NA DEFESA DE UMA EDUCAÇÃO IGUALITÁRIA.
Por Abdon C. Marinho*.
DESDE tempos imemoriais que sabemos ser a educação a chave do sucesso. Não apenas do sucesso individual, como, também, do sucesso coletivo. Uma sociedade educada tem tudo para progredir e alcançar o bem-estar para todos.
Ainda pequeno lembro do meu pai dizer que me daria algo que ninguém jamais iria tomar: a educação. E, matriculou-me numa escola. Primeiro na escolinha do nosso povoado, uma casinha de latada; depois no Unidade Integrada Aldenora Belo, já na sede no município e na Unidade Integrada Castelo Branco, onde conclui o que hoje seria o fundamental anos iniciais; depois veio o Colégio Bandeirante, onde fiz os anos finais do fundamental; o ensino médio já no Liceu Maranhense e, por fim, o curso de Direito na Universidade Federal do Maranhão– UFMA.
Já contei esse breve roteiro da minha vida estudantil diversas vezes, bem como, que foi a educação que, literalmente, me tirou da “roça”, a mim e aos meus irmãos e/ou do garimpo para onde me sugeriu que fosse um amigo quando tinha cerca de 12 anos – para pedir esmolas.
Se a educação impacta de forma tão positiva a vida de uma criança, adolescente e jovens, as ações coordenadas de governos têm o condão de modificar a história de nações inteiras.
Foi o que ocorreu com as nações chamadas “tigres asiáticos” (Cingapura, Coreia do Sul, Hong Kong e Taiwan).
Qualquer um com estudos básicos de história sabe que até a primeira metade do século passado essas nações eram paupérrimas e que viviam basicamente de uma agricultura de subsistência em diminutos territórios e sem quaisquer recursos naturais. Sabe, também, que dentre os vários fatores que contribuíram com o desenvolvimento das mesmas “reina” a educação, fazendo com que tenham uma mão de obra altamente qualificada.
Sem tal condição, poderiam despejar ouro nas ruas e ainda assim não teriam avançado um palmo sequer.
Essa mesma compreensão influenciou o surgimento dos chamados “novos tigres asiáticos”, grupo constituído por Filipinas, Indonésia, Tailândia, Malásia, Vietnã, também países sem recursos naturais significativos.
Basta um simples exame de fotografia do que eram esses países há cerca de 60 anos e como estão hoje para percebermos o quanto se desenvolveram no período.
Logo, não restam dúvidas que o atraso econômico do Brasil encontra-se diretamente relacionado à baixa qualidade da nossa educação e por consequência do despreparo da nossa mão de obra.
Qualquer cidadão pode constatar isso nas coisas mais corriqueiras. Basta precisar de um bom pedreiro, um bom marceneiro, um bom eletricista. Não encontramos. Pedimos recomendação a um e outro quando a necessidade se torna premente.
Dizem que o que “atravanca” o desenvolvimento do país à atração de investimentos estrangeiros é o “custo Brasil”, o excesso de regulação trabalhista, etc.
Claro que isso tem um peso, mas penso que todas essas circunstâncias seriam absorvidas pelo capitalismo se tivéssemos uma população com educação de ponta e mão de obra qualificada, isso se reverteria em produtividade e o capital “daria seus pulos” para não perder.
Vejam a tragédia anunciada que nos encontramos: enquanto as nações chamadas “tigres asiáticos” cresceram um “absurdo” em sessenta anos, o Brasil, segundo estudos científicos, levará sessenta anos para “corrigir” uma década de atraso educacional em relação aos centros mais avançados.
Isso, se começarmos a fazer alguma coisa no sentido de corrigir a distorção imediatamente.
Como iremos alavancar o crescimento do país, atrair capital estrangeiro, aproveitar com racionalidade e segurança nossos recursos, sem uma educação de ponta, sem mão de obra qualificada e, sem, sequer, “falar a língua” dos investidores?
Desde sempre me interesso por educação e, nos últimos tempos, até por questões profissionais, tenho me interessado muito mais.
Nas minhas reflexões sobre o assunto entendi que o “motor” do desenvolvimento de qualquer nação chama-se educação pública. É nela, na educação pública, que devem se concentrar os investimentos a fim de melhorá-la para formar e qualificar os cidadãos que farão o país se desenvolver.
Não existe “projeto de nação” sem a compreensão de que sem uma população educada e qualificada para o trabalho nos vários ramos das ciências e das tecnologias.
Os governos municipais, estaduais e federal precisam compreender que investir corretamente na educação não é um favor para a criança ou seus pais, pelo contrário, muito mais do que as crianças e jovens precisarem de uma boa educação e qualificação, quem, efetivamente, precisam delas bem educadas e qualificadas, são os municípios, são os estados, é o país.
