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IMPEACH­MENT NÃO É PALAVRÃO.

Escrito por Abdon Mar­inho

IMPEACH­MENT NÃO É PALAVRÃO.

Por Abdon Marinho.

EXISTE um antigo aforismo que diz: “não há esforço sem rec­om­pensa”.

Ape­sar da mídia não ter dado o destaque dev­ido, assis­ti­mos nos últi­mos tem­pos uma cres­cente insat­is­fação da sociedade com o Poder Judi­ciário brasileiro. Essa insat­is­fação exposta já há muito tempo na ágora da atu­al­i­dade, a inter­net, teve uma man­i­fes­tação dig­amos, física ou analóg­ica, no último dia 17 de novem­bro de 2019, quando mil­hares de brasileiros, em diver­sas cidades do país, foram às ruas protestarem de forma vee­mente con­tra alguns min­istros do Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF.

Os man­i­fes­tantes, em pleno domingo enso­larado, ao invés de estarem com suas famílias, no recesso do lar, sabore­ando o almoço preferi­ram ir pra ruas car­regando faixas com inscrições con­tra os min­istros do Supremo. Esse é um fato bas­tante sig­ni­fica­tivo.

Como disse, as diver­sas mídias, talvez para ocul­tar o fato, não tra­tou como dev­e­ria, os protestos acima referi­dos. Como se não falassem deles, os impedis­sem de terem acon­te­cido. Uma espé­cie de negação.

Não me recordo de ter teste­munhado algo semel­hante, em tempo algum, em qual­quer democ­ra­cia do mundo – talvez protestos pare­ci­dos já ten­ham ocor­rido em alguma ditadura per­iférica, assim mesmo, com rari­dade.

Não faz muito tempo a min­is­tra Cár­men Lúcia, do STF, disse saber que este “é o momento de falar mal de juiz e do Supremo”.

A min­is­tra está equiv­o­cada. Há muito tempo o tri­bunal, dev­ido ao com­por­ta­mento de seus inte­grantes, é malvisto pela sociedade brasileira.

Os ques­tion­a­men­tos sobre con­du­tas inad­e­quadas já remon­tam mais de duas décadas.

Como disse acima não há esforço sem rec­om­pensa. O que a nação assiste, com protestos nas ruas, com bonecos rep­re­sen­tando juízes, com hash­tags com inscrições pedindo a saída de min­istros, tudo isso, é a “rec­om­pensa” pelos anos de mal serviços presta­dos a nação.

Não se trata de “moda” ou de críti­cas infun­dadas, trata-​se de uma justa reação há anos de desre­speitos aos cidadãos.

Nesta per­spec­tiva soa quixotesca a busca do Supremo por inimi­gos exter­nos. Como D. Quixote, de Cer­vantes, com­batem moin­hos de vento e não inimi­gos reais. Os ver­dadeiros inimi­gos da corte estão alo­ja­dos den­tro do tri­bunal de onde ameaçam não sairem tão cedo. Os ver­dadeiros inimi­gos são os inter­nos – nos seus dup­los sentidos.

Um dos min­istros que foi alvo dos protestos, Gilmar Mendes, tam­bém con­hecido com “soltador-​geral da República”, envolve-​se em polêmi­cas desde o seu ingresso na Corte. Jor­nal­is­tas e juris­tas de renome ques­tionam a qual­i­dade e moti­vações de suas decisões desde sem­pre.

Em 2009, há uma década, por­tanto, o então min­istro Joaquim Bar­bosa, em plena sessão, disse:

— Vossa excelên­cia não está na rua, não. Vossa excelên­cia está na mídia, destru­indo a cred­i­bil­i­dade do Judi­ciário brasileiro. É isso. […] Vossa excelên­cia quando se dirige a mim não está falando com os seus capan­gas do Mato Grosso, min­istro Gilmar. O sen­hor respeite.»

Alguém con­segue imag­i­nar ter­mos mais fortes para um min­istro referir-​se a outro? Foi uma reação intem­pes­tiva do min­istro Barbosa?

