AUTORITARISMO: OS FALSOS DEMOCRATAS CHEGARAM PRIMEIRO.
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- Criado: Sexta, 12 Abril 2019 11:12
- Escrito por Abdon Marinho
AUTORITARISMO: OS FALSOS DEMOCRATAS CHEGARAM PRIMEIRO.
Por Abdon Marinho.
DURANTE todo o processo eleitoral das últimas eleições presidenciais uma ameaça rondou os discursos de quase todos os candidatos: o retrocesso democrático, o retorno do autoritarismo que representaria a eleição daquele que acabaria por eleger-se.
Esse discurso catastrófico, do bem contra o mal, da trevas contra a luz, mobilizou a classe artística, os intelectuais, os ditos evoluídos culturalmente, em oposição aos toscos, à violência, a ditadura, ao inferno instalado na terra.
Com cem dias de governo não sei se todo o alarmismo semeado irá vingar, se a catástrofe prometida acontecerá, porém, em relação ao cerceamento das liberdades individuais e de expressão, os alarmistas chegaram primeiro.
Por estes dias vi, numa rede social, a deputada federal pelo Partido dos Trabalhadores — PT, Maria do Rosário “festejar” a condenação do humorista Danilo Gentili por crime de injúria.
Não conheço o tipo de humor deste cidadão – depois de certa idade só assisto aquilo que verdadeiramente tenho interesse, assim, nunca vi um dos seus programas ou assisti aos seus vídeos nas redes sociais, dentre os quais este que suscitou a sua condenação por, supostamente, injuriar a deputada.
A deputada, decerto, sentiu-se injuriada – e este é um sentimento de cunho pessoal –, a ponto de, usando a prerrogativa do cargo, perseguir – e conseguir –, a condenação do humorista na Justiça Federal.
Desde que, há dez anos, o Supremo Tribunal Federal — STF, decidiu por maioria, que a Lei nº. 5250/67, a chamada Lei de Imprensa, não fora recepcionada pela Constituição Federal de 1988, não me recordo de ter visto condenação criminal pelos chamados crimes de opinião.
O que vi, vez ou outra, foram condenações nas esferas cíveis, por dano moral, quando uma ou outra publicação, transborda do razoável.
Assim, soa estranho que alguém seja condenado à prisão (ainda que isso, efetivamente, não venha ocorrer) por, supostamente, ter se excedido numa crítica, ou mesmo que tenha sido grosseiro ou deselegante, contra uma deputada.
Mais estranho, ainda, que uma deputada federal, se valendo do cargo, tenha perseguido a condenação do humorista, tendo por base os mesmos instrumentos de repressão do régime militar que tanto jura combater.
A condenação criminal por crimes de opinião ou de livre expressão é incompatível com a ordem democrática vigente. Foi neste sentido a decisão do STF em 2009, ao dizer que a Lei de Imprensa não fora recepcionada pela Carta Magna.
Por que a deputada não buscou a condenação na esfera cível? Por que o desejo de condenar o humorista à prisão?
Só tenho uma resposta: porque ela, assim como seus aliados, não conseguem conviver com a crítica às suas contradições.
Não seria a primeira vez. O extinto jornalista Walter Rodrigues certa vez me contou o episódio em que um, então juiz federal usou o mesmo expediente: valeu-se da Lei de Imprensa e da Justiça Federal para tentar calar um jornal que falara dele. Essa era a condição para o editor do jornal não ser condenado criminalmente.
O veterano jornalista, muitos anos depois ainda revelava sua surpresa com o pendão autoritário dos falsos democratas.
–– Abdon, queriam fechar o jornal! Fechar o jornal.
Não sei se o atual presidente da República, em tão pouco tempo de cargo, já mandou processar algum jornalista ou blogueiro por criticá-lo.
Sei, que diferente do que foi profetizaram, ele fez foi se solidarizar com o humorista condenado.
