ney, mas já temos com­pro­misso tanto no aspecto político quanto pes­soal.

Antes de se des­pedir do coro­nel, Benu indaga: — Coro­nel me sacie uma curiosi­dade: todos sabe­mos que o dep­utado Sar­ney não é “bem visto” junto às Forças Armadas, sabe-​se até que figura no livro edi­tado pela bib­lioteca do exército como “per­sona non grata”. Como jus­ti­fica todo esse esforço para fazê-​lo governador?

O coro­nel Dil­er­mando responde: — Prefeito, o marechal Castelo Branco é um udenista fer­renho e homem de par­tido. Se o dep­utado Sar­ney é da UDN (União Democrática Nacional), tem todo o nosso apoio.

Para os que não con­hecem a história, o dep­utado Sar­ney ape­sar de ser da UDN era inte­grante da ala política chamada “Bossa Nova”, e até pos­suía sim­pa­tia pelo ex-​presidente Juscelino Kubitscheck de Oliveira e pelo vice-​presidente, que assumiu com a renún­cia de Jânio Quadros, João Goulart, que era do Par­tido Tra­bal­hista Brasileiro — PTB, por­tanto mal visto pelos mil­itares. Outro detalhe é que Sar­ney quase vira min­istro de Jango. Na ver­dade teria dormido min­istro e acor­dou sem sê-​lo, graças à inter­venção do senador Vitorino Freire, que ameaçou romper com o gov­erno fed­eral se a nomeação fosse concretizada.

Ader­son recorda que pouco antes do golpe mil­i­tar de 1964 o dep­utado Sar­ney teria escrito em “O Impar­cial” um artigo de apoio à Jango e con­tra os mil­itares. Ainda, segundo a “lenda” tal artigo, após o golpe, teria sido sub­sti­tuído por outro menos ácido.

Ader­son retro­cede um pouco no tempo para dizer que em 29 de março de 1964, sua família, ele, o pai e a mãe, chegaram ao Rio de Janeiro jus­ta­mente para o casa­mento da filha de Benu Lago com o filho de New­ton Belo.

A cidade que, ape­sar de não ser mais a cap­i­tal da República, era onde tudo acon­te­cia, já ante­via a efer­vescên­cia dos dias que iríamos viver no país.

Os cam­in­hões da Com­pan­hia de Lixo — Con­lurb, por ordem do gov­er­nador da Gua­n­abara, Car­los Lac­erda, inter­di­tava várias avenidas, sobre­tudo as que davam acesso ao palá­cio do gov­erno, onde Lac­erda havia mon­tado um bunker e prome­tia resi­s­tir.

Os dias seguintes estão far­ta­mente doc­u­men­ta­dos nos livros de história.

Ader­son narra que após o casa­mento o retorno, no começo de abril, foi uma ver­dadeira odis­seia, a empresa onde tin­ham as pas­sagens, a PANER do Brasil, sofreu inter­venção e seus aviões proibidos de deco­lar, reti­dos onde estivessem.

Con­seguiram um voo na Viação Aérea São Paulo — VASP, com voos sendo mar­ca­dos e des­mar­ca­dos diver­sas vezes.

Para este texto inter­essa que fiz­eram uma escala em Brasília, que na época ainda não pos­suía aero­porto, ape­nas a Base Aérea e todos os pas­sageiros tin­ham que descer lá, inde­pen­dente de seguirem ou não viagem na mesma aeron­ave.

Foi lá, naquele clima pós-​golpe, que encon­traram um ner­voso dep­utado Sar­ney, em man­gas de camisas. Este logo que viu a família Lago chamou Benu e, reser­vada­mente, con­fi­den­ciou que estava na lista dos que seriam cas­sa­dos pelo régime mil­i­tar e estava ali a cam­inho de Belo Hor­i­zonte para ten­tar, com Mag­a­l­hães Pinto, gov­er­nador de Minas Gerais e um dos líderes civis do golpe, escapar da cas­sação.

Pois é, como sabe­mos Mag­a­l­hães Pinto “salvou” Sarney.

Ader­son observa essa imensa capaci­dade “camaleônica” do ex-​presidente Sar­ney de, em ape­nas um ano deixar de ser um político “quase” cas­sado e “per­sona non grata” pelos mil­itares, para ser o seu can­didato ao gov­erno do Maran­hão, mobi­lizando o régime para apoiá-​lo.

A mudança foi tão ráp­ida que Neiva Mor­eira, impor­tante líder oposi­cionista, cas­sado pelos mil­itares e exi­lado, ao escr­ever uma carta apoiando Sar­ney jamais imag­i­naria que ele era o can­didato dos mil­itares, pen­sava ser ele, ainda, de oposição. Mas isso, tam­bém, é outra lenda.

Para Ader­son os mil­itares não ape­nas aju­daram Sar­ney pedindo votos e apoios para ele, “que­braram” a can­di­datura situa­cionista impondo um veto ao can­didato da prefer­ên­cia do eleitorado e do gov­er­nador, o então dep­utado Renato Archer.

Este fato provo­cou o rompi­mento do gov­er­nador New­ton Belo com Renato Archer e com Vitorino Freire, fazendo-​o lançar o ex-​prefeito de São Luís, Costa Rodrigues.

O dep­utado Renato Archer, não acred­i­tando no veto, com o apoio de Vitorino Freire, man­teve sua can­di­datura.

Essa divisão do grupo da situ­ação foi deter­mi­nante para a vitória do can­didato da oposição, dep­utado Sarney.

Mas os mil­itares foram além. Tudo que o ex-​presidente Sar­ney “vende” como seu mérito na real­iza­ção de obras estru­tu­rantes no estado no seu período de gov­erno, na ver­dade foi mérito dos mil­itares que man­daram as ver­bas e deixaram que tocasse as obras e noutros casos o gov­erno fed­eral que executou dire­ta­mente.

Foi assim com BR 135, foi assim com o Porto do Itaqui, foi assim com a Represa Boa Esper­ança.

Sobre o Porto do Itaqui Ader­son conta uma história muito inter­es­sante.

Diz que no iní­cio dos anos cinquenta quando uma empresa de um ital­iano chamada Con­stru­tora Curzi – que pos­suía larga exper­iên­cia na con­strução de grandes obras –, ten­tava con­struir o porto, mas enfrentava incon­táveis obstácu­los no seu intento, atribuí­dos, prin­ci­pal­mente, ao Tri­bunal de Justiça, que tinha o ex-​presidente Sar­ney como secretário-​geral. O sen­hor Curzi, após uma der­radeira der­rota naquela Corte, aos descer suas escadarias, teria pro­ferido a seguinte frase: “Se Al Capone fosse vivo e aqui estivesse diante deste rapaz de bigod­inho seria um mero aprendiz”.

A tarde não pas­sou enquanto con­ver­sava com Ader­son naquela véspera de feri­ado.

Os fatos nar­ra­dos neste texto com detal­hes que são descon­heci­dos de quase todos no Maran­hão, são ape­nas uma pequena parte do muito que con­ver­samos.

Insisti para que ele escreva um livro con­tando tudo que lem­bra e sabe da nossa história.

Abdon Mar­inho é advo­gado.