É pos­sível que alguns atribuam a acidez das palavras do min­istro, naquela dis­cussão de 2009, ao seu com­por­ta­mento “difí­cil”, mas, veja, em 2018, noutro momento “céle­bre” da Corte, o min­istro Bar­roso disse dirigindo-​se ao colega Gilmar Mendes: “— Me deixa de fora do seu mau sen­ti­mento. Você é uma pes­soa hor­rível. Uma mis­tura do mal com atraso e pitadas de psi­co­pa­tia. Isso não tem nada a ver com o que está sendo jul­gado. É um absurdo, Vossa Excelên­cia aqui fazer um comí­cio, cheio de ofen­sas, grosse­rias. Vossa Excelên­cia não con­segue artic­u­lar um argu­mento, fica procu­rando, já ofendeu a pres­i­dente, já ofendeu o min­istro Fux, agora chegou a mim. A vida para Vossa Excelên­cia é ofender as pes­soas”.

E acres­cen­tou: “— Vossa Excelên­cia, soz­inho, enver­gonha o tri­bunal. É muito ruim. É muito penoso para todos nós ter que con­viver com Vossa Excelên­cia aqui. Não tem ideia, não tem patri­o­tismo, está sem­pre atrás de algum inter­esse que não é o da Justiça. É uma coisa hor­ro­rosa, uma ver­gonha, um con­strang­i­mento. É muito feio isso”.

Podemos ficar ape­nas nestes dois momentos.

Outro alvo dos protestos das ruas, o min­istro Dias Tof­foli, é bem mais emblemático. Reprovado duas vezes em con­cur­sos públi­cos para juiz de dire­ito, por obra e graça do des­tino, virou min­istro da mais ele­vada Corte do país.

Sua investidura, basta olhar os jor­nais da época, cau­sou inqui­etação e críti­cas, mais diver­sas, inclu­sive essa: como alguém que não con­seguiu ser juiz numa comarca per­dida nos rincões do país podia “virar” min­istro do Supremo.

Recen­te­mente com­ple­tou uma década como min­istro e, se alguma alma cari­dosa, em algum momento, chegou ter dúvi­das se o seu ingresso na Corte se deu uni­ca­mente por ser “amigo do rei”, na presidên­cia do tri­bunal, ele espan­tou toda e qual­quer ques­tion­a­mento a respeito disso.

Não se trata “ape­nas” de ataques de “juizite”. São decisões de duvi­dosa legal­i­dade, como a aber­tura de inquérito secreto por sua própria ini­cia­tiva, com nomeação de rela­tor escol­hido a dedo para inves­ti­gar objeto incerto.

Antes, já tinha pedido – e con­seguido –, cen­surar dois veícu­los de comu­ni­cação que traziam reporta­gens sobre detal­hes pouco orto­doxos de sua vida finan­ceira.

Não sat­is­feito solic­i­tou dados do sig­ilo bancário e fis­cal de cerca de seis­cen­tos mil con­tribuintes entre pes­soas físi­cas e jurídi­cas, depois de deter­mi­nar a par­al­iza­ção de quase nove­cen­tos proces­sos que tiveram como base relatórios do antigo COAF.

Isso só para citar os fatos mais “polêmi­cos”.

A der­radeira prova cabal de sua inca­paci­dade foi “alu­gar” a atenção da nação por qua­tro horas para pro­ferir um voto cujo objeto caberia em, no máx­imo, 15 min­u­tos, estourando, 20 ou 30 min­u­tos, para, no final, ninguém enten­der a decisão que pro­feriu. Nem mes­mos os seus cole­gas, acos­tu­ma­dos ao lin­gua­jar empo­lado, ao tér­mino do voto sabiam qual tinha sido a decisão de sua excelên­cia, isso depois de pedi­rem diver­sos esclarec­i­men­tos durante a man­i­fes­tação.

Alguns sug­eri­ram a con­tratação de um pro­fes­sor de javanês, em alusão ao clás­sico de Lima Bar­reto, já out­ros dis­seram, pub­li­ca­mente, que estavam diante de um novo idioma: o “tof­folês”.

Quando o pres­i­dente da mais ele­vada Corte do país é tratado como piada por seus próprios pares é porque algo de muito errado há.

