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Ah, conta outra…

Escrito por Abdon Mar­inho

AH, CONTA OUTRA

alguns anos escrevi sobre a solidão do gov­er­nador no poder. Não falava da solidão pela ausên­cia de pes­soas, cer­ta­mente não é o caso, o poder atrai muito e o gov­er­nador que se vende de inteligente atrai muito mais. Logo, sua excelên­cia está cer­cada de pes­soas, mas das pes­soas “erradas”, os fãs, os adu­ladores e dos opor­tunistas.

Dizia que Fal­tava – e con­tinua fal­tando –, ami­gos ver­dadeiros, que não fos­sem fãs, adu­ladores ou opor­tunistas. Pes­soas solidárias e com a capaci­dade de lhe apon­tar os erros, os exces­sos, as infan­til­i­dades.

O texto foi inti­t­u­lado de “O menino só”. E por ele recebi diver­sos elo­gios de pes­soas comuns que comungavam (ou comungam) com o meu pen­sa­mento.

Ape­sar de haver retor­nado ao assunto out­ras vezes e até man­dado algu­mas car­tas aber­tas, nada mudou com­por­ta­mento de sua excelência

Com o pas­sar do tempo sua excelên­cia, sucumbiu de vez aos encan­tos das luzes e ao pro­jeto pes­soal de gal­gar espaços maiores no cenário da política nacional.

Como se fosse o mais fiel e dileto dis­cípulo de Goebbels pas­sou a cul­ti­var a indifer­ença à infor­mação cor­reta e inques­tionável, aquela a que ninguém poderá dizer um “mas” – que é bem difer­ente de defender “que uma men­tira dita mil vezes torna-​se ver­dade”.

Ora, ao meu sen­tir não sen­tido que qual­quer pes­soa viva “den­tro” do bro­cado “falem mal, mas fale de mim”, como parece ser o caso de sua excelência.

Tem sido esta a real­i­dade. E tanto fez – e faz –, prin­ci­pal­mente depois que resolveu antagonizar-​se com pres­i­dente Bol­sonaro que, hoje, ao homem de bem, é difí­cil dis­tin­guir quem é o espelho de quem.

Veja, sobre­tudo, agora que forçou a entrada aos holo­fotes da mídia nacional, sua excelên­cia, pre­cis­aria de alguém que lhe recomen­dasse comed­i­mento.

Fica feio um gov­er­nador ser ques­tion­ado por tudo que escreve. Fica feio aquela série de acusações de fal­tar com a ver­dade, ser chamado de Pinóquio (ou Dinóquio), a cada pub­li­cação que faz nas redes sociais.

E são muitas as vezes a que se sub­mete a isso. E, se antes, os ques­tion­a­men­tos sobre o que diz ou escreve não tinha grande reper­cussão, agora que resolveu dizer-​se can­didato, estes ques­tion­a­men­tos são expos­tos ao país inteiro.

Outro dia, sua excelên­cia, foi as redes soci­ais anun­ciar um tal de “piso remu­ner­atório” para os pro­fes­sores acima de 6 mil reais.

A infor­mação “care­cia” de uma série de “aden­dos”, primeiro que não era “piso”; segundo, que o aumento con­ce­dido pelo gov­erno estad­ual, em ape­nas uma faixa salar­ial – e assim mesmo para garan­tir o piso nacional –, foi supe­rior ao aumento con­ce­dido pelo gov­erno fed­eral para o piso salar­ial do mag­istério, a chamada Lei do Piso, todas as demais ficou abaixo e na grande maio­ria, quase a total­i­dade, não chegou à metade, cerca de 5% (cinco por cento) quando o gov­erno fed­eral con­cedeu uma aumento supe­rior a doze por cento; ter­ceiro, o gov­erno estad­ual des­cumpriu de forma acin­tosa o Estatuto do Mag­istério, vez que esta lei proíbe a con­cessão de aumen­tos infe­ri­ores aos esta­b­ele­ci­dos na política nacional.

Com a cumpli­ci­dade de quase todos os dep­uta­dos da base gov­ernista na Assem­bleia Leg­isla­tiva e até do sindi­cato da cat­e­go­ria aprovaram o “aumento rabo de cav­alo” e, não sat­is­feitos, ainda foram comem­o­rar nas redes soci­ais e nas demais mídias sub­sidi­adas pelo governo.

