A BANCADA DO VÍRUS OU OS RATOS CHEGARAM AO PODER.
Por Abdon Marinho.
OUTRO DIA um amigo, profundo conhecedor da história, indagou-me sobre a seguinte constatação: — Abdon, já percebestes o deserto de estadistas na política mundial?
Depois, com mais vagar pus-me a pensar nas palavras deste amigo, recheadas de razão. Você olha a França e percebe que o senhor Macron não chega aos pés de um de Gaulle ou Mitterrand; olha para o Reino Unido e vemos que o senhor Jonhson mais se assemelha uma figura de humor do que a um estadista como o foi Sir Churchill ou mesmo Miss Thatcher; os Estados Unidos, mesmo reconhecendo o sucesso da política econômica de Trump, ele nunca deixará de ser uma figura folclórica, de passado duvidoso e mais preocupado com seus interesses internos do que com a humanidade, fica há anos-luz de um Roosevelt ou Eisenhower, ou mesmo Reagan.
Aqui não falo dos líderes de regimes totalitários ou autocráticos, mas daqueles estadistas que cultivaram e deram sua contribuição aos valores ocidentais – que muitos acham decadentes.
Esse deserto de estadistas fez com que, não faz muito tempo, algumas revistas reconhecessem em Ângela Merkel, primeira-ministra alemã, como a única líder do mundo livre ocidental.
Só isso, representa bem o quanto estamos desfalcados de líderes globais.
Se rememorássemos aquela antiga alegoria – retratada, inclusive, no cinema –, em que o Planeta Terra era invadido por alienígenas e estes pedissem: — nos leve ao seu líder! Certamente, não teríamos a quem levar.
Não existe um consenso mínimo de liderança no mundo. Não existe um estadista, na atualidade, que mereça ser chamado assim.
Levaríamos os alienígenas ao Trump? Ao projeto de ditador Putin, que acaba de aprovar medidas que permitirão ficar no poder até 2036, ou mais? Ao chinês Jìnpíng, que de tão democrata mandou censurar até uma figura de desenho animado, o ursinho Puff? Ao líder inglês, Johnson, que mais parece o personagem Loide, da comédia Débi&Loide?
O surgimento deste novo coronavírus tornou muito mais cristalina a falta de lideranças políticas globais. Essa falta de estadistas.
Trata-se de uma causa que interessa a todos.
Um inimigo comum, invisível e devastador.
Seria um motivo, caso tivéssemos líderes que merecessem ser chamados assim, para que se reunissem e encontrassem uma solução ou estratégia comum – ouvido os melhores especialistas de todos os países –, para melhor enfrentar o problema – envolvendo os menores riscos para a humanidade.
Em operações de guerra – e estamos diante de uma –, é inevitável as perdas humanas. Por isso cabe aos líderes adotarem as melhores estratégias para minimizá-las.
Apenas para citar um exemplo, quando os líderes aliados decidiram, na Segunda Guerra Mundial, pela invasão da Normandia, no chamado “Dia D”, sabiam que muitos daqueles jovens soldados, no começo da vida, não voltariam.
Foram 5.400 mortos naquele 6 de junho de 1944, um único dia, não foram mortes vãs, mas em nome de uma causa maior.
O conceito é básico: não existe vitória sem a cobrança de sacrifícios.
A terra está em risco de perder milhares de vidas no momento, pela moléstia ou pelas consequências posteriores, com o empobrecimento das nações o aumento da violência, etc.
Arrisco dizer – isso da percepção de um diálogo com outro amigo –, que o próprio conceito de humanidade encontra-se numa encruzilhada – depois do que estamos passando é difícil que permaneça.
E, apesar disso, não há qualquer ação conjunta dos “líderes” mundiais – embora tenham tomado conhecimento do problema desde setembro ou outubro de 2019.
Basta dizer que a primeira providência a ser adotada pelas nações, antes mesmo de buscarem qualquer diálogo sobre como tratar desta emergência global, foi fechar as fronteiras, proibir o deslocamento de pessoas – inclusive o regresso de muitos cidadãos a seus países de origem –, sem qualquer sistematização, cada um fazendo no seu tempo e conforme sua conveniência.
Ora, se sabiam com antecedência que o vírus chegaria a seus países, por que nada fizeram em um esforço conjunto para encontrar a solução.
Ao invés disso, preferiram se fechar. Como ratos, cada um foi cuidar da sua “toca”. E, nas suas tocas, as famílias trancadas em suas casas.
Em pleno século XXI, temos que lidar com o conceito de “nação-toca”, onde cada país escolhe a melhor forma de se lidar com uma emergência global que afeta a toda a humanidade.
A falta que fazem estadistas de estirpes, que se preocupem com os problemas da humanidade e não apenas com o seu quintal.
Quando transportamos tal situação para o Brasil (a ausência de estadistas no comando), a situação fica mais dramática.
Até porque, acredito, o último estadista que tivemos no comando da nação foi D. Pedro II, desde então, com uma outra exceção, uma chusma que não distinguem conceitos básicos.
