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HOMENS E ARMAS.

Escrito por Abdon Mar­inho

HOMENS E ARMAS.

Por Abdon Marinho.

COMO ESPER­ADO o assunto do final de sem­ana foi a rev­e­lação do desejo homi­cida do ex-​procurador-​geral da República, Rodrigo Janot que, deduz-​se, para turbinar a venda de um livro de memórias sobre seu período à frente da Procuradoria-​Geral, rev­elou que foi armado ao Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF e, por muito pouco, não matou o min­istro Gilmar Mendes.

Ainda descon­tando as infini­tas piadas e “memes”, o assunto “bom­bou”, como dizem atual­mente, ofus­cando, até mesmo, o último capí­tulo da estraté­gia do “pacto das elites” para colo­car fim ao com­bate à cor­rupção, anu­lar proces­sos, par­al­isar inves­ti­gações e soltar os cor­rup­tos já pre­sos. Não teve para “ninguém” só se falou no tiro não dado nas dependên­cias da Corte Suprema. Todos falando do assunto, anal­isando suas con­se­quên­cias e tirando suas “casquin­has”. Por certo que é uma pauta inter­es­sante e dela tratare­mos, tam­bém, em um texto especí­fico.

Por estas pla­gas, até o ex-​presidente Sar­ney, na sua col­una sem­anal, tra­tou do assunto trazendo à memória uma crônica de Odilo Costa, filho, sobre episó­dio sim­i­lar ocor­rido no Tri­bunal de Justiça do Piauí, do qual par­ticipou o seu pai, então desem­bar­gador Odilo Costa.

Na sua col­una Sar­ney aproveita para tirar um “sarro” com o ex-​procurador-​geral – talvez como uma pequena vin­gança –, ao colocá-​lo na mesma condição do facínora com múlti­plas con­de­nações, Fer­nando Beira-​mar. Foi sutil, mas per­cep­tível.

Episó­dios envol­vendo homens e armas são infini­tos.

Conta a lenda que aqui mesmo, no nosso Maran­hão ocor­reu um fato pitoresco com temática semel­hante.

Segundo dizem, o então juiz de dire­ito, José Maria Mar­ques, aguar­dava ansioso seu ingresso como desem­bar­gador do Tri­bunal de Justiça do Maran­hão.

Como não era muito querido pelos desem­bar­gadores nunca con­seguiu o ingresso por merec­i­mento, sem­pre preterido por um ou outro.

Aguardou pacien­te­mente a vaga por antigu­idade. Quando chegou a data em que o desem­bar­gador da vez dev­e­ria aposentar-​se ficou intri­gado, pas­sou um mês, dois meses e nada. Dirigiu-​se ao TJMA e indagou na secretaria-​geral: — O desem­bar­gador fulano de tal (omito o nome para não causar embaraços) não dev­e­ria ter se aposen­tado dia tal?

O secretário olhou os arquivos e respon­deu: — Olha Dr. José Maria, aqui con­sta o desem­bar­gador fulano de tal só entra na com­pul­sória daqui a dois anos.

O juiz ficou fulo pois sabia que não tinha se enganado nas suas con­tas. Mas o que fazer diante de um doc­u­mento ofi­cial?

Certa tarde estava o mag­istrado tomando uma cerve­jinha em uma das mesas na calçada do antigo Hotel Cen­tral, na Praça Bened­ito Leite, quando passa jus­ta­mente o filho do desem­bar­gador que dev­e­ria ter se aposen­tado que, inad­ver­tida­mente, o cumpri­men­tou e indagou: —Boa tarde, Dr. José Maria! Quando vamos à desem­bar­gatória?

Como estava o mag­istrado retru­cou: — Ire­mos a ela no dia que o sen­hor seu pai decidir com­ple­tar setenta anos.

O tempo pas­sou, o desem­bar­gador se aposen­tou e, final­mente, o surgiu a vaga por antigu­idade, por dire­ito, do mag­istrado.

Passou-​se uma sem­ana, duas, nada de chamarem o juiz para ser empos­sado.

