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CRÔNICA DE UMA MORTE NÃO ANUNCIADA.

Escrito por Abdon Mar­inho

CRÔNICA DE UMA MORTE NÃO ANUNCIADA.

FRAN­CISCO Edinei Lima Silva, cidadão bar­ra­cor­dense ou cordino (con­forme o gosto do freguês) com cerca de 40 anos, não imag­i­nava que cam­in­hava para a morte ao sair de casa por volta do meio-​dia para com­prar um carvãoz­inho e dar con­tinuidade ao chur­rasco de domingo.

Envolvido num aci­dente de trân­sito com um moto­ci­clista foi preso e jogado no “cas­tigo” da del­e­ga­cia de polí­cia daquela urbe.

Aqui começa a tragé­dia. O tal cas­tigo da del­e­ga­cia é uma espé­cie de gaiola local­izada nos fun­dos do pré­dio sujeito às intem­péries climáti­cas. Quem fica lá tem que aguen­tar a chuva, o vento, o sol.

Con­siderando que os meses de agosto, setem­bro e out­ubro são os mais quentes do ano em Barra do Corda – e em toda região cen­tral do estado –, com a tem­per­atura chegando, facil­mente, a 40º, não é difí­cil con­cluir que alguém colo­cado num ambi­ente destes com o sol a pino, está, ver­dadeira­mente, sub­metido à infamante prática de tortura.

Segundo, ainda, me infor­mam ami­gos daquela cidade, famil­iares apelaram inúmeras vezes às autori­dades poli­ci­ais para que o reti­rassem daquela situ­ação e estas autori­dades fiz­eram ouvi­dos moucos.

Ape­nas, no dia seguinte, quando o rapaz entrou em con­vul­são, com espumas saindo pela boca, alguém assumiu a respon­s­abil­i­dade de man­dar tirá-​lo da cela por sua conta e risco, mas já era tarde e o rapaz já chegou morto ao hospital.

Disseram-​me que até a mãe do cidadão, fez “ape­los de mãe”, tal qual Maria fez por Jesus na Via Cru­cis, e de nada lhes valeram os ape­los ou lágrimas.

Dissseram-​me, mas custo a acred­i­tar, que ao prisioneiro/​custodiado sequer foi per­mi­tido que bebesse um copo d’água.

Alguém, com um senso qual­quer de humanidade, con­segue imag­i­nar um ser humano preso numa gaiola exposto ao sol a pino, com a tem­per­atura de 40º à som­bra sem dire­ito a uma sede d’água? Isso uma tarde inteira, uma noite inteira, até altas horas manhã do dia seguinte.

Acho que vi cenas assim, mas em filmes como “Conan, O Bár­baro” ou naquela série da fran­quia “Mad Max”, e ainda, naque­les que nar­ram as tor­turas nos primór­dios da civilização.

Causa-​me pavor saber que no Maran­hão, em pleno século 21, ainda ten­hamos que con­viver com cidadãos sofrendo esse tipo de inom­inável tor­tura, preso em gaiola, no sol quente.

Uma vio­lação con­sti­tu­cional gravíssima.

Está lá, logo no iní­cio do capí­tulo que trata dos dire­itos e garan­tias indi­vid­u­ais, no artigo 5º: “III — ninguém será sub­metido a tor­tura nem a trata­mento desumano ou degradante;”.

Alguma autori­dade deste estado é capaz de explicar como chamariam o recol­hi­mento de um cidadão em uma gaiola, exposto a inclemên­cia do sol da tarde, numa tem­per­atura de quarenta graus, sem dire­ito a uma sede d’água?

Se tiverem outro nome que não seja tor­tura, degradação, desumanidade, abuso, inom­inável ver­gonha, por favor, me ensinem.

Ainda pelas infor­mações que me chegaram, este rapaz era um cidadão de bem, tra­bal­hador, não sendo con­hecida qual­quer má con­duta que o desabonasse. Ainda que não fosse. Como podem agentes públi­cos, pagos com nos­sos impos­tos, pegar um ser humano, jogá-​lo numa gaiola nas condições nar­rada acima e sem dire­ito, sequer, de matar a sede?

