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A ARTE DE APA­GAR INCÊN­DIO COM GASOLINA.

Escrito por Abdon Mar­inho

A ARTE DE APA­GAR INCÊN­DIO COM GASOLINA.

NO AUGE da crise de 1954 – que ficara mais aguda com o assas­si­nato do major Vaz, na Rua do Toneleiro, rio de Janeiro, enquanto fazia a segu­rança do líder oposi­cionista Car­los Lac­erda e o man­i­festo dos coro­néis negando apoio ao gov­erno –, Ivete Var­gas, a filha mais política do velho caudilho, teria sug­erido ao pai que bus­casse apoio em setores das Forças Armadas. Getúlio teria, suposta­mente, respon­dido: — minha filha, mil­i­tar pensa como militar.

Se Getúlio Var­gas fez ou não tal assertiva é algo que nunca saber­e­mos. O certo é que rechaçou mais uma solução mil­i­tar, que dividiria, ainda mais as forças de segu­rança do país para se man­ter no poder, preferindo «sair da vida e entrar para história, nas suas próprias palavras.

Ori­undo da caserna o ex-​presidente con­hecia em pro­fun­di­dade a cul­tura cas­trense. A ponto de saber que não se deve, por qual­quer forma ou a qual­quer pre­texto, fomen­tar cisão interna.

Emb­ora com leg­is­lação própria as polí­cias mil­itares são con­sti­tuí­das com essa cul­tura, her­dada, em todos os aspec­tos, das Forças Armadas, como se fosse um corpo a parte da sociedade.

Emb­ora sejam out­ros os tem­pos e os cos­tumes, faço essa breve digressão para dizer que o gov­erno estad­ual tem errado feio no trato dos seus militares.

Este último episó­dio envol­vendo o tenente-​coronel Ciro Nunes é a prova cabal disso.

Aqui não dis­cuto a questão antecedente, o desen­tendi­mento, às por­tas do tri­bunal, entre o procurador-​geral e o tenente-​coronel. Se um ou outro é o cul­pado pelo episó­dio o curso das inves­ti­gações irá dizer.

A mim cabe esperar – como amigo de ambos –, o desen­ro­lar dos fatos.

Entre­tanto, arrisco na argu­men­tação de que ambos con­tribuíram com o triste episódio.

O procurador-​geral se equiv­o­cou por “brin­car” com uma questão tão del­i­cada, não ape­nas para os servi­dores mil­itares, mas para todos os demais, que vivem essa con­stante “queda de braço” com o gov­erno na busca por van­ta­gens ou dire­itos, con­forme a ótica de cada um.

A pil­héria se tornou ainda mais ino­por­tuna, do ponto de vista político admin­is­tra­tivo, quando sabe­mos que o gov­erno acabou de obter uma impor­tante vitória sobre o fun­cional­ismo, que foi a questão dos 21,7%. Tal vitória, obtida graças ao incan­sável tra­balho da procu­rado­ria – e aqui, tam­bém, não aden­tro ao mérito –, trouxe grande ten­são nas relações entre os defen­sores do gov­erno estad­ual e a cat­e­go­ria dos servi­dores públicos.

Ao per­gun­tar ao tenente-​coronel se ele “se diver­tia” com os proces­sos, cer­ta­mente, foi como jogar gasolina no incên­dio, uma vez que o tenente-​coronel luta há anos para ter recon­hecido alguns dos seus dire­itos por parte do Estado, den­tre as quais pro­moção por ressarci­mento de preter­ição, que ele mesmo acom­panha, dili­gen­ciando o anda­mento do processo.

Não acred­ito, por nen­hum momento, que tenha agido assim no intu­ito de ir além da pil­héria, mesmo porque, não acred­ito que seja do per­fil do procu­rador, espez­in­har sobre os ven­ci­dos, ainda que do ponto vista jurídico.

Já o tenente-​coronel, talvez por se encon­trar envolvido pes­soal­mente na causa, con­tribuiu com o episó­dio ao aguardar o procu­rador no intu­ito de lhe tomar satisfações.

