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Na defesa de uma edu­cação igualitária.

Escrito por Abdon Mar­inho


NA DEFESA DE UMA EDU­CAÇÃO IGUAL­ITÁRIA.

Por Abdon C. Marinho*.

DESDE tem­pos imemo­ri­ais que sabe­mos ser a edu­cação a chave do sucesso. Não ape­nas do sucesso indi­vid­ual, como, tam­bém, do sucesso cole­tivo. Uma sociedade edu­cada tem tudo para pro­gredir e alcançar o bem-​estar para todos.

Ainda pequeno lem­bro do meu pai dizer que me daria algo que ninguém jamais iria tomar: a edu­cação. E, matriculou-​me numa escola. Primeiro na escol­inha do nosso povoado, uma cas­inha de latada; depois no Unidade Integrada Alde­nora Belo, já na sede no municí­pio e na Unidade Integrada Castelo Branco, onde con­clui o que hoje seria o fun­da­men­tal anos ini­ci­ais; depois veio o Colé­gio Ban­deirante, onde fiz os anos finais do fun­da­men­tal; o ensino médio já no Liceu Maran­hense e, por fim, o curso de Dire­ito na Uni­ver­si­dade Fed­eral do Maran­hão– UFMA.

Já con­tei esse breve roteiro da minha vida estu­dan­til diver­sas vezes, bem como, que foi a edu­cação que, lit­eral­mente, me tirou da “roça”, a mim e aos meus irmãos e/​ou do garimpo para onde me sug­eriu que fosse um amigo quando tinha cerca de 12 anos – para pedir esmo­las.

Se a edu­cação impacta de forma tão pos­i­tiva a vida de uma cri­ança, ado­les­cente e jovens, as ações coor­de­nadas de gov­er­nos têm o condão de mod­i­ficar a história de nações inteiras.

Foi o que ocor­reu com as nações chamadas “tigres asiáti­cos” (Cin­ga­pura, Cor­eia do Sul, Hong Kong e Tai­wan).

Qual­quer um com estu­dos bási­cos de história sabe que até a primeira metade do século pas­sado essas nações eram paupér­ri­mas e que viviam basi­ca­mente de uma agri­cul­tura de sub­sistên­cia em dimin­u­tos ter­ritórios e sem quais­quer recur­sos nat­u­rais. Sabe, tam­bém, que den­tre os vários fatores que con­tribuíram com o desen­volvi­mento das mes­mas “reina” a edu­cação, fazendo com que ten­ham uma mão de obra alta­mente qual­i­fi­cada.

Sem tal condição, pode­riam despe­jar ouro nas ruas e ainda assim não teriam avançado um palmo sequer.

Essa mesma com­preen­são influ­en­ciou o surg­i­mento dos chama­dos “novos tigres asiáti­cos”, grupo con­sti­tuído por Fil­ip­inas, Indonésia, Tailân­dia, Malásia, Vietnã, tam­bém países sem recur­sos nat­u­rais significativos.

Basta um sim­ples exame de fotografia do que eram esses países há cerca de 60 anos e como estão hoje para perce­ber­mos o quanto se desen­volveram no período.

Logo, não restam dúvi­das que o atraso econômico do Brasil encontra-​se dire­ta­mente rela­cionado à baixa qual­i­dade da nossa edu­cação e por con­se­quên­cia do despreparo da nossa mão de obra.

Qual­quer cidadão pode con­statar isso nas coisas mais cor­riqueiras. Basta pre­cisar de um bom pedreiro, um bom marceneiro, um bom eletricista. Não encon­tramos. Ped­i­mos recomen­dação a um e outro quando a neces­si­dade se torna pre­mente.

Dizem que o que “atra­vanca” o desen­volvi­mento do país à atração de inves­ti­men­tos estrangeiros é o “custo Brasil”, o excesso de reg­u­lação tra­bal­hista, etc.

Claro que isso tem um peso, mas penso que todas essas cir­cun­stân­cias seriam absorvi­das pelo cap­i­tal­ismo se tivésse­mos uma pop­u­lação com edu­cação de ponta e mão de obra qual­i­fi­cada, isso se rever­t­e­ria em pro­du­tivi­dade e o cap­i­tal “daria seus pulos” para não perder.