A per­gunta que se faz é: como cheg­amos a isso?

A primeira resposta é que isso sinal­iza a ausên­cia e/​ou o mau fun­ciona­mento das insti­tu­ições repub­li­canas.

Ao longo dos anos assis­ti­mos o apar­el­hamento do Poder Judi­ciário em suas várias instân­cias. Car­gos vitalí­cios de desem­bar­gadores e min­istros sendo “repar­tidos” entre agremi­ações par­tidárias em detri­mento dos inter­esses da nação.

As insti­tu­ições não fun­cionaram (e não fun­cionam) por ocasião das investiduras e menos ainda quando surge a neces­si­dade de reti­rar um ou outro ministro.

A falta de ini­cia­tiva e mesmo de ação das insti­tu­ições democráti­cas sus­ci­tam os protestos nas ruas e, até mesmo, pro­postas de cunho anti­democrático.

Desde a rede­moc­ra­ti­za­ção do país, e já sob a égide da Con­sti­tu­ição de 1988, foram feitos os impeach­ment de dois pres­i­dentes da República, legit­i­ma­dos por mil­hões de votos; o par­la­mento já cas­sou dezenas de par­la­mentares e tan­tos out­ros foram con­de­na­dos pela Justiça.

Os pro­ced­i­men­tos de impeach­ment, os proces­sos de cas­sação, assim como, a perda dos mandatos por dec­re­tação emanada do Poder Judi­ciário são legí­ti­mas, ape­sar disso, com motivos mais do que sufi­cientes, não são aber­tos os proces­sos de impeach­ment em face dos min­istros do Supremo.

O Senado da República, que nos ter­mos da Con­sti­tu­ição pos­sui a com­petên­cia para levar a cabo o impeach­ment não per­mite nem que os mes­mos sejam instau­ra­dos. São proces­sos sérios, car­rega­dos em provas con­tun­dentes e argu­men­tação farta, que o pres­i­dente do Senado ignora e deixa dor­mi­tar em suas gave­tas.

É jus­ta­mente essa omis­são a raiz de todos os males. Os min­istros, que se acham inat­ingíveis, deixam de se com­portarem como mag­istra­dos para se com­portarem como políti­cos, com um com­por­ta­mento desre­grado e emitindo opinião, fora dos autos, sobre tudo; noutra frente a sociedade que sabe não poder con­fiar nas insti­tu­ições, sai às ruas pedindo soluções arbi­trárias.

Estivessem as insti­tu­ições fun­cio­nando de forma reg­u­lar, sabendo suas atribuições, os pro­ced­i­men­tos de impeach­ment seriam instau­ra­dos e os, suposta­mente, cul­pa­dos, proces­sa­dos e jul­ga­dos pelo foro com­pe­tente, que não é a rua ou a ágora da inter­net.

Assim o Brasil vai tril­hando rumo ao caos.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

A DEMOC­RA­CIA DE CADA UM.

Escrito por Abdon Mar­inho

A DEMOC­RA­CIA DE CADA UM.

Por Abdon Marinho.

AH, MEU FILHO, quem “destrata” quer com­prar.

A frase já dita em meus tex­tos tan­tas vezes, como sabem, faz parte dos ensi­na­men­tos do meu saudoso pai. Ele, ape­sar de anal­fa­beto por parte de pai, mãe e parteira, nunca deixou de ter uma palavra sobre os temas do cotid­i­ano e nos ensi­nar.

E essa frase, que con­hece­mos desde tem­pos imemo­ri­ais, a magia do tempo nos mostra, nunca foi tão atual.

Vejamos, na atual quadra política, o para­lelo que podemos traçar entre o cenário político nacional e o local, aqui, numa questão bem específica.

Desde que o atual pres­i­dente da República assumiu o mandato que tem sido tratado como o dita­dor, autoritário, indigno e um risco à democracia.

Desde o começo do gov­erno quem tem feito um esforço sobre-​humano e, às vezes, bizarro, para ser a antítese ao gov­erno do sen­hor Bol­sonaro é o gov­er­nador do Maran­hão, o sen­hor Dino, inte­grante do Par­tido Comu­nista do Brasil – PCdoB.