Ainda que tenha enten­dido a chiste do mesmo como uma “humil­hação”, dev­e­ria quedar-​se à dis­ci­plina a que foi for­mado desde o fim da ado­lescên­cia. Pode­ria ter feito isso. Lev­ado na brincadeira.

O tenente-​coronel Ciro Nunes é, além de mil­i­tar, um estu­dioso do dire­ito e con­hece como poucos a leg­is­lação mil­i­tar (e mesmo a civil), sendo capaz de citar alíneas, incisos, pará­grafos e arti­gos, mesmo das leis mais esquecidas.

Razão pela qual, mais ainda, pode­ria enten­der que o seu dire­ito, sendo bom, pode­ria tar­dar, mas não falharia.

Dito isso, entendo, a par­tir daí, que os des­do­bra­men­tos e equívo­cos do episó­dio, com a con­se­quente crise mil­i­tar – que não inter­essa a ninguém, muito menos à sociedade –, devem ser deb­ita­dos na conta do gov­erno e seus agentes.

Emb­ora ambos estivessem “far­da­dos”, um como mil­i­tar e o outro como rep­re­sen­tante do Estado, pelo que se depreende das infor­mações que se tem até aqui, é que o “entrevero” fora pri­vado. Dev­e­ria, pois, o suposto ofen­dido, reg­is­trar um bole­tim de ocor­rên­cia poli­cial e, pos­te­ri­or­mente, se jul­gasse necessário, entrar com uma ação por danos morais.

Con­forme já disse noutras opor­tu­nidades, acred­ito que fal­tou “tato”, a velha exper­iên­cia, para lidar com uma questão, trans­for­mando em uma crise na caserna um assunto que pode­ria ser iso­lado como questão privada.

Os dois cidadãos se desen­ten­deram – ainda bem que ape­nas no campo das palavras –, e foram bus­car a reparação à honra na esfera judi­cial. Ponto. Não have­ria neces­si­dade de se envolver as patentes e/​ou car­gos no episódio.

O gov­erno fez jus­ta­mente o con­trário, trans­for­mou uma questão pri­vada numa crise de Estado.

Repito, falta tato, exper­iên­cia ao gov­erno para lidar com questões delicadas.

Ainda que fosse uma questão “de Estado”, dev­e­riam pon­derar a mel­hor maneira para con­duzir o assunto.

Os aux­il­iares, sobre­tudo, os mais próx­i­mos ao gov­er­nador dev­e­riam, como se diz no pop­u­lar, “colo­car panos quentes”, para diminuir o alcance da crise instaurada.

Indifer­ente a del­i­cadeza da situ­ação, fez-​se o pior mobilizou-​se “meio gov­erno” para “pren­der” o “inso­lente” tenente-​coronel. E, con­forme li, fiz­eram isso “atro­pelando” a leg­is­lação pátria para atin­gir seu intento, inclu­sive fazendo exi­s­tir um fla­grante quando o mil­i­tar apresentara-​se vol­un­tari­a­mente à autori­dade policial.

O que con­sta, segundo a man­i­fes­tação do mil­i­tar na mídia, é que ele se apre­sen­tou vol­un­tari­a­mente com dois ou três cole­gas que se recusaram ao papel de con­du­tor, tendo um inte­grante da cúpula da PMMA, “apare­cido”, a sor­relfa, e se apre­sen­tado como con­du­tor, e assim, gerar a situ­ação de flagrância.

Uma acusação grave, de um fato mais grave ainda.

Tanto assim, que o tenente-​coronel não chegou a esquen­tar o rude catre da cela onde o colo­caram, tendo a juíza plan­ton­ista, numa sen­tença áspera, dito, que o “estado” agira de forma errada e o colo­cado ime­di­ata­mente em liberdade.

Ape­sar do pro­nun­ci­a­mento da Justiça, temos notí­cias de que muitos aux­il­iares do gov­er­nador, den­tro e fora da cor­po­ração, ainda insis­tem em fazer a história “ren­der”, com punições, como per­das de funções de con­fi­ança pela patente (o que oner­ará dupla­mente o Estado) e ameaças ao mil­i­tar envolvido.