Vejam a tragé­dia anun­ci­ada que nos encon­tramos: enquanto as nações chamadas “tigres asiáti­cos” cresce­ram um “absurdo” em sessenta anos, o Brasil, segundo estu­dos cien­tí­fi­cos, levará sessenta anos para “cor­ri­gir” uma década de atraso edu­ca­cional em relação aos cen­tros mais avança­dos.

Isso, se começar­mos a fazer alguma coisa no sen­tido de cor­ri­gir a dis­torção ime­di­ata­mente.

Como ire­mos ala­van­car o cresci­mento do país, atrair cap­i­tal estrangeiro, aproveitar com racional­i­dade e segu­rança nos­sos recur­sos, sem uma edu­cação de ponta, sem mão de obra qual­i­fi­cada e, sem, sequer, “falar a lín­gua” dos investi­dores?

Desde sem­pre me inter­esso por edu­cação e, nos últi­mos tem­pos, até por questões profis­sion­ais, tenho me inter­es­sado muito mais.

Nas min­has reflexões sobre o assunto entendi que o “motor” do desen­volvi­mento de qual­quer nação chama-​se edu­cação pública. É nela, na edu­cação pública, que devem se con­cen­trar os inves­ti­men­tos a fim de melhorá-​la para for­mar e qual­i­ficar os cidadãos que farão o país se desenvolver.

Não existe “pro­jeto de nação” sem a com­preen­são de que sem uma pop­u­lação edu­cada e qual­i­fi­cada para o tra­balho nos vários ramos das ciên­cias e das tec­nolo­gias.

Os gov­er­nos munic­i­pais, estad­u­ais e fed­eral pre­cisam com­preen­der que inve­stir cor­re­ta­mente na edu­cação não é um favor para a cri­ança ou seus pais, pelo con­trário, muito mais do que as cri­anças e jovens pre­cis­arem de uma boa edu­cação e qual­i­fi­cação, quem, efe­ti­va­mente, pre­cisam delas bem edu­cadas e qual­i­fi­cadas, são os municí­pios, são os esta­dos, é o país.

Edu­cação de qual­i­dade não é um favor que se faz é uma neces­si­dade estratég­ica da nação. É isso que os gov­er­nantes brasileiros e mesmo os gestores edu­ca­cionais e até pro­fes­sores pre­cisam com­preen­der.

Infe­liz­mente, no Brasil, não cheg­amos ainda esse grau de com­preen­são.

Os gov­er­nantes brasileiros, não aten­tam que edu­cação pública de qual­i­dade não tem a ver com o filho do pobre virar doutor ou “ficar” com a vaga do filho do rico, e, sim, que os fil­hos de pobres e ricos bem edu­ca­dos trarão desen­volvi­mento para todos.

Sem com­preen­der que a edu­cação pública é o motor do desen­volvi­mento da nação, temos assis­tido ao longo das últi­mas décadas o seu desprestí­gio.

E vejam que temos investido muito na edu­cação pública – não sei se o sufi­ciente –, mas, acred­ito que tais inves­ti­men­tos não estão sendo feitos “den­tro de um pro­jeto de nação”.

Tanto assim, que os pais das cri­anças sem­pre que pos­suem qual­quer “folga” finan­ceira tiram os fil­hos da rede pública para colocá-​los em uma escola pri­vada, mesmo que medi­ana. O inverso até existe, mas ape­nas como exceção a jus­ti­ficar a regra.

Nestes mais vinte e cinco anos em que tra­balho na advo­ca­cia pública nunca vi tan­tas cam­pan­has de “busca ativa” para a edu­cação quanto estou assistindo agora. Lou­vável que façam isso, mas essa busca ativa deve vir acom­pan­hada de uma política edu­ca­cional que torne a escola pública atra­tiva para as cri­anças e ado­les­centes.

Uma per­gunta se faz necessária: se a escola pública não pos­sui uma estru­tura física tão defi­ciente, se os pro­fes­sores e fun­cionários são até mel­hor remu­ner­a­dos que os da rede pri­vada, por que os pais, sem­pre que podem, pref­erem pagar para ter os fil­hos na escola pri­vada e não na escola pública? O que falta à rede pública?

São per­gun­tas per­ti­nentes, uma vez que, se o ensino brasileiro encontra-​se com uma década de atraso em relação aos mel­hores cen­tros mundi­ais, pelo seu desprestí­gio ao longo dos anos, imag­i­namos que o atraso da rede pública seja ainda maior.