Como é pos­sível jus­ti­ficar que alguém envolvido num aci­dente de trân­sito, ainda que com todas as agra­vantes, seja sub­metido a este tipo de tor­tura? Ainda que tivesse matado a mãe, chutado grávi­das na praça.

A ninguém, menos, ainda, ao Estado, é dado o dire­ito de torturar.

Evoluí­mos para o Estado da bar­bárie? É isso?

O que ocor­reu em Barra do Corda, um dos maiores municí­pios brasileiros, com cerca de 100 mil habi­tantes, não foi só uma vio­lação a ordem con­sti­tu­cional, aos trata­dos de dire­itos humanos, foi, tam­bém, uma ver­gonha para aque­les assumi­ram o com­pro­misso de não per­mi­tir que coisas deste tipo voltassem a ocorrer.

Se crit­i­cavam as rebe­liões que out­rora ocor­riam no presí­dio de Pedrin­has, onde mar­gin­ais pro­moviam decap­i­tações, aqui temos algo mais grave. Não foram mar­gin­ais que mataram o cidadão cus­to­di­ado, foram os agentes públi­cos. Foi a mão do Estado.

Ninguém – nem mesmo os que não con­hecem qual­quer coisa de dire­ito –, igno­ram a respon­s­abil­i­dade obje­tiva do Estado num caso como o ora narrado.

Entre­tanto, o que me deixa ver­dadeira­mente chocado, é saber que juízes, pro­mo­tores, del­e­ga­dos, defen­sores públi­cos, todos pes­soas da lei, pro­fun­dos con­hece­dores da Con­sti­tu­ição Fed­eral, dos trata­dos de dire­itos humanos, tin­ham e têm con­hec­i­mento deste tipo de cela de tor­tura, que remete aos primór­dios da civ­i­liza­ção, e nunca se mobi­lizaram para extir­par tamanha vergonha.

É triste, é ater­rador que con­sig­amos con­viver com tamanha bar­bari­dade e não nos indignar.

As autori­dades estatais não têm ape­nas o dever de apu­rar com máx­imo rigor – e punir com igual sev­eri­dade os cul­pa­dos –, têm, ainda, o dever moral de, pub­li­ca­mente, se des­cul­parem com os famil­iares e ami­gos da vítima, e com toda a sociedade cor­dina e do Maranhão.

O mín­imo que devem fazer as autori­dades – nem fale­mos na reparação pecu­niária dev­ida –, é, pub­li­ca­mente, se des­cul­parem. Tanto o secretário da pasta – que por muito menos dev­e­ria ser exon­er­ado –, quanto o sen­hor governador.

Farão isso? Não creio.

Os fatos ocor­ri­dos em Barra do Corda, pela intenção mesquinha de tor­tu­rar o preso cus­to­di­ado, chega a ser até mais grave que a desastrada oper­ação poli­cial ocor­rida em Bal­sas, no final de 2015, que viti­mou uma moça, e que, emb­ora os poli­ci­ais ten­ham sido denun­ci­a­dos por homicí­dio doloso, não temos notí­cias, até hoje, de nen­hum pedido de des­cul­pas ofi­cial por parte das autori­dades estatuais.

Não se des­cul­parem por fatos de tamanha gravi­dade, não é ape­nas ina­ceitável, é uma ver­gonha para todos os cidadãos de bem.

O mín­imo que nos devem as autori­dades é se des­cul­parem quando seus agentes come­tem taman­hos desatinos.

Este título: “Crônica de uma morte não anun­ci­ada”, o colo­quei, por não ser comum um cidadão sair de casa ape­nas com intenção de com­prar um carvão, uma carne, uma cerveja, para encer­rar o fim de sem­ana, envolver-​se num aci­dente, encon­trar o Estado e morrer.

Ele não esper­ava mor­rer, que­ria ape­nas ter­mi­nar o domingo com ale­gria e enfrentar mais uma sem­ana de labor. No meio do cam­inho, infe­liz­mente, encon­trou o Estado. Encon­trou a morte. Fim da crônica.

