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A MIS­ÉRIA DE CADA UM.

Escrito por Abdon Mar­inho

A MIS­ÉRIA DE CADA UM.

Por Abdon Mar­inho.

O MARAN­HÃO se prepara para mais uma eleição estad­ual.

Inde­pen­dente do que venha acon­te­cer; quem sejam os can­didatos; quem vai gan­har ou perder; das pro­postas dos can­didatos, uma coisa tenho por certo: mais uma vez a pauta da mis­éria tomará conta do debate político.

Tem sido assim desde que come­cei a acom­pan­har o debate eleitoral estad­ual – quando ainda era era uma cri­ança, no longín­quo 1982.

Desde então em todas as eleições o tema da mis­éria tem assento garan­tido no debate. E não é sem razão: a despeito viver­mos num dos esta­dos mais ricos da fed­er­ação, a nossa pop­u­lação ostenta índices africanos de mis­éria, com grande parte da pop­u­lação vivendo graças aos diver­sos pro­gra­mas soci­ais de dis­tribuição de renda.

E assim, na cap­i­tal ou no inte­rior, temos mil­hões de maran­henses vivendo em condições indig­nas, em palafi­tas, casas de pal­has e chão batido, cer­cadas como cur­rais ou em barro, onde as famílias, cri­anças, jovens, adul­tos e idosos, não raro, pade­cem com a falta de comida.

O Maran­hão vive outro eterno para­doxo de, sendo tão rico, expor­tar mão de obra escrava para o resto do país, inclu­sive para esta­dos que não pos­suem as condições favoráveis que temos.

Os números da mis­éria no nosso estado foram, são e serão parte da nossa ver­gonha.

E Será sem­pre o maior entrave do desen­volvi­mento enquanto con­viver­mos com uma classe polit­ica que coloca seus inter­esses próprios à frente dos inter­esses da pop­u­lação.

Agora mesmo são divul­ga­dos, por insti­tu­ições ofi­ci­ais, que houve aumento no número de pobres no nosso estado e que, tam­bém, aumen­tou o número de desem­pre­ga­dos.

Os dados da PNAD e IBGE são reais.

Não adi­anta ten­tar desmerecê-​los.

Quem con­hece o Maran­hão atesta facil­mente o que foi apon­tado nas pesquisas. Todos os dias vejo jovens e sen­hores das mais vari­adas áreas pedi­rem ou recla­marem da falta de emprego ou que não ganha o sufi­ciente para fazer face as despe­sas com ali­men­tação, trans­porte, gás e a manutenção de famil­iares. Muitos deixaram as esco­las par­tic­u­lares, os planos de saúde. Muitos são os que não con­seguem uma ali­men­tação diária digna.

Não adi­anta dizer que a crise é nacional ou fruto de admin­is­trações ante­ri­ores. Não que estes fatos não este­jam inter-​relacionados, eles estão.

Qual­quer um é capaz de iden­ti­ficar que a crise que assola o país se faz refle­tir tam­bém por aqui.

Qual­quer um é capaz de iden­ti­ficar que os gov­er­nos ante­ri­ores tem sua respon­s­abil­i­dade com a mis­éria do Maranhão.

Este não é o debate. O debate ver­dadeiro vai além disso.

O Maran­hão foi a terra prometida que não se con­cretizou ape­sar de todas as condições favoráveis que sem­pre teve: recur­sos hídri­cos; Porto de qual­i­dade; ter­ras férteis; min­erais diver­sos, etc.

Os reti­rantes das secas do resto do nordeste, nos anos 40, 50, 60 e 70, vieram cá acred­i­tando em todo o poten­cial maran­hense. E nada acon­te­ceu! Mais de setenta anos depois, con­tin­u­amos osten­tando números africanos.

A respon­s­abil­i­dade por esse estado de coisas é de todos, como bem disse, em texto recente, o ex-​governador José Reinaldo Tavares. Ou como dizia meu saudoso pai: “em casa que falta pão, todos brigam e ninguém tem razão”.

