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A TEO­RIA DA POBREZA DIVINA.

Escrito por Abdon Mar­inho


A TEO­RIA DA POBREZA DIVINA.

Por Abdon Marinho.

DURANTE todos estes anos em que me entendo por gente sem­pre me inqui­etou a questão da pobreza no nosso estado, no nosso país.

Outro dia, lendo a col­una sem­anal do ex-​presidente Sar­ney minha dúvida se dis­sipou: somos pobres por obra e graça de Deus.

Pois é, o ex-​presidente, ao tratar da van­tagem estratég­ica do Porto do Itaqui, na col­una do dia 23/​11/​2019, assen­tou, que o Cri­ador não foi muito gen­eroso com o nosso estado, a começar pela errada avali­ação que nos­sas ter­ras eram exce­lentes quando na ver­dade são ter­ras paupér­ri­mas – exceto por uma faixa de ter­ras nas ime­di­ações dos municí­pios de Gra­jaú e For­t­aleza dos Nogueiras. Ape­nas uma man­cha, de resto ter­ras áci­das e arenosas.

Outra culpa do Cri­ador, foi não ter nos legado um minério, eco­nomi­ca­mente expres­sivo.

Estas segundo o ex-​presidente, as razões da nossa pobreza, a moti­vação para ter­mos mais de 54% (cinquenta e qua­tro por cento) da nossa pop­u­lação vivendo abaixo da linha da pobreza, e, destes, um expres­sivo con­tin­gente, sobrevindo na mis­éria absoluta.

Nos dias que se seguiram ao diag­nós­tico do ex-​presidente sobre as razões para a mis­éria do Maran­hão, esperei, esperei, esperei … e nada. Nem na Assem­bleia Leg­isla­tiva, nem na Câmara dos Dep­uta­dos, nem no Senado da República, nem no Palá­cio do gov­erno, ninguém tinha uma man­i­fes­tação, ou uma opinião sobre o que disse o velho moru­bix­aba.

Não leram? Não deram importân­cia? Con­cor­daram com o que disse?

Em quais­quer das hipóte­ses, antes de cul­par­mos o Altís­simo, talvez devêsse­mos olhar aqui mesmo para os lados e enx­erg­amos o ver­dadeiro cul­pado da des­graça que acom­panha os maran­henses desde sem­pre: a classe política, os rep­re­sen­tantes do povo, eleitos para bem representá-​los e apre­sen­tar o mel­hor cam­inho a seguir. Ao invés disso, parece que temos uma classe política que não sabe o seu papel, e, que no lugar de ret­ribuir a con­fi­ança rece­bida, trata de se dar bem e per­pet­uar a mis­éria.

Nas palavras do ex-​presidente, temos a com­pro­vação disso. Ele atribui a Deus a respon­s­abil­i­dade pela mis­éria do estado ao não nos deixar solos férteis ou ricos minérios.

Mas, ele fez o quê? Ao menos rezou?

Vejam, o ex-​presidente Sar­ney é, de longe, o político mais bem suce­dido do estado e, quiçá, do Brasil. Foi dep­utado, gov­er­nador, senador de 1970 a 1985, pres­i­dente da República, senador nova­mente, pelo Amapá de 1991 a 2015. Como senador, teve a honra, e o mérito, de pre­sidir o Senado por qua­tro vezes. Na sua car­reira política, tanto no par­la­mento quanto no poder exec­u­tivo, teve a chance de dialogar e tro­car exper­iên­cias com as maiores lid­er­anças do mundo. Ele mesmo faz questão de dizer isso.

Difi­cil­mente encon­traremos na história da República car­reira política tão proem­i­nente. E, ape­sar de tudo isso, já chegando aos noventa anos de idade e exper­iên­cia acu­mu­lada, o ex-​presidente cred­ita a Deus a respon­s­abil­i­dade pelo fato do Maran­hão, estado onde man­dou por quase cinco décadas, ser pobre, mis­erável, e encontrar-​se na rabeira de tudo que é indi­cador social e de desenvolvimento.

Pior, ninguém da classe política parece se impor­tar ou ter alguma ideia para mudar tal situ­ação. Pelo con­trário, pare­cem achar nat­ural que o Maran­hão seja pobre. Ou, talvez, con­cor­dem que a pobreza é uma graça Div­ina. Afi­nal, agora somos todos Sarney.