Se o pres­i­dente diz que o céu está azul-​anil, lá vem o gov­er­nador dizer que o céu está encar­nado como a ban­deira da China; se diz que faz frio, o gov­er­nador diz que está quente como no deserto do Saara. E por aí vai.

Reconheça-​se que neste intento, por alguns momen­tos, o gov­er­nador até chegou a ser recon­hecido como o ver­dadeiro opos­i­tor ao pres­i­dente, levando-​o a dizer-​se pré-​candidato à presidên­cia da República, prati­ca­mente, qua­tro anos antes do pleito. Algo inédito.

Um dos prin­ci­pais pon­tos de antag­o­nismo, sem dúvida, foi a pro­posta de reforma da pre­v­idên­cia, encam­in­hada pelo gov­erno fed­eral logo nos primeiros dias da nova legislatura.

A reforma da pre­v­idên­cia, como sabe­mos, era uma emergên­cia nacional. Claro que ninguém gosta de lim­i­tar ou mesmo ces­sar dire­itos que foram con­quis­ta­dos ao longo de anos – emb­ora muitos dos supos­tos “dire­itos” sejam, na ver­dade, priv­ilé­gios de uma elite per­dulária que desde sem­pre viveu às cus­tas do Estado.

Ape­sar de todos saberem da sua neces­si­dade, sobre­tudo, os diri­gentes dos esta­dos fed­er­a­dos, o gov­er­nador maran­hense e seus ali­a­dos tudo fiz­eram para tor­pedear a reforma da pre­v­idên­cia e “desidratá-​la” ao máx­imo.

Em deter­mi­nado momento, quando os par­la­mentares chegaram a um con­senso com os gov­er­nadores visando a inclusão de esta­dos e municí­pios na reforma, o “nosso” gov­er­nador foi o único (salvo mel­hor juízo) a colocar-​se con­tra, e não assi­nar o acordo, obri­g­ando a aprovação da reforma sem os esta­dos e municí­pios.

Noutra frente, seus ali­a­dos no par­la­mento uniram-​se ao que de mais rea­cionário existe den­tro do Con­gresso Nacional para garan­tir priv­ilé­gios e reduzir a econo­mia do país com a reforma.

Mesmo depois que a reforma foi aprovada na Câmara dos Dep­uta­dos, já em votação no Senado, foi uma ali­ada sua que apre­sen­tou – e con­seguiu aprovar –, uma emenda à pro­posta, reduzindo ainda mais a econo­mia do país com a reforma.

Esse breve histórico é impor­tante para enten­der­mos a forma de agir de sua excelên­cia em relação ao público externo e interno.

Enquanto, além das fron­teiras do Maran­hão, o que mais se ouve da boca de sua excelên­cia são ter­mos como diál­ogo, debate, democ­ra­cia, liber­dade e out­ras coisas mais do “ane­dotário” – de ane­dota mesmo, pois parece piada –, para o público interno a con­versa é bem dis­tinta.

A Emenda Con­sti­tu­cional nº. 103, com o que “sobrou” da reforma da pre­v­idên­cia, após sofrer todo tipo de boicote do gov­er­nador maran­hense e seus ali­a­dos, foi pro­mul­gada pelo Con­gresso Nacional no dia 12 de novem­bro, pois bem, já no dia 19 de novem­bro, menos de oito dias, e con­siderando um feri­ado nacional (procla­mação da República) e um final de sem­ana, já estava sua excelên­cia, o “nosso” gov­er­nador, batendo às por­tas da Casa de Manuel Beck­man, “orde­nando” aos valentes dep­uta­dos da sua base que aprovassem na leg­is­lação estad­ual as alter­ações da reforma que tanto criticou.

Só não aprovou a adesão do estado a reforma no espaço de duas ou três horas porque um ou dois dep­uta­dos da oposição pedi­ram vis­tas reg­i­men­tal do pro­jeto. Mas, já no dia seguinte o pro­jeto estava sendo votado, acred­ito que daquela velha maneira “os sen­hores dep­uta­dos que con­cor­dam per­maneçam como estão”. Pronto! Estava sacra­men­tada a adesão às novas nor­mas con­sti­tu­cionais da reforma da previdência.

