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REINALDO AINDA APOSTA NA GRATIDÃO.

Escrito por Abdon Mar­inho

ZÉ REINALDO AINDA APOSTA NA GRATIDÃO.
Por Abdon Mar­inho.
O EX-​GOVERNADOR José Reinaldo Tavares anun­ciou aos maran­hense, no Sábado de Aleluia, sua mais arriscada obra de engen­haria política: ser can­didato a senador sus­ten­tado por duas can­di­dat­uras de gov­er­nador do campo oposi­cionista ao gov­erno comu­nista do estado, algo até aqui, nunca tes­tado, pelo con­trário, em vezes ante­ri­ores, o que se viu sem­pre foi uma can­di­datura de gov­er­nador apoiando duas de senador, às vezes três.
Os deveres famil­iares na Sem­ana Santa, afastou-​me, nos últi­mos dias, até mesmo da leitura dos jor­nais, sites e blogues, o que me impediu de acom­pan­har o desen­ro­lar dos fatos, que, con­fesso, deixou-​me sur­preso.
Depois, já na noite do Domingo de Pás­coa, pas­sei a refle­tir mel­hor sobre a estraté­gia do ex-​governador e a con­clusão que chego é que ele decidiu apos­tar todas as suas fichas onde menos sus­peitá­va­mos: na gratidão. Logo ele que, como o Maran­hão inteiro assiste, ainda incré­dulo, foi vítima da mais ines­per­ada das ingratidões, que foi o desprezo e a humil­hação que sofreu da parte do atual gov­er­nador, “feito” na política por ele, José Reinaldo, e que nem os impávi­dos Leões da frente do palá­cio acred­i­taria que fosse ocor­rer da parte dele e de todo seu séquito, como o foi.
Emb­ora sentindo o golpe – a ingratidão é sem­pre difí­cil de ser assim­i­lada –, o ex-​governador, engen­heiro de profis­são, busca, numa “engen­haria política” inusi­tada, recuperar-​se e dar a volta por cima.
Segundo soube, cos­turou o ingresso no ninho tucano direto com o pres­i­dente nacional do par­tido e can­didato à presidên­cia da república, Ger­aldo Alck­min, como uma espé­cie de “carta de seguro” con­tra quais­quer con­tratem­pos da parte dos tucanos locais, por­ven­tura, inco­moda­dos com fato de con­cor­rer ao Senado pelo par­tido já tendo declar­ado pub­li­ca­mente apoio ao can­didato do Par­tido da Mobi­liza­ção Nacional — PMN, Eduardo Braide.
Como podemos ver trata-​se de uma estraté­gia arriscada, entre­tanto, se der certo, trará uma série de lições às atu­ais e futuras ger­ações.
A primeira delas, caso se con­firmem duas can­di­dat­uras apoiando uma de senador, será o espírito de sol­i­dariedade ao ex-​governador demon­strado pelos dois can­didatos ao gov­erno estad­ual, Roberto Rocha (PSDB) e Eduardo Braide (PMN).
Emb­ora pareça esquisito os dois terão muito mais a gan­har que a perder com tal gesto, con­forme explico abaixo.
O senador Roberto Rocha pas­sou os últi­mos anos car­regando a fama de desagre­gador e – no atual gov­erno –, tam­bém, a fama de traidor.
Ao aceitar e apoiar o dep­utado José Reinaldo na sua pre­ten­são ao Senado da República, cargo que já declarou, ser dev­ido ao ex-​governador, prin­ci­pal­mente em tais cir­cun­stan­cias, desmisti­fica grande parte da pro­pa­ganda neg­a­tiva imposta pelos atu­ais donos do poder no Estado, através de diver­sos veícu­los de comu­ni­cação alin­hados ao gov­erno.