A ten­ta­tiva de “enquadra­mento”, ainda que restrito ao um mil­i­tar, pela situ­ação cri­ada é como se pre­tendessem enquadrar a própria corporação.

Todo episó­dio, além de favore­cer explo­ração política por conta dos adver­sários, reforça a imagem de que o gov­erno comu­nista é autoritário e tru­cu­lento. Preferindo mais o temor que o respeito de ali­a­dos e desafetos.

Essa imagem, que parece, fazem questão de cul­ti­var, vem de diver­sos episó­dios, prin­ci­pal­mente a acusação de abuso de poder político e finan­ceiro nas últi­mas eleições munic­i­pais, onde os adver­sários do gov­erno sen­ti­ram sobre si a força do Estado em favor dos seus aliados.

São raros os municí­pios maran­henses onde o ressen­ti­mento não se faz pre­sente. Acusam o gov­erno perseguidor. Mesmo ali­a­dos de primeira hora do gov­erno, mas que não estão na linha de frente das cam­pan­has, têm sua dose de ressentimentos.

A ideia de se bus­car o temor ao invés do respeito, ainda que se obtenha o resul­tado no curto prazo, nunca é a mel­hor alter­na­tiva política. Em se tratando de mil­itares, quase sem­pre é a pior. Na cor­po­ração todo mundo tem os “seus”, quanto mais alta a patente, mais tal assertiva é verdadeira.

Nos últi­mos dias na caserna – emb­ora a dis­ci­plina os prive de diz­erem pub­li­ca­mente –, o que mais se ouviu foi que a prisão fora arbi­trária; que não teve motivo; que se dera em razão de envolver mem­bro do alto escalão do gov­erno; etc.

A falta de com­preen­são do gov­erno trato desta questão, acaba por gal­va­nizar um sen­ti­mento em torno do tenente-​coronel, seja por se espal­harem no fato de que tal situ­ação pode­ria ocor­rer com qual­quer um deles; seja por se sen­tirem atingi­dos, como cor­po­ração, pelo suce­dido; seja por se sen­tirem rep­re­sen­ta­dos pelo enfrenta­mento por um dos seus a alta cúpula do gov­erno, fazendo o que muitos gostaria de fazer seja pela própria ideia do “per­tenci­mento”, do mil­i­tar se sen­tir como inte­grante daquela cor­po­ração – sen­ti­mento, este, que se encon­trava em desuso.

O gov­erno dev­e­ria ficar atento a estes sinais. Não ficar esti­cando a corda, retar­dando ao extremo o cumpri­mento de decisões judi­ci­ais, muitas tran­si­tadas em jul­gado, que recon­hece­ram deter­mi­na­dos dire­itos aos servi­dores ou poster­gando o cumpri­mento da leg­is­lação cas­trense no que se ref­ere às pro­moções por ressarci­mento de preterição.

Assim como o tenente-​coronel Ciro Nunes, muitos out­ros estão na mesma situ­ação. Muitos out­ros se «sen­tem» pas­sa­dos para trás nas pro­moções por merec­i­mento. Acred­i­tam que alguns por terem con­tatos con­seguem ser pro­movi­dos e eles não.

São muitos sen­ti­men­tos con­fli­tu­osos a exi­girem inteligên­cia para lidar com eles. Aço­da­men­tos ou “esti­ca­mento de corda” só agravam a situação.

Por fim, não se deve perder de vista o que teria dito (ou não) Getúlio Var­gas, até porque são palavras certeiras: — mil­i­tar pensa como militar.

O gov­erno prestaria um grande serviço a si próprio se tra­bal­hasse no sen­tido de não de ali­men­tar crises, e sim, debelá-​las.

Abdon Mar­inho é advogado.

O SILÊN­CIO DOS CUL­PA­DOS OU A VENEZUELA É LOGO ALI.

