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A morte da sensatez.

Escrito por Abdon Mar­inho


A MORTE DA SENSATEZ.

Por Abdon Marinho.

ACABARA de chegar, depois de uma sem­ana no inte­rior, quando recebi a lig­ação de um amigo querido convidando-​me para o lança­mento de seu livro na sem­ana seguinte. Brin­cal­hão, disse tratar-​se de um evento sim­ples e para pou­cas pes­soas, enfa­ti­zando que estas eram das que podíamos dis­cor­dar sem cor­rer o risco de virar­mos inimi­gos eter­nos.

A par­tir daí, pas­samos a tro­car algu­mas impressões sobre o clima rad­i­cal­izado das relações pes­soais e políti­cas que dom­ina o país no qual você, obri­ga­to­ri­a­mente, tem que escol­her um “lado”, con­viver com seus iguais e satanizar os que pen­sam diferente.

Con­cluí­mos que no Brasil, a única certeza é a morte da sen­satez. Ela, a sen­satez, mor­reu assas­si­nada pela intol­erân­cia política que dom­ina nos­sos dias.

Lem­brei ao amigo a famosa frase atribuída a Antônio Car­los Brasileiro de Almeida Jobim, ou sim­ples­mente, Tom Jobim, nascido no Rio de Janeiro aos 25 de janeiro de 1927 e fale­cido em em Nova Iorque em 8 de dezem­bro de 1994, segundo o qual “o Brasil não é para prin­cipi­antes”.

Rimos e nos des­ped­i­mos com a promessa de que ten­taria me fazer pre­sente ao lança­mento do livro, diante da própria difi­cul­dade de loco­moção e de morar longe do local do evento.

Nos dias seguintes pus-​me a pen­sar na frase do mae­stro brasileiro (até no nome) sobre as com­plex­i­dades do nosso país con­cluindo que ele estava longe de imag­i­nar o alcance de sua frase em relação à quadra atual da real­i­dade nacional.

Em pouco mais de uma sem­ana con­vive­mos com fatos capazes de red­i­men­sionar a frase do com­pos­i­tor, mae­stro, pianista, can­tor, arran­jador e vio­lonista brasileiro.

A sem­ana ini­ciou sob o impacto da divul­gação por uma revista sem­anal de que o ex-​presidente e pre­sidiário con­de­nado pelos crimes de cor­rupção e lavagem de din­heiro, Luís Iná­cio Lula da Silva, seria um dos autores int­elec­tu­ais da tor­tura e homicí­dio do ex-​prefeito de Santo André/​SP, Celso Daniel, ocor­rido no iní­cio do ano de 2002, do seu próprio par­tido, suposta­mente, por este ter descoberto e se recu­sado a par­tic­i­par de um esquema de propinas na prefeitura dirigida por ele, pro­movido pelo par­tido de ambos.

A rev­e­lação foi feita pelo “oper­ador” dos esque­mas de cor­rupção do par­tido, con­de­nado no famoso escân­dalo do men­salão, Mar­cos Valério, que durante anos abaste­ceu de din­heiro público a gula dos com­pan­heiros, até ter sua ação rev­e­lada pelo ex-​deputado Roberto Jef­fer­son, do Par­tido Tra­bal­hista Brasileiro — PTB, em 2005.

O Par­tido dos Tra­bal­hadores — PT ainda se ocu­pava dos des­men­ti­dos pro­to­co­lares e as con­tu­mazes ale­gações de perseguição – mas trazendo como ele­mento novo: a ale­gação de que o crime que “não come­teram” suas lid­er­anças estaria pre­scrito nos ter­mos da leg­is­lação penal –, quando os atu­ais inquili­nos do Palá­cio do Planalto, talvez, toma­dos pela “inveja” da atenção dis­pen­sada aos arquir­rivais pas­saram a chamar a atenção para as suas peripé­cias.