Foi curioso pois enquanto os ali­a­dos do gov­er­nador votavam o “aumento” os pro­fes­sores que con­seguiram chegar e entrar nas gale­rias da assem­bleia protes­tavam de forma vee­mente con­tra o mesmo. Os pro­fes­sores, decerto, devem ser uns “sab­o­ta­dores” do gov­erno ou, sim­ples­mente, sabem fazer contas.

Os pro­fes­sores do Maran­hão, se com­para­dos a out­ras cat­e­go­rias e até mesmo aos cole­gas de out­ros esta­dos, estão numa situ­ação mel­hor. Entre­tanto, essa situ­ação é fruto das con­quis­tas da cat­e­go­ria. O atual gov­erno e mesmo seus ali­a­dos do sindi­cato, pouco ou quase nada tiveram com elas. São con­quis­tas do Estatuto do Mag­istério, quase trin­tenário, as leis do FUN­DEF e do FUN­DEB, da Lei do Piso, etc.

Não é aceitável ou ético que ao mesmo tempo que achata os salários e nega con­quis­tas históri­cas, o gov­erno estad­ual, ainda queira tirar “casquinha”.

Mal encer­rada a patranha do “aumento fake” aos pro­fes­sores, sua excelên­cia cor­reu para a tri­buna das redes soci­ais com uma ideia curiosa.

Comu­ni­cou a pat­uleia que solic­i­tara uma audiên­cia ao pres­i­dente da República para tratar das pés­si­mas condições das rodovias fed­erais no estado e ofer­e­cer ajuda do gov­erno estad­ual para a recu­per­ação das mesmas.

Há mais de vinte anos que per­corro as rodovias que cor­tam o estado, tanto as fed­erais quanto as estad­u­ais. Quase uma dezena de vezes con­tei a história do defi­ciente visual que pede esmo­las em For­t­aleza (CE) e em Belém (PA), para dizer que ele sabe com uma pré­cisão todas vezes que entra e que sai do estado. Não pre­cisa ninguém dizer onde começa ou onde ter­mina uma via que corta o estado. Ele sabe.

Pois bem, é ver­dade que as rodovias fed­erais que cor­tam o estado estão ruins, na ver­dade sem­pre foram assim, muitos maran­henses próx­i­mos à fron­teira com o Piauí pref­ere se deslo­car pelas vias daquele estado, acon­te­cendo o mesmo em relação aos que estão próx­i­mos ao Tocan­tins e ao Pará.

Por outro lado tam­bém é ver­dade que as rodovias estad­u­ais são bem piores.

O nosso não pos­sui rodovias – não sei nem o porquê de levarem este nome –, e sim “estrad­in­has”, mal feitas, com asfalto fino (as que pos­sui), roí­das nas bor­das e sem um palmo de acosta­mento. Se alguém pre­cisar parar por qual­quer motivo ou para fazer qual­quer coisa, até mesmo verter água tem que parar no meio da pista, por sua conta e risco.

As recu­per­ações de tão malfeitas, antes de rece­ber a sinal­iza­ção já estão esbu­ra­cadas e pre­cisando de novos reparos.

A exceção da rodovia MA 101 (a estrada de Riba­mar), no tre­cho que vai da Forquilha ao Maiobão e do pro­longa­mento da Avenida dos Holan­deses, MA 103 (estrada da Raposa, em obras) não tem uma que seja dupli­cada, que pos­sua um acosta­mento, e out­ras qual­i­fi­cações que as tornem seguras ou dig­nas de serem chamadas rodovias.

Exceto pelas estrad­in­has que acabam de ser inau­gu­radas e enfeitam as pro­pa­gan­das gov­er­na­men­tais as demais estão em “petição de mis­éria”, mesmo aque­las impor­tan­tís­si­mas para o desen­volvi­mento do estado como a que liga o Cujupe, em Alcân­tara a Gov­er­nador Nunes Freire.

Outro dia, no pro­grama Globo Rural, mostrou os pro­du­tores do sul do estado fazendo, por conta própria, a recu­per­ação de uma impor­tante via estad­ual para o escoa­mento da pro­dução.