Na ter­ceira sem­ana ele foi ao tri­bunal, aguardou acabar a sessão e dirigiu-​se à sala do lanche, atrás do Plenário. Lá sacou seu Smith-​Wesson .38 e disse aos desem­bar­gadores: — Olha, vocês estão poster­gando para me chamarem para assumir uma vaga que é minha por dire­ito. Um vaga. Aqui eu tenho seis balas, se con­tin­uarem a me “sacanearem” na próx­ima sessão abrirei, não só uma, mas seis vagas.

Na sessão seguinte con­vo­caram o Dr. José Maria Mar­ques para assumir sua vaga de desem­bar­gador.

Mas isso, tam­bém, é uma lenda. Faz parte da história não con­tada da sociedade maran­hense.

O ex-​presidente Sar­ney pode­ria ter ilustrado sua crônica com tal episó­dio ou um outro que o envolveu pessoalmente.

Nos efer­ves­centes meses que ante­ced­eram a mudança do régime mil­i­tar para o civil, o senador Sar­ney era o pres­i­dente do PDS (Par­tido Democrático Social) e colo­cara os três fil­hos para apoiarem cada um, um can­didato dis­tinto do par­tido, Fer­nando apoiou Maluf, com a des­culpa ou argu­mento de ter fir­mado amizade quando estu­dara em São Paulo na década ante­rior; Zequinha foi de Mário Andreazza; e Roseana de Aure­liano Chaves, que era vice-​presidente República.

Como sabe­mos, Maluf acabou “con­ven­cendo” as lid­er­anças par­tidárias, der­ro­tou os opo­nentes, e gan­hou a indi­cação do par­tido para ir à dis­puta no Colé­gio Eleitoral.

A vitória de Maluf, sobre­tudo, por seus méto­dos abriu uma séria dis­sidên­cia no par­tido, que iria forma um movi­mento chamado “frente lib­eral”, lid­er­ado por Aure­liano Chaves, Marco Maciel, entre out­ros, que apoiou Tan­credo Neves, e depois viraria o Par­tido da Frente Lib­eral — PFL.

O ex-​presidente Sar­ney era um dos dis­si­dentes e, por conta disso, teve que deixar o comando do par­tido. Estava con­fortável, eleito em 1978, ainda tinha mandato de senador até 1986.

Pois bem, segundo foi noti­ci­ado e, se não me falha a memória, dito pelo próprio ex-​presidente, em uma entre­vista a um jor­nal ou revista, para aquela tensa reunião onde iria comu­nicar que estava deixando a presidên­cia do par­tido (e o par­tido), ele foi armado.

Comu­ni­cou a sua renún­cia à presidên­cia do par­tido, pouco depois deixou o par­tido e já no começo do seguinte estava no Movi­mento Democrático Brasileiro — MDB, como can­didato a vice-​presidente na chapa de Tan­credo Neves no Colé­gio Eleitoral e, em março daquele ano assumiria pro­vi­so­ri­a­mente e no mês seguinte, em defin­i­tivo, à presidên­cia da República.

Até hoje não se sabe o que o ex-​presidente pre­tendia fazer ao ir armado a uma reunião do par­tido: rea­gir à bala caso hou­vesse algum xinga­mento? Ati­rar em alguém especificamente?

Eram os tur­bu­len­tos anos oitenta. Eram out­ros tem­pos. Por­tar armas ainda era sím­bolo de cor­agem e deste­mor.

Para a ale­gria (ou tris­teza) de muitos nem Sar­ney, nem Jonot chegaram a fazer uso de suas armas.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

O MARAN­HÃO E AS HISTÓRIAS NÃO CONTADAS.

Escrito por Abdon Mar­inho

O MARAN­HÃO E AS HISTÓRIAS NÃO CON­TADAS.

Por Abdon Mar­inho.

VÉSPERA DE FERI­ADO à tarde, com o escritório prati­ca­mente vazio recebo a visita do amigo ex-​deputado estad­ual Ader­son Lago. Nos con­hece­mos desde 1991 quando assumiu o primeiro mandato como dep­utado e eu tra­bal­hava na Assem­bleia Leg­isla­tiva na asses­so­ria do dep­utado Juarez Medeiros.