Começou com o próprio pres­i­dente divul­gando em sua rede social o famoso vídeo do “leão e as hienas”, onde ele seria o leão sendo ata­cado por uma família de hienídeos, os mes­mos iden­ti­fi­ca­dos por par­tido, STF, etc.

O “chiste” mais do que impróprio para um pres­i­dente da República feriu os brios dos min­istros da Corte que, como se tornou comum, cor­reram para a mídia para recla­mar do “ataque” insti­tu­cional que estavam sofrendo.

Era só o começo!

Já no dia seguinte a prin­ci­pal emis­sora de tele­visão aberta do país, a Rede Globo, no seu prin­ci­pal jor­nal, o Jor­nal Nacional, levou ao ar densa matéria na qual insin­u­ava através do depoi­mento de um porteiro, ter havido alguma par­tic­i­pação do pres­i­dente da República no assas­si­nato da vereadora do Rio de Janeiro, Marielle Franco e do seu motorista, Ander­son Silva, ocor­rido já há quase dois anos, em que as inves­ti­gações real­izadas mais con­fun­dem que esclare­cem.

A matéria não ouviu o pres­i­dente ou sua asses­so­ria antes da veic­u­lação, ape­sar de uma equipe da emis­sora seguir os pas­sos da comi­tiva pres­i­den­cial na tour pela Ásia e Ori­ente Médio.

A forma como a matéria foi dis­posta – não pelo con­teúdo, uma vez que existindo inter­esse público, tudo pode e deve ser divul­gado –, sus­ci­tou duras críti­cas de alguns arti­c­ulis­tas “inde­pen­dentes” e, até mesmo, de out­ras emis­so­ras mais alin­hadas ao gov­erno.

O pres­i­dente, fiel ao estilo “bateu, levou” e devoto do ditado de que “remé­dio de doido é doido e meio”, lá mesmo da Arábia Sau­dita, na madru­gada, pelo horário ofi­cial de Brasília, dis­parou durís­si­mas acusações con­tra a emis­sora da família e con­tra o gov­er­nador do Rio de Janeiro, Wil­son Witzel. Visivel­mente emo­cionado e transtor­nado, acredita-​se que diante de uma acusação injusta, sua excelên­cia elevou o tom con­tra a emis­sora, seus profis­sion­ais e con­tra o gov­er­nador do estado, não os poupando de epíte­tos como canal­has, pat­ifes, e diver­sos out­ros,

Em depoi­mento à polí­cia o porteiro teria dito que o suposto mata­dor da vereadora teria estado no con­domínio onde residia o pres­i­dente e a ele teria aden­trado através de uma autor­iza­ção do próprio “seu Jair”.

Na sua resposta através da “live” na madru­gada, o pres­i­dente provou que naquele dia não se encon­trava no Rio de Janeiro e sim em Brasília, tendo o painel de votação da Câmara dos Dep­uta­dos reg­istrado sua pre­sença em dois momen­tos, o que tornaria inviável o depoi­mento do porteiro.

O próprio Min­istério Público, que acom­panha as inves­ti­gações, afir­mou através de nota e de entre­vista cole­tiva que o depoi­mento do porteiro se chocava com as provas téc­ni­cas cola­cionadas aos autos onde con­sta, inclu­sive o áudio da autor­iza­ção do ingresso do suposto crim­i­noso que fora se encon­trar com o outro impli­cado na morte da vereadora.

Ape­sar da oposição e seus seguidores tentarem esta­b­ele­cer uma nar­ra­tiva impli­cando o pres­i­dente no crime abjeto, até então, ape­sar dos exces­sos cometi­dos na “defesa bateu, levou”, a audiên­cia estava favorável a ele, seria uma vitória quase que por nocaute (lit­eral­mente) con­tra a acusação de homicí­dio qual­i­fi­cado con­tra a vereadora e seu motorista, não pas­sando de infe­lizes coin­cidên­cias o fato de um dos sus­peitos de envolvi­mento no crime morar no mesmo con­domínio que ele, um dos seus fil­hos ter namorado (ou namorar) a filha do impli­cado ou mesmo a afeição que ele e seus famil­iares sem­pre demon­straram com pes­soas envolvi­das com as milí­cias.