O grupo Sar­ney que coman­dou o estado por décadas tem respon­s­abil­i­dade pela mis­éria do nosso povo – e por isso não tem dire­ito de criticar o aumento da mesma nos indi­cadores referi­dos –, assim como os demais gov­er­nos que lhe fiz­eram oposição têm sua parcela de respon­s­abil­i­dade, inclu­sive o atual que, cam­in­hando para a quadra final, não mostra medi­das conc­re­tas capazes de apon­tar um rumo.

Sendo as suas medi­das e ini­cia­ti­vas não muito difer­entes daque­las dos seus pre­de­ces­sores. Talvez até pior em muitos aspec­tos.

Não faz muito tempo assisti a uma reportagem sobre o Estado de Israel.

O que aquele povo real­i­zou em setenta anos, numa área deserta, menor que o Estado de Alagoas, com con­fli­tos de todos os lados, tendo que inve­stir mas­si­va­mente em segu­rança, é algo para fazer corar de ver­gonha os gov­er­nantes brasileiros e, sobre­tudo, os maran­henses. Tornou-​se uma potên­cia, a 32ª econo­mia do mundo.

Mas não pre­cisamos ir tão longe. O Ceará, aqui do lado, enfrentando, tam­bém situ­ações tão adver­sas é outro exem­plo de pros­peri­dade. O que mais ouço é que o Ceará cresceu e se desen­volveu como um todo. E os números estão aí para mostrar. São polos e mais polos de desen­volvi­mento econômico, atraindo cidadãos de out­ros esta­dos para irem lá com­prar para reven­der ou inve­stir.

Vejam, não faz muitas décadas aquele estado expor­tava mão de obra para o Maran­hão, Pará, Ama­zonas. Hoje está recebendo seus fil­hos de volta e tan­tos out­ros de out­ras nat­u­ral­i­dade.

Outro Estado que apre­sen­tou desen­volvi­mento inve­jável foi Per­nam­buco. Não ape­nas na cap­i­tal, Recife, que muitos brasileiros, apon­tam como a Miami do Brasil, como tam­bém no inte­rior. Isso tudo, em pouco tempo.

Estes são esta­dos que aproveitaram – e que cri­aram condições de desen­volvi­mento –, com o pouco que tin­ham, foram atrás e fiz­eram acon­te­cer.

Se são o sucesso que são hoje é porque seus gov­er­nantes tiveram visões de futuro, sabiam o que que­riam e como atin­gir seus obje­tivos.

Enquanto isso, o Maran­hão “pati­nou” e con­tinua a “pati­nar” no fim da fila do desen­volvi­mento, tro­cando lugar aqui e acolá, nos diver­sos indi­cadores, com Alagoas, pois até o Piauí, nos ultra­pas­sou em quase tudo.

Os cidadãos maran­henses devem se per­gun­tar como esta­dos que até bem pouco tempo pas­savam por difi­cul­dades extremas, expor­tando reti­rantes que fugiam da fome, apre­sen­tam uma situ­ação bem mel­hor que a nossa no rank­ing de desen­volvi­mento econômico e social, enquanto o nosso estado, infe­liz­mente, não só con­tinua na “rabeira” como não apre­senta boas expec­ta­ti­vas de futuro com tan­tas condições favoráveis.

Lem­bro que os políti­cos do grupo Sar­ney, quando insta­dos a se man­i­festarem sobre o crônico quadro de mis­éria, vin­ham com a velha des­culpa das “razões históri­cas e cul­tur­ais”. Teve até um que chegou a dizer que fazia parte da cul­tura dos maran­henses habitações cober­tas de palha e feitas em adobe. Como se tamanha ver­gonha fosse jus­ti­ficável.

Des­cul­pas bem pare­ci­das são apre­sen­tadas pelos atu­ais donos do poder quando con­fronta­dos com a situ­ação de aumento de pobreza, de desem­prego e até de vio­lên­cia.

Primeiro ten­tam desqual­i­ficar os insti­tu­tos de pesquisas, como se estes não fos­sem os mes­mos que sem­pre embasaram as críti­cas ao grupo Sar­ney.

Depois vêm com a sur­rada des­culpa da “her­ança maldita”, que o quadro é fruto de gov­er­nos ante­ri­ores ou do quadro nacional.