Ainda na cam­panha, em 2014, sua excelên­cia, prom­e­teu fazer da MA 006, a rodovia reden­tora do Maran­hão. Lig­ando Alto Par­naíba a Apicum-​Açu, seria a espinha dor­sal do nosso desen­volvi­mento. Já indo pelo sexto ano de mandato, quan­tos quilômet­ros (ou pal­mos) foram feitos?

Dito isso, como levar a sério a pro­posta de sua excelên­cia de ofer­e­cer ajuda ao gov­erno fed­eral para recu­perar as rodovias fed­erais? Pare­ceu piada. Piada de pés­simo gosto.

A menos que ajuda pro­posta seja “ofer­e­cendo” os empresários que cuidam de muitas rodovias estad­u­ais e que vez ou outra se tor­nam hós­pedes do Estado.

Como podemos perce­ber, é muito difí­cil para o gov­er­nador do estado sus­ten­tar deter­mi­nadas “nar­ra­ti­vas” ainda mais quando tem por meta uma can­di­datura presidencial.

Outro dia, tanto sua excelên­cia, quanto seus ali­a­dos de “primeira hora” ficaram “sen­ti­dos” a ponto de recla­marem pub­li­ca­mente – e com dire­ito a mar­cação nos tex­tos, nas redes soci­ais –, do site The Inter­cept Brasil por conta de uma reportagem sobre o con­flito do Cajueiro.

O gov­er­nador – e os seus ali­a­dos –, tenta vender a nar­ra­tiva de que nada tem a ver com o prob­lema. Grosso modo, dizem se tratar de decisão judi­cial e de um con­flito entre terceiros.

Con­forme expliquei – e demon­strei –, em diver­sos tex­tos sobre o assunto, espe­cial­mente no texto “Quem é grileiro das ter­ras do Cajueiro?”, o gov­erno estad­ual atual tem total respon­s­abil­i­dade sobre o assunto.

Está tudo lá, o assen­ta­mento pelo gov­erno estad­ual em 1998, a escrit­u­ração do imóvel para as famílias; a desapro­pri­ação em 2014; o can­ce­la­mento da desapro­pri­ação pelo atual gov­er­nador logo no iní­cio do mandato e, por fim, a nova desapro­pri­ação “meia-​boca” feita por ele.

Como sus­ten­tar a nar­ra­tiva de não tem nada com a história?

Claro que o site The Inter­cept Brasil – que até outro dia era o “querid­inho” do gov­er­nador, do seu par­tido e ali­a­dos, defen­dido até diante de pesadas acusações –, não fez reportagem moti­vado por inter­esse público ou por pre­ocu­pação com aque­les desa­lo­ja­dos.

Emb­ora chorosos o gov­er­nador e sua troupe já iden­ti­ficaram as dig­i­tais do PT e do PSol no assunto.

A leitura é muito sim­ples: se Lula preso dava uma ban­deira e unia todos, Lula solto, só desagrega a esquerda e põe a escant­eio o sonho do comu­nista maran­hense – que tenta se via­bi­lizar com acenos ao cen­tro e a dire­ita.

Ini­cial­mente Lula disse que o povo brasileiro não aceita um can­didato comu­nista; depois, diante da con­tra infor­mação de que teria con­vi­dado o maran­hense para ingres­sar no PT, pub­li­ca­mente, desmentiu.

A reportagem/​denúncia é fruto do “racha” da esquerda que não aceita a ascen­são do gov­er­nador do Maran­hão e que, con­forme as con­veniên­cias, vai expor suas falhas.

E não são pou­cas. Não se trata ape­nas deste dis­curso de “pós ver­dade” ado­tado desde o iní­cio do gov­erno, de “vender” qual­quer coisa que o favoreça e, se ninguém dizer nada, ficar como ver­dade, e, se diz­erem, fin­gir que não ouvi­ram, são atos con­cre­tos.

Veja, é difí­cil de engolir uma “frente ampla” coman­dada por comu­nistas. Como é pos­sível democ­ratas cer­rarem fileiras jun­tos com um par­tido que desde seu nasce­douro tem viés autoritário? Que nos seus doc­u­men­tos inter­nos apoiou e apoia os regimes mais sangrentos?

A verve do autori­tarismo se faz pre­sente no atual gov­erno do Maran­hão e seus diri­gentes. Basta dizer que nunca na história do estado tan­tos jor­nal­is­tas, os poucos que teimaram em ser jor­nal­is­tas, foram tão perseguidos.