O pres­i­dente e seus seguidores não tiveram tempo de fes­te­jar a “vitória” con­tra os “detra­tores”.

Já no mesmo dia (ou no seguinte, como estava em viagem o acom­pan­hamento dos fatos restou prej­u­di­cado), foi a vez do filho do pres­i­dente, Eduardo Bol­sonaro, o dep­utado fed­eral mais votado do país, meter-​se a falar sobre política inter­na­cional a um canal do YouTube coman­dado pela jor­nal­ista Leda Nagle.

Ao dis­cu­tir os protestos no Equador, Peru, Bolívia e Chile, enx­er­gou um movi­mento orquestrado por comu­nistas finan­cia­dos por Cuba ou Venezuela, sug­erindo que se caso tais movi­men­tos apor­tassem por aqui uma das alter­na­ti­vas seria a adoção de instru­men­tos como o Ato Insti­tu­cional nº. 05, o AI-​5, como ficou con­hecido, lançado mão pelo régime mil­i­tar em 13 de dezem­bro de 1968, que “endure­ceu o régime”, cas­sou mandatos, fechou o Con­gresso Nacional e o Supremo Tri­bunal Fed­eral, sem con­tar as prisões arbi­trárias, a repressão e a tor­tura.

A ver­dade é que o dep­utado não pode­ria ser mais infe­liz.

Até aqui, ape­sar do fes­ti­val de insanidades que toma conta das insti­tu­ições do país, sem exceção, não temos assis­tido a qual­quer movi­mento com “força política” sufi­ciente para levar o país a um clima de insta­bil­i­dade, pelo con­trário, a inflação, que era o fla­gelo de out­rora, deve fechar o ano na casa dos 3% (três por cento); a taxa de juros que no gov­erno ante­rior, beirou os 15% (quinze por cento), hoje está em 5% (cinco por cento), a mais baixa de toda a história; a Bolsa de Val­ores fechou a sem­ana acima dos 108 mil pon­tos, outro recorde histórico, e com tendên­cia de cresci­mento.

A insen­satez do dep­utado fed­eral revig­orou o dis­curso oposi­cionista que ameaçou (ou já pro­to­colou) pedido de cas­sação de mandato e gan­hou o repú­dio de diver­sos setores da sociedade.

Vejam que até o ex-​presidente Sar­ney, que se criou à som­bra do régime mil­i­tar só deixando de apoiá-​lo quando este vivia seus ester­tores, em 1984, achou-​se no dire­ito de criticar o dep­utado pela triste lem­brança de reed­ição do instru­mento da ditadura mil­i­tar, que ele apoiou.

Isso sem falar nos novos/​velhos opor­tunistas de sem­pre – que dis­pen­sarei da audiên­cia de lhes citar os nomes –, que a despeito de apoiarem ditaduras san­guinárias como Cuba, Venezuela e Cor­eia do Norte, só para citar as mais demonía­cas, saíram em busca da cruz para cru­ci­ficar o dep­utado, que errou por ignorân­cia ou estu­pidez, mas que não o difer­en­cia dos seus críti­cos que ren­dem hom­e­na­gens aos piores dita­dores da história da humanidade.

Não pensem que acabou. Para fechar a sem­ana (se nada de novo sur­gir) na terra da insen­satez, na esteira da tolice do filho pres­i­den­cial zero três, surgiu a denún­cia de que o pres­i­dente teria sub­traído o áudio do con­domínio onde morava, favore­cendo o dis­curso da posição que anun­ciou uma rep­re­sen­tação ao STF por “obstrução de justiça” e um pedido de impeach­ment na Câmara dos Dep­uta­dos.

