DEBATES EXTREMOS.
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- Criado: Terça, 31 Outubro 2017 18:41
- Escrito por Abdon Marinho
DEBATES EXTREMOS.
NÃO tenho lembrança de ter acompanhado, na história do Brasil, mesmo através da livros, dias em que os debates, sobre quaisquer temas, fossem tão radicalizados. Mesmo assuntos do cotidiano geram debates onde se opõem os grupos – políticos ou não –, com posições extremas.
Não vejo futuro para país nisso, pelo contrário, assisto com perplexidade a criação de fossos que aos poucos se tornam intransponíveis. Uma lástima.
Apenas para citar um exemplo, atualmente um dos assuntos mais discutidos e mais radicalizados é a tal da questão de gênero. Confesso, que até bem pouco tempo nem sabia do que se tratava. Depois descobri que por trás desta questão existe toda uma ideologia, o que me pareceu muito mais estranho ainda.
Adepto do rock nacional, imaginava que Cazuza falava sério ao dizer que precisava de uma ideologia para viver. E ao dizer isso, era – assim entendia –, que as ideologias, ao menos como fomos apresentados nos tempos de militância política estivessem desaparecidos. Daí o clamar: – ideologia, eu quero uma para viver.
Em tempos tão radicais, provavelmente, seria satanizado, bem mais do que foi e do que ainda é.
Mas voltando a tal da ideologia de gênero, que citávamos, como exemplo retórico, apenas, temos um dos mais claros exemplos de extremismos neste debate e que reflete bem a quadra obscura que vive o país.
Pelo que pude entender, até aqui, de um lado temos uns «iluminados» defendendo a ideia de que a sexualidade dos seres humanos é uma mera convenção social e que os seres nasceriam desprovidos de sexo que estes papéis seriam definidos pela sociedade que os impõe como lhes convém, certamente de forma «careta», «burguesa», «retrógrada» e todos os «ismos» presentes e comuns nos debates extremos.
Já na outra ponta, temos um grupo a pregar, sem constrangimentos, que todos os papéis dissonantes são frutos de patologias e que estes humanos (os que têm uma vida sexual distinta dos demais) seriam abominações, conforme, descrito em alguns textos bíblicos.
Como podemos perceber, são posições inconciliáveis. E, ouso dizer, equivocadas.
Não vejo como admitir-se que que homens e mulheres sejam iguais no sentido que pregam os tais ideólogos de gênero. Não o são. São biologicamente diferentes, fisicamente diferentes e, também, têm percepções diferentes das emoções e das coisas. Não vejo como pretender uma igualdade onde ela não existe e transferir à sociedade a responsabilidade por sua definição.
Antes que digam que estou sendo machista ou misógino, não o sou, apenas estou assentando que homens e mulheres são seres diferentes. Nenhum é superior ao outro e ambos são merecedores e detentores dos mesmos direitos, deveres e, principalmente, respeito.
Noutra quadra, não há como ignorar que, até cientificamente, muitos destes seres não se identificam com o seu sexo biológico ou, mesmo havendo identificação biológica, relacionam-se com pessoas do mesmo sexo. São milhões de transgêneros no mundo e muitos mais milhões, ainda a integrar a sopa de letrinhas dos papéis sexuais existentes. Ou vão vão dizer que não existem?
Muitas ditaduras adotam a negação como instrumento de repressão política.
Certa vez questionaram um dirigente iraniano – que aliás foi bem festejado pelos governos da era petista –, sobre o tratamento dispensado por seus país à comunidade LGBT. respondeu simplesmente que não tinham este problema uma vez que não existiam homossexuais em seu país.
Nunca compreendi muito bem o interesse de certas ditaduras sobre este aspecto da vida privada de seus cidadãos. Reprimem, matam e/ou os renegam aos “guetos» sociais.
No a vida privada incomoda os que pensam diferente ou vivem de uma outra forma? O que tem demais em respeitar estas pessoas?
A existência de milhões pessoas no Brasil – e no mundo –, que vivem outras experiências diversas é uma realidade que está posta e que a ninguém é dado o direito de tratar estas pessoas como aberrações ou abominações. Ou, ainda, como portadoras de uma patologia a merecer quaisquer tipo de cura. Ou, pior, agredir, humilhar ou mesmo matar estas pessoas por sua orientação ou situação sexual.
Estas pessoas, diferente do que querem fazer crer certos ideólogos ou radicais religiosos são tão seres humanos e merecedores de iguais respeitos quanto todos os demais seres humanos. Por isso mesmo, não reclamam ou merecem tratamento diferenciado ou superior, querem sim, tratamento igual e, sobretudo, respeito.
O Brasil de hoje (e mesmo outros países) experimenta, infelizmente, a realidade da exclusão, onde todo aquele que não pensa dentro do grupo é tido como um inimigo em potencial e é um alvo a ser eliminado.
O exemplo acima citado em torno desta questão de gênero – que aliás, não consigo entender a razão de ocupar o centro dos debates nacionais –, é apenas uma a dividir a sociedade brasileira como nunca vimos antes, repito.
A prova maior do que digo é o fato das últimas pesquisas apontarem em primeiro e segundo lugares para uma eventual disputa em segundo turno da eleição presidencial do ano que vem, candidatos destes extremos.
Os dois, pelo menos, no plano teórico, se comportam como os representantes legítimos dos extremos a que nos referimos.
Aqui, e nesta oportunidade, não discutirei méritos ou defeitos de nenhum deles, que são de todos conhecidos, inclusive pela estridência com que expõem suas ideias.
A minha reflexão é que a eventual eleição de qualquer dos dois ou um outro que advogue governar o país a partir de ideias extremistas, apenas nos trará mais incertezas e instabilidades.
Numa nação continental, como é o Brasil, um extremo, a não ser com muito derramamento de sangue, conseguirá se impor ao outro ou lhe conquistar.
Assim, teremos, caso se confirmem as pesquisas, um Brasil ainda mais dividido do se encontra agora pelos próximos anos.
Não precisa ser especialista, doutor neste assunto, para saber que o resultado dessa equação. Nação nenhuma no mundo conseguiu o milagre de governar dos extremos sem que isso se desse através de brutal repressão com milhares de assassinatos. Aliás, já é isto que os partidários mais intolerantes pregam: a eliminação do pensamento, e daqueles que vivem de uma forma diferente do que entendem ser a adequada.
Ora, quero acreditar que em tempos de debates tão polarizados, o Brasil só encontrará a paz se costurar seu “pacto social” a partir da convergência do centro para as bordas, “empurrando” os extremistas, de todos os matizes, para o seu real é diminuto espaço numa sociedade, como a nossa, forjada na pluralidade e tolerância.
Como sabemos, pensamentos e grupos extremistas sempre existiram por aqui, não os percebíamos porque suas ideias não encontravam eco e estavam restritas a grupos bem reduzidos.
O vazio de poder a partir das convergências centrais medianas, fizeram com que os discursos extremistas ganhassem corpo e conquistassem adeptos a ponto de representar um grave problema para o conjunto da sociedade brasileira, majoritariamente, tolerante.
Esta é a verdadeira identidade nacional. O Brasil sempre teve pessoas intolerantes, mas estes sempre foram uma minoria, o conjunto da sociedade nunca encontrou dificuldades para conviver com as divergências e a respeitar as diversidades.
Este Brasil de ódios, radicalismos e intolerâncias, confesso, é algo novo, para mim, pelo menos.
O que nos resta é torcer para que a tragédia anunciada não se confirme.
Abdon Marinho é advogado.