O próprio ex-​presidente conta que pelos anos sessenta, num dos mil­hares fóruns inter­na­cionais que par­ticipou, travou diál­ogo com Golda Meir, uma das desta­cadas lid­er­anças de Israel naque­les tumul­tua­dos dias em que ele se fir­mava. Pode­ria ter aproveitado para inda­gar como o minús­culo e árido ter­ritório estava pro­duzindo ali­men­tos, saber dos êxi­tos dos kibutz.

Pode­ria ter feito o mesmo, com diver­sos out­ros países ou mesmo esta­dos, que a despeito de pos­suírem situ­ações geográ­fi­cas des­fa­voráveis despon­tavam – e despon­tam –, como mod­e­los de desen­volvi­mento, seja na agri­cul­tura, pecuária, ou mesmo no ramo das tec­nolo­gias.

Israel é um exem­plo, o Japão é outro. E, assim, são tan­tos bons exem­p­los que poderíamos ter segui­dos para desen­volver o Maran­hão. Ainda que con­tando, ape­nas de 1966 para cá.

O Maran­hão pos­sui uma área ter­ri­to­r­ial de 331.936,95 km2 e 7 mil­hões de habi­tantes, o segundo maior estado em exten­são ter­ri­to­r­ial, ficando atrás, ape­nas, da Bahia, que pos­sui área de 564.732,45 km2 e pop­u­lação de 15.344.447 habi­tantes; é cerca de cinquenta por cento maior que o Piauí, que pos­sui área de 251.611,93 km2, onde aco­moda 3.219.257 habi­tantes; mais que o dobro da área do Ceará, que pos­sui área de 148.887,93 km2 onde aco­moda mais de 9 mil­hões de habi­tantes; e, mais que três vezes a área do estado de Per­nam­buco que pos­sui 98.076,02 km2 e pop­u­lação de 9.473.266 habi­tantes. Fique­mos ape­nas nestes na região Nordeste.

Pois bem, o valor bruto da pro­dução agropecuária maran­hense nos val­ores em reais para o ano de 2019, segundo o Min­istério da Agri­cul­tura é R$ 7.398.548.495; já o do Piauí é de R$ 4.774.627.241; o do Ceará é R$ 3.230.531.698; e o de Per­nam­buco de 5.666.115.343.

Em que pese o Maran­hão fig­u­rar na frente destes esta­dos, sabe­mos que, até pelas condições climáti­cas destes, o valor bruto da nossa pro­dução e pífio.

O VBPA do Ceará é quase metade do nosso e sabe­mos que o outro nome de seca e aridez do solo atende pelo nome de Ceará; já o Piauí, que sem­pre foi sinôn­imo de pobreza apre­senta um VBPA sig­ni­fica­tivo em relação ao nosso, mais de dois terços e o que dizer de Per­nam­buco que com uma área três vezes menor que o nosso estado quase nos alcança?

A situ­ação torna-​se ainda mais vex­atória quando com­para­mos com a Bahia, que não rep­re­senta em área ter­ri­to­r­ial dois esta­dos do Maran­hão mas que pos­sui um Valor Bruto de Pro­dução Agropecuário mais de qua­tro vezes supe­rior ao nosso, com R$ 29.126.130.583.

Se com­para­r­mos com out­ros esta­dos fora da região nordeste a situ­ação do nosso estado tam­bém não é boa.

Vejamos o estado de Rondô­nia que pos­sui uma área ter­ri­to­r­ial de cerca de dois terço do nosso ter­ritório com 237.765,29 km2 e pouco menos de 2 mil­hões de habi­tantes. O Valor Bruto da Pro­dução Agropecuária alcançou para este ano o mon­tante de R$ 10.018.082.461.

Vejamos outro estado, Santa Cata­rina, cujo ter­ritório é mais de três vezes menor que o nosso, o VBPA para este ano é de R$ 21.040.499.354;

Se com­para­r­mos com o Paraná que pos­sui ape­nas 199.307,94 km2, aí que a nossa situ­ação fica com­pli­cada. Para este ano aquele estado apre­senta como VBPA o mon­tante de R$ 72.561.183.299, ou seja, dez vezes o valor da pro­dução maran­hense, com menos de dois terços do nosso ter­ritório.