Acred­ito que den­tro de uma política de Estado que con­sidere a edu­cação pública como vetor do desen­volvi­mento da nação, uma das primeiras medi­das a serem ado­tadas é bus­car fer­ra­men­tas edu­ca­cionais que igualem em qual­i­dade as duas redes: pública e pri­vada.

Essa igual­dade deve ser “perseguida” já nos primeiros con­tatos da cri­ança com a escola: nos três primeiros anos (mater­nal) e nos anos ini­ci­ais do fun­da­men­tal. É nessa fase da vida da edu­cação que têm iní­cio as desigual­dades entre as redes e que jamais o aluno da escola pública con­segue ultra­pas­sar o aluno da rede pri­vada, salvo, tam­bém, as exceções.

Um exem­plo clás­sico do que falo diz respeito ao ensino de lín­gua estrangeira, enquanto na rede pri­vada, já no mater­nal a cri­ança é edu­cada em pelo menos dois idiomas, na rede pública o ensino de outro idioma só é obri­gatório a par­tir do sexto ano.

Vejam, em ape­nas uma “fer­ra­menta de apren­diza­gem” a rede pública de ensino, que dev­e­ria ser o “motor” do desen­volvi­mento da nação começa com OITO ANOS de desvan­tagem.

Uma desvan­tagem jus­ta­mente nos mel­hores anos para o desen­volvi­mento das habil­i­dades cog­ni­ti­vas da cri­ança.

Ainda em relação ao exem­plo acima, tal desvan­tagem não será cor­rigida nos anos seguintes, entre os vários fatores, as fer­ra­men­tas que a rede pública disponi­bi­liza não con­sid­era o tempo que já foi per­dido e por isso mesmo são inad­e­quadas.

O resul­tado é que numa pop­u­lação de 215 mil­hões de cidadãos ape­nas 5% (cinco por cento) tem algum con­hec­i­mento de lín­gua estrangeira e ape­nas UM POR CENTO tem fluên­cia.

A con­se­quên­cia disso é que Brasil não “fala” a lín­gua dos investi­dores estrangeiros que gostaria de atrair. Somos um país monoglota, com uma edu­cação clau­di­cante e mão de obra desqual­i­fi­cada.

Estes são prob­le­mas que os nos­sos con­cor­rentes asiáti­cos não enfrentam. Desde cedo com­preen­deram e trataram a edu­cação como política de Estado e vetor do cresci­mento da econo­mia da região.

Impen­sável alcançar o pata­mar de desen­volvi­mento econômico que alcançaram sem essa com­preen­são.

O Brasil pre­cisa encarar a edu­cação pública como uma política de Estado, um vetor para o desen­volvi­mento econômico e bem-​estar social; pre­cisa ele­var o nível do ensino como um todo e tornar igual­itária a edu­cação, pelo topo, em todo o ter­ritório nacional.

Igua­lando a edu­cação nacional bus­care­mos a igualá-​la as mel­hores do mundo.

O começo dessa “rev­olução” é pelo ensino fun­da­men­tal, que deve­mos torná-​lo uni­forme em todo o ter­ritório nacional, com as fer­ra­men­tas necessárias ao pleno desen­volvi­mento de todos.

Deve­mos ter na mente uma coisa: ofer­e­cendo condições iguais a todos ter­e­mos legit­im­i­dade para cobrar as razões do sucesso e do fra­casso de cada um.

Abdon C. Mar­inho é advo­gado.

O assas­si­nato das carpas do imper­ador e out­ros delitos.

Escrito por Abdon Mar­inho


O ASSAS­SI­NATO DAS CARPAS DO IMPER­ADOR E OUT­ROS DELI­TOS.

Por Abdon C. Marinho*.

COMO faço todos os finais de sem­anas e feri­ados, mais cedo me ocu­pei da agradável tarefa de ali­men­tar as carpas que crio no sítio há cerca de seis anos. Ali­men­tar, diz-​se por força de expressão, há todo um rit­ual que começa por chamá-​las para a refeição (da manhã ou da tarde), que elas aten­dem des­barata “car­reira”; depois me sento em uma cadeira ou no chão e começo a jogar a ração de um lado e de outro do laguinho e vou “con­ver­sando” com elas. O “rit­ual” dura quase meia hora, às vezes, até mais.