Uma acusação que não pode recair sobre senador tucano é de que lhe falta per­cepção do quadro politico local. Pelo con­trário, já por ocasião da rup­tura do então gov­er­nador José Reinaldo com o grupo político do senador Sar­ney, na primeira metade da década de 2000, o atual senador foi um dos prin­ci­pais arti­fi­cies daquela cos­tura polit­ica que trouxe o então gov­er­nador para as hostes oposi­cionistas ao grupo político do qual fez parte a vida inteira até ali.
Lem­bro que muitos, naquela opor­tu­nidade, cus­taram a acred­i­tar que a rup­tura do gov­er­nador com o grupo Sar­ney era “para valer” e, por conta disso, perderam espaço no gov­erno. Não foi o que se deu com Roberto Rocha, ele não só acred­i­tou que a rup­tura era para valer como ocupou ou indi­cou pes­soas de sua con­fi­ança para inte­grar o gov­erno, como foi o caso de Pedro Maran­hão, den­tre out­ros.
As vicis­si­tudes da política que os afas­tou – basi­ca­mente o pro­jeto de José Reinaldo em “fazer” Flávio Dino gov­er­nador –, não mais per­sis­tem, pelo con­trário, demon­stram muito mais con­vergên­cias que divergên­cias em seus pro­je­tos para Maran­hão, como os são a Zona de Expor­tação do Maranhão-​ZEMA, de ini­cia­tiva do senador e os pro­je­tos para o Cen­tro de Lança­mento de Alcân­tara, uma luta diária do dep­utado fed­eral.
A vitória do pro­jeto politico traçado em 2006 e só alcançada em 2014, chega para o ex-​governador, em 2018, como o maior dos seus infortúnios. Humil­hado e igno­rado desde os primeiros dias do atual gov­erno, não mere­ceu, por fim, sequer a indi­cação como can­didato do grupo do gov­er­nador ao Senado, cargo que sem­pre alme­jou desde que per­maneceu no gov­erno em 2006 – e com isso per­mi­tiu a primeira vitória do grupo “oposi­cionista”. Pior que isso, assis­tiu o gov­er­nador erguer o braço do seu “favorito” como can­didato na primeira vaga e infor­mar que os demais pos­tu­lantes – entre os quais o ex-​governador – teriam que ir para o “murro” pela segunda indi­cação.
Isso, ape­sar de, mais de uma vez ter man­i­fes­tado o inter­esse de con­cor­rer como inte­grante da chapa do atual gov­er­nador.
Escrúpu­los de con­sciên­cia ou ide­ológ­ica? Que nada, o que mais tem nas cer­ca­nias do poder são ex-​aliados do grupo Sar­ney, sem con­tar a ver­dadeira “guerra” que travaram para con­tar com o apoio do Par­tido Democ­ratas — DEM, no arco de alianças, par­tido que pos­sui um ideário total­mente oposto (e em con­tradição) ao ideário comu­nista.
A segunda lição é que, emb­ora a “engen­haria” seja do ex-​governador, não se pode deixar de recon­hecer o gesto de desprendi­mento do senador tucano em aqui­escer com tal pro­jeto.
Ao fazer isso, no fundo, tam­bém, está dando uma lição ao atual gov­er­nador: a lição da gratidão. Mostra que, enquanto o atual gov­er­nador, por quem Jose Reinaldo tanto fez, lhe vira as costas largas, ele, Roberto Rocha, não coloca obstácu­los em dividir com outro opo­nente, Eduardo Braide, a sua can­di­datura de senador.
Como disse, trata-​se de uma estraté­gia inusi­tada – um can­didato a senador ser apoiado por dois can­didatos a gov­er­nador –, e nada garante que será exi­tosa. Mas, ninguém acred­i­tava que fosse ter êxito a estraté­gia da “coop­er­a­tiva de can­didatos” artic­u­lada em 2006.