No mesmo estudo, merece destaque que a soja con­tribui com R$ 3.268.495.594; o milho com R$1.024.379.805; e, a cul­tura bov­ina com R$1.690.928.797. Estas as prin­ci­pais cul­turas do estado na com­posição do VBPA. As duas primeiras, como sabe­mos, pro­duzi­das na região sul do estado e, já no médio Par­naíba, sobre­tudo por agricul­tores vin­dos de out­ras regiões do país que acred­i­taram nas poten­cial­i­dades do estado para estas cul­turas e desafi­aram o estigma de que a nossa terra é pobre.

Se fos­sem acred­i­tar na teo­ria de que nosso solo, com exceção da “man­cha” entre os municí­pios de Gra­jaú e For­t­aleza dos Nogueiras, cer­ta­mente, estaríamos apre­sen­tando um resul­tado ainda mais pífio.

Quero dizer – como, aliás, já disse noutros tex­tos –, que o Maran­hão pode se desen­volver a par­tir da situ­ação van­ta­josa do seu posi­ciona­mento geográ­fico, pelo fato de pos­suir por­tos com situ­ações espe­ci­ais, que poderão e dev­erão, ser ampli­a­dos, pelo con­strução de novos por­tos, rodovias e fer­rovias, além, claro, da explo­ração do Cen­tro de Lança­mento de Alcân­tara — CLA, mas, difer­ente do entendi­mento do ex-​presidente, existe muito espaço para o cresci­mento do estado, tam­bém no setor primário, na pro­dução de arroz, milho, soja, algo­dão, assim como na pro­dução de bovi­nos, suínos, capri­nos, ovi­nos, etc.

A pro­dução agropecuária inde­pen­dente de ter­ras férteis, com espaço tudo se resolve. Poderíamos ser uma das maiores potên­cias do mundo com cul­turas no sis­tema hidropônico, por exem­plo.

O Maran­hão pos­sui um vasto ter­ritório – que alguns tolos ou mal inten­ciona­dos querem desmem­brar –, e, ainda, muitos recur­sos hídri­cos (que pre­cisamos zelar e con­ser­var), um litoral rico, um clima estável, sem con­tar as diver­sas out­ras riquezas.

Difer­ente do que pensa o ex-​presidente, o Cri­ador foi muito gen­eroso com o nosso estado, se fal­hou, não por sua culpa, mas pela nossa, foi quanto aos homens que con­duzem os nos­sos des­ti­nos, estes sim, desprovi­dos de quais­quer con­hec­i­men­tos e capaci­dades. Essa é a nossa única des­graça.

Gov­er­nantes do pas­sado, do pre­sente – e já temo pelo futuro –, nunca foram capazes de traçar um pro­jeto de desen­volvi­mento para o estado. A prova disso é a mis­éria que grassa os lares e que só tem aumen­tado a despeito dos dis­cur­sos tor­tos; a prova disso é ter­mos a maior lid­er­ança política do estado e país, dizendo que nossa pobreza se deve à falta de gen­erosi­dade de Deus.

Abdon Mar­inho é advogado.

IMPEACH­MENT NÃO É PALAVRÃO.

Escrito por Abdon Mar­inho

IMPEACH­MENT NÃO É PALAVRÃO.

Por Abdon Marinho.

EXISTE um antigo aforismo que diz: “não há esforço sem rec­om­pensa”.

Ape­sar da mídia não ter dado o destaque dev­ido, assis­ti­mos nos últi­mos tem­pos uma cres­cente insat­is­fação da sociedade com o Poder Judi­ciário brasileiro. Essa insat­is­fação exposta já há muito tempo na ágora da atu­al­i­dade, a inter­net, teve uma man­i­fes­tação dig­amos, física ou analóg­ica, no último dia 17 de novem­bro de 2019, quando mil­hares de brasileiros, em diver­sas cidades do país, foram às ruas protestarem de forma vee­mente con­tra alguns min­istros do Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF.