O próprio gov­er­nador, em data recente, se pro­nun­ciou con­tra uma cláusula pétrea da Con­sti­tu­ição: a que per­mite a livre man­i­fes­tação dos cidadãos porque con­vo­cada por pes­soas ou movi­men­tos de apoio ao gov­erno fed­eral. Insin­uou con­teúdo “nazista” da manifestação.

Ora, existe muita difer­ença entre nazismo e comu­nismo? Recen­te­mente uma lei da Ucrâ­nia, que exper­i­men­tou a bar­báries dos dois regimes, os equiparou.

As difi­cul­dades do par­tido em ser este “catal­isador” de um movi­mento con­tra o gov­erno fed­eral é uma das razões pela qual o par­tido tenta criar uma espé­cie de “fake” para representá-​lo nas eleições, um tal movi­mento seguido do número da leg­enda.

Tem-​se, com isso, um par­tido que se recusa a ser chamado pelo próprio nome é assumir o seu pas­sado e presente.

Mais um fake, entre tan­tos.

Isso sem con­tar as situ­ações mais pre­mentes provo­cadas pelo próprio gov­erno.

Como pes­soas sérias poderão cer­rar fileiras ao lado um gov­er­nante que a despeito de ter sido o gov­er­nante que mais aumen­tou a carga trib­utária, apre­senta uma gestão tão ruim?

Muito além do fraco por ten­tar “buri­lar” a ver­dade, os indi­cadores são ter­ríveis con­tra as pre­ten­sões do gov­er­nador.

O IBGE no dia 28 de fevereiro, por imposição legal, divul­gou os dados da Pnad/​contínua mostrando que a renda per capita dos maran­henses é a mais baixa do país, pouco mais da metade do salário mín­imo do ano ante­rior.

O gov­er­nador que prom­e­teu tanto, já no sexto ano de gestão, nos apre­senta um estado que fica atrás de todos os esta­dos da fed­er­ação quando se trata de renda.

Um estado tão rico, com tan­tas poten­cial­i­dades pas­sar por este tipo de con­strang­i­mento é um ates­tado que os gov­er­nantes, pas­sado e do pre­sente, erraram e erram feio.

Como pre­ten­dem ser uma opção a ser con­sid­er­ada para país?

Ah, conta outra…

Abdon Mar­inho é advo­gado.

A democ­ra­cia não teme as ruas

Escrito por Abdon Mar­inho

A DEMOC­RA­CIA NÃO TEME AS RUAS.

Por Abdon Marinho.

FOI nos meus primeiros anos na escola – e já se vão uns quarenta anos –, que aprendi o sig­nifi­cado da palavra democ­ra­cia. Lá estava a pro­fes­sor­inha dizendo: o termo democ­ra­cia vem do grego dēmokratía e sig­nifica gov­erno do povo, sendo que “demos” = povo e kratos = poder; o termo democ­ra­cia tem origem no século V a. C.

Dito isso, temos por certo que o con­ceito de democ­ra­cia e sua sig­nifi­cação tem mais de dois mil e quin­hen­tos anos de “estrada”.

Faço tais con­sid­er­ações bási­cas porque, pelo que tenho ouvido, lido e assis­tido de man­i­fes­tações, prin­ci­pal­mente, de autori­dades, chego a con­clusão que o Brasil pre­cisa voltar ao primário.

São dois milênios e meio de um con­ceito que as pes­soas, ainda nos dias atu­ais, teimam em não saber, ou pior, em dá a inter­pre­tação que lhes é conveniente.

Digo isso a propósito de uma man­i­fes­tação agen­dada para o dia 15 de março em apoio ao gov­erno fed­eral e às muitas inter­pre­tações e nar­ra­ti­vas a respeito da mesma.

Até onde sei, o movi­mento, ainda que com a par­tic­i­pação de alguns inte­grantes do gov­erno, é autônomo, vale dizer não é “ban­cado” com recur­sos públi­cos; não está coagindo ninguém a par­tic­i­par e está fazendo suas con­vo­cações para defender seus posi­ciona­men­tos, num espec­tro político de ampla liber­dade de ideias.

Até o onde sei, a con­vo­cação não parte do chefe do Poder Exec­u­tivo – e ainda que par­tisse, não teria nada demais –, que, ape­nas, e tão somente, retrans­mi­tiu uma men­sagem de con­vo­cação do ato marcado.