Educação de qualidade não é um favor que se faz é uma necessidade estratégica da nação. É isso que os governantes brasileiros e mesmo os gestores educacionais e até professores precisam compreender.
Infelizmente, no Brasil, não chegamos ainda esse grau de compreensão.
Os governantes brasileiros, não atentam que educação pública de qualidade não tem a ver com o filho do pobre virar doutor ou “ficar” com a vaga do filho do rico, e, sim, que os filhos de pobres e ricos bem educados trarão desenvolvimento para todos.
Sem compreender que a educação pública é o motor do desenvolvimento da nação, temos assistido ao longo das últimas décadas o seu desprestígio.
E vejam que temos investido muito na educação pública – não sei se o suficiente –, mas, acredito que tais investimentos não estão sendo feitos “dentro de um projeto de nação”.
Tanto assim, que os pais das crianças sempre que possuem qualquer “folga” financeira tiram os filhos da rede pública para colocá-los em uma escola privada, mesmo que mediana. O inverso até existe, mas apenas como exceção a justificar a regra.
Nestes mais vinte e cinco anos em que trabalho na advocacia pública nunca vi tantas campanhas de “busca ativa” para a educação quanto estou assistindo agora. Louvável que façam isso, mas essa busca ativa deve vir acompanhada de uma política educacional que torne a escola pública atrativa para as crianças e adolescentes.
Uma pergunta se faz necessária: se a escola pública não possui uma estrutura física tão deficiente, se os professores e funcionários são até melhor remunerados que os da rede privada, por que os pais, sempre que podem, preferem pagar para ter os filhos na escola privada e não na escola pública? O que falta à rede pública?
São perguntas pertinentes, uma vez que, se o ensino brasileiro encontra-se com uma década de atraso em relação aos melhores centros mundiais, pelo seu desprestígio ao longo dos anos, imaginamos que o atraso da rede pública seja ainda maior.
Acredito que dentro de uma política de Estado que considere a educação pública como vetor do desenvolvimento da nação, uma das primeiras medidas a serem adotadas é buscar ferramentas educacionais que igualem em qualidade as duas redes: pública e privada.
Essa igualdade deve ser “perseguida” já nos primeiros contatos da criança com a escola: nos três primeiros anos (maternal) e nos anos iniciais do fundamental. É nessa fase da vida da educação que têm início as desigualdades entre as redes e que jamais o aluno da escola pública consegue ultrapassar o aluno da rede privada, salvo, também, as exceções.
Um exemplo clássico do que falo diz respeito ao ensino de língua estrangeira, enquanto na rede privada, já no maternal a criança é educada em pelo menos dois idiomas, na rede pública o ensino de outro idioma só é obrigatório a partir do sexto ano.
Vejam, em apenas uma “ferramenta de aprendizagem” a rede pública de ensino, que deveria ser o “motor” do desenvolvimento da nação começa com OITO ANOS de desvantagem.
Uma desvantagem justamente nos melhores anos para o desenvolvimento das habilidades cognitivas da criança.
Ainda em relação ao exemplo acima, tal desvantagem não será corrigida nos anos seguintes, entre os vários fatores, as ferramentas que a rede pública disponibiliza não considera o tempo que já foi perdido e por isso mesmo são inadequadas.
O resultado é que numa população de 215 milhões de cidadãos apenas 5% (cinco por cento) tem algum conhecimento de língua estrangeira e apenas UM POR CENTO tem fluência.
A consequência disso é que Brasil não “fala” a língua dos investidores estrangeiros que gostaria de atrair. Somos um país monoglota, com uma educação claudicante e mão de obra desqualificada.
Estes são problemas que os nossos concorrentes asiáticos não enfrentam. Desde cedo compreenderam e trataram a educação como política de Estado e vetor do crescimento da economia da região.
Impensável alcançar o patamar de desenvolvimento econômico que alcançaram sem essa compreensão.
O Brasil precisa encarar a educação pública como uma política de Estado, um vetor para o desenvolvimento econômico e bem-estar social; precisa elevar o nível do ensino como um todo e tornar igualitária a educação, pelo topo, em todo o território nacional.
Igualando a educação nacional buscaremos a igualá-la as melhores do mundo.
O começo dessa “revolução” é pelo ensino fundamental, que devemos torná-lo uniforme em todo o território nacional, com as ferramentas necessárias ao pleno desenvolvimento de todos.
Devemos ter na mente uma coisa: oferecendo condições iguais a todos teremos legitimidade para cobrar as razões do sucesso e do fracasso de cada um.
Abdon C. Marinho é advogado.