Os man­i­fes­tantes, em pleno domingo enso­larado, ao invés de estarem com suas famílias, no recesso do lar, sabore­ando o almoço preferi­ram ir pra ruas car­regando faixas com inscrições con­tra os min­istros do Supremo. Esse é um fato bas­tante sig­ni­fica­tivo.

Como disse, as diver­sas mídias, talvez para ocul­tar o fato, não tra­tou como dev­e­ria, os protestos acima referi­dos. Como se não falassem deles, os impedis­sem de terem acon­te­cido. Uma espé­cie de negação.

Não me recordo de ter teste­munhado algo semel­hante, em tempo algum, em qual­quer democ­ra­cia do mundo – talvez protestos pare­ci­dos já ten­ham ocor­rido em alguma ditadura per­iférica, assim mesmo, com rari­dade.

Não faz muito tempo a min­is­tra Cár­men Lúcia, do STF, disse saber que este “é o momento de falar mal de juiz e do Supremo”.

A min­is­tra está equiv­o­cada. Há muito tempo o tri­bunal, dev­ido ao com­por­ta­mento de seus inte­grantes, é malvisto pela sociedade brasileira.

Os ques­tion­a­men­tos sobre con­du­tas inad­e­quadas já remon­tam mais de duas décadas.

Como disse acima não há esforço sem rec­om­pensa. O que a nação assiste, com protestos nas ruas, com bonecos rep­re­sen­tando juízes, com hash­tags com inscrições pedindo a saída de min­istros, tudo isso, é a “rec­om­pensa” pelos anos de mal serviços presta­dos a nação.

Não se trata de “moda” ou de críti­cas infun­dadas, trata-​se de uma justa reação há anos de desre­speitos aos cidadãos.

Nesta per­spec­tiva soa quixotesca a busca do Supremo por inimi­gos exter­nos. Como D. Quixote, de Cer­vantes, com­batem moin­hos de vento e não inimi­gos reais. Os ver­dadeiros inimi­gos da corte estão alo­ja­dos den­tro do tri­bunal de onde ameaçam não sairem tão cedo. Os ver­dadeiros inimi­gos são os inter­nos – nos seus dup­los sentidos.

Um dos min­istros que foi alvo dos protestos, Gilmar Mendes, tam­bém con­hecido com “soltador-​geral da República”, envolve-​se em polêmi­cas desde o seu ingresso na Corte. Jor­nal­is­tas e juris­tas de renome ques­tionam a qual­i­dade e moti­vações de suas decisões desde sem­pre.

Em 2009, há uma década, por­tanto, o então min­istro Joaquim Bar­bosa, em plena sessão, disse:

— Vossa excelên­cia não está na rua, não. Vossa excelên­cia está na mídia, destru­indo a cred­i­bil­i­dade do Judi­ciário brasileiro. É isso. […] Vossa excelên­cia quando se dirige a mim não está falando com os seus capan­gas do Mato Grosso, min­istro Gilmar. O sen­hor respeite.»

Alguém con­segue imag­i­nar ter­mos mais fortes para um min­istro referir-​se a outro? Foi uma reação intem­pes­tiva do min­istro Barbosa?

É pos­sível que alguns atribuam a acidez das palavras do min­istro, naquela dis­cussão de 2009, ao seu com­por­ta­mento “difí­cil”, mas, veja, em 2018, noutro momento “céle­bre” da Corte, o min­istro Bar­roso disse dirigindo-​se ao colega Gilmar Mendes: “— Me deixa de fora do seu mau sen­ti­mento. Você é uma pes­soa hor­rível. Uma mis­tura do mal com atraso e pitadas de psi­co­pa­tia. Isso não tem nada a ver com o que está sendo jul­gado. É um absurdo, Vossa Excelên­cia aqui fazer um comí­cio, cheio de ofen­sas, grosse­rias. Vossa Excelên­cia não con­segue artic­u­lar um argu­mento, fica procu­rando, já ofendeu a pres­i­dente, já ofendeu o min­istro Fux, agora chegou a mim. A vida para Vossa Excelên­cia é ofender as pes­soas”.

E acres­cen­tou: “— Vossa Excelên­cia, soz­inho, enver­gonha o tri­bunal. É muito ruim. É muito penoso para todos nós ter que con­viver com Vossa Excelên­cia aqui. Não tem ideia, não tem patri­o­tismo, está sem­pre atrás de algum inter­esse que não é o da Justiça. É uma coisa hor­ro­rosa, uma ver­gonha, um con­strang­i­mento. É muito feio isso”.