Este sim­ples ato – retrans­mi­tir uma men­sagem ou diver­sas men­sagens –, tem sido inter­pre­tado pelos “sábios” de plan­tão como um crime de respon­s­abil­i­dade, a moti­var o impeach­ment do pres­i­dente e um aten­tado con­tra a democ­ra­cia.

São min­istros do supremo, gov­er­nadores de estado, senadores e dep­uta­dos, estad­u­ais e fed­erais, além de inúmeros jor­nal­is­tas, muitos à soldo de deter­mi­nadas pau­tas, falando estas e out­ras bobagens.

A democ­ra­cia não teme as ruas, não teme o povo nas ruas prote­s­tando, muito pelo con­trário, isso é da essên­cia das democ­ra­cias pujantes.

Ape­nas para citar alguns exem­p­los, depois da Segunda Guerra Mundial já tive­mos mul­ti­dões nas ruas con­tra a cor­rida arma­men­tista; con­tra a pro­lif­er­ação de armas nucleares; con­tra as guer­ras das Cor­eias e do Vietnã; as man­i­fes­tações de 68; con­tra e a favor do aborto; con­tra o Muro de Berlim, etc.

No Brasil tive­mos inúmeras man­i­fes­tações con­tra o régime mil­i­tar; pela volta das eleições dire­tas; pela Con­sti­tu­inte; pelo impeach­ment de Col­lor; por reforma agrária; as man­i­fes­tações de 2013, com pau­tas diver­sas; pelo impeach­ment de Dilma, etc.

O povo é o “dono” da democ­ra­cia pelo sim­ples fato, como repisamos a lição do primário, que muitos esque­ce­ram, democ­ra­cia é o povo no poder (demos” = povo e kratos = poder).

Me per­doem, mas sus­ten­tar que o povo nas ruas prote­s­tando por quais­quer pau­tas, ainda as mais absur­das, atenta con­tra a democ­ra­cia, é pas­sar um ates­tado de ignorância.

Vi uns e out­ros dizendo que os protestos serão pro­movi­dos por rea­cionários, con­ser­vadores. E daí?

Estas pes­soas são tão cidadãos quanto os demais, cumprem suas obri­gações e pagam seus impos­tos como quais­quer outros.

Os inco­moda­dos que mar­quem seus protestos tam­bém, defendam suas pau­tas nas ruas.

A mar­avilha de viver­mos no Brasil é que qual­quer um tem plena liber­dade de ir às ruas fazer seu protesto, soz­inho ou em grupo, desde que pací­fico.

Até bem pouco tempo tín­hamos protestos quase diários em Brasília, muitos deles vio­len­tos e quase todos custea­dos com din­heiro público. Os par­tidos que estavam no poder “apar­el­haram” movi­men­tos soci­ais para que fos­sem as ruas pres­sionar o Con­gresso Nacional e o Supremo Tri­bunal Fed­eral, na defesa de suas pau­tas.

Isso nunca cau­sou escân­dalo em quem quer que fosse, nem mes­mos nestes que hoje se dizem escan­dal­iza­dos pelo fato do pres­i­dente da República ter retrans­mi­tido uma men­sagem que con­voca um ato pací­fico, custeado as expen­sas dos seus par­tic­i­pantes e orga­ni­zadores, em defesa do seu governo.

Onde estavam nas últi­mas décadas quando os gov­er­nos patroci­navam com recur­sos públi­cos toda a sorte de man­i­fes­tações e movi­men­tos, inclu­sive, os de cunho violento?

Onde estavam os min­istros do Supremo? onde estavam os pres­i­dentes das casas do Con­gresso Nacional? Onde estavam os gov­er­nadores? Onde estavam os dep­uta­dos estad­u­ais, fed­erais e senadores?

Pois é, antes tin­ham a com­preen­são que man­i­fes­tações públi­cas eram expressões legí­ti­mas da democ­ra­cia, agora não.

Con­tinua sendo, o povo é o dono real do poder. Ele na rua é sinôn­imo de que as coisas devem ser resolvi­das den­tro das regras da democ­ra­cia.

Não sei se assisto a um dan­tesco espetáculo de hipocrisia ou de cin­ismo. Tomem tento, meus sen­hores, como dizia meu pai.