A ter­ceira lição que nos socorre – e tam­bém mere­ce­dora de reg­istro –, é o altruísmo demon­strado pelo dep­utado Eduardo Braide, a quem o ex-​governador José Reinaldo já hipote­cou pub­li­ca­mente apoio no pleito majoritário ao gov­erno, em, tam­bém, não colo­car obstácu­los na “engen­haria” mon­tada com vis­tas a favore­cer a eleição do ex-​governador ao Senado. Aposta no futuro. Não no futuro dis­tante, mas no futuro próx­imo.
Esse gesto de desprendi­mento, será mer­cado­ria valiosa que poderá servir para cap­tar inúmeros apoios caso vença a bar­reira do primeiro turno e passé ao segundo, prin­ci­pal­mente se a estraté­gia for exi­tosa e José Reinaldo se eleger senador.
Não bas­tasse isso, o dep­utado ainda é muito jovem, o que sig­nifica, terá uma longa estrada na política. O gesto com o qual agora que ini­cia uma car­reira majoritária estad­ual, vai credencia-​lo junto à uma classe política tão des­gas­tada, como uma pes­soa capaz de ati­tudes grandiosas e não voltadas a inter­esses mera­mente pes­soais.
Além do mais não se pode descar­tar, antes ou depois da eleição, uma união em torno da can­di­datura mais viável, no primeiro ou ape­nas no segundo turno. Tudo pode acon­te­cer.
Por fim, mere­cendo igual recon­hec­i­mento, a “engen­haria” do ex-​governador. Qual­quer outro, enfrentando tan­tas adver­si­dades, traições e ingratidões, inclu­sive a trama urdida covarde­mente, que o impediu de ir para o Par­tido Democratas-​DEM, com quem ini­ciara as trata­ti­vas desde o ano pas­sado, teria esbrave­jado con­tra os seus algo­zes e tartu­fos ou mesmo desis­tido. Ao invés disso, com elegân­cia e argú­cia cos­tura em torno de si uma aliança inédita que pode romper com uma lóg­ica de quase todas as eleições: a de que o can­didato a gov­er­nador vence­dor no primeiro turno leva con­sigo o(s) senador(es).
A “engen­haria” do ex-​governador – sem con­tar os inúmeros apoios de prefeitos, ex-​prefeitos ou mesmo lid­er­anças políti­cas ainda gratas pelo trata­mento dele rece­bido desde quando ocupou os diver­sos car­gos no plano estad­ual ou fed­eral –, pode ser respon­sável pela rup­tura da lóg­ica política traçada até aqui.
Assim sendo, será a vitória da gratidão con­tra o engodo. Em todo caso, acerta ao ainda apos­tar na gratidão.
Abdon Mar­inho é advogado.

A SOCIEDADE E O SUPREMO.

Escrito por Abdon Mar­inho

A SOCIEDADE E O SUPREMO.
Por Abdon Mar­inho.
POU­CAS VEZES vi o Supremo Tri­bunal Fed­eral sofrer tan­tas críti­cas quanto agora. As incon­táveis charges espal­hadas nos veícu­los de comu­ni­cações nacionais – e mesmo além fron­teiras –, mostram o esgarça­mento das relações entre a sociedade e nossa corte Suprema. São achin­cal­hes, críti­cas áci­das, ofen­sas e mesmo protestos.
Vive­mos tem­pos difí­ceis. Quando poderíamos imag­i­nar que enti­dades da sociedade civil iriam con­vo­car protestos de rua con­tra a instân­cia máx­ima da justiça brasileira?
Parece que atingi­mos o fundo do poço. Só não ouso afir­mar isso porque sem­pre são capazes de cavar um pouco mais. O poço da indecên­cia brasileira não tem fundo.
Cer­ta­mente irão dizer: — tudo bem, são ape­nas piadas, charges.
Pode ser, mas nada comu­nica mel­hor o sen­ti­mento de um povo que o satírico, que a piada, que a con­versa infor­mal na mesa do bar.