Podemos ficar ape­nas nestes dois momentos.

Outro alvo dos protestos das ruas, o min­istro Dias Tof­foli, é bem mais emblemático. Reprovado duas vezes em con­cur­sos públi­cos para juiz de dire­ito, por obra e graça do des­tino, virou min­istro da mais ele­vada Corte do país.

Sua investidura, basta olhar os jor­nais da época, cau­sou inqui­etação e críti­cas, mais diver­sas, inclu­sive essa: como alguém que não con­seguiu ser juiz numa comarca per­dida nos rincões do país podia “virar” min­istro do Supremo.

Recen­te­mente com­ple­tou uma década como min­istro e, se alguma alma cari­dosa, em algum momento, chegou ter dúvi­das se o seu ingresso na Corte se deu uni­ca­mente por ser “amigo do rei”, na presidên­cia do tri­bunal, ele espan­tou toda e qual­quer ques­tion­a­mento a respeito disso.

Não se trata “ape­nas” de ataques de “juizite”. São decisões de duvi­dosa legal­i­dade, como a aber­tura de inquérito secreto por sua própria ini­cia­tiva, com nomeação de rela­tor escol­hido a dedo para inves­ti­gar objeto incerto.

Antes, já tinha pedido – e con­seguido –, cen­surar dois veícu­los de comu­ni­cação que traziam reporta­gens sobre detal­hes pouco orto­doxos de sua vida finan­ceira.

Não sat­is­feito solic­i­tou dados do sig­ilo bancário e fis­cal de cerca de seis­cen­tos mil con­tribuintes entre pes­soas físi­cas e jurídi­cas, depois de deter­mi­nar a par­al­iza­ção de quase nove­cen­tos proces­sos que tiveram como base relatórios do antigo COAF.

Isso só para citar os fatos mais “polêmi­cos”.

A der­radeira prova cabal de sua inca­paci­dade foi “alu­gar” a atenção da nação por qua­tro horas para pro­ferir um voto cujo objeto caberia em, no máx­imo, 15 min­u­tos, estourando, 20 ou 30 min­u­tos, para, no final, ninguém enten­der a decisão que pro­feriu. Nem mes­mos os seus cole­gas, acos­tu­ma­dos ao lin­gua­jar empo­lado, ao tér­mino do voto sabiam qual tinha sido a decisão de sua excelên­cia, isso depois de pedi­rem diver­sos esclarec­i­men­tos durante a man­i­fes­tação.

Alguns sug­eri­ram a con­tratação de um pro­fes­sor de javanês, em alusão ao clás­sico de Lima Bar­reto, já out­ros dis­seram, pub­li­ca­mente, que estavam diante de um novo idioma: o “tof­folês”.

Quando o pres­i­dente da mais ele­vada Corte do país é tratado como piada por seus próprios pares é porque algo de muito errado há.

A per­gunta que se faz é: como cheg­amos a isso?

A primeira resposta é que isso sinal­iza a ausên­cia e/​ou o mau fun­ciona­mento das insti­tu­ições repub­li­canas.

Ao longo dos anos assis­ti­mos o apar­el­hamento do Poder Judi­ciário em suas várias instân­cias. Car­gos vitalí­cios de desem­bar­gadores e min­istros sendo “repar­tidos” entre agremi­ações par­tidárias em detri­mento dos inter­esses da nação.

As insti­tu­ições não fun­cionaram (e não fun­cionam) por ocasião das investiduras e menos ainda quando surge a neces­si­dade de reti­rar um ou outro ministro.

A falta de ini­cia­tiva e mesmo de ação das insti­tu­ições democráti­cas sus­ci­tam os protestos nas ruas e, até mesmo, pro­postas de cunho anti­democrático.

Desde a rede­moc­ra­ti­za­ção do país, e já sob a égide da Con­sti­tu­ição de 1988, foram feitos os impeach­ment de dois pres­i­dentes da República, legit­i­ma­dos por mil­hões de votos; o par­la­mento já cas­sou dezenas de par­la­mentares e tan­tos out­ros foram con­de­na­dos pela Justiça.