Ao longo dos anos tive­mos a opor­tu­nidade de tra­bal­har­mos jun­tos em alguns pro­je­tos: as duas cam­pan­has de Cafeteira, 1994 e 1998; e, depois, já como advo­gado, em diver­sas ações, como Ação Pop­u­lar con­tra a pri­va­ti­za­ção do Banco do Estado, as ações rela­cionadas ao escân­dalo da estrada Paulo Ramos/​Arame, dois pedi­dos de impeach­ment de Roseana Sar­ney; ação a favor de uma difer­ença do FUN­DEF que o estado não repas­sava aos municí­pios e tan­tas out­ras em defesa do povo do Maranhão.

Nos dezes­seis anos que pas­sou como dep­utado foi dos mais ativos e prepara­dos se desta­cando como prin­ci­pal dep­utado de oposição na assem­bleia leg­isla­tiva

Após tratar­mos do assunto que o levou ao escritório começamos a tro­car ideias sobre o quadro político local, o nacional e as nos­sas deses­per­anças com tudo que esta­mos assistindo.

O formidável de con­ver­sar com Ader­son é que ele tem uma memória extra­ordinária, lem­bra detal­hes como se os fatos tivessem ocor­ri­dos ontem.

Quando falá­va­mos do sarneísmo a propósito deste pacto “camaleônico” com o gov­erno comu­nista do Maran­hão Ader­son provo­cou:

— Sabes como foi eleição de Sar­ney, em 1965, Abdon?

O meu con­hec­i­mento é o dos livros esco­lares, que­ria ouvir dele. Disse-​lhe: — Não!

Aí ele pas­sou a me con­tar a história não escrita, a par­tir de suas lembranças.

Diz-​me ele: em 1965 o prefeito de Baca­bal era Benu Lago (Bened­ito de Car­valho Lago, seu tio e o trigésimo primeiro prefeito de Baca­bal).

Inter­rompe para con­tar um pouco sobre Benu Lago. Fala que Benu ficou órfão muito cedo, com 17 anos, e ape­sar da pouca idade, virou arrimo de família assu­mindo a respon­s­abil­i­dade pela edu­cação dos demais irmãos, den­tre os quais seu pai, o pai de Jack­son Lago den­tre out­ros. Ressalva que ape­sar do avô, José Luís Teix­eira do Lago, ter deix­ado posses, o mérito de Benu Lago não pode ser descar­tado, tanto assim que em 1950 elegeu-​se dep­utado fed­eral, elegeu o irmão, pai de Jack­son, Zé Lago, dep­utado estad­ual, além de out­ros três dep­uta­dos estad­u­ais, Zeca Branco, Jose Mar­ques Teix­eira e Clementino Bez­erra, todos do municí­pio de Pedreiras.

Cer­ta­mente Pedreiras, que pos­suía a segunda ou ter­ceira econo­mia do estado, nunca mais repetiu tal feito.

Aí retorna à eleição de 1965: Pois bem, estava Benu em seu gabi­nete quando entra um de seus secretários de nome Zé San­tos, que depois foi vereador em Baca­bal: — Seu Benu tem um “gen­eral” aí fora querendo falar com o senhor.

— Pois mande o homem entrar, retruca o prefeito.

O homem que que­ria falar com o prefeito não era (ainda) gen­eral, era o coro­nel Dil­er­mando Mon­teiro (que depois viraria gen­eral e coman­daria o Segundo Exército, em São Paulo).

O coro­nel estava em mis­são, dev­i­da­mente far­dado, fora des­ig­nado pelo Marechal Castelo Branco, então pres­i­dente da República, para, em seu nome, pedir o apoio dos prefeitos maran­henses para a cam­panha do dep­utado José Sar­ney ao gov­erno estad­ual.

Ader­son acres­centa: — quem tam­bém esteve por aqui com a mesma mis­são foi, entre out­ros, o (ainda) coro­nel João Bap­tista Figueiredo, que veio a ser o último pres­i­dente do Régime Mil­i­tar.

Benu rece­beu o coro­nel Dil­er­mando mas disse-​lhe: — Coro­nel, lamento não poder aten­der o pedido do pres­i­dente, meu par­tido que é o mesmo par­tido gov­er­nador já tem um can­didato, o ex-​prefeito de São Luís, além disso, o gov­er­nador é sogro da minha filha. Até tenho uma boa relação como dep­utado Sar­ney, mas já temos com­pro­misso tanto no aspecto político quanto pes­soal.