Não teve nada de diál­ogo, de debates, con­venci­men­tos e todas essas coisas “hor­ríveis” da democ­ra­cia. Foi aprovada na base da “lei do mais forte”.

Vejam que não ques­tiono a aprovação do pro­jeto em si. Os entes fed­er­a­dos devem submeter-​se às nor­mas gerais da Con­sti­tu­ição da República, o que se dis­cute aqui é a con­tradição exis­tente entre o dis­curso para o público externo e o que é prat­i­cado inter­na­mente.

Até onde se sabe, out­ros esta­dos, suposta­mente, em situ­ação até pior que a nossa, não “cor­reram” para aplicar as novas alíquo­tas, mesmo aque­les gov­er­nadores que, tam­bém, se mostraram con­trário à reforma, muito menos, “inter­di­taram” quais­quer pos­si­bil­i­dades de diál­ogo dos rep­re­sen­tantes do povo.

Com efeito o artigo 9º, da Emenda Con­sti­tu­cional, esta­b­elece: “§ 4º Os Esta­dos, o Dis­trito Fed­eral e os Municí­pios não poderão esta­b­ele­cer alíquota infe­rior à da con­tribuição dos servi­dores da União, exceto se demon­strado que o respec­tivo régime próprio de pre­v­idên­cia social não pos­sui deficit atu­ar­ial a ser equa­cionado, hipótese em que a alíquota não poderá ser infe­rior às alíquo­tas aplicáveis ao Régime Geral de Pre­v­idên­cia Social”.

À luz da ação empreen­dida temos, por certo, a admis­são indi­reta que a pre­v­idên­cia social do estado está “que­brada”, ou seja, pos­sui déficit autuo­r­ial a ser equa­cionado.

O que, aliás, sem­pre soube­mos – ape­sar dos reit­er­a­dos des­men­ti­dos dos gov­er­nantes –, e que a oposição denun­cia desde muito tempo.

A pre­v­idên­cia estad­ual, na atual gestão, saiu de uma situ­ação con­fortável, com recur­sos investi­dos sufi­cientes para arcar com suas despe­sas, para uma situ­ação, segundo dizem, de acu­mu­lar um déficit de mais de 2 bil­hões de reais no mesmo espaço de tempo e ter que se des­fazer do seu patrimônio imo­bil­iário para ten­tar diminuir o “rombo”.

Talvez estas ver­dades incon­ve­nientes, mas incon­testáveis, jus­ti­fiquem a inter­dição do debate democrático, pelo gov­erno, na Assem­bleia Leg­isla­tiva. Ou, talvez, os dep­uta­dos estad­u­ais não ten­ham “moral” sufi­ciente para impor o debate político sobre as questões do estado, fazendo valer o mandato que lhes con­feri­ram às urnas. Ou, talvez, este­jam todos comungando do surto autoritário que dom­ina o estado. Que, aqui não enx­ergam, mas que são doutores em apon­tar em relação ao gov­erno fed­eral.

Aliás, todos aque­les que se esgoe­laram prote­s­tando con­tra a reforma da pre­v­idên­cia e o gov­erno fed­eral, aqui, quando o gov­erno man­dou aprovar a “adesão” a parte da reforma não dis­seram nada, silen­cia­ram, emude­ce­ram, acharam tudo muito bem, obri­gado.

Segundo soube, um dep­utado da oposição desafiou quais­quer dos dep­uta­dos da situ­ação a dizer o que tinha em deter­mi­nado artigo da lei que estava em dis­cussão, não obteve resposta. E olha que pro­jeto (que virou lei) era bem “mix­u­ruca”.

Arrisco dizer que não imag­i­nava que em pleno século XXI, com tan­tas infor­mações cir­cu­lando, fôsse­mos ter uma rep­re­sen­tação política tão defi­ciente. Um gov­er­nador sen­ho­r­ial impondo-​se sobre um par­la­mento ajoel­hado.