Escrito por Abdon Mar­inho

O SILÊN­CIO DOS CUL­PA­DOS OU A VENEZUELA É LOGO ALI.

TODOS os dias cen­te­nas de venezue­lanos cruzam a fron­teira para o Brasil em busca de uma condição de vida mel­hor para si e para os seus. Aqui chegando os que não pos­suem meios e/​ou qual­i­fi­cação sufi­ciente, lançam de qual­quer coisa, inclu­sive do próprio corpo para sobreviverem.

Fogem da escassez de ali­men­tos, de remé­dios, da repressão política.

Os que ficam na Venezuela, diari­a­mente, engrossam os cordões de protestos, vio­len­ta­mente reprim­i­dos pelo gov­erno, que, em ape­nas três meses, ceifou a vida de quase uma cen­tena de cidadãos, sobre­tudo de jovens, na faixa de 18 a 25 anos. Não faz muito tempo, em ape­nas um dia, cinco jovens, nesta faixa de idade, perderam vida.

Os caraque­ños mais humildes dis­putam com os ani­mais as sobras das feiras livres e os refu­gos dos super­me­r­ca­dos. Numa das cenas mais tocantes dos últi­mos tem­pos vi uma sen­hora, durante um protesto, enfrentar as forças gov­er­na­men­tais com uma frase cor­tante: — protesto porque tenho fome. Vais me matar por ter fome?

Isso foi lá atrás, hoje os venezue­lanos protes­tam porque, além da fome, da econo­mia em fran­gal­hos, da repressão política, querem democ­ra­cia e não supor­tam mais o mod­elo boli­var­i­ano, implan­tado naquele país.

Noutra ponta temos o gov­erno de Nico­las Maduro ace­nando com mais autori­tarismo, com mais ditadura.

Já falamos em vezes ante­ri­ores sobre a crise na Venezuela e, inclu­sive, dos seus reflexos no nosso país, onde Roraima, porta de entrada destes irmãos do Norte, encontra-​se à beira de uma crise human­itária, sem poder ofer­e­cer os serviços essen­ci­ais a estes migrantes e à sua própria população.

Desta vez abor­dare­mos o estranho silên­cio da classe política brasileira ao que vem ocor­rendo na Venezuela.

Não falo do silên­cio do gov­erno, este até tem se man­i­fes­tado com firmeza, cobrando soluções para a crise e pedindo democracia.

O prob­lema é que estes protestos são repeli­dos sob o argu­mento de que o atual gov­erno é “golpista”, por­tanto, não pos­suindo qual­quer legit­im­i­dade para recla­mar de nada em relação ao país vizinho.

Pois bem, se se pode ale­gar ile­git­im­i­dade do gov­erno – que pode­ria se esten­der até políti­cos da sua base, pelo raciocínio boli­var­i­ano –, o mesmo não se daria em relação aos políti­cos da oposição – aque­les que até ontem eram governo.

Estes políti­cos, que hoje estão na oposição, sobre­tudo, os lig­a­dos ao ex-​presidente Lula – e ainda os mais rad­i­cais –, sem­pre defend­eram o mod­elo boli­var­i­ano como o ideal para ser implan­tado no Brasil. Teciam loas ao ex-​ditador Hugo Chavez e ao seu pupilo Nicolás Maduro, como fig­uras ideais do cenário político mundial.

O Brasil nos gov­er­nos Lula/​Dilma, chegou ao ponto de contentar-​se em ser coad­ju­vante – ape­sar de infini­ta­mente mais rico e impor­tante politi­ca­mente –, no con­texto sul-​americano, deixando a Venezuela como pro­tag­o­nista e “potên­cia” regional.

No exem­plo claro das prefer­ên­cias ide­ológ­ica superando a lóg­ica política, o Brasil que, can­di­da­mente, aceitava ser coad­ju­vante, abria os cofres nacionais para inves­ti­men­tos no país viz­inho – e não ao con­trário –, na clás­sica situ­ação do “rabo bal­ançando o cachorro”.