Antes de se des­pedir do coro­nel, Benu indaga: — Coro­nel me sacie uma curiosi­dade: todos sabe­mos que o dep­utado Sar­ney não é “bem visto” junto às Forças Armadas, sabe-​se até que figura no livro edi­tado pela bib­lioteca do exército como “per­sona non grata”. Como jus­ti­fica todo esse esforço para fazê-​lo governador?

O coro­nel Dil­er­mando responde: — Prefeito, o marechal Castelo Branco é um udenista fer­renho e homem de par­tido. Se o dep­utado Sar­ney é da UDN (União Democrática Nacional), tem todo o nosso apoio.

Para os que não con­hecem a história, o dep­utado Sar­ney ape­sar de ser da UDN era inte­grante da ala política chamada “Bossa Nova”, e até pos­suía sim­pa­tia pelo ex-​presidente Juscelino Kubitscheck de Oliveira e pelo vice-​presidente, que assumiu com a renún­cia de Jânio Quadros, João Goulart, que era do Par­tido Tra­bal­hista Brasileiro — PTB, por­tanto mal visto pelos mil­itares. Outro detalhe é que Sar­ney quase vira min­istro de Jango. Na ver­dade teria dormido min­istro e acor­dou sem sê-​lo, graças à inter­venção do senador Vitorino Freire, que ameaçou romper com o gov­erno fed­eral se a nomeação fosse concretizada.

Ader­son recorda que pouco antes do golpe mil­i­tar de 1964 o dep­utado Sar­ney teria escrito em “O Impar­cial” um artigo de apoio à Jango e con­tra os mil­itares. Ainda, segundo a “lenda” tal artigo, após o golpe, teria sido sub­sti­tuído por outro menos ácido.

Ader­son retro­cede um pouco no tempo para dizer que em 29 de março de 1964, sua família, ele, o pai e a mãe, chegaram ao Rio de Janeiro jus­ta­mente para o casa­mento da filha de Benu Lago com o filho de New­ton Belo.

A cidade que, ape­sar de não ser mais a cap­i­tal da República, era onde tudo acon­te­cia, já ante­via a efer­vescên­cia dos dias que iríamos viver no país.

Os cam­in­hões da Com­pan­hia de Lixo — Con­lurb, por ordem do gov­er­nador da Gua­n­abara, Car­los Lac­erda, inter­di­tava várias avenidas, sobre­tudo as que davam acesso ao palá­cio do gov­erno, onde Lac­erda havia mon­tado um bunker e prome­tia resi­s­tir.

Os dias seguintes estão far­ta­mente doc­u­men­ta­dos nos livros de história.

Ader­son narra que após o casa­mento o retorno, no começo de abril, foi uma ver­dadeira odis­seia, a empresa onde tin­ham as pas­sagens, a PANER do Brasil, sofreu inter­venção e seus aviões proibidos de deco­lar, reti­dos onde estivessem.

Con­seguiram um voo na Viação Aérea São Paulo — VASP, com voos sendo mar­ca­dos e des­mar­ca­dos diver­sas vezes.

Para este texto inter­essa que fiz­eram uma escala em Brasília, que na época ainda não pos­suía aero­porto, ape­nas a Base Aérea e todos os pas­sageiros tin­ham que descer lá, inde­pen­dente de seguirem ou não viagem na mesma aeron­ave.

Foi lá, naquele clima pós-​golpe, que encon­traram um ner­voso dep­utado Sar­ney, em man­gas de camisas. Este logo que viu a família Lago chamou Benu e, reser­vada­mente, con­fi­den­ciou que estava na lista dos que seriam cas­sa­dos pelo régime mil­i­tar e estava ali a cam­inho de Belo Hor­i­zonte para ten­tar, com Mag­a­l­hães Pinto, gov­er­nador de Minas Gerais e um dos líderes civis do golpe, escapar da cas­sação.

Pois é, como sabe­mos Mag­a­l­hães Pinto “salvou” Sarney.