E tem sido isso o que temos visto: as piadas, as charges, os debates de mesa de bar. O último “bate-​boca” entre os min­istros ren­deu, den­tre out­ras coisas, um inspi­rado samba-​canção e uma poe­sia decla­mada na voz de Maria Bethâ­nia.
Além do juridiquês e das falas empo­ladas nas sessões da Corte o que restou claro para a sociedade foi que o tri­bunal não fala a sua lín­gua. Pior que isso, que parte das excelên­cias estavam man­dando às favas quais­quer escrúpu­los de con­sciên­cia e jogando no lixo sua própria jurisprudên­cia do tri­bunal para livrar da prisão um ex-​presidente con­de­nado por cor­rupção e lavagem de din­heiro, com sen­tença con­de­natória con­fir­mada e ampli­ada pela segunda instân­cia.
A sociedade sen­tiu que a Corte Suprema, guardiã maior da sociedade, respon­sável em última instân­cia pela igual­dade, estava, clara­mente, como dito pelo próprio con­de­nado, em con­versa tele­fônica inter­cep­tada por ordem da Justiça, “aco­var­dada”.
E é fato que o Supremo tem se ape­que­nado na dis­cussão sobre a prisão do ex-​presidente. Como se o mesmo, por ser quem é e ter uma claque artic­u­lada – além de respon­sável pela nomeação de muitos deles –, estivesse acima do bem e do mal, inal­cançável pela lei.
Em tudo a sessão que ini­ciou o jul­ga­mento de um habeas cor­pus para livrar o ex-​presidente do cárcere a que se encon­tra con­de­nado, pare­ceu uma pés­sima ence­nação, a começar pela pausa para o cafez­inho que de dez min­u­tos rotineiros virou mais de hora e que cul­mi­nou com um “puxad­inho legal” que deu um salvo con­duto para não ser preso até a con­clusão do jul­ga­mento, já aprazado, ini­cial­mente, para o dia 4 de abril próx­imo.
O cidadão, mesmo aquele que não vive ou cir­cula no meio jurídico, perce­beu, com clareza solar, que a Suprema Corte esta­b­ele­ceu um trata­mento dis­tinto entre os brasileiros.
Afi­nal, nas mes­mas condições do ex-​presidente, quan­tos con­de­na­dos, mesmo pre­sos, teriam um habeas cor­pus exam­i­nado com tanta celeri­dade? A resposta é sabida por todos. Inúmeros são os que não con­seguem chegar até o STF e os que chegam, pela tradição da Corte, não têm seus reclames nem con­heci­dos.
Agora mesmo, quan­tos não são os pedi­dos de pre­sos, até por crimes menores, mesmo faméli­cos, que repousam nos gabi­netes dos min­istros do Supremo sem que ninguém os exam­ine? Estes têm o mesmo dire­ito do ex-​presidente de serem soltos ou não serem guarda­dos pre­sos até que o tri­bunal os exam­ine? Claro que não.
Ouvi na sessão que o paciente não pode­ria ser preso por inér­cia do corte em não con­cluir o jul­ga­mento do seu habeas cor­pus. Mas quan­tos não estão pre­sos nes­tas condições? Não foi o tri­bunal que enten­deu que isso era pos­sível? Que não ofendia a Con­sti­tu­ição? Agora não pode mais?
Acaso, antes da con­de­nação, e pos­te­rior con­fir­mação da sen­tença pela segunda instân­cia do sen­hor ex-​presidente e out­ros graú­dos, havia tanto furor e mobi­liza­ção pela revisão da decisão do STF de 2016 que con­siderou con­sti­tu­cional o cumpri­mento ante­ci­pado da pena? A resposta é não.
Aliás, bem poucos foram o que se colo­caram con­trários aquele entendi­mento, até mesmo, em vir­tude do reduzido número de recur­sos espe­ci­ais que são provi­dos no Supe­rior Tri­bunal de Justiça — STJ, cerca de 0,6% (zero vír­gula seis por cento) e menos ainda os que con­seguem chegar e serem provi­dos no Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF.