As carpas são peixes inteligentes, capazes de recon­hecer as pes­soas, quando apare­cem alguém estranho perto do lago elas “fogem” para um canto mais dis­tante do lago, mesmo chamando-​as e sendo horário da “refeição”, relu­tam em apare­cer; são solidárias. Certa vez, uma delas se machu­cou – foi dá um salto mais alto e caiu de mal jeito, enfrentando difi­cul­dades para nadar –, e, enquanto as ali­men­tava, um barulho estranho ou a pre­sença de outra pes­soa, as fez “cor­rer” para o escon­der­ijo, restando ape­nas aquela que se encon­trava machu­cada. Não demorou muito e avis­tei duas delas voltando e se colo­cando lado a lado com a que estava machu­cada servindo de “escolta” e a con­duzindo para onde estavam as out­ras.

Já reg­istrei diver­sos episó­dios que ates­tam a inteligên­cia, sen­si­bil­i­dade e até memória “dos meni­nos”, por exem­plo, além de me recon­hecerem, já recon­hecem e lem­bram dos meus sobrin­hos, emb­ora demorem sem­anas ou meses entre uma visita e outra.

Vez ou outra algum amigo gaiato per­gunta comenta que as min­has carpas já estão no ponto de uma “caldeirada”. Nes­tas opor­tu­nidades per­gunto se não pode ir até o porto da Raposa com­prar uma pescada amarela.

Cuidadas, ali­men­tadas e man­ti­das as condições nor­mais de oxi­ge­nação da água, as carpas podem viver cerca de cem anos – e até mais.

Estava envolto no “rit­ual” quando assaltou-​me a lem­brança do “assas­si­nato” das carpas do Alvo­rada ocor­rido quase que de forma simultânea à “troca de comando” na cap­i­tal da República.

As “carpas do imper­ador” ocu­pavam o espelho d’água do Palá­cio da Alvo­rada há quase quarenta anos – o que prova sua longev­i­dade –, e foi um pre­sente do lendário imper­ador Hiro­hito, que viveu entre 1901 e 1989 – o 124º imper­ador japonês reinou de 1926 até sua morte, em 1989, tendo sido a teste­munha priv­i­le­giada dos prin­ci­pais acon­tec­i­men­tos do século pas­sado –, em recon­hec­i­mento e como votos de boa sorte aquela nova etapa política da vida nacional ini­ci­ada com a eleição da chapa Tan­credo Neves/​José Sar­ney, em 1985.

Guardo com muito apreço os pre­sentes que ganho. Tenho-​os como um “pedaço ima­te­r­ial” daquela pes­soa comigo. Quando os olho ou uso algum deles é uma opor­tu­nidade para lem­brar aque­las pes­soas, aque­las cir­cun­stân­cias em que fui agra­ci­ado. Por exem­plo, há mais de duas décadas o saudoso amigo, jor­nal­ista Wal­ter Rodrigues que deixou esse plano em 2010, presenteou-​me com dois jogos de taças para vinho em cristais. Quando aparece uma cir­cun­stân­cia espe­cial que exija um vinho para comem­o­rar, peço que peguem na cristaleira as “taças de WR” e digo: “— essas taças foram um pre­sente do querido amigo Wal­ter Rodrigues, tomemos este vinho tam­bém em sua hom­e­nagem”. Aproveito, ainda, para con­tar episó­dios da amizade em comum ou das opiniões que tinha sobre alguns assun­tos.

Assim, imag­ino que as carpas que foram doadas pelo então imper­ador do Japão há quase quarenta anos ao Brasil têm sig­nifi­cado histórico. Um pre­sente para durar por sécu­los, com toda sua sim­bolo­gia. Um imper­ador lendário, de uma nação amiga e que já não se encon­tra entre nós, deu-​nos carpas, naquele momento histórico, um sím­bolo da força, per­sistên­cia, bravura e sucesso – tudo pré­cisá­va­mos e pre­cisamos. As carpas trazem ainda uma outra sim­bolo­gia, elas crescem de acordo com o ambi­ente em que vivem. Sig­nif­i­cando que, tam­bém, as pes­soas podem “crescer” con­forme o ambi­ente em que estão inseri­das, não fisi­ca­mente, mas nos planos emo­cional, espir­i­tual e int­elec­tual.

Como cri­ador, imag­ino o tra­balho que foi o trans­porte de quase uma cen­tena de carpas do Japão para o Brasil, tendo que man­ter as condições ideais de oxi­ge­nação da água durante todo o voo.