Ader­son observa essa imensa capaci­dade “camaleônica” do ex-​presidente Sar­ney de, em ape­nas um ano deixar de ser um político “quase” cas­sado e “per­sona non grata” pelos mil­itares, para ser o seu can­didato ao gov­erno do Maran­hão, mobi­lizando o régime para apoiá-​lo.

A mudança foi tão ráp­ida que Neiva Mor­eira, impor­tante líder oposi­cionista, cas­sado pelos mil­itares e exi­lado, ao escr­ever uma carta apoiando Sar­ney jamais imag­i­naria que ele era o can­didato dos mil­itares, pen­sava ser ele, ainda, de oposição. Mas isso, tam­bém, é outra lenda.

Para Ader­son os mil­itares não ape­nas aju­daram Sar­ney pedindo votos e apoios para ele, “que­braram” a can­di­datura situa­cionista impondo um veto ao can­didato da prefer­ên­cia do eleitorado e do gov­er­nador, o então dep­utado Renato Archer.

Este fato provo­cou o rompi­mento do gov­er­nador New­ton Belo com Renato Archer e com Vitorino Freire, fazendo-​o lançar o ex-​prefeito de São Luís, Costa Rodrigues.

O dep­utado Renato Archer, não acred­i­tando no veto, com o apoio de Vitorino Freire, man­teve sua can­di­datura.

Essa divisão do grupo da situ­ação foi deter­mi­nante para a vitória do can­didato da oposição, dep­utado Sarney.

Mas os mil­itares foram além. Tudo que o ex-​presidente Sar­ney “vende” como seu mérito na real­iza­ção de obras estru­tu­rantes no estado no seu período de gov­erno, na ver­dade foi mérito dos mil­itares que man­daram as ver­bas e deixaram que tocasse as obras e noutros casos o gov­erno fed­eral que executou dire­ta­mente.

Foi assim com BR 135, foi assim com o Porto do Itaqui, foi assim com a Represa Boa Esper­ança.

Sobre o Porto do Itaqui Ader­son conta uma história muito inter­es­sante.

Diz que no iní­cio dos anos cinquenta quando uma empresa de um ital­iano chamada Con­stru­tora Curzi – que pos­suía larga exper­iên­cia na con­strução de grandes obras –, ten­tava con­struir o porto, mas enfrentava incon­táveis obstácu­los no seu intento, atribuí­dos, prin­ci­pal­mente, ao Tri­bunal de Justiça, que tinha o ex-​presidente Sar­ney como secretário-​geral. O sen­hor Curzi, após uma der­radeira der­rota naquela Corte, aos descer suas escadarias, teria pro­ferido a seguinte frase: “Se Al Capone fosse vivo e aqui estivesse diante deste rapaz de bigod­inho seria um mero aprendiz”.

A tarde não pas­sou enquanto con­ver­sava com Ader­son naquela véspera de feri­ado.

Os fatos nar­ra­dos neste texto com detal­hes que são descon­heci­dos de quase todos no Maran­hão, são ape­nas uma pequena parte do muito que con­ver­samos.

Insisti para que ele escreva um livro con­tando tudo que lem­bra e sabe da nossa história.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

O MARAN­HÃO E AS VILAS DE POTEMKIN.