Os pro­ced­i­men­tos de impeach­ment, os proces­sos de cas­sação, assim como, a perda dos mandatos por dec­re­tação emanada do Poder Judi­ciário são legí­ti­mas, ape­sar disso, com motivos mais do que sufi­cientes, não são aber­tos os proces­sos de impeach­ment em face dos min­istros do Supremo.

O Senado da República, que nos ter­mos da Con­sti­tu­ição pos­sui a com­petên­cia para levar a cabo o impeach­ment não per­mite nem que os mes­mos sejam instau­ra­dos. São proces­sos sérios, car­rega­dos em provas con­tun­dentes e argu­men­tação farta, que o pres­i­dente do Senado ignora e deixa dor­mi­tar em suas gave­tas.

É jus­ta­mente essa omis­são a raiz de todos os males. Os min­istros, que se acham inat­ingíveis, deixam de se com­portarem como mag­istra­dos para se com­portarem como políti­cos, com um com­por­ta­mento desre­grado e emitindo opinião, fora dos autos, sobre tudo; noutra frente a sociedade que sabe não poder con­fiar nas insti­tu­ições, sai às ruas pedindo soluções arbi­trárias.

Estivessem as insti­tu­ições fun­cio­nando de forma reg­u­lar, sabendo suas atribuições, os pro­ced­i­men­tos de impeach­ment seriam instau­ra­dos e os, suposta­mente, cul­pa­dos, proces­sa­dos e jul­ga­dos pelo foro com­pe­tente, que não é a rua ou a ágora da inter­net.

Assim o Brasil vai tril­hando rumo ao caos.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

A DEMOC­RA­CIA DE CADA UM.

Escrito por Abdon Mar­inho

A DEMOC­RA­CIA DE CADA UM.

Por Abdon Marinho.

AH, MEU FILHO, quem “destrata” quer com­prar.

A frase já dita em meus tex­tos tan­tas vezes, como sabem, faz parte dos ensi­na­men­tos do meu saudoso pai. Ele, ape­sar de anal­fa­beto por parte de pai, mãe e parteira, nunca deixou de ter uma palavra sobre os temas do cotid­i­ano e nos ensi­nar.

E essa frase, que con­hece­mos desde tem­pos imemo­ri­ais, a magia do tempo nos mostra, nunca foi tão atual.

Vejamos, na atual quadra política, o para­lelo que podemos traçar entre o cenário político nacional e o local, aqui, numa questão bem específica.

Desde que o atual pres­i­dente da República assumiu o mandato que tem sido tratado como o dita­dor, autoritário, indigno e um risco à democracia.

Desde o começo do gov­erno quem tem feito um esforço sobre-​humano e, às vezes, bizarro, para ser a antítese ao gov­erno do sen­hor Bol­sonaro é o gov­er­nador do Maran­hão, o sen­hor Dino, inte­grante do Par­tido Comu­nista do Brasil – PCdoB.

Se o pres­i­dente diz que o céu está azul-​anil, lá vem o gov­er­nador dizer que o céu está encar­nado como a ban­deira da China; se diz que faz frio, o gov­er­nador diz que está quente como no deserto do Saara. E por aí vai.

Reconheça-​se que neste intento, por alguns momen­tos, o gov­er­nador até chegou a ser recon­hecido como o ver­dadeiro opos­i­tor ao pres­i­dente, levando-​o a dizer-​se pré-​candidato à presidên­cia da República, prati­ca­mente, qua­tro anos antes do pleito. Algo inédito.

Um dos prin­ci­pais pon­tos de antag­o­nismo, sem dúvida, foi a pro­posta de reforma da pre­v­idên­cia, encam­in­hada pelo gov­erno fed­eral logo nos primeiros dias da nova legislatura.

A reforma da pre­v­idên­cia, como sabe­mos, era uma emergên­cia nacional. Claro que ninguém gosta de lim­i­tar ou mesmo ces­sar dire­itos que foram con­quis­ta­dos ao longo de anos – emb­ora muitos dos supos­tos “dire­itos” sejam, na ver­dade, priv­ilé­gios de uma elite per­dulária que desde sem­pre viveu às cus­tas do Estado.