No único episó­dio em que a Venezuela, ainda através de Chavez, disse que iria inve­stir no Brasil, foi na já famosa refi­naria Abreu e Lima, em Per­nam­buco, e lev­a­mos um “cano” bil­ionário, mais de 8 bil­hões de dólares.

Ape­sar do “cano” o Brasil con­tin­uou seus inves­ti­men­tos por lá, abrindo os cofres do BNDES para diver­sos empresários ami­gos para estes faz­erem lá, na Venezuela, as obras estru­tu­rantes que tam­bém fal­tavam ao Brasil.

Estes são recur­sos que o Brasil difi­cil­mente rece­berá de volta.

Pois bem, os políti­cos nacionais que par­tic­i­param, endos­saram, fes­te­jaram, raste­jaram aos pés de Chavez e Maduro, hoje não têm nada a dizer sobre a crise política, a vio­lên­cia desen­f­reada – muitas vezes por ordem estatal –, con­tra os cidadãos, a dis­solução das insti­tu­ições e o fim da democracia.

As vezes até procuro em seus sites alguma opinião sobre a situ­ação venezue­lana e nada encon­tro. É como se a Venezuela tivesse “sum­ido” do mapa para estes políti­cos brasileiros.

Quando cobro essa coerên­cia, essa man­i­fes­tação, faço isso porque estes políti­cos endos­saram o chav­ismo, o mod­elo boli­var­i­ano. Se cobro dos ex-​presidentes Lula e Dilma que digam algo, é porque o primeiro esteve lá par­tic­i­pando da cam­panha que “elegeu” o sen­hor Maduro. É porque eles, com nos­sos recur­sos, recur­sos do povo brasileiro, con­tribuíram com a ditadura que se instalou por lá.

Estes ex-​governantes “fiz­eram o diabo” para elegerem Maduro. Até os seus mar­queteiros foram deslo­ca­dos para lá, regia­mente pagos com din­heiro de propinas, con­forme eles mes­mos con­fes­saram à justiça brasileira.

Estes, e tan­tos out­ros políti­cos brasileiros, ainda os que não con­tribuíram dire­ta­mente com a eleição de Maduro, sem­pre defend­eram o mod­elo bolivariano.

E não só os políti­cos, os chama­dos “int­elec­tu­ais” foram na mesma onda.

O que têm a dizer sobre a “con­sti­tu­inte” con­vo­cada por Maduro com o claro propósito de diminuir os poderes dos par­la­mentares e aumen­tar os seus? Que têm a final­i­dade de levar as próx­i­mas eleições para as cal­en­das? Que pre­tende criar um mod­elo tar­dio de par­tido único com o poder entregue aos poucos boli­var­i­anos que restam em detri­mento do resto da população?

Ninguém escuta a opinião destes valentes sobre a atual real­i­dade da Venezuela. Estão todos silentes.

Este é o silên­cio da culpa ou da covar­dia, con­forme queiram.

Abdon Mar­inho é advogado.

Em tempo: Este texto foi escrito antes das declar­ações da senadora Gleisi Hoff­mann, nos seguintes ter­mos: “O PT man­i­festa seu apoio e sol­i­dariedade ao gov­erno do PSUV, seus ali­a­dos e ao pres­i­dente Nicolás Maduro frente à vio­lenta ofen­siva da dire­ita con­tra o gov­erno da Venezuela e con­de­n­amos o recente ataque ter­ror­ista con­tra a Corte Suprema. Temos a expec­ta­tiva que a Assem­bleia Con­sti­tu­inte possa con­tribuir para uma con­sol­i­dação cada vez maior da rev­olução boli­var­i­ana e que as divergên­cias políti­cas se resolvam de forma pacífica”.

RIO DE LÁGRIMAS.

Escrito por Abdon Mar­inho

RIO DE LÁGRIMAS.

NUNCA uma metá­fora fez tanto sen­tido quanto esta que refere-​se ao Rio de Janeiro como um rio de lágrimas.