Esqueci alguma coisa? Não!?

E assim ter­mina mais uma sem­ana neste país trop­i­cal abençoado por Deus e bonito por natureza, que nas palavras do artista não é lugar para prin­cipi­antes. Ufa!

Abdon Mar­inho é advo­gado.

O AMBI­ENTE IDEOLÓGICO.

Escrito por Abdon Mar­inho


O AMBI­ENTE IDEOLÓGICO.

Por Abdon Mar­inho.

O LEITOR já deve ter perce­bido que tudo no Brasil se tornou motivo para explo­ração política dos lados que se engalfin­ham na guerra de poder.

Quando se fala “tudo” é na acepção mais ampla da palavra. Como numa guerra, não há espaço que não esteja em dis­puta ou trincheira que não seja suscetível à con­quista.

Disputa-​se tudo, até aquilo que dev­e­ria ser motivo de con­vergên­cia – se hou­vesse alguma con­vergên­cia no país.

Nesta “guerra”, prin­ci­pal­mente, de vaidades, o que menos inter­essa é a ver­dade ou o bem-​estar da sociedade, que não passa de plateia. Como na antiga brin­cadeira de cabo de guerra, um lado só estará sat­is­feito com a queda do outro, sem, entre­tanto, o aspecto lúdico de out­rora.

Outro dia um amigo chamou minha atenção para a polêmica em torno da questão ambiental.

Na linha do que muitos dizem, não estaria havendo a mesma mobi­liza­ção das infini­tas insti­tu­ições e enti­dades de defesa do meio ambi­ente que hou­vera pouco antes, por conta dos incên­dios na Amazô­nia, agora, por conta do der­rame de óleo no litoral brasileiro atingindo a vida mar­inha e toda a costa nordes­tina.

Com efeito, por ocasião dos incên­dios na Amazô­nia, autori­dades do mundo inteiro se man­i­fes­taram cobrando solução para o prob­lema, chegando, inclu­sive, a sug­erirem uma “inter­venção” no ter­ritório brasileiro ou que a flo­resta amazônica deix­asse de ser con­sid­er­ada parte inte­grante do ter­ritório nacional.

O gov­erno brasileiro pas­sou a ser tratado como um pária entre as nações civ­i­lizadas.

As enti­dades ambi­en­tal­is­tas do mundo inteiro pas­saram a atribuir ao gov­erno a respon­s­abil­i­dade direta pelos crimes ambi­en­tais que estariam ocor­rendo como estraté­gia para destru­ição e explo­ração da flo­resta amazônica, como se os próprios inte­grantes do gov­erno estivessem com as tochas nas mãos colo­cando fogo nas árvores.

Mesmo agora, após pas­sado o ápice do prob­lema, gov­er­nadores da região, entre os quais o do Maran­hão, que há muito tempo deixou que destruíssem suas flo­restas, foram lit­eral­mente “recla­mar ao Papa” sobre os pos­síveis “maus tratos” impos­tos pelo gov­erno fed­eral a flo­resta amazônica.

Con­forme assen­tei naquela opor­tu­nidade, o gov­erno Bol­sonaro teve sua parcela de respon­s­abil­i­dade pelos incên­dios ocor­ri­dos, sobre­tudo, pelo dis­curso incon­se­quente de que deve­mos explo­rar as riquezas da flo­resta amazônica a todo custo, o que “abriu” opor­tu­nidade aos esper­tal­hões que há anos grilam ter­ras e explo­ram a flo­resta a se sen­tirem con­fortáveis para, inclu­sive, pro­moverem um “dia de fogo”, como ficou con­statado nas inves­ti­gações.

Outra, o gov­erno reagiu mal e fora do tom ao que estava acon­te­cendo no período, colo­cando a culpa no carteiro em detri­mento ao con­teúdo da carta.