Como na música, “vejo o futuro repe­tir o pas­sado, vejo um museu de grandes novidades”.

Ao teste­munhar os dep­uta­dos estad­u­ais aprovarem um pro­jeto de lei de tanta importân­cia sem qual­quer dis­cussão, sem um debate democrático sobre a situ­ação do estado; aprovar sem ler em questão de horas, vapt-​vupt; ver a imprensa, quase toda, silen­ciar como um cordeiro, faz-​me recor­dar de como eram as coisas no iní­cio do século pas­sado, como se o pre­sente (e o futuro) repetisse o passado.

Já con­tei aqui essa história – mas não custa repe­tir –, conta a “lenda”, que no tempo dos coro­néis as eleições eram “pro forma”. O rico coro­nel, insta­lava a seção eleitoral no alpen­dre de sua casa de fazenda e os cabo­c­los for­mava a fila para votar. O coro­nel, então, preenchia cédula dev­i­da­mente “votada” e dobrada para que “eleitor” a deposi­tasse na urna, sob suas vis­tas. Se algum dos “eleitores” tomasse a ini­cia­tiva de ten­tar abrir a cédula para ver em quem “votara”, já lhe atal­hava o coro­nel: — o que é isso cabo­clo, você não sabe que o voto é secreto?

Como podemos con­statar, falta bem pouco para o gov­erno e a Assem­bleia Leg­isla­tiva retornem a esse nível. Já alcançamos as votações “vapt-​vupt”, para retornar as cédu­las “votadas”, falta bem pouco.

Abdon Marino é advo­gado.

Par­tidos: A questão da fidelidade.

Escrito por Abdon Mar­inho


PARTIDOS: A QUESTÃO DA FIDELIDADE.

Por Abdon Marinho.

UM ASSUNTO tem chamado minha atenção ulti­ma­mente. Falo dos debates em torno das mudanças de par­la­mentares dos par­tidos pelos quais foram eleitos para out­ros, num xadrez que obe­dece uni­ca­mente à lóg­ica dos inter­esses pessoais.

De longe, a maior con­fusão deu-​se – e ainda per­du­rará por muito tempo –, den­tro do par­tido do pres­i­dente, o PSL, entre os ali­a­dos do próprio, leia-​se, famil­iares, e o grupo do pres­i­dente do par­tido, sen­hor Bivar, pelo comando da agremi­ação – e dos mil­hões ameal­ha­dos pela far­tura de dep­uta­dos, tanto no fundo par­tidário quanto no fundo eleitoral. Tratare­mos desta farra com o din­heiro do con­tribuinte noutra opor­tu­nidade.

Der­ro­ta­dos na batalha pelo comando do par­tido o grupo que segue o comando do pres­i­dente da República, com ele à frente, anun­cia­ram a cri­ação de um novo par­tido.

O pres­i­dente, inclu­sive, já anun­ciou sua des­fil­i­ação par­tidária (a nona, se não me falha a memória, na sua car­reira política), os dep­uta­dos aguardam os pro­ced­i­men­tos para cri­ação do par­tido para poderem sair sem o risco de perderem os mandatos.

Por estas pla­gas, o fre­n­esi par­tidário tam­bém se faz pre­sente, sobre­tudo, tendo em vista as eleições de 2020, com alguns dep­uta­dos estad­u­ais, e fed­erais, anun­ciando mudanças de leg­enda e alguns exibindo umas tais “car­tas de añuên­cia” como se fos­sem “car­tas de alfor­ria”, de triste memória. Tratare­mos, tam­bém, deste assunto.

Até 2007 o troca-​troca par­tidário ocor­ria sem qual­quer critério. Mudava-​se de par­tido como se tro­cava de roupa.

Foi a par­tir dos jul­ga­men­tos dos Man­da­dos de Segu­rança nº 26.602, 26.603 e 26.604, pelo Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF, recon­hecendo que os mandatos perte­cem aos par­tidos políti­cos que as coisas começaram a mudar.

Em out­ubro de 2007, o Tri­bunal Supe­rior Eleitoral — TSE, na esteira dos jul­ga­dos do do Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF, edi­tou a Res­olução TSE nº. 22.610, dis­ci­plinando o processo de perda de cargo ele­tivo, bem como de jus­ti­fi­cação de des­fil­i­ação par­tidária.