A Con­sti­tu­ição Fed­eral no seu artigo 5º, inciso XVI, asse­gura: “XVI — todos podem reunir-​se paci­fi­ca­mente, sem armas, em locais aber­tos ao público, inde­pen­den­te­mente de autor­iza­ção, desde que não frus­trem outra reunião ante­ri­or­mente con­vo­cada para o mesmo local, sendo ape­nas exigido prévio aviso à autori­dade competente;”.

Este dis­pos­i­tivo con­sti­tu­cional é uma garan­tia dos dire­itos da cidada­nia. Sim, os cidadãos podem ir às ruas protestarem livre­mente con­tra o que acham errado; podem recla­mar dos poderes e insti­tu­ições. Isso é democracia.

Ah, estão con­vo­cando para protes­tar con­tra o Con­gresso Nacional e con­tra o STF. E o que tem de errado em protes­tar con­tra o Con­gresso Nacional e o STF?

Estes poderes, assim como o Poder Exec­u­tivo, estão sub­or­di­na­dos a von­tade dos cidadãos.

Não ape­nas podem, mas sem­pre que pos­sível, até para que saibam que não estão agradando, devem ser alvos de protestos nas ruas, sim!

O protesto é o cidadão que paga a conta dizendo que não con­corda com o que estão fazendo fal­sa­mente em seu nome.

O que inco­moda os que estão com esse mim­imi todo é que, pelo que soube, a pauta do protesto con­vo­cado é muito especí­fica: os man­i­fes­tantes estão con­tra o fato do Con­gresso Nacional querer dis­por de uma gorda fatia do orça­mento da União, traduzindo, do din­heiro público em bene­fí­cio de seus próprios mem­bros.

São trinta bil­hões, ou mais, que o Con­gresso Nacional – mais caro do mundo –, quer “meter a mão”. Os que protes­tam têm a plena con­vicção que grande parte, senão a maior parte, destes recur­sos serão desvi­a­dos. Voltarão para o bolso de suas excelên­cias, salvo rarís­si­mas exceções.

Fazia tempo que não via uma pauta tão justa.

O povo nas ruas, de forma ordeira e pací­fica, vai dizer que não con­corda que o seu din­heiro, o nosso din­heiro, o din­heiro do con­tribuinte seja rou­bado, é isso. Só isso!

Na defesa dos recur­sos da nação, con­tra os rou­bos, insti­tu­cional­iza­dos ou não, dev­e­ria haver um protesto diário.

O Brasil tem o estranho “tal­ento” de trans­for­mar ideias boas em monstros.

É o que acon­tece com o tal orça­mento impos­i­tivo. A ideia era boa. Mas o que tem acon­te­cido? Suas excelên­cias querem se apoderar da maior parte do orça­mento da união em proveito próprio.

Trata-​se de uma per­ver­são da democ­ra­cia. Os dep­uta­dos e senadores “nadando no din­heiro público”, sem con­tar os fun­dos eleitorais e par­tidários, dis­putam eleições em condições de abso­luta desigual­dade com os demais brasileiros que dese­jam rep­re­sen­tar o seu povo numa das casas do con­gresso.

Nos últi­mos tem­pos, o que mais tenho ouvido são pes­soas dizendo que não têm cor­agem de enfrentar uma dis­puta eleitoral com os atu­ais deten­tores de mandatos eletivos.

Essa desigual­dade, a que as autori­dades pare­cem cegas, fere muito mais a democ­ra­cia do que a con­vo­cação de qual­quer protesto pop­u­lar.

Ape­nas os bem idio­tas ou mal inten­ciona­dos caem nessa lorota de que os pres­i­dentes da Câmara dos Dep­uta­dos e do Senado da República estão pre­ocu­pa­dos com a democ­ra­cia no país.

Neste caso especí­fico, menos ainda, pois não é seg­redo para ninguém que dese­jam a manip­u­lação destes recur­sos da nação para “con­vencerem” seus pares a mudarem a Con­sti­tu­ição da República e per­mi­tir que os mes­mos se per­petuem nos car­gos. É “só” isso que querem.

O país não pode se calar diante disso. O cam­inho das ruas é o mais democrático e o único a seguir.