Abdon Mar­inho é advogado.

UM POUCO DE BOM SENSO AJUDARIA.

Escrito por Abdon Mar­inho

UM POUCO DE BOM SENSO AJUDARIA.

LOGO que ter­minei de escr­ever o texto “Sem Insti­tu­ições Será o Caos”, um amigo me alcança, por um destes aplica­tivos de celu­lar, para indagar-​me como estou vendo a sucessão no Tri­bunal de Justiça do Maranhão.

Após recomendar-​lhe que lesse o texto que acabara de pub­licar, lhe disse que, a princí­pio, achava fal­tar juízo a suas excelên­cias na con­dução do processo eleitoral.

Ape­sar do processo democrático, através de escol­has livres, ser sem­pre saudável, quando tais con­tendas descam­bam práti­cas que mais se pare­cem com dis­putas de várzea, todos per­dem, sobre­tudo a instituição.

Fui além ao pon­derar que mais impor­tante do que saber quem vai diri­gir a corte é evi­tar que ela se frag­ilize – ainda mais.

O texto sobre a crise nas insti­tu­ições nacionais trata jus­ta­mente disso, da forma e dos motivos pelas quais elas (insti­tu­ições) se frag­ilizaram a ponto de colo­car em risco a própria nação e a segu­rança da sociedade.

Prova disso é uma pesquisa recente que rev­ela o quanto é grave a crise de con­fi­ança da sociedade nas suas instituições.

Acred­ito, nunca vi tamanha rejeição.

Pior mesmo, só a avali­ação da classe política que ficou em último lugar entre os mais de 130 países pesquisados.

Assen­tei, ainda, ser o descrédito insti­tu­cional fruto, em parte, dos desac­er­tos indi­vid­u­ais de muitos dos seus mem­bros, mas não con­seguindo, as insti­tu­ições, nos últi­mos tem­pos se mostrarem supe­ri­ores a eles e, por isso mesmo, acabam por, como se diz pop­u­lar­mente, “pagar o pato”.

O que temos visto são questões menores acabarem con­t­a­m­i­nando o todo. E erros ou ati­tudes indi­vid­u­ais pas­sarem a ofus­car muitas das vir­tu­osas ini­cia­ti­vas das insti­tu­ições em favor da sociedade.

Uma das coisas que tor­nam as insti­tu­ições maiores que seus mem­bros e, por isso mesmo, mais imunes as ingerên­cias exter­nas ou aos desac­er­tos inter­nos provo­ca­dos pelos seus mem­bros, é a rig­orosos obser­vação das tradições internas.

Por tradição, entenda-​se as nor­mas não escritas – ou mesmo escritas – que obrigam e aos quais se obrigam os seus inte­grantes a observar.

Antiga­mente era cos­tume dizer – em relação ao STF –, que mesmo o mais rejeitado indi­cado antes da nomeação, virava uma “outra pes­soa”, pelo poder da cor­po­ração a que pas­sava a inte­grar. E este, pelo poder da toga, não se tor­nava “devedor”de ninguém.

Quando o inte­grante de uma insti­tu­ição ou Poder do Estado fala, ele, antes de tudo deve ter em mente que não fala ape­nas em seu nome – pelo menos é assim que a sociedade entende – daí a neces­si­dade de se obser­var deter­mi­nadas regras bási­cas de condutas.

Era a isso que deter­mi­nado ex-​presidente chamava de litur­gia do cargo.

Se se deixa de obser­var as litur­gias dos car­gos, e as nor­mas inter­nas (escritas ou não), da insti­tu­ição fatal­mente começarão a sur­gir as fissuras.

A preser­vação da higidez insti­tu­cional deve ser bus­cada a todo custo e deve prevale­cer sobre os inter­esses indi­vid­u­ais por mais bem inten­ciona­dos que estes estejam.

Um tri­bunal – qual­quer que seja ele, do Supremo aos Tri­bunais Estad­u­ais – não deve ceder aos mod­is­mos ou deixar de obser­var suas tradições inter­nas, pois é isso que os tor­nam maiores que seus integrantes.