Sem desprezar tais jus­ti­fica­ti­vas, as mes­mas não pas­sam de des­cul­pas. Lem­bro que no fim década de oitenta e começo da de noventa, já no primeiro gov­erno, Tasso Jereis­sati, do Ceará, apre­sen­tava um rumo para o seu estado, pro­jeto de desen­volvi­mento econômico e social. Lem­bro que o salto que deu Per­nam­buco no único mandato de Eduardo Cam­pos.

Forçoso recon­hecer que não tive­mos o mesmo com­pro­me­ti­mento por aqui, ape­sar de todas as condições, recur­sos nat­u­rais e rep­re­sen­ta­tivi­dade política, com pres­i­dente da República, Min­istros de Estado, e tudo mais. Fal­tou e ainda falta, políti­cos que enx­er­guem além dos próprios inter­esses – com as exceções de sem­pre a jus­ti­ficar a regra.

Mesmo o atual gov­erno nascido com a promessa de fazer o estado avançar – con­forme os números mostram –, não apre­senta o resul­tado esper­ado.

Não é que ten­hamos uma caveira de burro enter­rada por aqui – até deve­mos ter mais de uma –, o que quer me pare­cer é que os nos­sos gov­er­nantes sem­pre viram na rep­re­sen­tação política nada além do “poder pelo poder” e uma forma de gal­garem out­ras posições.

Por conta disso, não con­seguem fazer gov­er­nos de con­tinuidade ou val­orizar as ini­cia­ti­vas de quais­quer out­ros que não este­jam sob o mando do gov­er­nante de plan­tão. Situ­ação que parece ter pio­rado na atu­al­i­dade.

Um dos exem­p­los mais claros que tenho disso é o pro­jeto do ZEMA – Zona de Expor­tação do Maran­hão, este, ao meu sen­tir, um pro­jeto que pode­ria ele­var a econo­mia estad­ual de pata­mar, colocando-​a em condições de igual­dade com Sin­ga­pura ou Hong Kong, na Ásia – temos todas as condições para isso –, entre­tanto, como parte de uma ini­cia­tiva de alguém de faz oposição ao atual gov­er­nador, o senador Roberto Rocha, não se viu e não se vê nen­hum empenho dos gov­ernistas em encam­par e lutar pelo pro­jeto para fazê-​lo acontecer.

O outro exem­plo, este em menor escala, mas com sig­nificân­cia, é a indifer­ença dos atu­ais gov­er­nantes as ini­cia­ti­vas do ex-​governador e dep­utado fed­eral José Reinaldo Tavares em relação ao Com­plexo Aeroe­s­pa­cial de Alcân­tara. A ideia é muito boa, trará desen­volvi­mento para o estado e, prin­ci­pal­mente, para aquela região, ape­sar disso não vemos o empenho do gov­erno e somar para que isso ocorra.

É assim, meus sen­hores, que o Maran­hão con­tinua afun­dado na mis­éria.

Pois indifer­ente as condições do povo, os seus gov­er­nantes sem­pre estiveram mais pre­ocu­pa­dos com seus próprios inter­esses pes­soais e políti­cos.

E, arro­gantes que são, não sen­tem quais­quer con­strang­i­men­tos por conta disso.

E, quem não se con­strange com a mis­éria alheia é, sim, o ver­dadeiro mis­erável.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

SOBRE APREEN­SÕES DE VEÍCU­LOS: O EXAGERO DO PRÍNCIPE.

Escrito por Abdon Mar­inho

SOBRE APREEN­SÕES DE VEÍCU­LOS: O EXAGERO DO PRÍNCIPE.

Por Abdon Marinho

COLHO da obra “O Príncipe”, de Nico­lau Maquiavel o seguinte: “Deve o príncipe, não obstante, fazer-​se temer de forma que, se não con­quis­tar o amor, fuja ao ódio, mesmo porque podem muito bem coex­i­s­tir o ser temido e o não ser odi­ado: isso con­seguirá sem­pre que se abstenha de tomar os bens e as mul­heres de seus cidadãos e de seus súdi­tos e, em se lhe tor­nando necessário der­ra­mar o sangue de alguém, faça-​o quando exi­s­tir con­ve­niente jus­ti­fica­tiva e causa manifesta.”