Quando naquela opor­tu­nidade me colo­quei ao lado da mino­ria que foi der­ro­tada na dis­cussão ou seja, con­trário ao cumpri­mento ante­ci­pado da pena, foi por enten­der que tal entendi­mento estava em desacordo com a regra con­sti­tu­cional do artigo 5º.: “LVII — ninguém será con­sid­er­ado cul­pado até o trân­sito em jul­gado de sen­tença penal con­de­natória;”.
O STF e muita gente boa enten­deram que bas­taria a con­fir­mação da con­de­nação em segunda instân­cia para que o con­de­nado fosse instado ao cumpri­mento da pena. E que tal medida, con­forme defendeu na época o min­istro Gilmar Mendes, aprox­i­maria o Brasil do mundo civ­i­lizado, uma vez que o Brasil era um dos poucos países onde os con­de­na­dos não cumpriam a pena logo na primeira ou na segunda instân­cia.
Ora, se aque­las pes­soas de notável saber jurídico, que têm a mis­são de inter­pre­tar o texto con­sti­tu­cional, ainda que por estre­ita maio­ria, estavam dizendo que o cumpri­mento da pena pode­ria ocor­rer a par­tir da segunda instân­cia instân­cia, como não aceitar? Ainda que dis­cor­dando, aceitei.
Agora, com os escân­da­los se suce­dendo e um “monte de gente impor­tante envolvida” – como na música da banda RPM –, sendo con­vi­dada a con­hecer as dependên­cias do sis­tema carcerário nacional, as mes­mas excelên­cias que “cri­aram” a regra que vem sendo apli­cada no país inteiro, querem redis­cu­tir a matéria.
Na ver­dade, redis­cussão é um eufemismo, suas excelên­cias querem é mudar a regra com o jogo em anda­mento.
Diante de tudo isso, com as infor­mações cir­cu­lando com uma veloci­dade nunca visto, não é de se estran­har a insat­is­fação da sociedade com a sua Corte Suprema.
A sociedade está acober­tada de razão ao ques­tionar e se inda­gar os porquês de tan­tas oscilações de com­por­ta­mento agora, se decidi­ram, ainda ontem, que estava tudo certo.
Como é pos­sível a instân­cia maior da Justiça brasileira tomar uma decisão e esta mesma decisão não ser cumprida nem pelos seus min­istros? Como é pos­sível que a regra valha para uns e não para out­ros? Como querem que a sociedade entenda isso como nor­mal? Como achar nor­mal que, agora, quando os poderosos estão na eminên­cia de cumprirem o “carma” dos demais mor­tais busquem sub­ter­fú­gios para driblar a regra que cri­aram?
Alertei antes e o faço nova­mente: o STF, a par­tir de suas últi­mas posições cam­inha a pas­sos lar­gos para con­quis­tar sua irrelevân­cia na história; para tornar-​se um tri­bunal sem o respeito da sociedade brasileira; para ser referido como um tri­bunal boli­var­i­ano.
O Brasil que já tem uma classe política hor­ro­rosa – pio­rando a cada dia –, com os poderes leg­isla­tivo e exec­u­tivo com­petindo, entre si, para saber quem comete mais crimes, pas­sar a ter uma Corte Suprema em que a sociedade não possa con­fiar, ter­e­mos a insolvên­cia das insti­tu­ições e o fim da democ­ra­cia. Se é que esta algum dia exis­tiu por aqui. Em todo caso, fin­gíamos que tín­hamos.
Um país com tal nível de descrédito insti­tu­cional não tem como fun­cionar o que leva a ser um campo aberto a todo tipo de opor­tunistas, mila­greiros e crim­i­nosos.
A quadra de inse­gu­rança jurídica em vive o país é inédita, não tem solução fácil e, infe­liz­mente, tem uma “pitada” de pre­sepada do nosso Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF, que não tem para onde ir nem para onde voltar.