O prob­lema não era a divul­gação das queimadas crim­i­nosas e sim as queimadas em si.

O fato de agora o Insti­tuto Nacional de Pesquisas Espa­ci­ais — INPE, infor­mar que o mês de out­ubro apre­sen­tou o menor número de focos de incên­dio em vinte e um anos não elide os pre­juí­zos oca­sion­a­dos pelos incên­dios que ainda estão ocor­rendo (ape­sar de serem os menores no espaço-​tempo), assim como os que ocor­reram ante­ri­or­mente.

Como já disse: a flo­resta amazônica “encolhe” a cada ano sendo justa a pre­ocu­pação dos cidadãos brasileiros e estrangeiros com o seu futuro.

Pois bem, enquanto a flo­resta ardia (e ainda arde), um outro desas­tre ambi­en­tal se desen­rolava: o der­ra­ma­mento de toneladas de óleo cru na costa brasileira afe­tando a total­i­dade dos esta­dos do Nordeste.

Ape­sar da gravi­dade do dano ambi­en­tal aos diver­sos ecos­sis­temas mar­in­hos, aos mangues, onde se repro­duzem mil­hares de espé­cies e, mesmo, ao sus­tento de mil­hões de cidadãos, não vimos os protestos de enti­dades e ambi­en­tal­is­tas que “entraram em guerra”, quando das queimadas na Amazô­nia.

Assim como o gov­erno Bol­sonaro, no episó­dio da queimada da flo­resta, os protestos dos balu­artes do ambi­en­tal­ismo só foram apare­cer para criticar a demora do gov­erno na ação de com­bate ao óleo que inva­dia as pra­ias, os estuários dos rios e os manguezais.

Emude­ce­ram em relação a apu­ração das respon­s­abil­i­dades e se o der­ra­ma­mento de óleo acon­te­ceu aci­den­tal­mente ou se fora o crime cometido delib­er­ada­mente con­tra o Brasil, sobre­tudo, quando rev­e­lado, por dados cien­tí­fi­cos, que o óleo que apare­cia (e aparece) aos bor­botões tinha origem venezue­lana.

Ape­nas agora, mais de noventa dias depois da data ini­cial do desas­tre ambi­en­tal, ocor­rido a 700 km da costa da Paraíba, aponta-​se como prin­ci­pal sus­peito de ter efe­t­u­ado o der­ra­ma­mento de óleo uma embar­cação de ban­deira grega que fora car­regada na Venezuela com des­tino à Malásia.

Com a embar­cação iden­ti­fi­cada resta saber se foi aci­den­tal ou crim­i­noso o der­ra­ma­mento de óleo e as razões para não darem o alarme do aci­dente – como remen­dado –, no sen­tido de pre­venir ou mino­rar os danos a par­tir da adoção do Plano Nacional de Con­tingên­cia – PNC.

Ape­sar do que temos até aqui rev­e­lado ser estar­rece­dor, impera o mutismo sele­tivo de enti­dades ambi­en­tal­is­tas e de gov­er­nos em relação ao acontecido.

Para começar o próprio navio respon­sável pelo “aci­dente” dev­e­ria ter se repor­tado às autori­dades navais avisando do acon­te­cido. Depois, quando con­statado que se tratava de óleo de origem venezue­lana aquele país dev­e­ria ter se ofer­e­cido para aju­dar, infor­mando que embar­cações naquele período tin­ham sido car­regadas com aquele tipo de óleo.

Ambos preferi­ram o silên­cio. Por quais razões?

As descober­tas até aqui se deram graças aos esforços do gov­erno brasileiro, empresa, enti­dades e gov­er­nos estrangeiros que não aque­les que pode­riam e dev­e­riam ter aju­dado na alu­ci­nação dos fatos.