E arremata: “Deve, sobre­tudo, abster-​se dos bens alheios, posto que os homens esque­cem mais rap­i­da­mente a morte do pai do que a perda do patrimônio.”

Em tex­tos ante­ri­ores assen­tei o quanto era desproposi­tada e exager­ada a política de empreen­dida pelo gov­erno estad­ual de apreen­der e leiloar os veícu­los dos cidadãos – estima-​se que cerca de 15 mil foram apreen­di­dos e quase 12 mil leiloa­dos, nos últi­mos três anos e meio –, na maio­ria das vezes, o único bem dos cidadãos que vêm enfrentando uma das maiores crises econômi­cas de todos os tem­pos, graças, sobre­tudo, aos equívo­cos dos gov­er­nos ali­a­dos do atual gov­erno estad­ual no plano federal.

Foram tan­tas as apreen­sões e leilões que arrisquei dizer que se fosse, o gov­erno estad­ual, uma con­ces­sionária de veículo teria sido campeã de ven­das recordes nos três anos segui­dos.

Ora, ninguém, no mundo real, atrasa as con­tas por querer ou por serem “foras-​da-​lei”, como ten­tou sus­ten­tar a pro­pa­ganda ofi­cial durante muito tempo: de que as apreen­sões se davam como medida de com­bate à vio­lên­cia, que os veícu­los apren­di­dos eram de mar­gin­ais e que, por­tanto, estar-​se-​ia fazendo um bem maior a sociedade: sua segurança.

O tempo provou que, ape­sar das apreen­sões “para com­bater a vio­lên­cia”, esta (a vio­lên­cia) man­tém os mes­mos índices desde o iní­cio do atual gov­erno, con­forme atesta o site G1, apre­sen­tando, inclu­sive, pas­mem!, um acréscimo nos anos de 2015 e 2016. Ano pas­sado, 2017, o número de crimes vio­len­tos no estado alcançou 1.945 víti­mas, o que rep­re­senta 27,8/100 mil habi­tantes, o Maran­hão tem 7 mil­hões de habi­tantes. Ape­nas para se ter uma ideia, o Estado de São Paulo, com mais de 45 mil­hões de habi­tantes, uma pop­u­lação seis vezes supe­rior a nossa, reg­istrou “ape­nas” 3.892 crimes vio­len­tos, o que lhe con­feriu uma média de 8,6/100 mil habi­tantes, a mais baixa do país.

Ele­men­tar, caro Wat­son (a mais famosa frase jamais dita por Sher­lock Holmes, per­son­agem imor­tal­izado por Sir Arthur Conan Doyle), salvo algu­mas exceções, a ban­didagem hoje está muito mais profis­sion­al­izada, quer pas­sar des­perce­bida, exceto para o come­ti­mento de crimes, seus veícu­los estão em dias com suas taxas. Assim, o «grosso» das apreen­sões de veícu­los deu-​se em cima dos cidadãos comuns, operários, tra­bal­hadores que sofrem com a crise, com o preço da gasolina e do gás de coz­inha.

São os assalari­a­dos que gan­ham um ou um pouco mais do salário mín­imo que não con­segue pagar as dívi­das de seus veícu­los pois têm de optar entre pagar e colo­car o “de comer” den­tro de casa; o que está voltando a coz­in­har na lenha pois o boti­jão de gás con­some quase dez por cento do ordenado.

Foram estes os cidadãos que, para tra­bal­har e fugir do caótico trans­porte cole­tivo, fez um cav­alar esforço para com­prar um “car­rinho» ou uma moto em “tro­cen­tas» prestações, que atra­sou suas obri­gações com paga­mento das suas taxas e licen­ci­a­men­tos.

Muitos deles, tendo per­dido o emprego usavam/​usam seus veícu­los para fazer o, tam­bém, reprim­ido trans­porte cole­tivo, atuando como “mototaxistas”ou “über genérico”. Estas foram as pes­soas a quem foi dire­cionada a polit­ica de apreen­sões de veícu­los. E foram elas que, por não poderem res­gatar os mes­mos, dev­i­dos as mul­tas e taxas, perderam seu único bem e meio de sobre­vivên­cia.