Como des­fazer a decisão de 2016 sem cair no mais abso­luto descrédito? Como man­ter a decisão de 2016 sem sub­me­ter todos a ela, inclu­sive os mem­bros da próprio tri­bunal que teimam em não cumprir? Como fica a sociedade? Ao alvedrio de um tri­bunal em que a sorte do juris­di­cionado depende da mesa onde seu processo vai repousar? Uma lei para cada parte?
A atual situ­ação do país é esta. Entre­tanto acred­ito que mais impor­tante que o diag­nós­tico, sejam as causas: como cheg­amos a essa situ­ação de caos insti­tu­cional? Quem são os cul­pa­dos? Esse é o resul­tado do atual mod­elo que temos?
São per­gun­tas que pre­cisamos nos fazer para dar­mos um norte ao país para os próx­i­mos anos. Fora isso, só muita fé em Deus para acred­i­tar que saire­mos cedo de tamanha insta­bil­i­dade.
Abdon Mar­inho é advogado.

O SUPREMO AMEAÇA A DEMOCRACIA.

Escrito por Abdon Mar­inho

O SUPREMO AMEAÇA A DEMOC­RA­CIA.
Por Abdon Mar­inho.
JAMAIS pen­sei algum dia iria pro­ferir uma assertiva tão dura. Mas o que dizer quando, em rede nacional, min­istros da mais ele­vada Corte de Justiça do Brasil tro­cam acusações dig­nas de bares de pés-​sujos e por pouco não partem para “as vias de fato”?
Já vem de longe a inca­paci­dade de suas excelên­cias cumprirem o ele­vadís­simo papel que lhe reserva a Con­sti­tu­ição Fed­eral e par­tirem para agressões mútuas que, não ape­nas enver­gonham a Justiça, ofen­dem o sen­ti­mento de nação dos cidadãos de bem que “ralam” a não mais poderem para sus­ten­tar o mon­u­men­tal Estado, que den­tre out­ras coisas, garante as mor­do­mias e priv­ilé­gios injus­ti­ficáveis da elite gov­er­nante, inclu­sive da própria corte.
A Justiça, aprendi desde cedo, é a der­radeira trincheira da cidada­nia. Sim, quando nada mais pud­er­mos fazer para ces­sar uma injustiça, uma vio­lação aos nos­sos dire­itos, nos restará bater às por­tas dos tri­bunais para que eles nos socor­ram.
E, se qual­quer órgão da justiça tem tal sig­nificân­cia, o Supremo Tri­bunal Fed­eral, sua instân­cia máx­ima, é a encar­nação de todo esse sen­ti­mento, deve, ele e seus min­istros, serem insuscetíveis de quais­quer críti­cas, pos­suírem, con­forme man­da­mento con­sti­tu­cional, uma con­duta ilibada. Aquela que qual­quer dicionário define como “con­duta limpa, cor­reta, ínte­gra, com honra. Uma pes­soa com idonei­dade moral, hon­esta, que age sem­pre de acordo com a moral e os bons cos­tumes”.
Como o cidadão deve sentir-​se quando ouve em rede nacional de tele­visão e rádio, um min­istro dizer que o outro é a mis­tura do mal com o atraso e pitadas de psi­co­pa­tia e o outro retru­car pedindo que o detra­tor feche seu escritório de advo­ca­cia?
Em que republi­queta esta­mos onde um min­istro diz que o outro é o mal, é um psi­co­pata e é retor­cido com a acusação de que con­tinua atuando como advo­gado?
E vejam, que em cenas de pugi­latos ante­ri­ores as refer­ên­cias foram, igual­mente, do mesmo nível ou pior.
Se o que estar dito tiver algum fundo de ver­dade – e tam­bém se não for, pouco importa –, o cidadão tem todos os motivos do mundo para não con­fiar na sua instân­cia máx­ima de Justiça, dai a razão da assertiva de que o Supremo, na quadra atual, rep­re­senta uma ameaça a democ­ra­cia brasileira.