Se pegarmos só do fim do régime militar para cá, quem poderíamos chamar de estadista?
O Sarney que tendo mandado num estado da federação por quase 50 anos justifica seus indicadores africanos com o fato do estado não possuir terras férteis ou minérios de alto valor econômico?
O Collor, que foi apeado do poder por corrupção e desde então não aparece um escândalo de roubalheira do dinheiro público em que não esteja envolvido?
O Fernando Henrique Cardoso, que mesmo no poder, ninguém nunca deu importância as suas ideias?
O Lula da Silva, que montou uma quadrilha para assaltar os cofres públicos quando esteve no poder e foi condenado por corrupção e lavagem de dinheiro?
A Dilma Rousseff, que de tanto falar tolices virou uma espécie de piada nacional, um “meme” ambulante?
O último desta lista infame é o atual presidente, o senhor Bolsonaro.
Desde sempre se soube que o preparo dele para o cargo de presidente era nulo.
Sua vitória, em grande parte, é devida ao sentimento de vingança pela desgraça que Partido dos Trabalhadores — PT e seus aliados fizeram com o país – acrescentando os dois anos de Temer –, 16 anos de roubalheira e “aparelhamento” do Estado.
O mérito dele – inegável –, foi conseguir encarnar, como nenhum outro, o antipetismo.
No governo, mais atrapalha do que ajuda. Mesmo quando tem razão não consegue passar confiança a equipe e aos governados.
Se fosse imaginar o presidente como uma alegoria da minha infância, seria como aquele menino lá do povoado que o pai não mandava ir à venda, a dois quilômetros de distância da casa, porque tinha receio dele não saber comprar dois quilos de açúcar, um fardo de farinha e uma quarta de café.
O Bolsonaro é isso: alguém que se atrapalha lendo um bilhete. Alguém que é contestado violentamente até quando tem razão.
Não duvido que seja honesto; não duvido que tenha boas intenções, mas, verdadeiramente, é alguém muito frágil para a enormidade do desafio de governar o país – apesar de legítimo e eleito pela vontade soberana do povo.
Essa fragilidade fez com que o Congresso Nacional, o Supremo, usurpassem o poder e passassem a “mandar” no governo mais que o Poder Executivo.
Na atual crise – por conta da pandemia –, apareceu mais um grupo para “mandar” no governo: o grupo dos governadores.
Não duvido que os governadores tenham preocupações com a saúde da população.
Acontece que eles, assim como a maioria esmagadora da politica nacional, fazem parte dessa chusma de políticos menores que estão longe de serem – ou mesmo de saberem –, o significado da palavra estadista.
O que mais tenho assistido são governadores querendo tirar vantagens da pandemia.
Criaram uma verdadeira “bancada do vírus”, cada um mais afoito que o outro querendo colher dividendos eleitorais futuros.
Já disse – volto a repetir –, é escandaloso que políticos se utilizem de uma pandemia, uma tragédia, que está ceifando milhares de vidas ao redor do mundo para se promoverem politicamente.
Infelizmente é que mais temos visto! São governadores, são senadores, são deputados federais e estaduais, prefeitos e até vereadores, todos querendo tirar uma “casquinha” do vírus.
Não têm pudor ou qualquer constrangimento em explorarem uma tragédia como essa.
A pandemia tornou-se uma espécie de vale-tudo dos desavergonhados.
Outro dia vi uma autoridade criticando o presidente da República por que aquele comparecera na porta do palácio para cumprimentar uns manifestantes.
O acusou de está espalhando o vírus.
Pois é, essa mesma autoridade, dias depois, quando a pandemia já se tornara mais acentuada, promoveu uma farta distribuição de cestas básicas a pessoas carentes (ato necessário), sem qualquer preocupação com a aglomeração e contágio pelo coronavírus (covid-19) ou pelo vírus H1N1.
Nesta, e em diversas outras situações, até mesmo contraditórias, vê-se, claramente, o objetivo meramente eleitoreiro por trás da “boa intenção”.
O mesmo acontece com deputados, e até vereadores, que ficam propondo medidas, como isenções, adiamento de contas, impostos, etc., aos governos estaduais e municipais.
Fazem uma indicação – às vezes nem protocola –, e correm para os meios de comunicação para “vender” o feito. Existem até “brigas” e acusações de plágio em determinados casos.
Poderia, mas não cito os nomes para não “dar ibope” a quem age com tanta torpeza.
Aqui nem falo daqueles que, com o surgimento do novo coronavírus – e apostando no alastramento da desgraça –, já correram para propor as prorrogações de seus próprios mandatos ou de seus aliados.
Ainda que isso se faça necessário – se, infelizmente, a tragédia aumentar –, a proposta, no momento, é de um oportunismo ímpar.
A existência de uma “bancada do vírus” é a comprovação definitiva de que os ratos chegaram ao poder – e não é de hoje.
Abdon Marinho é advogado.