A REPÚBLICA DA BADERNA.
HÁ uma frase de Rui Barbosa que beira os cem anos muito apropriada para os dias atuais. Dizia o maio jurista brasileiro: «Com a lei, pela lei e dentro da lei; porque fora da lei não há salvação.»
Pelo que vejo, parece que uma grande parcela da população esqueceu, ignora ou simplesmente não tem qualquer apreço pela lei.
Esse pouco caso pelas leis em nosso país se aplica em quase tudo. Parece que lei existe para ser violada. Na visão destes sábios, inclusive, alguns fazedores de leis, as mesmas só servem ou têm valia se atenderem aos seus interesses.
Agora mesmo inventam e proliferam nos quatros cantos do país, nos programas partidários, em discursos nas casas do parlamento e mesmo nas ruas manifestações pedindo Eleições Diretas Já.
Ora, essa pauta era pertinente em 1984, quando foi as ruas a campanha por eleitores diretas abolidas pela régime militar inaugurado em 1964. Agora não.
O Brasil tem eleições diretas regulares, acontecem a cada quatro anos – se consideramos as municipais que ocorrem neste intervalo, temos eleitores a cada dois anos –, com um calendário predefinido e todos sabendo quais são as regras do jogo eleitoral.
As próximas eleições ocorrerão daqui a pouco mais de um ano, quando serão eleitos o presidente da República e o vice-presidente; os governadores de estado e respectivos vices-governadores; dois terços do senadores; deputados federais e deputados estaduais.
Agora os iluminados querem alterar a Constituição da República para eleger um presidente da República. Só presidente e vice.
Já disse, e repito, que a ideia além de flagrantemente inconstitucional, uma vez que a Constituição traz as regras de sucessão em caso de vagância dos cargos, com previsão de eleições indiretas, pelo Congresso Nacional, no caso de vagância dos cargos de presidente e vice ocorrerem nos dois últimos anos do mandato.
Até aqui já vagou o cargo de presidente, uma vez que a eleita teve o mandato cassado no ano passado após processo de impeachment. O vice-presidente, investido no cargo que vagou, pode até renunciar, morrer, sofrer indenizo processo de impeachment ou ser cassado pela Justiça Eleitoral, mas isso, caso venha a acontecer, não autoriza que se altere a Constituição para substituí-lo.
A Constituição de um país é bem maior que seus destinatários, não pode sofrer alterações ao sabor dos ventos ou para agradar esse ou aquele.
Os defensores da tese de eleições diretas dizem o atual Congresso Nacional não possuiria legitimidade para eleger um presidente da República.
A ideia padece de um v/cio de origem.
Quer dizer que o Congresso Nacional não tem legitimidade para eleger o indigitado que ocupará o cargo de presidente por por um ano ou menos que isso, mas tem legitimidade para alterar a Constituição Federal, que é algo bem mais grave?
Mais. Se o Congresso Nacional é ilegítimo para eleger um presidente para um mandato tampão, mas legitimo para alterar a Constituição, por que não o fazê-lo para antecipar as eleições gerais de 2018?
Pois é, não vejo nenhum dos valentes defensores das eleições diretas defenderem a antecipação das eleições gerais.
Isso denota o interesse de sobrepor o interesse pessoal ao império da lei. O vale tudo que não ver problema em desrespeitar a própria Constituição da nação para atendê-los.
Não satisfeitos na pregação partem para prática.
As manifestações convocadas por centrais sindicais e movimentos ocorridas no país não têm o propósito de manifestar inconformismo contra as medidas do governo, ou mesmo de protestar contra o próprio governo e defender sua renúncia, o que legitimo e previsto nas leis do país, mas sim, têm o claro propósito de desestabilizar as instituições.
O que vimos nas ruas de Brasilia, dentro e fora do Congresso Nacional, foram atos de vandalismo que desafiam o Estado de Direito. Uma clara tentativa de, pela violência, modificarem as regras do jogo democrático.
Os defensores dos atos de violência ocorridos com vandalismo de diversos ministérios, com cidadãos feridos, inclusive gravemente, dizem que foram as forças do Estado que reprimiram as manifestações.
Qualquer um sabe que isso não é verdade. O governador do Distrito Federal é de um cidadão com largas tradições democráticas que jamais iria colocar policia sob seu comando contra o povo. mesmo os policiais brasilienses possuem experiência com manifestações – acredito que poucos lugares no mundo tenham tantos protestos quanto tem Brasilia –, não iriam reprimir os movimentos de forma açodada.
Maior prova disso é que nos anos de 2015 e 2016 ocorrem na capital manifestações que contaram com participação popular em número bem superior, centenas de milhares de cidadãos onde não foi quebrada uma janela.
Vejo com a absurda a ideia de se querer criminalizar a ação policial diante da grave situação em que foram colocados. Claro, que tudo deve ser apurado e as responsabilidades atribuídos. Quem errou tem que pagar.
O Brasil vive momentos absurdos. Só isso justifica que as críticas de parcela da população tenha se dirigido a polícia e ao governo e não aos vândalos que destruiram prédios e bens públicos, colocando em risco a vida e/ou integridade de centenas de servidores públicos que estavam trabalhando nos mesmos.
Vou além, criticam até o fato do presidente da República ter recorrido as Forças Armadas para preservação da ordem e garantir a segurança do patrimônio público. Esta medida – se oportuna, necessária ou não –, encontra-se prevista na Constituição. O que não se encontra previsto é, a guisa de se fazer protestos, destruirem o patrimônio de todos.
Criticam a utilização da lei ao invés de criticarem os atos criminosos. Até ministro do Supremo incorreu em tal equivoco.
O v/cio pelo descumprimento da lei parece endêmico.
Agora mesmo vimos uma comédia dos erros envolvendo a Polícia Federal, Ministério Público e Supremo Tribunal Federal na divulgação criminosa de conversas de um jornalista com sua fonte. Algo que encontra vedação constitucional. Errou a policia que deveria separar o material que não tinha relação com objeto da investigação, o MPF que não verificou tal falha e o Supremo (que literalmente errou por último) ao permitir que tais conversas fossem divulgadas. Tanto errou que após os questionamentos que sofreu determinou novo sigilo das gravações.
Todos as autoridades e órgãos envolvidos na celeuma têm conhecimento do que diz a lei. Se não a observaram foi porque quiseram e não por ignorância.
Assim segue o Brasil, uma terra onde as pessoas, sobretudo, as que têm responsabilidades institucionais buscando salvação fora lei.
Nunca encontrarão.
Abdon Marinho é advogado.