Outro dia, assisti, com pro­fundo pesar e indig­nação, a revolta de um pro­pri­etário de veículo apreen­dido no Municí­pio de São José de Riba­mar. O cidadão tomado por incon­tida revolta e deses­pero destruiu todo o seu veículo. Já sabia que uma vez apreen­dido não teria como resgatá-​lo.

São pes­soas como aquele com­pan­heiro que encon­trei no inte­rior em uma de min­has andanças, ainda por mea­dos de 2015, ele me rev­elou, con­forme já nar­rado aqui, toda a sua revolta com o gov­erno por ter, segundo ele, “acabado” com sua moto na cam­panha do atual gov­er­nador e, quando pen­sava que rece­be­ria alguma com­pen­sação pelo esforço, “perdeu” a sua moto numa destas blitzes do gov­erno estad­ual. Perdeu, aliás, em defin­i­tivo, pois não teve como quitar o que devia e ela foi a leilão.

O país tem vivido, nos últi­mos anos, uma das crises mais agu­das. Só quem não con­vive com os cidadãos comuns ignora isso. Diari­a­mente recebo abor­dagem de jovens, de sen­hores, sen­ho­ras e até pes­soas com idade mais avançada, me pedindo uma ajuda, um emprego, uma colo­cação de tra­balho para si ou para alguém seu.

As estatís­ti­cas com­pro­vam o que já sabia pelo diál­ogo per­ma­nente com as pes­soas: que houve um aumento da mis­éria no Maran­hão. Ela vem de longe e se acen­tuou nos últi­mos anos (aguar­dem texto especí­fico sobre isso).

Pois bem, ao que parece só agora o gov­erno se deu conta desta crise e acena, no assunto especí­fico das apreen­sões de veícu­los com uma uma providên­cia já con­tida no Código Nacional de Trân­sito de dar prefer­ên­cia a edu­cação e con­sci­en­ti­za­ção dos cidadãos ao invés de apreen­der e leiloar seus bens sem maiores con­sid­er­ações.

A medida vem com “ape­nas” três anos e meio de atraso. Essa era uma medida que dev­e­ria ter sido imple­men­tada no começo do gov­erno. Ao invés de apren­der os veícu­los dev­e­riam, antes de tal medida, ter feito as blitzes educa­ti­vas e de con­sci­en­ti­za­ção. Aquilo que o decreto edi­tado ou a edi­tar prevê «copiando» o que já deter­mina o Código Trân­sito Brasileiro — CTB, Lei 9.503. Qual­quer um sabe disso: Primeiro se educa, se con­sci­en­tiza, se é tol­er­ante, para depois aplicar os rig­ores da lei.

Assisto a tudo isso fico com impressão de que os mem­bros do gov­erno ao invés de lerem “O Príncipe”, Nico­lau Maquiavel, leram ape­nas “O Pequeno Príncipe”, de Antoine de Saint-​Exúpery – sem qual­quer embargo, uma obra igual­mente mag­ní­fica, porém mais afeita às coisas dos sen­ti­men­tos que da polit­ica. Caso tivessem aten­ta­dos para a obra do gen­ovês ao invés da obra do francês, teriam perce­bido que no seu escólio con­sta o lap­i­dar ensi­na­mento de que o mal deve ser feito de uma só vez enquanto que o bem deve se fazer aos poucos.

Pois é, se pas­saram três anos e meio, indifer­entes ao sofri­mento do povo, na apli­cação dos rig­ores da lei, passa a assi­s­tir razão aos críti­cos e opos­i­tores, quando agora, às vésperas de uma eleição, na quadra final do mandato, ten­tam “vender” a ideia que pas­saram a praticar o bem fazendo ces­sar as mul­tas, apreen­sões e leilões, pas­sando a edu­car e con­sci­en­ti­zar.

Em face da edição do decreto da “bon­dade”, sobram algu­mas inda­gações: havia neces­si­dade de apreen­der e leiloar mil­hares de veícu­los dos cidadãos menos favore­ci­dos em tão curto espaço de tempo? Foi opor­tu­nizado, sobre­tudo a este público mais humilde o esgo­ta­mento de todas as vias para reaverem seus bens? Qual “van­tagem» auferiu o estado com tais medi­das? Como ficam aque­les que perderam, na maio­ria das vezes, seu único bem?