Uma ameaça porque aos poucos e com o som histriônico dos pic­a­deiros vai caindo no descrédito pop­u­lar. Até porque, o vex­ame moral não alcança ape­nas os mais famosos con­tendores, se espalha por diver­sos out­ros.
Acred­ito que assis­ti­mos um momento hor­rível na cred­i­bil­i­dade da Justiça. Não digo pior porque sem­pre estão na iminên­cia de pio­rarem um pouco mais a já enx­o­val­hada imagem da pobre sen­hora.
Infe­liz­mente, pois não faz tanto tempo assim – talvez menos de um quarto de século –, ninguém ousava ques­tionar uma decisão de um min­istro do STF ou uma de suas decisões cole­giadas, hoje é como se não tivesse importân­cia alguma. Os poderosos, inclu­sive do crime orga­ni­zado, chegaram à con­clusão que os min­istros do STF são “pres­sionáveis”, ou uma definição bem pior que essa, para o desalento da sociedade.
Vejam o caso do cumpri­mento pro­visório da pena após de esgo­ta­dos os recur­sos de segunda instân­cia.
O Supremo decidiu, ainda ontem, em ter­mos jurídi­cos, em 2016, con­fir­mando uma decisão de 2009, que tal pos­si­bil­i­dade não ofend­e­ria o princí­pio con­sti­tu­cional da pre­sunção de inocên­cia.
A decisão foi aper­tada, mas foi uma decisão do tri­bunal, caberia aos demais mem­bros, ainda que ressal­vando seu entendi­mento pes­soal, man­ter a higidez da decisão cole­giada.
Não é isso que tem ocor­rido, os min­istros colo­cam seu posi­ciona­mento pes­soal, sua fração de poder, acima da decisão cole­giada.
Em out­ras palavras: a liber­dade dos cidadãos pas­sou a ser uma lote­ria, depen­dendo de onde seu pedido “cair”, min­istro ou turma, pode ficar livre ou não.
Temos diante de nós o tri­bunal cuja mis­são precípua é a guarda Con­sti­tu­ição, como o primeiro a desrespeita-​la, prin­ci­pal­mente naquela que é sua parte mais impor­tante: dos dire­itos e garan­tias fun­da­men­tais, o Título II.
Logo no seu artigo 5º., está assen­tado: “Art. 5º Todos são iguais per­ante a lei, sem dis­tinção de qual­quer natureza, garantindo-​se aos brasileiros e aos estrangeiros res­i­dentes no País a invi­o­la­bil­i­dade do dire­ito à vida, à liber­dade, à igual­dade, à segu­rança e à pro­priedade, nos ter­mos seguintes:”.
Com efeito, a bal­búr­dia que tomou conta do STF, retira dos brasileiros a sua situ­ação prin­ci­pal: a igual­dade per­ante a lei. Fran­cisco e José são iguais per­ante a lei mas se forem con­de­na­dos em segunda instân­cia e seus pedi­dos de liber­dade “caírem”, nas mãos dos min­istros Gilmar Mendes e Edson Fachin, respec­ti­va­mente, ape­nas como exem­plo, cessa aí sua “igual­dade”, um esper­ará o jul­ga­mento de todos e quais­quer recur­sos enquanto que o outro irá ou con­tin­uará, sem dó ou piedade, no cárcere.
Existe situ­ação pior que esta? Existe! A decisão ao gosto do freguês.
Vejam o caso do sen­hor Luiz Iná­cio Lula da Silva. O indig­i­tado, por coin­cidên­cia ex-​presidente da República, foi inves­ti­gado, indi­ci­ado, denun­ci­ado, jul­gado e con­de­nado, em primeira e segunda instân­cia e, con­forme o entendi­mento do STF, após o jul­ga­mento dos der­radeiros ape­los no Tri­bunal Regional Fed­eral da Quarta Região, dev­erá ou dev­e­ria seguir para o cumpri­mento da pena de 12 anos e um mês que lhe foi apli­cada.