Muito menos romper suas tradições por questões mínimas.

No caso da eleição para o TJMA vê-​se um con­flito, ao meu sen­tir, sem muito sen­tido, uma vez que daqui a dois anos, respeitada a tradição bicen­tenária, o pos­tu­lante de hoje tem asse­gu­rado o seu dire­ito de con­duzir o tri­bunal por um biênio.

Vi um estudo nos quais é mostrado que em seus mais de duzen­tos anos, ape­nas uma vez, e por opção daquele que teria o dire­ito a investidura no cargo de pres­i­dente, a tradição não foi mantida.

Em mais de duzen­tos anos pode se dizer que é uma tradição considerável.

E serve estas e out­ras tradições para evi­tar tri­bunais com alas, o que não inter­essa a ninguém. Menos ainda ao próprio tri­bunal e aos jurisdicionados.

Em tem­pos de crises – como os atu­ais –, o mel­hor para as insti­tu­ições, sobre­tudo, as lig­adas ao Poder Judi­ciário, é man­ter suas tradições e coesões inter­nas afastando-​se o máx­imo pos­sível de quais­quer ati­tudes e con­tendas que as levem à fis­suras internas.

Suas excelên­cias pre­cisam ter bas­tante atenção sobre as con­se­quên­cias do que está em curso no momento.

A rup­tura de uma tradição interna por qual­quer insti­tu­ição abre cam­inho para insta­bil­i­dade e para a rup­tura de diver­sas outras.

O que garante, por exem­plo, que futu­ra­mente se estenda o mandato ou que possa ficar por dois biênios con­sec­u­tivos? Ou mesmo mais de um não con­sec­u­tivos? O que impede, dora­vante, que qual­quer um passé a dis­putar o comando da corte?

Ah! dirão: o Reg­i­mento Interno.

Ora, qual­quer um sabe, que romp­ida uma norma ou tradição, basta que a maio­ria de ocasião mude o regimento.

Mesmo uma lei, que depende de aprovação leg­isla­tiva, basta que a maio­ria a aprove e encam­inhe ao par­la­mento e depois “cab­ulem» os votos dos sen­hores deputados.

A mudança de uma tradição como essa – com mais de duzen­tos anos –, exige uma pro­funda reflexão, sob pena de com­pro­m­e­ter o reg­u­lar fun­ciona­mento da corte e da própria Justiça.

Não se trata, uni­ca­mente, como querem fazer pare­cer, de uma eleição para direção da justiça estad­ual, onde pode­ria pen­der a bús­sola da escolha por esse ou aquele pre­tendente – que sabe­mos são igual­mente mere­ce­dores do encargo –, onde possa aflo­rar as prefer­ên­cias pessoais.

Se assim o fosse seria fácil.

Na ver­dade, está em curso uma mudança de rumos com con­se­quên­cias para o futuro e por isso mesmo exige, não ape­nas dos pos­tu­lantes, mas do seleto colé­gio de eleitores uma pro­funda reflexão sobre os seus desdobramentos.

Um pouco de juízo e bom senso aju­daria muito.

Abdon Mar­inho é advogado.

SEM INSTI­TU­IÇÕES SERÁ O CAOS.

Escrito por Abdon Mar­inho

SEM INSTI­TU­IÇÕES SERÁ O CAOS.

TORNOU-​SE lugar comum, dizer diante das crises em torno da política ou da econo­mia, que tudo vai bem pois as insti­tu­ições estão fun­cio­nando reg­u­lar­mente. Era assim.

O Brasil, depois de muito tempo, vive agora não uma crise política ou econômica, vive, sim, uma grave crise insti­tu­cional que poderá desdobra-​se para con­se­quên­cias que os mais lúci­dos não dese­jam: uma ditadura, uma republi­queta de bananas, o império da cor­rupção insti­tu­cional­izada ou out­ros males que os valha.