Chegando aqui tiveram que adaptar-​se as difer­enças de tem­per­atura. Ainda assim, por quase quarenta anos sobre­viveram a tudo, até mesmo as incon­veniên­cias dos tur­is­tas.

Só não resi­s­ti­ram às hor­das de Huno que ocu­param o poder nos últi­mos anos.

Con­trataram uma empresa “espe­cial­izada” que achou opor­tuno esvaziar o espelho d’água e reti­rar toda “biolo­gia” dos peixes, só falta dizer que para man­ter o espelho “limpo” resolveram colo­car água clo­rada no mesmo.

Pior mesmo, só a ilação de que a “moti­vação” para a “limpeza” foi o inter­esse em cole­tar as moedas que os tur­is­tas lançam por lá.

Não entendi que tipo de limpeza fazia-​se necessária no espelho d’água. Aqui, a única coisa que faze­mos é man­ter uma camada de cas­calho de rio no fundo do lago, um sis­tema de fil­tragem com fil­tros e com aguapés e a reti­rada da fol­has que caem diari­a­mente. Vez ou outra, quando não chove, colo­camos um pouco de água do poço para repor as per­das pela evap­o­ração ou de algum vaza­mento, e só.

A falta de zelo pelas carpas do imper­ador Hiro­hito e toda sua sig­nifi­cação ape­nas rev­e­lam a ignorân­cia das autori­dades brasileiras. Não con­hecem o ele­men­tar de história; não sabem o que sig­nifica uma troca de pre­sentes; não têm nen­hum respeito pelos ani­mais ou pela flora.

Decerto pen­saram que o pre­sente do imper­ador: “eram ape­nas peixes”.

A mesma falta de zelo que resul­tou na morte de diver­sas emas que habitam o mesmo palá­cio e que têm como função precípua a manutenção do equi­líbrio ecológico, com a redução do número de inse­tos que infes­tam o ambi­ente. Os “hunos” não zelam nem pelos ani­mais que zelam por eles.

Os maus-​tratos aos ani­mais, para a des­graça dos humanos, não ceifam ape­nas as carpas do imper­ador do Japão, as emas que equi­li­bram o ambi­ente nas residên­cias ofi­ci­ais, pelo con­trário se espal­ham por todo o país. São as queimadas sem con­t­role, o des­mata­mento sem trégua, a con­t­a­m­i­nação dos rios, o lixo jogado nos oceanos …

Aqui mesmo, na ilha do Maran­hão, uma cena me entris­tece diari­a­mente, pelo menos duas vezes ao dia.

Nas três rodovias que pego para chegar ao tra­balho todos os dias, me deparo com uma “pro­cis­são” de ani­mais vagando sem rumo, sem donos e sem cuida­dos, pas­sando fome, sede e sendo mal­trata­dos. São jumen­tos de várias idades, são bur­ros, cav­a­los, são cães, são gatos. Muitos com as patas machu­cadas, que­bradas, com diver­sas esco­ri­ações ou doentes mesmo. É um sofri­mento sem fim.

As autori­dades estad­u­ais e dos municí­pios “fingem-​se” de cegos ou que não pos­suem qual­quer respon­s­abil­i­dade com o assunto.

O Min­istério Público Estad­ual, que cer­ta­mente pos­sui algum setor espe­cial­izado para o tema, parece não se inco­modar com o sofri­mento dos ani­mais; out­ras enti­dades da sociedade civil, a OAB, inclu­sive, dão o silên­cio como respostas.

Um silên­cio ensur­de­ce­dor a con­trastar com a dor e o sofri­mento das cen­te­nas de ani­mais que vagam sem des­tino.

Ninguém se move para fazer algo, ninguém se move para cobrar que façam.

Até quando?

Abdon C. Mar­inho é advo­gado.

A fome, a doença, a ganân­cia e o crime.

Escrito por Abdon Mar­inho


A FOME, A DOENÇA, A GANÂN­CIA E O CRIME.

Por Abdon C. Marinho.

A FOME sem­pre me foi um tema per­tur­bador. Talvez ter sido cri­ado como “Deus cria batatas na beira do rio”, na inse­gu­rança da orfan­dade desde os cinco anos de idade, tenha influ­en­ci­ado neste sen­ti­mento.