Ape­sar de todos saberem da sua neces­si­dade, sobre­tudo, os diri­gentes dos esta­dos fed­er­a­dos, o gov­er­nador maran­hense e seus ali­a­dos tudo fiz­eram para tor­pedear a reforma da pre­v­idên­cia e “desidratá-​la” ao máx­imo.

Em deter­mi­nado momento, quando os par­la­mentares chegaram a um con­senso com os gov­er­nadores visando a inclusão de esta­dos e municí­pios na reforma, o “nosso” gov­er­nador foi o único (salvo mel­hor juízo) a colocar-​se con­tra, e não assi­nar o acordo, obri­g­ando a aprovação da reforma sem os esta­dos e municí­pios.

Noutra frente, seus ali­a­dos no par­la­mento uniram-​se ao que de mais rea­cionário existe den­tro do Con­gresso Nacional para garan­tir priv­ilé­gios e reduzir a econo­mia do país com a reforma.

Mesmo depois que a reforma foi aprovada na Câmara dos Dep­uta­dos, já em votação no Senado, foi uma ali­ada sua que apre­sen­tou – e con­seguiu aprovar –, uma emenda à pro­posta, reduzindo ainda mais a econo­mia do país com a reforma.

Esse breve histórico é impor­tante para enten­der­mos a forma de agir de sua excelên­cia em relação ao público externo e interno.

Enquanto, além das fron­teiras do Maran­hão, o que mais se ouve da boca de sua excelên­cia são ter­mos como diál­ogo, debate, democ­ra­cia, liber­dade e out­ras coisas mais do “ane­dotário” – de ane­dota mesmo, pois parece piada –, para o público interno a con­versa é bem dis­tinta.

A Emenda Con­sti­tu­cional nº. 103, com o que “sobrou” da reforma da pre­v­idên­cia, após sofrer todo tipo de boicote do gov­er­nador maran­hense e seus ali­a­dos, foi pro­mul­gada pelo Con­gresso Nacional no dia 12 de novem­bro, pois bem, já no dia 19 de novem­bro, menos de oito dias, e con­siderando um feri­ado nacional (procla­mação da República) e um final de sem­ana, já estava sua excelên­cia, o “nosso” gov­er­nador, batendo às por­tas da Casa de Manuel Beck­man, “orde­nando” aos valentes dep­uta­dos da sua base que aprovassem na leg­is­lação estad­ual as alter­ações da reforma que tanto criticou.

Só não aprovou a adesão do estado a reforma no espaço de duas ou três horas porque um ou dois dep­uta­dos da oposição pedi­ram vis­tas reg­i­men­tal do pro­jeto. Mas, já no dia seguinte o pro­jeto estava sendo votado, acred­ito que daquela velha maneira “os sen­hores dep­uta­dos que con­cor­dam per­maneçam como estão”. Pronto! Estava sacra­men­tada a adesão às novas nor­mas con­sti­tu­cionais da reforma da previdência.

Não teve nada de diál­ogo, de debates, con­venci­men­tos e todas essas coisas “hor­ríveis” da democ­ra­cia. Foi aprovada na base da “lei do mais forte”.

Vejam que não ques­tiono a aprovação do pro­jeto em si. Os entes fed­er­a­dos devem submeter-​se às nor­mas gerais da Con­sti­tu­ição da República, o que se dis­cute aqui é a con­tradição exis­tente entre o dis­curso para o público externo e o que é prat­i­cado inter­na­mente.

Até onde se sabe, out­ros esta­dos, suposta­mente, em situ­ação até pior que a nossa, não “cor­reram” para aplicar as novas alíquo­tas, mesmo aque­les gov­er­nadores que, tam­bém, se mostraram con­trário à reforma, muito menos, “inter­di­taram” quais­quer pos­si­bil­i­dades de diál­ogo dos rep­re­sen­tantes do povo.

Com efeito o artigo 9º, da Emenda Con­sti­tu­cional, esta­b­elece: “§ 4º Os Esta­dos, o Dis­trito Fed­eral e os Municí­pios não poderão esta­b­ele­cer alíquota infe­rior à da con­tribuição dos servi­dores da União, exceto se demon­strado que o respec­tivo régime próprio de pre­v­idên­cia social não pos­sui deficit atu­ar­ial a ser equa­cionado, hipótese em que a alíquota não poderá ser infe­rior às alíquo­tas aplicáveis ao Régime Geral de Pre­v­idên­cia Social”.