O que acon­te­cerá, por exem­plo, se o Senado Fed­eral – como se desenha –, vir a dizer que a Suprema Corte não pos­sui juris­dição sob os mem­bros do Con­gresso Nacional? Ou que as decisões emanadas daquela Corte não são vál­i­das para os seus mem­bros? O seu cole­giado Pleno dec­re­tará a prisão dos mem­bros do Con­gresso? Quem irá cumprir? Como irá cumprir? As Forças Armadas se por­tarão ao lado de qual Poder? Ou irá tomar para si o poder?

O Supremo Tri­bunal Fed­eral, por suas vez, não se sairá mel­hor caso resolva, ele próprio, des­fazer a decisão de sua Turma. E, o fazendo, pas­sará a ideia de que sucumbiu às pressões externas.

A quadra em que nos encon­tramos exige uma real pre­ocu­pação sobre os rumos em que país se encon­tra. Infe­liz­mente, as autori­dades, pen­sando mais nos seus inter­esses pes­soais que nas insti­tu­ições, deixaram que as coisas chegassem a esse ponto.

Outro dia a min­is­tra Car­men Lúcia, pres­i­dente do Supremo Tri­bunal Fed­eral, chamou a atenção para algo que, de tão nor­mal, não have­ria neces­si­dade: que as insti­tu­ições são maiores que seus integrantes.

Diria mais: são maiores que a soma de todos seus integrantes.

E, sendo-​as maiores que a soma de seus mem­bros faz-​se necessário o rigor na con­duta dos mes­mos de sorte a evi­tar que seus com­por­ta­men­tos ou inter­esses pes­soais acabem por «con­t­a­m­i­nar» as insti­tu­ições a ponto de fazer com que per­cam o respeito da sociedade e sua própria grandeza.

Noutras palavras, as insti­tu­ições pre­cisam de mecan­is­mos que as tornem imper­me­áveis aos “ataques» exter­nos – daque­les que as querem enfraque­cer na guerra con­stante pelo poder –, quanto interno, provo­cado pela desagre­gação dos seus membros.

Assis­ti­mos, não sem estar­rec­i­mento, min­istros crit­i­cando pub­li­ca­mente seus pares, incen­ti­vando o des­cumpri­mento de decisões judi­ci­ais ou o seu “des­faz­i­mento” pelo outro poder.

Esta­mos falando de um choque entre a mais alta Corte do País e o Senado Fed­eral, algo impen­sável e muito sério que deter­mi­nará os rumos da nação.

Diante de tudo isso, resta-​nos a con­clusão de que o Brasil encontra-​se longe da nor­mal­i­dade insti­tu­cional tão apregoada.

Em parte, essa crise se deve a medioc­ridade dos nos­sos homens públi­cos. Medioc­ridade que não se encon­tra restrita ape­nas aos políti­cos que elege­mos. Se o fosse, seria mais fácil, ela seria ven­cida pela for­t­aleza dos out­ros homens públi­cos das demais instituições.

A medioc­ridade alcança mag­istra­dos – mes­mos os das mais altas cortes – que se dão ao des­frute de falar mais pela imprensa do que pelos autos que jul­gam; que têm inter­esses pes­soais a serem sat­is­feitos por out­ros poderes a ponto de não acharem nada demais um min­istro da mais alta corte, em man­gas de camisa, despedir-​se de um dep­utado inves­ti­gado com “tap­in­has” nas costas ou rece­berem mimos de empresários; ou terem uma “renca» de par­entes nomea­dos – mesmo em car­gos de Estado – mais por influên­cia política do que por com­petên­cia profis­sional; ou que não se sen­tem con­strangi­dos em jul­garem proces­sos patroci­na­dos por escritórios de par­entes ou em saberem da rede de influ­en­cia de seus par­entes nos tri­bunais bon­dem atuam, numa troca de favores e favorec­i­men­tos que fazem corar, até mesmo, os mais notórios cor­rup­tos da nação.

Mas engana-​se os que pen­sam que essa geleia pútrida alcança ape­nas os dig­natários que foram eleitos ou nomea­dos por estes para atu­arem como seus pre­pos­tos nos poderes da nação ou nos seus min­istérios, nada me parece mais emblemático do caos em que vive­mos do que – o ainda pouco rev­e­lado – ocor­rido na Procu­rado­ria Geral da República.