Escrito por Abdon Mar­inho

O MARAN­HÃO E AS VILAS DE POTEMKIN.
Por Abdon Mar­inho.
O QUE teria em comum o Maran­hão do século XXI com a Rús­sia Czarista do século XVIII?
A qual­quer um a quem se fizesse tal inda­gação cer­ta­mente diria que nada.
Um olhar mais atento perce­berá out­ras simil­i­tudes além da grande mis­éria gras­sava aquele Império e que foi tão bem retratadas nas obras de Górki e Dos­toiévski, já no século XIX.
Uma outra é a que recor­damos agora.
Como sabe­mos, a Cza­rina Cata­rina II, a Grande, que gov­ernou o Império Russo de 1762 a 1796, viveu muito além dos pudores daquela época o que lhe per­mi­tiu cole­cionar um vasto número de amantes – uma série em exibição em diver­sas platafor­mas de mídia (e que recomendo) traz uma impor­tante visão daquele momento –, den­tre eles Potemkin (Grig­ory Alexan­drovich Potemkin, 17391791).
Foi este mil­i­tar, que virou favorito de Cata­rina e a aju­dou gov­ernar por 17 anos, o cri­ador de um mar­ket­ing extra­ordinário para aque­les tem­pos e que ainda hoje inspira muitos políti­cos inclu­sive no nosso estado nos dias atu­ais, razão pela qual me veio à lem­brança.
Conta a história (ou seria lenda) que após a incor­po­ração da Crimeia (a primeira incor­po­ração em 1783 ) mas na iminên­cia de um outro con­flito com os Otomanos, este orga­ni­zou uma excursão de Cata­rina com diver­sos out­ros políti­cos europeus para mostrar que a nova pos­sessão estava per­feita­mente integrada, habitada e próspera.
Para isso, man­dou con­struir diver­sas vilas com madeira e papelão com tudo que uma vila pode­ria ter: casas, igre­jas, comér­cios, etcetera, entre Kiev e Sebastopol.
Assim, quando Cata­rina e seu séquito pas­savam, iam vendo lin­das vilas bem pin­tadas, cri­anças brin­cando, homens de Potemkin fan­tasi­a­dos de cam­pone­ses felizes tra­bal­hando, out­ros saudando a Corte de Peters­burgo e lin­das planí­cies com gado, etc.
Na ver­dade, por trás daque­las fachadas, aquela parte do país era deserta e o povo mis­erável.
Ao longo dos sécu­los muitos políti­cos fiz­eram o mesmo que fez o favorito de Cata­rina e, ainda hoje, as “vilas de Potemkin” servem para des­ig­nar obras de fachada.
E, aqui entra o novo velho Maran­hão cansado de guerra.
Desde que o atual gov­er­nador do estado tornou-​se “amante” da ideia de vir a ser pres­i­dente da República, vestiu-​se de Potemkin e pas­sou a espal­har a pesa­dos cus­tos para o con­tribuinte, suas “vilas prósperas”.
Quem assiste às preleções de sua excelên­cia no rádio ou nos pro­gra­mas de tele­visão imag­ina que o Maran­hão virou um oásis de desen­volvi­mento e que o nosso gov­er­nante é um “gênio da raça” com capaci­dade para solu­cionar todos os prob­le­mas do Brasil e do mundo.
A real­i­dade, infe­liz­mente, dis­corda da impressão: e o gov­erno é como as vilas de Potemkin, de fachada.
Recen­te­mente, enquanto em entre­vis­tas sua excelên­cia “vendia-​se” como a solução para os prob­le­mas do país – qual­quer semel­hança com as orga­ni­za­ções Taba­jara é mera coin­cidên­cia –, uma matéria do Jor­nal Valor Econômico lançava um pouco de luz sobre a real­i­dade maran­hense.
Segundo a pub­li­cação o Maran­hão é o estado da fed­er­ação com mais mis­eráveis, com 12,2%(doze e dois avos por cento) das famílias sobre­vivendo abaixo da linha da mis­éria, com menos de 85 reais por mês.
Em ter­mos abso­lu­tos, con­siderando que o Maran­hão, segundo esti­ma­tiva do Insti­tuto Brasileiro de Geografia e Estatís­tica — IBGE, pos­sui uma pop­u­lação de 7 mil­hões de habi­tantes, temos um exército de desvali­dos supe­rior à casa dos mil­hões, quando con­sid­er­amos que as famílias mais pobres são jus­ta­mente aque­las que pos­suem mais inte­grantes.
Não é pouca coisa, esta­mos falando de dois, três ou talvez qua­tro mil­hões de mis­eráveis.