Vejam que mesmo cidadãos e enti­dades brasileiras, ditos defen­sores do meio ambi­ente, quando con­fronta­dos com a infor­mação de o óleo que chegava às pra­ias era ori­undo da Venezuela fiz­eram pouco caso ou con­tes­taram a infor­mação téc­nica numa nar­ra­tiva pura­mente ide­ológ­ica, que, aliás, per­manece até agora.

Para estes, a culpa pelo der­ra­ma­mento do óleo na costa do Nordeste é do gov­erno brasileiro – que, como em tudo que faz, é ata­bal­hoado –, e não daque­les que, efe­ti­va­mente, der­ra­ma­ram (por aci­dente ou de forma proposi­tal o óleo) e não repor­taram as autori­dades; ou do gov­erno venezue­lano que depois de saber a origem do pro­duto, nada fez para aju­dar na iden­ti­fi­cação dos respon­sáveis.

O certo é mil­hões de cidadãos brasileiros já estão pagando um preço ele­vado por um desas­tre ambi­en­tal enquanto a classe política nacional e a elas se agre­gando enti­dades de diver­sos matizes que se dizem defen­so­ras do meio ambi­ente pati­nam nas suas nar­ra­ti­vas ide­ológ­i­cas.

Onde ire­mos parar com tudo isso? Qual o futuro do país quando os inter­esses pes­soais ou das ide­olo­gias se sobrepõem aos inter­esses nacionais?

Abdon Mar­inho é advo­gado.

A JUSTIÇA DOS POBRES E A JUSTIÇA DOS RICOS.

Escrito por Abdon Mar­inho

A JUSTIÇA DOS POBRES E A JUSTIÇA DOS RICOS.

Por Abdon Mar­inho.

EM MEA­DOS de 2018, durante uma de min­has via­gens pelo inte­rior, fui procu­rado por um amigo. Que­ria que inter­cedesse por uma família que fora presa pre­ven­ti­va­mente, em um con­flito agrário, acu­sada de ameaçar os inva­sores da terra. Alguns habeas cor­pus já tin­ham sido avi­a­dos, porém, ainda, sem êxito.

Ape­sar de não ser nossa área de atu­ação e pouca famil­iari­dade ter­mos com matéria penal, solicitei que um dos meus sócios fizesse um novo HC que iria falar com o desem­bar­gador. Assim foi feito e dias depois a família estava solta.

Pas­sou pouco mais de dois meses (no máx­imo três) quando fui nova­mente procu­rado com o mesmo assunto. A Justiça, nova­mente, dec­re­tara a prisão de inte­grantes da família sob a acusação de que eles estariam ameaçando os supos­tos inva­sores das ter­ras. Nova­mente tive­mos que per­cor­rer um longo cam­inho para con­seguir soltar os cidadãos pre­sos por ameaça. Vitória só obtida no Tri­bunal de Justiça através do voto da maio­ria dos mem­bros da Câmara Criminal.

O crime de ameaça de que trata o artigo 147 do Código Penal, objeto da prisão daque­les cidadãos, esta­b­elece pena de detenção de um a seis meses, ou multa.

Con­tado o tempo em pas­saram pre­sos – nas duas vezes –, cumpri­ram mais que a pena máx­ima esta­b­ele­cida no tipo penal.

Cumpre obser­var que cumpri­ram todo esse tempo de prisão sem serem ouvi­dos ou estado na pre­sença de um juiz de dire­ito, vez que não é obri­gatória, nas comar­cas do inte­rior, a chamada audiên­cia de custó­dia.

O Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF, decidirá breve­mente sobre a con­sti­tu­cional­i­dade da prisão após o jul­ga­mento em segunda instân­cia.

Ainda, segundo dizem, o STF, escu­d­ado na inter­pre­tação lit­eral do inciso LVII do artigo 5º, da Con­sti­tu­ição Fed­eral, segundo o qual: “ninguém será con­sid­er­ado cul­pado até o trân­sito em jul­gado de sen­tença penal con­de­natória;”, vetará a prisão a par­tir da con­de­nação em segunda instância.