O povo nas ruas prote­s­tando é a prova de que nem tudo, ainda, está per­dido. Como dizia aquele velho bor­dão de tan­tas lutas: o povo unido jamais será vencido!

Abdon Mar­inho é advo­gado.

SIN­HOZ­INHO MALTA VER­SUS ZECA DIABO

Escrito por Abdon Mar­inho


SINHOZ­INHO MALTA VER­SUS ZECA DIABO.

Por Abdon Marinho.

TODOS já sabiam que não acon­te­ceria boa coisa no dia em que Sin­hoz­inho Malta encon­trasse com Zeca Diabo. Habi­tando tem­pos e espaços difer­entes – emb­ora per­sonas inter­pre­tadas por um mesmo artista –, poucos acred­i­tavam que tal encon­tro um dia viesse acon­te­cer.

Pois é, mas o impon­derável acon­te­ceu e Sin­hoz­inho Malta cru­zou com Zeca Diabo, não em Sucu­pira do Norte ou Asa Branca, mas onde ninguém esper­ava: no sertão do Ceará, em Sobral, municí­pio de pop­u­lação esti­mada em cerca de 200 mil habi­tantes.

A essa altura o leitor já deve ter perce­bido que tratarei do assunto que domi­nou as “rodas políti­cas” nos últi­mos dias: o “inci­dente” envol­vendo o senador Cid Gomes (PDT/​CE) e os poli­ci­ais mil­itares do Ceará que se encon­tram “amoti­na­dos” há alguns dias.

O leitor mais atento já deve ter bus­cado saber que os dois per­son­agens antagôni­cos que emprestam nome à pre­sente crônica fazem parte do pan­teão da dra­matur­gia brasileira, ambos inter­pre­ta­dos pelo bril­hante Lima Duarte, nas obras inesquecíveis do não menos bril­hante Dias Gomes: O Bem Amado e Roque San­teiro.

Tenho por certo que o leitor já deve ter iden­ti­fi­cado a quem cabe cada um dos papéis.

Antes de prosseguir com a crônica esclareço que esta­mos diante de uma comé­dia (ou tragé­dia) de erros na qual nen­hum dos lados tem razão. A polí­cia mil­i­tar, proibida pela Con­sti­tu­ição da República de fazer “greve” e o senador cearense que não tinha nada com a história.

Dito isso, cabe anal­isar os fatos.

A primeira per­gunta que fiz ao saber que um senador avançou com uma car­regadeira con­tra cidadãos tendo estes pronta­mente reagido a “bala” foi: o que o senador tinha com o prob­lema?

Até onde se sabe o senador está licen­ci­ado do Senado para tratar de inter­esses pes­soais – registre-​se, sem remu­ner­ação.

O senador não ocupa qual­quer cargo no gov­erno do Ceará, menos ainda, algum rela­cionado à segu­rança pública ou qual­quer outro que lhe per­mi­tisse ir tratar com os poli­ci­ais amoti­na­dos. Ainda que fosse, pelo que vimos, o senador seria a der­radeira pes­soa para tratar de qual­quer nego­ci­ação com quem quer que seja.

Alguém sabe dizer se já viu algum nego­ci­ador chegar para nego­ci­ação “armado” com uma car­regadeira e ameaçar “ir para cima” das pes­soas com quem se deseja nego­ciar? Acho que só no Ceará dos Fer­reira Gomes.

Quer me pare­cer que o senador licen­ci­ado, pela desen­voltura com que agiu, é uma espé­cie de “Sin­hoz­inho Malta” do Ceará, não é autori­dade, mas age como se fosse, saiu do cargo de gov­er­nador há mais de cinco anos, mas a “gov­er­nança” não saiu dele.

Ora, tal qual o per­son­agem do fol­hetim, parece ou se investe de mais autori­dade que o gov­er­nador do estado. Se brin­car, quando vai ao palá­cio do gov­erno cearense o gov­er­nador Camilo San­tana (PT) lhe cede a cadeira de gov­er­nador, assim como fazia o seu Flor, de Asa Branca, quando o Sin­hoz­inho Malta chegava a prefeitura.

Emb­ora pareça óbvio é de se per­gun­tar: onde já se viu um cidadão que não tem qual­quer autori­dade no assunto se inve­stir de “nego­ci­ador” e inve­stir com um tra­tor con­tra dezenas de pes­soas?