À luz da ação empreen­dida temos, por certo, a admis­são indi­reta que a pre­v­idên­cia social do estado está “que­brada”, ou seja, pos­sui déficit autuo­r­ial a ser equa­cionado.

O que, aliás, sem­pre soube­mos – ape­sar dos reit­er­a­dos des­men­ti­dos dos gov­er­nantes –, e que a oposição denun­cia desde muito tempo.

A pre­v­idên­cia estad­ual, na atual gestão, saiu de uma situ­ação con­fortável, com recur­sos investi­dos sufi­cientes para arcar com suas despe­sas, para uma situ­ação, segundo dizem, de acu­mu­lar um déficit de mais de 2 bil­hões de reais no mesmo espaço de tempo e ter que se des­fazer do seu patrimônio imo­bil­iário para ten­tar diminuir o “rombo”.

Talvez estas ver­dades incon­ve­nientes, mas incon­testáveis, jus­ti­fiquem a inter­dição do debate democrático, pelo gov­erno, na Assem­bleia Leg­isla­tiva. Ou, talvez, os dep­uta­dos estad­u­ais não ten­ham “moral” sufi­ciente para impor o debate político sobre as questões do estado, fazendo valer o mandato que lhes con­feri­ram às urnas. Ou, talvez, este­jam todos comungando do surto autoritário que dom­ina o estado. Que, aqui não enx­ergam, mas que são doutores em apon­tar em relação ao gov­erno fed­eral.

Aliás, todos aque­les que se esgoe­laram prote­s­tando con­tra a reforma da pre­v­idên­cia e o gov­erno fed­eral, aqui, quando o gov­erno man­dou aprovar a “adesão” a parte da reforma não dis­seram nada, silen­cia­ram, emude­ce­ram, acharam tudo muito bem, obri­gado.

Segundo soube, um dep­utado da oposição desafiou quais­quer dos dep­uta­dos da situ­ação a dizer o que tinha em deter­mi­nado artigo da lei que estava em dis­cussão, não obteve resposta. E olha que pro­jeto (que virou lei) era bem “mix­u­ruca”.

Arrisco dizer que não imag­i­nava que em pleno século XXI, com tan­tas infor­mações cir­cu­lando, fôsse­mos ter uma rep­re­sen­tação política tão defi­ciente. Um gov­er­nador sen­ho­r­ial impondo-​se sobre um par­la­mento ajoel­hado.

Como na música, “vejo o futuro repe­tir o pas­sado, vejo um museu de grandes novidades”.

Ao teste­munhar os dep­uta­dos estad­u­ais aprovarem um pro­jeto de lei de tanta importân­cia sem qual­quer dis­cussão, sem um debate democrático sobre a situ­ação do estado; aprovar sem ler em questão de horas, vapt-​vupt; ver a imprensa, quase toda, silen­ciar como um cordeiro, faz-​me recor­dar de como eram as coisas no iní­cio do século pas­sado, como se o pre­sente (e o futuro) repetisse o passado.

Já con­tei aqui essa história – mas não custa repe­tir –, conta a “lenda”, que no tempo dos coro­néis as eleições eram “pro forma”. O rico coro­nel, insta­lava a seção eleitoral no alpen­dre de sua casa de fazenda e os cabo­c­los for­mava a fila para votar. O coro­nel, então, preenchia cédula dev­i­da­mente “votada” e dobrada para que “eleitor” a deposi­tasse na urna, sob suas vis­tas. Se algum dos “eleitores” tomasse a ini­cia­tiva de ten­tar abrir a cédula para ver em quem “votara”, já lhe atal­hava o coro­nel: — o que é isso cabo­clo, você não sabe que o voto é secreto?

Como podemos con­statar, falta bem pouco para o gov­erno e a Assem­bleia Leg­isla­tiva retornem a esse nível. Já alcançamos as votações “vapt-​vupt”, para retornar as cédu­las “votadas”, falta bem pouco.

Abdon Marino é advo­gado.