AbdonMarinho - A TEORIA DA POBREZA DIVINA.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sexta-​feira, 22 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

A TEO­RIA DA POBREZA DIVINA.


A TEO­RIA DA POBREZA DIVINA.

Por Abdon Marinho.

DURANTE todos estes anos em que me entendo por gente sem­pre me inqui­etou a questão da pobreza no nosso estado, no nosso país.

Outro dia, lendo a col­una sem­anal do ex-​presidente Sar­ney minha dúvida se dis­sipou: somos pobres por obra e graça de Deus.

Pois é, o ex-​presidente, ao tratar da van­tagem estratég­ica do Porto do Itaqui, na col­una do dia 23/​11/​2019, assen­tou, que o Cri­ador não foi muito gen­eroso com o nosso estado, a começar pela errada avali­ação que nos­sas ter­ras eram exce­lentes quando na ver­dade são ter­ras paupér­ri­mas – exceto por uma faixa de ter­ras nas ime­di­ações dos municí­pios de Gra­jaú e For­t­aleza dos Nogueiras. Ape­nas uma man­cha, de resto ter­ras áci­das e arenosas.

Outra culpa do Cri­ador, foi não ter nos legado um minério, eco­nomi­ca­mente expres­sivo.

Estas segundo o ex-​presidente, as razões da nossa pobreza, a moti­vação para ter­mos mais de 54% (cinquenta e qua­tro por cento) da nossa pop­u­lação vivendo abaixo da linha da pobreza, e, destes, um expres­sivo con­tin­gente, sobrevindo na mis­éria absoluta.

Nos dias que se seguiram ao diag­nós­tico do ex-​presidente sobre as razões para a mis­éria do Maran­hão, esperei, esperei, esperei … e nada. Nem na Assem­bleia Leg­isla­tiva, nem na Câmara dos Dep­uta­dos, nem no Senado da República, nem no Palá­cio do gov­erno, ninguém tinha uma man­i­fes­tação, ou uma opinião sobre o que disse o velho moru­bix­aba.

Não leram? Não deram importân­cia? Con­cor­daram com o que disse?

Em quais­quer das hipóte­ses, antes de cul­par­mos o Altís­simo, talvez devêsse­mos olhar aqui mesmo para os lados e enx­erg­amos o ver­dadeiro cul­pado da des­graça que acom­panha os maran­henses desde sem­pre: a classe política, os rep­re­sen­tantes do povo, eleitos para bem representá-​los e apre­sen­tar o mel­hor cam­inho a seguir. Ao invés disso, parece que temos uma classe política que não sabe o seu papel, e, que no lugar de ret­ribuir a con­fi­ança rece­bida, trata de se dar bem e per­pet­uar a mis­éria.

Nas palavras do ex-​presidente, temos a com­pro­vação disso. Ele atribui a Deus a respon­s­abil­i­dade pela mis­éria do estado ao não nos deixar solos férteis ou ricos minérios.

Mas, ele fez o quê? Ao menos rezou?

Vejam, o ex-​presidente Sar­ney é, de longe, o político mais bem suce­dido do estado e, quiçá, do Brasil. Foi dep­utado, gov­er­nador, senador de 1970 a 1985, pres­i­dente da República, senador nova­mente, pelo Amapá de 1991 a 2015. Como senador, teve a honra, e o mérito, de pre­sidir o Senado por qua­tro vezes. Na sua car­reira política, tanto no par­la­mento quanto no poder exec­u­tivo, teve a chance de dialogar e tro­car exper­iên­cias com as maiores lid­er­anças do mundo. Ele mesmo faz questão de dizer isso.

Difi­cil­mente encon­traremos na história da República car­reira política tão proem­i­nente. E, ape­sar de tudo isso, já chegando aos noventa anos de idade e exper­iên­cia acu­mu­lada, o ex-​presidente cred­ita a Deus a respon­s­abil­i­dade pelo fato do Maran­hão, estado onde man­dou por quase cinco décadas, ser pobre, mis­erável, e encontrar-​se na rabeira de tudo que é indi­cador social e de desenvolvimento.