A res­olução referida encontra-​se vigente.

A par­tir de 2015, através da Lei nº. 13.165÷2015, foi acrescido o artigo 22-​A, a Lei nº. 9096/​1995, con­hecida como a Lei Orgânica dos Par­tidos Políti­cos, esta­b­ele­cendo:

Art. 22-​A. Perderá o mandato o deten­tor de cargo ele­tivo que se des­fil­iar, sem justa causa, do par­tido pelo qual foi eleito.

Pará­grafo único. Consideram-​se justa causa para a des­fil­i­ação par­tidária somente as seguintes hipóteses:

I — mudança sub­stan­cial ou desvio reit­er­ado do pro­grama par­tidário;

II — grave dis­crim­i­nação política pes­soal; e

III — mudança de par­tido efe­t­u­ada durante o período de trinta dias que ante­cede o prazo de fil­i­ação exigido em lei para con­cor­rer à eleição, majoritária ou pro­por­cional, ao tér­mino do mandato vigente.

Cabe assev­erar que para per­mi­tir a mudança de par­tido através da chamada “ janela” foi pro­mul­gada a Emenda Con­sti­tu­cional nº. 91, de 18 de fevereiro de 2016, para aque­las eleições, fac­ul­tando a qual­quer deten­tor de mandato ele­tivo, no prazo que esta­b­ele­cia, mudar de par­tido:

Art. 1º É fac­ul­tado ao deten­tor de mandato ele­tivo desligar-​se do par­tido pelo qual foi eleito nos trinta dias seguintes à pro­mul­gação desta Emenda Con­sti­tu­cional, sem pre­juízo do mandato, não sendo essa des­fil­i­ação con­sid­er­ada para fins de dis­tribuição dos recur­sos do Fundo Par­tidário e de acesso gra­tu­ito ao tempo de rádio e tele­visão”.

Como podemos ver­i­ficar a emenda acima per­mi­tiu a qual­quer um que mudasse de par­tido, tânatos para aquela eleição, como para quais­quer out­ras ou, sim­ples­mente, para des­o­bri­gar o deten­tor de mandato do com­pro­misso par­tidário, mas deixando claro o prazo para essa mudança.

Outra hipótese de mudança par­tidária, de caráter con­sti­tu­cional, foi trazida pela Emenda Con­sti­tu­cional nº. 97, de 04 de out­ubro de 2017, voltada para os deten­tores de mandatos eleitos por par­tidos que não cumpri­ram a chamada cláusula de bar­reira: “§ 5º Ao eleito por par­tido que não preencher os req­ui­si­tos pre­vis­tos no § 3º deste artigo é asse­gu­rado o mandato e fac­ul­tada a fil­i­ação, sem perda do mandato, a outro par­tido que os tenha atingido, não sendo essa fil­i­ação con­sid­er­ada para fins de dis­tribuição dos recur­sos do fundo par­tidário e de acesso gra­tu­ito ao tempo de rádio e de tele­visão.» (Art. 17, da CF).

Com tais con­sid­er­ações, acred­ito que exista um óbice quase que intransponível aos ali­a­dos do pres­i­dente para que mudem do par­tido pelo qual foram eleitos sem que provem quais­quer dos motivos esta­b­ele­ci­dos no rol tax­a­tivo do artigo 22-​A, da Lei 9096/​95, sem que ten­ham de aguardar a aber­tura da “janela”, o que, para os dep­uta­dos fed­erais, só acon­te­cerá em março de 2022, vez que não preenchem os req­ui­si­tos do §5°, do artigo 17 da CF.

Ao meu sen­tir, emb­ora a Res­olução TSE 22.610 per­maneça vigente, o rol a con­sid­erar como justa causa para a des­fil­i­ação par­tidária foi alter­ado pela lei que é norma de hier­ar­quia supe­rior, ou seja, deixou de exi­s­tir aquela per­mis­são para fil­i­ação em par­tido novo.