O que vimos nesta escan­dalosa nego­ci­ação envol­vendo a JBS e os irmãos Batis­tas, talvez os maiores cor­rup­tos do Brasil (e por isso mesmo do mundo), foi que mem­bros do val­oroso Min­istério Público ced­eram aos encan­tos da cor­rupção, tombaram diante do din­heiro fácil, ainda, como sabido por todos – e prin­ci­pal­mente por eles –, obti­dos de for­mas ilíc­i­tas. E, não fos­sem eles próprios darem com as lín­guas nos dentes estariam todos usufruindo do exílio encan­tado em ter­ras estrangeiras des­fru­tando de todos os mimos que o din­heiro usurpado do povo é capaz de proporcionar.

Quem diria que pes­soas no topo de suas car­reiras, iriam sucumbir aos encan­tos do vil metal?

Vejam, o próprio ex-​procurador-​geral, o homem do bam­buzal de fle­chas certeiras, talvez, ainda tenha muito que se explicar sobre o muito que fez e a forma como fez. As sus­peitas são devastadoras.

E dirão: – mas ninguém pode ser cru­ci­fi­cado com base em suspeitas.

Mas é mais grave que isso: é impen­sável que um fis­cal da lei, a quem a Con­sti­tu­ição reser­vou um lugar de honra, seja sus­peito de con­du­tas incom­patíveis com as atribuições do cargo, com aux­il­iares próx­i­mos nego­ciando dos dois lados da mesa, e ele próprio sendo fla­grado em “pé sujo” com o advo­gado dos corruptores/​delatores.

Coin­cidên­cia, teria dito. Vai além, alguém na sua posição dev­e­ria ter ficado acima de qual­quer sus­peita, de qual­quer coin­cidên­cia. Há mais de 2 mil anos, o imper­ador Romano Júlio César já dizia que a mul­her de César não bas­tava ser hon­esta, mas, tam­bém, pre­cisava pare­cer honesta.

Se ape­nas um terço do que dizem ou insin­uam nos veícu­los de comu­ni­cação diver­sos tiver fundo de ver­dade, será algo digno de pena e de sofri­mento ao povo brasileiro.

A imagem que vem a minha mente é a de um xerife, que escu­d­ado pela estrela da lei, agia, nas noites sotur­nas, como chefe da quadrilha.

Quem nunca assis­tiu a um faroeste assim?

Então ficamos assim: um Pres­i­dente da República e seus min­istros mais próx­i­mos, respon­dendo a sua segunda denún­cia como chefe de quadrilha, cor­rupção; O pres­i­dente da Câmara dos Dep­uta­dos e do Senado Fed­eral e grande parte dos seus pares, denun­ci­a­dos, inves­ti­ga­dos ou torcendo para não serem lem­bra­dos; mem­bros da cúpula do Min­istério Público sus­peitos de terem tomba­dos ante à cor­rupção; a mais alta Corte do país, em fran­gal­hos, com riscos, de ser dimin­uída pelo com­por­ta­mento de seus membros.

Isso sem con­tar ex-​presidentes, par­la­mentares, diri­gentes par­tidários, inves­ti­ga­dos, denun­ci­a­dos, con­de­na­dos, pre­sos ou na iminên­cia disso.

Se não temos homens públi­cos a altura dos desafios da nação – a ponto de um con­de­nado por cor­rupção – fig­u­rar como preferido para eleger-​se no pleito que vem, pre­cis­aríamos de insti­tu­ições sól­i­das capazes de garan­tir a esta­bil­i­dade da nação. Não é o que temos visto.

A sociedade pre­cisa se unir em torno das suas insti­tu­ições a ponto de garan­tir que ocu­pem o pro­tag­o­nismo a que se destinam.

Pode-​se até dizer que vive­mos uma nor­mal­i­dade insti­tu­cional, sim, mas até quando?

Abdon Mar­inho é advogado.