Pior, ninguém da classe política parece se impor­tar ou ter alguma ideia para mudar tal situ­ação. Pelo con­trário, pare­cem achar nat­ural que o Maran­hão seja pobre. Ou, talvez, con­cor­dem que a pobreza é uma graça Div­ina. Afi­nal, agora somos todos Sarney.

O próprio ex-​presidente conta que pelos anos sessenta, num dos mil­hares fóruns inter­na­cionais que par­ticipou, travou diál­ogo com Golda Meir, uma das desta­cadas lid­er­anças de Israel naque­les tumul­tua­dos dias em que ele se fir­mava. Pode­ria ter aproveitado para inda­gar como o minús­culo e árido ter­ritório estava pro­duzindo ali­men­tos, saber dos êxi­tos dos kibutz.

Pode­ria ter feito o mesmo, com diver­sos out­ros países ou mesmo esta­dos, que a despeito de pos­suírem situ­ações geográ­fi­cas des­fa­voráveis despon­tavam – e despon­tam –, como mod­e­los de desen­volvi­mento, seja na agri­cul­tura, pecuária, ou mesmo no ramo das tec­nolo­gias.

Israel é um exem­plo, o Japão é outro. E, assim, são tan­tos bons exem­p­los que poderíamos ter segui­dos para desen­volver o Maran­hão. Ainda que con­tando, ape­nas de 1966 para cá.

O Maran­hão pos­sui uma área ter­ri­to­r­ial de 331.936,95 km2 e 7 mil­hões de habi­tantes, o segundo maior estado em exten­são ter­ri­to­r­ial, ficando atrás, ape­nas, da Bahia, que pos­sui área de 564.732,45 km2 e pop­u­lação de 15.344.447 habi­tantes; é cerca de cinquenta por cento maior que o Piauí, que pos­sui área de 251.611,93 km2, onde aco­moda 3.219.257 habi­tantes; mais que o dobro da área do Ceará, que pos­sui área de 148.887,93 km2 onde aco­moda mais de 9 mil­hões de habi­tantes; e, mais que três vezes a área do estado de Per­nam­buco que pos­sui 98.076,02 km2 e pop­u­lação de 9.473.266 habi­tantes. Fique­mos ape­nas nestes na região Nordeste.

Pois bem, o valor bruto da pro­dução agropecuária maran­hense nos val­ores em reais para o ano de 2019, segundo o Min­istério da Agri­cul­tura é R$ 7.398.548.495; já o do Piauí é de R$ 4.774.627.241; o do Ceará é R$ 3.230.531.698; e o de Per­nam­buco de 5.666.115.343.

Em que pese o Maran­hão fig­u­rar na frente destes esta­dos, sabe­mos que, até pelas condições climáti­cas destes, o valor bruto da nossa pro­dução e pífio.

O VBPA do Ceará é quase metade do nosso e sabe­mos que o outro nome de seca e aridez do solo atende pelo nome de Ceará; já o Piauí, que sem­pre foi sinôn­imo de pobreza apre­senta um VBPA sig­ni­fica­tivo em relação ao nosso, mais de dois terços e o que dizer de Per­nam­buco que com uma área três vezes menor que o nosso estado quase nos alcança?

A situ­ação torna-​se ainda mais vex­atória quando com­para­mos com a Bahia, que não rep­re­senta em área ter­ri­to­r­ial dois esta­dos do Maran­hão mas que pos­sui um Valor Bruto de Pro­dução Agropecuário mais de qua­tro vezes supe­rior ao nosso, com R$ 29.126.130.583.

Se com­para­r­mos com out­ros esta­dos fora da região nordeste a situ­ação do nosso estado tam­bém não é boa.