É dizer, o par­tido, dos son­hos pres­i­den­ci­ais, ou qual­quer outro, pode ser for­mado e con­tar com fil­i­a­dos deten­tores de mandatos ele­tivos majoritários, mas, em relação aos deten­tores de mandatos pro­por­cionais, dev­erá aguardar a aber­tura das “janelas” pre­vis­tas na lei, vereadores, março de 2020; e, dep­uta­dos estad­u­ais e fed­erais, a janela de março de 2022.

Noutro giro, entendo que diante de um rol tão fechado, coibindo as mudanças par­tidárias, pouca ou nen­huma valia têm as ditas “car­tas de añuên­cia”, expe­di­das ao alvedrio ou por con­veniên­cia das direções par­tidárias locais.

Ora, a lei e até mesmo a Con­sti­tu­ição Fed­eral são claras ao esta­b­ele­cer as hipóte­ses a pos­si­bil­i­tar a des­fil­i­ação par­tidária aos deten­tores de mandatos ele­tivos pro­por­cionais, não con­stando em tais leg­is­lações a hipótese do par­tido, dos seus órgãos dire­tivos, menos ainda, o pres­i­dente da agremi­ação de per­mi­tir a mudança par­tidária.

Emb­ora esteja consignado que mandato per­tence ao par­tido, tais regras servem como pro­teção ao cidadão/​eleitor. Noutras palavras, o eleitor ao votar no can­didato tam­bém o faz por con­sid­erar que o mesmo vai defender os princí­pios par­tidários, tanto assim, que vota antes no par­tido, e, pos­te­ri­or­mente, no can­didato.

Ao meu sen­tir, repito, não faria sen­tido que o leg­is­lador impusesse tan­tas restrições à mudança par­tidária por parte dos deten­tores de mandatos ele­tivos e deix­asse nas “mãos” dos diri­gentes par­tidários o poder para decidir quem fica e quem sai. Com base no quê?

Assim, entendo legí­timo, que mesmo o par­tido, por suas direções, equiv­o­cada­mente, “liberem” este ou aquele deten­tor de mandato, ao seu alvedrio, por con­veniên­cia ou por quais out­ros incofessáveis motivos, aos suplentes, com inter­esse, e ao Min­istério Público Eleitoral, cabe que pleit­eiem, junto à Justiça Eleitoral, nos ter­mos da Res­olução TSE 22.610, a perda do mandato do político deser­tor.

Vou além, ao Min­istério Público, na função de fis­cal da lei, cabe ficar atendo à pos­síveis ten­ta­ti­vas de burla à leg­is­lação, pre­venindo que escu­d­a­dos nos per­mis­sivos esta­b­ele­ci­dos no artigo 17 da Con­sti­tu­ição Fed­eral – § 1º É asse­gu­rada aos par­tidos políti­cos autono­mia para definir sua estru­tura interna e esta­b­ele­cer regras sobre escolha, for­mação e duração de seus órgãos per­ma­nentes e pro­visórios e sobre sua orga­ni­za­ção e fun­ciona­mento e para ado­tar os critérios de escolha e o régime de suas col­i­gações nas eleições majoritárias, vedada a sua cel­e­bração nas eleições pro­por­cionais, sem obri­ga­to­riedade de vin­cu­lação entre as can­di­dat­uras em âmbito nacional, estad­ual, dis­tri­tal ou munic­i­pal, devendo seus estatu­tos esta­b­ele­cer nor­mas de dis­ci­plina e fidel­i­dade par­tidária –, os diri­gentes par­tidários “frau­dem” a von­tade dos cidadãos/​eleitores.

Noutras palavras, emb­ora nos ter­mos acima, os par­tidos pos­suam ampla autono­mia, o des­ti­natário der­radeiro das nor­mas legais e con­sti­tu­cionais é o cidadão, é a sociedade. Para isso, com­pete às insti­tu­ições a vig­ilân­cia efe­tiva para garan­tir o seu cumpri­mento no inter­esse da sociedade.

Mas este é um assunto, ainda, a deman­dar muitas inda­gações. Cer­ta­mente voltare­mos a ele.

Abdon Mar­inho é advo­gado.