O que temos visto desde a con­fir­mação da con­de­nação em segunda instân­cia do ex-​presidente é todo tipo de gente, até mesmo réus, exercerem todo o tipo de pressão sobre a Suprema Corte do país, para que ela mude o seu entendi­mento sobre o cumpri­mento pro­visório da pena. E, pior que isso, mesmo os inte­grantes do tri­bunal investi­dos nesta mis­são.
Vejam, o enve­ne­na­mento maior do STF a cul­mi­nar com a sua desmor­al­iza­ção per­ante a sociedade brasileira, não é para o tri­bunal voltar a dis­cu­tir o assunto, o que já não seria recomendável, tão pouco tempo da decisão ante­rior, o que está por trás de todo esse engodo é mudar o entendi­mento e per­mi­tir que o ex-​presidente fique impune pelos crimes aos quais já foi con­de­nado, e pelas demais con­de­nações que não tar­darão a ocor­rer – com mais de setenta anos e com tanta gente dis­posta a livrá-​lo do alcance da lei, além da prover­bial lentidão da justiça nacional, estou certo que ter­mi­nará seus dias, encanecendo da sociedade brasileira, livre, leve e solto.
O meu entendi­mento pes­soal – e escrevi sobre isso por ocasião do jul­ga­mento de 2016 –, é que o encar­ce­ra­mento a par­tir da segunda instân­cia estaria em dis­sonân­cia com o espírito do leg­is­lador con­sti­tu­inte, qual seja, vio­laria a pre­sunção de inocên­cia. E, con­hecendo a Justiça brasileira, via como um risco aos dire­itos dos cidadãos.
Mas, emb­ora irres­ig­nado, quedei-​me inerte em respeito à decisão Corte Suprema.
Agora, diante de tamanho acinte à sociedade brasileira, entendo que o Supremo está às por­tas da dec­re­tação de sua irrelevân­cia.
Esta­mos diante de min­istros que se pre­dis­põem a mudar o entendi­mento da maior instân­cia da Justiça para aten­der uma pes­soa, para isso não impor­tando a imensa inse­gu­rança jurídica que levará o país.
Sim, como a decisão orig­i­nal é de 2009 e a con­fir­mação de 2016, temos diver­sos cidadãos cumprindo pena, quando, tal qual o ex-​presidente Lula, pode­riam nunca con­hecer as dependên­cias do sis­tema pri­sional, seja pelo decurso do prazo, seja pelo perec­i­mento dos ape­na­dos, seja pela gen­erosa pre­scrição das penas no país.
Ora, caso deci­dam pela mudança de entendi­mento (me recuso acred­i­tar que come­terão o suicí­dio cole­tivo), vão, junto com a decisão sob medida, deter­mi­nar, de ofí­cio, que todos que este­jam na mesma situ­ação sejam ben­e­fi­ci­a­dos? Mesmo os que não têm recur­sos pen­dentes? E, o que farão com os que já cumpri­ram suas penas, que foram pri­va­dos da liber­dade, serão ind­eniza­dos?
Talvez fique menos feio que uma decisão para aten­der uma única pes­soa.
Caso, o pior venha acon­te­cer – e digo isso pen­sando no futuro do país e suas insti­tu­ições até porque o infortúnio de ninguém me traz prazer –, serei forçado a con­cor­dar com o con­de­nado Luiz Iná­cio Lula da Silva, quando apan­hado em um grampo autor­izado pela Justiça: “— temos uma Suprema Corte aco­var­dada”.
Mas encerro acred­i­tando que o STF, ape­sar de todos os vex­ames que temos assis­tido, não vai dar o primeiro passo para o Brasil se trans­for­mar numa Venezuela com comida e papel higiênico, como bem disse um incré­dulo amigo, recen­te­mente.
Abdon Mar­inho é advogado.