No hor­rip­i­lante cenário de absur­dos que tomou conta da cidade (e do estado) não há quem não lem­bre de uma tragé­dia que tenha lhe des­per­tado a atenção com mais inten­si­dade – isso inde­pen­dente de ser o cidadão do próprio estado ou não.

Ape­nas neste mês, em con­ver­sas com ami­gos, um dizia que lhe chamara atenção fora um assalto “ao vivo” de uma sen­hora em pleno calçadão, com dezenas transe­untes indifer­entes. Um outro disse-​me que lhe inco­modou as ima­gens da sen­hora grávida sendo atro­pelada, enquanto o marido era esfaque­ado, isso tudo na pre­sença de um filho de dez anos de idade.

Estas e tan­tas out­ras, são situ­ações que chamam a atenção pelo absurdo, pela gra­tu­idade de vio­lên­cia, pela falta de sen­ti­mento de humanidade.

Out­rora se dizia que lugar mais seguro que pode­ria exi­s­tir para uma pes­soa era a bar­riga da mãe. Esta ver­dade, quase abso­luta, a povoar o imag­inário mundial, deixou de fazer sen­tido quando trans­portada para o Rio de Janeiro. Afora a cri­ança que não chegou a nascer por conta do atro­pela­mento da mãe, poucos dias antes do ocor­rido foi a vez de um bebê ser atingido por “bala per­dida” ainda na bar­riga da mãe.

Este pequeno brasileiro, chamado Arthur, ao menos con­seguiu nascer, e recupera-​se dos fer­i­men­tos, que torce­mos, não lhe traga maiores seque­las, como se imag­i­nou logo após o fato.

O pequeno Arthur nasceu e já com­pro­vou o quanto a leg­is­lação brasileira é falha na pro­teção dos seus cidadãos, aliás ele é a prova viva disso, o segundo artigo do Estatuto Civil pátrio esta­b­elece: “Art. 2º A per­son­al­i­dade civil da pes­soa começa do nasci­mento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a con­cepção, os dire­itos do nascituro.”

Vejam, antes de Arthur adquirir sua per­son­al­i­dade civil, que só começaria com o seu nasci­mento, o país, a nação brasileira, já lhe negava seus direitos.

A lei, difer­ente do prometido não pôs a salvo seus dire­itos, prin­ci­pal­mente, o mais ele­men­tar deles: o dire­ito à segurança.

A situ­ação deste bebê talvez seja ape­nas a mais emblemática, mas a real­i­dade é dramática para todos, sobre­tudo para os mais frágeis, como cri­anças, vel­hos, defi­cientes, pes­soas que não têm como fugir de tan­tos desre­speito aos seus dire­itos mais elementares.

Quase todos os dias, mil­hares de cri­anças têm revo­gado o seu dire­ito sagrado à edu­cação. Comuns são os “toques de recol­her” dec­re­ta­dos por ban­di­dos; não raros são cri­anças serem reti­radas das salas de aula para ficarem amon­toadas nos corre­dores e, assim, fugirem de alguma bala per­dida dos rotineiros tiroteios, entre a ban­didagem e a Poli­cia ou ape­nas entre os primeiros por espaços de poder na hier­ar­quia do crime.

Isso, sem con­tar que já chegam às esco­las, muitas vezes, trauma­ti­zadas pelos tiroteios ocor­ri­dos durante a noite e que lhes roubou o sono.

Tem que ser assim? Só este ano, inúmeras foram as víti­mas de “bala per­dida”, que, ape­sar do nome, sem­pre acaba achando uma vida para dá cabo.

Uma estatís­tica informa a pop­u­lação, já aneste­si­ada pelo medo, que ocor­rem na cidade uma média de quinze tiroteios por dia. Talvez a Síria ou o Iraque não reg­istrem tantos.