Segundo soube, os mais notórios crim­i­nosos do país já estão con­fir­mando pre­sença nas fes­tas de final de ano e em out­ras pre­vis­tas para o primeiro semes­tre do ano que vem.

Trata-​se, por óbvio de uma impor­tante decisão, fun­dada em tese jurídica rel­e­vante, afi­nal, se à Con­sti­tu­ição diz que ninguém pode ser con­sid­er­ado cul­pado até o trân­sito em jul­gado da sen­tença penal con­de­natória, em tese, ninguém pode­ria ser preso até que se esgo­tassem todos os recur­sos nas der­radeiras instân­cias da Justiça.

Doutri­nar­i­a­mente até con­cordo com tal entendi­mento, con­forme já expres­sei em escritos ante­ri­ores. Entre­tanto, após muito refle­tir sobre o tema, me pus a pen­sar se este foi o norte traçado pelo con­sti­tu­inte orig­inário.

Quando pro­mul­gada em out­ubro de 1988 o pres­i­dente da Assem­bleia Nacional Con­sti­tu­inte, Ulysses Guimarães, pon­tif­i­cou que aquela era uma Con­sti­tu­ição cidadã, des­ti­nada, por­tanto, a diminuir as imen­sas desigual­dades soci­ais exis­tentes no nosso país.

Nos últi­mos trinta e um anos, por diver­sas vezes, sendo a última em 2016, o Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF, exceto pelo inter­valo exis­tente entre 2009 a 2016, enten­deu que o cumpri­mento da pena a par­tir da con­fir­mação do decreto con­de­natório na segunda instân­cia não ofend­e­ria à Con­sti­tu­ição cidadã.

Na última decisão sobre o tema, em 2016, tanto o min­istro Gilmar Mendes quanto o min­istro Dias Tof­foli assen­taram que o Brasil, com aquele entendi­mento, se aprox­i­mava do mundo civ­i­lizado, uma vez que quase a total­i­dade das nações ado­tam o cumpri­mento da pena a par­tir da primeira ou da segunda instân­cia.

Emb­ora ressal­vando as mel­hores das intenções que os min­istros do STF têm, chega a ser per­tur­bador que em tão pouco tempo mudem de opinião sobre um assunto tão sério e com mon­u­men­tal impacto sobre a vida dos cidadãos brasileiros, ainda mais quando se sabe que exis­tem moti­vações sub­al­ter­nas numa mudança de entendi­mento na pre­sente quadra: garan­tir a liber­dade dos poderosos que foram apan­hados no curso das inves­ti­gações da Oper­ação Lava Jato.

Olhando mais de perto, sabe­mos que essa é “missa encomen­dada” para soltar o ex-​presidente Lula e diver­sos out­ros crim­i­nosos de “colar­inho branco”, que ficarão fora do alcance da lei pelo resto de suas vidas. Como um recado para a pat­uleia de que o crime com­pensa e que quanto maior o crime maior a rec­om­pensa.

Nos últi­mos anos o STF, ao se ocu­par de out­ros assun­tos que não os per­ti­nentes à sua pauta precípua: a guarda da Con­sti­tu­ição, tem ficado a dever à sociedade. Agora, ao insi­s­tir (caso venha acon­te­cer) em se tornar casa revi­sora de ações penais, ficará devendo muito mais. Não ape­nas porque não dará conta de jul­gar os recur­sos crim­i­nais que por lá apor­tarão como, tam­bém, por negar à sociedade uma punição célere e justa aos malfeitores.

Os exem­p­los estão aí, ainda à vista de todos. Basta lem­brar o caso de Pimenta Neves que matou a namorada pub­li­ca­mente é só foi cumprir a pena após mais de uma década depois do crime, quando aos famil­iares da vítima – os que ainda estavam vivos –, sequer inter­es­sava mais. Ou caso do ex-​senador Luiz Estevão que ficou, igual­mente, mais de uma década impune após ser con­de­nado por fraudes e este­lion­atos diver­sos em todas as instân­cias da justiça e ficou poster­gando com dezenas de recur­sos.