Quando tra­bal­hei na Assem­bleia Leg­isla­tiva (1991÷1995) como chefe de gabi­nete do dep­utado estad­ual Juarez Medeiros, sem­pre me cha­gavam pedi­dos de toda ordem. Não sei se ainda é assim, mas no tempo em que a Casa do Povo fun­cionava na Rua do Egito e o acesso dos cidadãos era mais fácil, está­va­mos a dez met­ros de ser­mos sur­preen­di­dos com algum pedido. Uma indús­tria de ped­intes profis­sion­ais que viviam pas­sando de gabi­nete em gabi­nete ten­tando con­seguir alguma coisa.

Como chefe de gabi­nete, os pedi­dos chegavam para eu resolver, até já des­tiná­va­mos uma quan­tia todo mês com essa final­i­dade.

Certa vez, um cidadão que não con­hecia minha fama de pos­suir boa memória ten­tou aplicar-​me um golpe – e con­seguiu, ao menos em cinquenta por cento.

O indig­i­tado chegou no gabi­nete com uma con­versa “bonita”, porém, triste: pre­cisava ir a deter­mi­nado inte­rior porque sua mãe mor­rera naquele dia, que­ria o din­heiro da pas­sagem e ainda uma ajuda para o velório/​enterro.

Sen­si­bi­lizado diante de uma tragé­dia que con­hecia bem, não demorei a acudi-​lo, peguei o recurso do “fundo de reserva” e o ajudei.

Não se pas­saram seis meses – acred­ito que por ter­mos mudado de gabi­nete –, lá estava o mesmo cidadão diante de mim con­tanto a mesma história: — sabe, sen­hor, minha mãe mor­reu hoje, pre­ciso ir com urgên­cia para o velório, aju­dar no enterro, etc. Para ten­tar aumen­tar a empa­tia, ainda com­ple­tou: — sei que o dep­utado Juarez é uma pes­soa de bom coração, você é irmão dele, não é? Como gente feia é tudo pare­cida, na época cor­ria o boato que eu seria irmão do dep­utado.

Mal ter­mi­nou sua falação, o atal­hei: — meu amigo, não sei quan­tos pais você tem, se tem mais de um ou nen­hum, mas mãe só se tem uma e a sua, ajudei a “enterrá-​la” não tem seis meses.

O cidadão riu amarelo e saiu para ten­tar aplicar o golpe noutro gabi­nete ou para rua.

Já o mesmo tirocínio nunca tive quando o cidadão diz que pre­cisa de ajuda para com­prar comida, para si, ou para os fil­hos menores. Me “gan­ham” todas. Basta dizer: — oh, doutor saí de casa cedo a procura de tra­balho e não deixei nada para as cri­anças com­erem.

Muitas das vezes a con­versa tem “cara” de golpe, “cheiro” golpe e todos os demais pred­i­ca­dos de que se trata de um golpe, mas acabo “caindo”. Sem­pre penso: “e se for ver­dade, se de fato tem uma ou mais cri­ança pas­sando fome?”.

Agora com essa pro­fusão de redes soci­ais, méto­dos de paga­men­tos, os pedidos/​golpes vem pelo celu­lar e as trans­fer­ên­cias via pix.

Parto do princí­pio de que é prefer­ível ser o alvo dos pedi­dos de ajuda – golpes ou não –, do que pre­cisar da ajuda de out­rem.

Pois bem, feitas tais con­sid­er­ações, devo dizer – ou con­fes­sar –, que as ima­gens dos indí­ge­nas ianomâmis esquáli­dos, lit­eral­mente “mor­tos de fome”, já pas­sa­dos tan­tos dias desde que divul­gadas pela primeira vez, não me saem da cabeça.

São cen­te­nas – talvez mil­hares –, de indí­ge­nas mor­tos pela fome ou doenças cau­sadas por ela ou pela con­t­a­m­i­nação dos seus recur­sos nat­u­rais ren­ováveis. Crimes cometi­dos con­tra um povo que não poderão ficar impunes.

Nos últi­mos anos órgãos públi­cos, do próprio gov­erno, aler­taram aos man­datários eleitos para cuidar do povo, para o avanço dos garim­pos ile­gais em áreas indí­ge­nas.

Tais aler­tas apon­tavam para o acréscimo de mil­hares e mil­hares de hectares de garim­pos ile­gais. Out­ros aler­tas, para a con­t­a­m­i­nação dos rios pelo mer­cúrio e até mesmo para o fato dos indí­ge­nas já estarem mor­rendo em decor­rên­cia disso.