Não bas­tassem os tiroteios que, dia e noite, reme­tem a cidade a uma rotina de guerra civil, há a vio­lên­cia no “mano a mano”, como daquela, e tan­tas out­ras moças, que são assaltadas diari­a­mente, à luz do dia, não sendo raros os que per­dem a vida em tais ações crim­i­nosas, como um garoto de quinze anos que levou um tiro na testa por não ter dado um celu­lar na hora que o ban­dido pediu ou, dos tan­tos out­ros, que per­dem a vida ou são esfaque­a­dos, por um cordão, um celu­lar, uma bicicleta.

No inter­esse do crime as prin­ci­pais vias do estado são “fecha­dos» por ban­di­dos, que fazem arrastões e neles ferem, matam, tiram vidas.

Não restam dúvi­das que as autori­dades são ou estão inca­pazes de apre­sen­tar soluções, sobre­tudo, de curto prazo, para tan­tos problemas.

O gov­erno estad­ual não con­segue, sequer, pagar em dia a folha do pes­soal ativo e dos aposen­ta­dos. Estes últi­mos, já cansa­dos pelos anos, pade­cem mais ainda. A humil­hação a que são sub­meti­dos corta o coração ver suas lágri­mas ao não con­seguirem hon­rar com seus com­pro­mis­sos rotineiros, como pagar suas con­tas de aluguel, água, luz, tele­fone, com­prar os medica­men­tos de uso con­tínuo ou mesmo a alimentação.

Situ­ação que não é difer­ente daquela que vivem os servi­dores da ativa, com meses de salários atrasa­dos e que tendo de recor­rer a cari­dade alheia para, após horas a fio, rece­berem uma cesta básica.

E, se falta recur­sos para paga­mento da folha de pes­soal e aposen­ta­dos , é porque desde muito já fal­tam recur­sos para out­ras ativi­dades bási­cas do estado, como edu­cação, saúde e segu­rança pública.

Sim, a segu­rança pública que tem sido negada à pop­u­lação de uma maneira geral e aos mais frágeis em espe­cial, é o primeiro direto. As pes­soas pre­cisam, primeiro estarem vivas para usufruírem os demais direitos.

Como aumen­tar o quan­ti­ta­tivo de poli­ci­ais nas ruas se não podem pagar os salários? Se não pos­suem recur­sos para colo­car as viat­uras para rodar ou dar manutenção as mesmas?

Ora, se não con­seguem, num momento tão agudo, exercer uma política de repressão à crim­i­nal­i­dade, menos ainda terão condições de implan­tar políti­cas públi­cas que visem o com­bate ao crime no médio e longo prazo.

No nível de aban­dono que o Estado do Rio de Janeiro (e sua prin­ci­pal cidade) chegaram, não sei se a solução da inter­venção – a única que parece viável no momento –, resolveria.

A sucessão de equívo­cos políti­cos no Rio de Janeiro, com gov­er­nantes desprepara­dos, cor­rup­tos ou os dois jun­tos, não é recente, vem desde os anos setenta, mais não resta dúvi­das que nos últi­mos anos o quadro de descal­abro só se agravou e con­t­a­minou toda malha estatal.

Se antes tín­hamos tumores can­cerígenos setor­iza­dos, hoje é como se estes estivessem e metás­tases em todo o corpo.

Dúvi­das tam­bém não exis­tem de que a cor­rupção que tomou de conta do estado nos últi­mos anos é um fator que con­tribui larga­mente com o descal­abro atual.

Os números da cor­rupção do gov­erno Sér­gio Cabral, aquele que está preso e responde já a mais de uma dúzia de ações penais, é algo assom­broso. Ele, e muitos de sua equipe, segundo se sabe agora, tin­ham mais pre­ocu­pação em roubar, desviar, rece­ber propinas, que gov­ernar o estado, realizar políti­cas públi­cas, devolver ao con­tribuinte seus impos­tos em forma de serviços comuns.

O din­heiro que afa­naram e a ener­gia que gas­taram em tais ofí­cios, fiz­eram falta e hoje se rev­ela o legado de aban­dono, daquela que já foi a prin­ci­pal unidade da fed­er­ação e cartão postal do Brasil.

Abdon Mar­inho é advogado.