Comportamento bem diferente de muitos artistas, intelectuais que tanto falaram contra a ditadura que se instalaria no Brasil a partir de janeiro e que silenciam diante de uma condenação que abre um sério – e grave precedente –, contra as liberdades civis e que foi provocado por uma deputada “moderna”, “democrática” e que dizia justamente o oposto.
Meu pai – que era analfabeto por parte de pai, mãe e parteira –, costumava dizer: –– meu filho, quem disso usa, disso cuida.
Quer dizer: aquele que tem o pendão pelo autoritarismo, enxerga no oponente seus próprios defeitos.
Vejam o exemplo do Maranhão. Aqueles que sempre criticaram o grupo Sarney, a quem apontam como uma espécie de senhor feudal desta capitania, se revelam bem piores em determinadas práticas que aquelas que lhe imputavam – e ainda imputam –, vez que, quatro anos depois de terem assumido o governo, até se faz chuva ou sol, ainda apontam o dedo para Sarney.
E, apenas para ficar no quesito da liberdade de expressão e opinião, o que ouço de inúmeros jornalistas e blogueiros é que nunca tantos foram tão processados, inclusive na esfera penal, como fez a deputada federal do PT.
Tudo para calar as opiniões diferentes.
Outra estratégia é a cooptação mediante argumentos irrecusáveis. Fazendo valer assim o velho adágio de que “no Maranhão, o que dinheiro ou taca não resolver, é porque foi pouca”.
Nunca acreditei (ou respeitei) modelos democráticos com pensamento monolítico. Esses modelos, para mim, são arremedos de ditaduras. Ou ditaduras completas.
Daí, porque nas ditaduras se perseguem tanto as liberdades individuais, de expressão e pensamento. Daí, porque precisam censurar, reprimir ou proibir a circulação de ideias e opiniões.
As democracias – e só merecem ser chamadas assim –, respeitam a pluralidade de ideias, permitem e estimulam a liberdade de pensamento.
Do Maranhão, também, sai outro péssimo exemplo para a concepção do que seja uma democracia. E, vem de onde menos se espera: da universidade.
Não com tanta surpresa tomei conhecimento que o Conselho de Pesquisa, Ensino e Extensão — CONSEPE, da Universidade Federal do Maranhão — UFMA, se reuniu e decidiu censurar um evento onde seria exibido o filme “1964: Entre Armas e Livros”.
Não sei se este conselho se reúné para discutir e propor soluções visando melhorar as condições de ensino dos seus alunos.
Soube que o argumento usado para a censura foi “garantir a segurança do corpo discente e de servidores”.
Não sei o conteúdo da tal película, mas os conselheiros acham que a exibição de um filme atenta contra a segurança de alunos e servidores?
Outros eventos, de outras correntes ideológicas, também mereceram reuniões do CONSEPE e foram censurados?
Qual a utilidade de uma universidade que não respeita ou não admite a possibilidade de pensamentos diferentes?
Não me parece que pessoas que agem assim mereçam respeito quando falam em democracia, quando criticam a ditadura, pois, na prática, o que defendem, não apenas como modelos externos, mas, também, para o Brasil, são seus próprios modelos ditatoriais.
As provas estão aí, à vista de todos: os mesmos que vibram ou silenciam diante da condenação criminal de um humorista proposta e perseguida por uma agente do estado (uma deputada federal); que festejam ou defendem que a universidade seja portadora de um pensamento único; que processam ou defendem processos contra jornalistas, blogueiros ou escritores e que os mesmos sejam condenados à prisão, são os mesmos que acusaram e acusam o atual governo de autoritarismo e ditatorial.
E são os mesmos, também, que protestam e clamam contra a prisão de Julian Assange, que através de seu site divulgou, inclusive, segredos militares de diversos países, colocando em risco a segurança de milhares de pessoas ao redor do mundo. Enquanto dispensam o eloquente silêncio em relação às prisões politicas na Venezuela, em Cuba …
Abdon Marinho é advogado.