É certo que o Maran­hão sem­pre esteve na “rabeira” do desen­volvi­mento não se podendo atribuir toda a respon­s­abil­i­dade ao atual gov­erno, na ver­dade a mis­éria do estado é histórica e há até quem diga que ser mis­erável “faz parte da nossa tradição”.
Por outro lado, é certo, tam­bém – e os números estão aí para teste­munhar –, que o estado, sob a gestão comu­nista, o número de famílias mis­eráveis aumen­tou em 40,23% (quarenta e vinte três avos por cento), saltando de quase nove para mais de doze por cento.
Vejam só, logo neste gov­erno que tinha como ban­deira de luta a redução da mis­éria e das desigual­dades, insti­tuindo, inclu­sive um pro­grama chamado Mais IDH nos trinta municí­pios mais pobres do estado, a mis­éria aumen­tou con­sid­er­av­el­mente.
Para quem “se vende” como o “resolvedor-​geral da República”, só estes números são sufi­cientes para provar que o sucesso da gestão se assemelha às Vilas de Potemkin.
A avali­ação fica ainda mais des­fa­vorável quando sabe­mos que o atual gov­erno rece­beu o estado com as con­tas prati­ca­mente em ordem, com as despe­sas com pes­soal abaixo dos quarenta por cento da receita; com servi­dores com salários em dias; com um fundo pre­v­idên­cia com polpu­dos recur­sos em caixa; e com con­tratos para o ingresso de recur­sos em caixa para obras estru­tu­rantes na casa dos bil­hões de reais.
Mas não foi só. Além de tudo isso, o atual gov­erno foi eleito, como se diz pop­u­lar­mente, “sem dever nada a ninguém”, podendo demi­tir quem quisesse, equi­li­brar muito mais as con­tas públi­cas, redis­cu­tir con­tratos, reduzir cus­tos e se preparar para os dias difí­ceis que viriam.
Todos, até mesmo os mais desin­for­ma­dos sabiam, que o país, os esta­dos e os municí­pios estavam atrav­es­sando uma crise que vinha desde 2012. Sua excelên­cia, que passa a ideia de que sabe muito, decreto sabia disso.
Infe­liz­mente, o Maran­hão perdeu, com o gov­erno que se ini­ciou em 2015, um grande chance de, mesmo na crise, dar um salto de qual­i­dade.
O que assis­ti­mos hoje, quase cinco anos depois de ini­ci­ado o desas­tre comu­nista, é a despesa com a folha de pes­soal nos lim­ites da lei de respon­s­abil­i­dade fis­cal; é o fundo de pre­v­idên­cia que­brado, sem que os aposen­ta­dos saibam até quando vão rece­ber em dia suas aposen­ta­do­rias e pen­sões; é o estado endi­vi­dado além de sua capaci­dade de paga­mento e cada vez devendo mais; é a total ausên­cia de obras estru­tu­rantes; é o des­perdí­cio de recur­sos públi­cos; são as pou­cas obras (mal) feitas se des­man­chando com as primeiras chu­vas; etc., etc., etc.
O certo é que o Maran­hão está no “atoleiro” do qual não con­seguirá sair soz­inho, por seus próprios meios.
Quem pode nos socor­rer é o gov­erno fed­eral com grandes pro­je­tos estru­tu­rantes como a explo­ração de Cen­tro de Lança­mento de Alcân­tara; com a ampli­ação e a con­strução de novos por­tos; é a interli­gação das redes fer­roviárias a estes por­tos, e out­ros pro­je­tos mais.
Indifer­ente a tudo isso, sobre­tudo à mis­éria que só aumenta, o atual gov­erno pref­ere se con­duzir por uma pauta ide­ológ­ica que só atende aos próprios inter­esses do gov­er­nante e seus ali­a­dos – os mil­hões de mis­eráveis que “se lixem”.
E, noutra quadra, segue con­stru­indo as suas “Vilas de Potemkin”, para quais não fal­tam recur­sos no orça­mento do estado. Na pasta da comu­ni­cação foram exe­cu­ta­dos em 2017, mais de 91 mil­hões de reais; em 2018, quase 62 mil­hões reais e a pre­visão para 2019 é de 63 mil­hões de reais. É muito din­heiro.
Com tan­tos recur­sos (pro­por­cional­mente, supe­ri­ores aos gas­tos do gov­erno fed­eral) querem vender a ideia que o Maran­hão é um paraíso, que esta­mos acel­er­a­dos no rumo do desen­volvi­mento e que temos os mel­hores gov­er­nantes de todos os tem­pos.
Tudo tão real quanto as vilas de Potemkin entre Kiev e Sebastopol.
Abdon Mar­inho é advogado.