E o que dizer do notório Paulo Maluf, que de tanto fazer malfeitos, até virou verbo, ainda na primeira metade dos anos oitenta, o verbo mal­u­far, e que só foi con­hecer as dependên­cias inter­nas de uma cela, e por curto período, no ano passado?

O Supremo, segundo a bolsa de apos­tas, tra­balha para trans­for­mar a impunidade em regra para aque­les que pud­erem pagar bons advo­ga­dos, inde­pen­dente de serem traf­i­cantes, latro­ci­das, cor­rup­tos, ladrões do din­heiro público.

Para estes as por­tas das cadeias serão giratórias.

Segundo dados do Con­selho Nacional de Justiça – CNJ, a pop­u­lação carcerária do país já pos­sui cerca de 730 mil pre­sos. Destes, quase a metade é com­posta de pre­sos pro­visórios, ou seja, de pre­sos que não foram jul­ga­dos ainda, cujo proces­sos se arras­tam por meses, por anos e, já tive­mos casos de, por décadas.

Como é pos­sível con­sid­erar ético ou moral­mente jus­ti­ficável que se man­tenha a prisão – até por anos –, de pes­soas que nunca foram jul­gadas ou con­de­nadas e que, até mesmo, nunca foram ouvi­das por um juiz, e man­dar soltar pre­sos que já foram jul­ga­dos e con­de­na­dos, por uma, duas, três ou mesmo qua­tro instân­cias – no caso dos diver­sos recur­sos exis­tentes no âmbito do STF?

A solução será soltar todos os encar­cer­a­dos cuja penas não ten­ham tran­si­tado e jul­gado? O que fazer com mil­hares de pre­sos pro­visórios?

Se é injusto que se mande à cadeia alguém que já foi con­de­nado por uma, duas, três, qua­tro instân­cias, mas que ainda não tenha ocor­rido o trân­sito em jul­gado, o que dizer da situ­ação daque­les que nunca foram jul­ga­dos uma única vez e estão encarcerados?

Alguma coisa está fora de ordem quando a justiça passa enten­der que uma prisão pro­visória garante mais a ordem pública que uma sen­tença con­de­natória.

Arrisco dizer que o STF poderá está con­duzindo o país àquela situ­ação em que o cidadão será com­pelido a fazer justiça com as próprias mãos.

Quem vai se con­for­mar e ter que ficar olhando para um cidadão que ceifou a vida de um filho, um irmão ou um par­ente seu por anos a fio enquanto não “tran­sita em jul­gado” todos recur­sos pos­síveis e imag­ináveis de serem ten­ta­dos? Quem vai se con­for­mar em ter que con­viver – ou em saber –, que os fascíno­ras que invadi­ram sua casa, lhe roubaram, estupraram sua filha e/​ou esposa ficarão soltos e rindo da sua cara? Como se man­ter pací­fico diante de uma justiça que obri­ga­to­ri­a­mente terá que tar­dar e quase sem­pre fal­har?

Não foi bem enten­dido o alerta que fez o gen­eral Vilas-​Boas sobre as con­se­quên­cias desas­trosas que poderão advir de uma decisão política do STF, pau­tada nos próprios inter­esses e sem aten­tar para a gravi­dade os des­do­bra­men­tos. O gen­eral não tem condições, sequer físi­cas, de ameaçar ninguém, como ten­taram fazer crer e como alguns idio­tas difundi­ram. Não vi o que disse, ou escreveu, como uma ameaça mas, sim, como um sen­ti­mento das ruas que já não tol­eram tanta impunidade e ban­dalha.

O que se desenha é uma justiça para os ricos e outra para os pobres?

Abdon Mar­inho é advo­gado.