Não vejo como a Polí­cia Fed­eral terá difi­cul­dades em iden­ti­ficar os respon­sáveis, os lenientes e os omis­sos em tais situ­ações.

O INPE o IBAMA e out­ros órgãos, desde sem­pre aler­taram para o aumento do des­mata­mento, para o surg­i­mento de inúmeros garim­pos ile­gais e depois, out­ros órgãos, foram aler­tando para as con­se­quên­cias decor­rentes.

O que fiz­eram os “supos­tos” respon­sáveis? Demi­ti­ram os diri­gentes dos órgãos, proibi­ram a emis­são de mul­tas, proibi­ram o com­bate as ativi­dades ile­gais, “sucatearam” os órgãos públi­cos e fiz­eram pouco caso das con­se­quên­cias.

Foi assim desde o iní­cio do gov­erno que findou.

A cada denún­cia de crime ambi­en­tal cometido, uma enx­ur­rada de fake news para desqual­i­ficar os denun­ciantes – ainda que fos­sem infor­mações ofi­ci­ais de órgãos públi­cos, do próprio governo.

Agora mesmo, diante das ima­gens chocantes que mais se assemel­ham às fotografias em preto-​e-​branco tiradas nos abom­ináveis Cam­pos de Con­cen­tração da Segunda Guerra Mundial, ten­tam fazer pouco caso, igno­rar, dizer que são “índios impor­ta­dos da Venezuela”, poli­ti­zar e fin­gir que nada têm com o caso.

Agora mesmo, o site UOL traz a infor­mação de que doc­u­men­tos ofi­ci­ais já cobravam providên­cias para o Min­istério da Justiça e da Cidada­nia desde mea­dos de 2021 em relação a situ­ação nutri­cional dos povos indí­ge­nas. E não foi ape­nas uma única vez, mas diver­sas, e o que fiz­eram as autori­dades? Igno­raram.

E a denún­cia do site é mais grave: segundo ele (site), emb­ora sabendo o que se pas­sava o gov­erno “cor­tou” os ali­men­tos que dev­e­riam ser envi­a­dos aos povos ianomâmis.

Os respon­sáveis, as cadeias de comando dos crimes cometi­dos é de fácil com­preen­são e elu­ci­dação.

O que pre­cisa ser com­pro­vado de forma incon­tro­versa é se os atos crim­i­nosos cometi­dos con­tra os povos indí­ge­nas tiveram o propósito delib­er­ado de exterminá-​los, ou seja, se a ideia era come­ter o genocí­dio. Caso afir­ma­tivo, quem ide­al­i­zou, con­cor­reu, teve ati­tude comis­si­vas ou omis­si­vas em relação ao que estava acon­te­cendo.

Con­forme já ampla­mente divul­gado nos meios de comu­ni­cação, inúmeros “reli­giosos” com acesso aos cic­los do poder, “vagaram” por garim­pos ile­gais ofer­e­cendo van­ta­gens e cobrando qui­los de ouro em troca, fazendo o mesmo em relação a out­ros trâmites de gov­er­na­men­tais; é fato que nos últi­mos anos nen­huma ativi­dade ile­gal seja de des­mata­mento – em ter­ras indí­ge­nas ou não –, seja garim­pagem ile­gal, sofreu qual­quer repressão efe­tiva, tanto assim que cresceu mil­hares e mil­hares de vezes em ter­mos per­centu­ais; é fato, segundo o próprio gov­erno, que mais de um bil­hão de reais foram repas­sa­dos a enti­dades reli­giosas para ali­men­tar e cuidar da saúde dos índios e que medica­men­tos e ali­men­tos foram parar nos garim­pos ile­gais.

Não cabe qual­quer dúvida de que crimes (inúmeros) foram cometi­dos em decor­rên­cia da ganân­cia e que tiveram como con­se­quên­cia, as doenças, a fome e à morte de um povo,

Aos inves­ti­gadores caberá delim­i­tar a respon­s­abil­i­dade de cada um, o dolo de forma comis­si­vas e omis­si­vas dos vários agentes, públi­cos ou não.

O seg­redo é saber inves­ti­gar.

Aos que preferi­ram os “bez­er­ros de ouro” ao estrito cumpri­mento da palavra de Deus, a hora de prestar con­tas talvez chegue mais rápido do que pen­saram.

Abdon C. Mar­inho é advo­gado.