Vejamos o estado de Rondô­nia que pos­sui uma área ter­ri­to­r­ial de cerca de dois terço do nosso ter­ritório com 237.765,29 km2 e pouco menos de 2 mil­hões de habi­tantes. O Valor Bruto da Pro­dução Agropecuária alcançou para este ano o mon­tante de R$ 10.018.082.461.

Vejamos outro estado, Santa Cata­rina, cujo ter­ritório é mais de três vezes menor que o nosso, o VBPA para este ano é de R$ 21.040.499.354;

Se com­para­r­mos com o Paraná que pos­sui ape­nas 199.307,94 km2, aí que a nossa situ­ação fica com­pli­cada. Para este ano aquele estado apre­senta como VBPA o mon­tante de R$ 72.561.183.299, ou seja, dez vezes o valor da pro­dução maran­hense, com menos de dois terços do nosso ter­ritório.

No mesmo estudo, merece destaque que a soja con­tribui com R$ 3.268.495.594; o milho com R$1.024.379.805; e, a cul­tura bov­ina com R$1.690.928.797. Estas as prin­ci­pais cul­turas do estado na com­posição do VBPA. As duas primeiras, como sabe­mos, pro­duzi­das na região sul do estado e, já no médio Par­naíba, sobre­tudo por agricul­tores vin­dos de out­ras regiões do país que acred­i­taram nas poten­cial­i­dades do estado para estas cul­turas e desafi­aram o estigma de que a nossa terra é pobre.

Se fos­sem acred­i­tar na teo­ria de que nosso solo, com exceção da “man­cha” entre os municí­pios de Gra­jaú e For­t­aleza dos Nogueiras, cer­ta­mente, estaríamos apre­sen­tando um resul­tado ainda mais pífio.

Quero dizer – como, aliás, já disse noutros tex­tos –, que o Maran­hão pode se desen­volver a par­tir da situ­ação van­ta­josa do seu posi­ciona­mento geográ­fico, pelo fato de pos­suir por­tos com situ­ações espe­ci­ais, que poderão e dev­erão, ser ampli­a­dos, pelo con­strução de novos por­tos, rodovias e fer­rovias, além, claro, da explo­ração do Cen­tro de Lança­mento de Alcân­tara — CLA, mas, difer­ente do entendi­mento do ex-​presidente, existe muito espaço para o cresci­mento do estado, tam­bém no setor primário, na pro­dução de arroz, milho, soja, algo­dão, assim como na pro­dução de bovi­nos, suínos, capri­nos, ovi­nos, etc.

A pro­dução agropecuária inde­pen­dente de ter­ras férteis, com espaço tudo se resolve. Poderíamos ser uma das maiores potên­cias do mundo com cul­turas no sis­tema hidropônico, por exem­plo.

O Maran­hão pos­sui um vasto ter­ritório – que alguns tolos ou mal inten­ciona­dos querem desmem­brar –, e, ainda, muitos recur­sos hídri­cos (que pre­cisamos zelar e con­ser­var), um litoral rico, um clima estável, sem con­tar as diver­sas out­ras riquezas.

Difer­ente do que pensa o ex-​presidente, o Cri­ador foi muito gen­eroso com o nosso estado, se fal­hou, não por sua culpa, mas pela nossa, foi quanto aos homens que con­duzem os nos­sos des­ti­nos, estes sim, desprovi­dos de quais­quer con­hec­i­men­tos e capaci­dades. Essa é a nossa única des­graça.

Gov­er­nantes do pas­sado, do pre­sente – e já temo pelo futuro –, nunca foram capazes de traçar um pro­jeto de desen­volvi­mento para o estado. A prova disso é a mis­éria que grassa os lares e que só tem aumen­tado a despeito dos dis­cur­sos tor­tos; a prova disso é ter­mos a maior lid­er­ança política do estado e país, dizendo que nossa pobreza se deve à falta de gen­erosi­dade de Deus.

Abdon Mar­inho é advogado.