Não fosse o Brasil uma terra de ficção, era para o “usurpador” da função pública ser chamado às falas pelos dois deli­tos: a usurpação de função pública e por ten­ta­ti­vas múlti­plas de homicí­dios.

Um cidadão comum que bebe, e dirige, se acon­tece um aci­dente de trân­sito tem-​se por certo que ele come­teu um homicí­dio qual­i­fi­cado ou uma ten­ta­tiva, se o “aci­dente” não resulta na morte.

Como qual­i­ficar, difer­ente disso, se o cidadão pega uma car­regadeira ameaça pas­sar por cima das pes­soas e avança com o veículo ao encon­tro das pes­soas só sendo parado à bala?

A ati­tude de sin­hoz­inho Malta do sertão era para ser pronta­mente reprim­ida, era para a polí­cia de ver­dade – não a amoti­nada –, tê-​lo pren­dido em fla­grante delito.

Ainda que o tivesse socor­rido (como se deve), era para tê-​lo lev­ado preso pelos crimes acima descritos.

Outra coisa, essa conta com deslo­ca­men­tos em helicóptero ou out­ros veícu­los, assim como a conta dos hos­pi­tais jamais dev­e­riam ser “espetadas” nas costas dos con­tribuintes.

O senador não estava em uma mis­são ou fazendo algo em inter­esse do país, estava come­tendo crimes.

Não faz sen­tido que o con­tribuinte que não tem nada com as “maluquices” do senador seja chamado para pagar suas contas.

Emb­ora saibamos que tudo se dará ao oposto disso, fica o reg­istro para que pense­mos sobre o assunto.

Noutra quadra, não temos como deixar “vestir” a PMCE no arquétipo de Zeca Diabo, o can­ga­ceiro e mata­dor temido pelo povo, não pelo fato, iso­lado, de haver reagido à bala diante da investida do senador – isso até é defen­sável sob a ótica da legí­tima defesa ou do estado de neces­si­dade –, mas, sim, por des­cuidar do seu papel de pro­te­tora da sociedade e fazer uma greve que é respon­sável pela a vio­lên­cia no Ceará, levando o estado a alcançar índices nunca antes exper­i­men­ta­dos, já tendo ceifado quase cerca de uma cen­tena de víti­mas (ou algo próx­imo disso).

Por mais que os gov­er­nos estad­u­ais, por irre­spon­s­abil­i­dade ou pre­con­ceitos ide­ológi­cos, ten­ham des­cuidado da val­oriza­ção das polí­cias, isso não lhes dá o dire­ito de, na defesa de inter­esses próprios – não dis­cuto se legí­ti­mos ou não –, colo­carem em risco a vida da pop­u­lação, os cidadãos comuns pagadores de impos­tos que sus­ten­tam a todos, gov­er­nantes e poli­ci­ais.

Esses cidadãos comuns, gente com os mes­mos prob­le­mas dos poli­ci­ais, são os que sofrem as con­se­quên­cias do “motim” de poli­ci­ais.

Os gov­er­nantes, as autori­dades a quem se dirigem os protestos estão todos bem guarda­dos em suas man­sões ou aparta­men­tos de alto padrão, com segu­ranças pri­va­dos e diver­sos out­ros itens que os colo­cam a salvo de qual­quer importunação.

São os cidadãos de bem, os homens comuns que estão despro­te­gi­dos e expos­tos à sanha da ban­didagem. São estas as pes­soas que pre­cisam da polí­cia. E, a estas, a polí­cia falha.

A PMCE, demonstrando-​se ingênua e sem instrução – ape­sar de gen­erosa – , tal qual o per­son­agem da ficção, defla­gra e per­siste em um movi­mento que afronta a leg­is­lação vigente, quando pode­ria, por out­ros meios, bus­car a solução para suas deman­das.

Diante do absurdo do que estão fazendo, ape­sar de não tão perto, dev­e­riam descer até o Juazeiro do Norte para pedi­rem perdão ao “Santo Padim Pade Ciço Romão Batista”, como faria, aliás, o ver­dadeiro Zeca Diabo.

Con­flito entre polí­cias e gov­er­nos, sobre­tudo, quando a reação descamba para pre­juí­zos vitais à pop­u­lação é como casa em que falta pão, todo mundo fala e ninguém tem razão.

Abdon Mar­inho é advogado.