Ainda que não seja essa a intenção fica pare­cendo uma medida eleitor­eira na intenção de cap­tar os votos da patuleia.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

QUANDO A REAL­I­DADE SE IMPÕE.

Escrito por Abdon Mar­inho

QUANDO A REAL­I­DADE SE IMPÕE.

Por Abdon Marinho.

QUEM acred­ita em coin­cidên­cias diz que foi mera fatal­i­dade. Os que não acred­i­tam dizem que foi tão somente a imposição da real­i­dade sobre o discurso.

O fato, entre­tanto, não pode­ria ser mais emblemático: no mesmo dia em que o gov­er­nador, em artigo assi­nado e pub­li­cado no Jor­nal Pequeno, tecia loas a polit­ica de segu­rança do seu gov­erno, jus­ta­mente neste dia, a ilha acor­dou sobres­saltada com as notí­cias de vio­lên­cia extrema. Na madru­gada foi um del­e­gado da Poli­cia Fed­eral que teve a vida ceifada (em princí­pio vitima de um assalto mal­suce­dido no bairro do Araçagi, São José de Riba­mar), antes deste fato ou logo depois um cidadão, tam­bém, vitima de um assalto, levou um tiro no rosto e se encon­tra inter­nado num hos­pi­tal da cap­i­tal; ainda na manhã domingo, chegou-​nos a infor­mação de que uma cri­ança, de ape­nas sete anos, mor­rera, atingida na cabeça durante uma troca de tiros entre mem­bros de facções rivais no Bairro de Fátima.

São fil­hos que nunca mais des­fru­tarão de um abraço do pai, uma esposa que não terá o aconchego do marido; são pai e mãe que, na inver­são da ordem nat­ural da vida, não verão o filho crescer, dar-​lhe netos, cuidar deles na vel­hice; são viti­mas para os quais não se sabe a exten­são das sequelas.

Como num roteiro macabro, escrito com o propósito de des­men­tir sua excelên­cia, todos esses fatos chegaram ao con­hec­i­mento da pat­uleia antes que tivésse­mos tempo de con­cluir a leitura do curto texto de autoel­o­gios, onde fes­teja, segundo as próprias estatís­ti­cas, sub­stan­ciosas reduções nos índices de crim­i­nal­i­dade na cap­i­tal e no inte­rior.

Não tenho ele­men­tos para aquilatar o grau de efe­tiva redução nos indi­cadores de vio­lên­cia, faz tempo – mas, acred­ito, já no atual gov­erno –, que o servi­dores do IML foram “proibidos” de repas­sarem a imprensa os dados das ocor­rên­cias e os meios de comu­ni­cação deixaram de inves­ti­gar os fatos rela­ciona­dos a eles.

Assim, os inter­es­sa­dos em saber os números e a natureza das ocor­rên­cias pas­saram a con­tar, uni­ca­mente, com o cadas­tro ofi­cial do sis­tema de segu­rança.

Sem embar­gos ou ques­tion­a­men­tos um corpo achado crivado de balas, deixa de ser homicí­dio e vira, na estatís­tica, “achado de cadáver”; o cidadão é alve­jado por balas ou facadas e morre um ou dois dias depois no hos­pi­tal, deixa de ser homicí­dio para ser “lesão cor­po­ral seguida de morte” e assim suces­si­va­mente. O que não fal­tam são meios de “dis­farçar” dados.

A falta de inter­esse e/​ou acom­pan­hamento externo facilita que ocor­ram tais situ­ações e que se “venda” uma falsa sen­sação de segurança.

A tragé­dia ocor­rida com a família do Del­e­gado Fed­eral David Aragão era anun­ci­ada desde sem­pre. São raras as residên­cias do Araçagi que ainda não foram assaltadas, arrom­badas ou fur­tadas. Até parece que o bairro virou uma espé­cie de “tra­balho” para os mar­gin­ais que, todos os dias, vão lá fazer o “apu­rado do dia”. Não raros são os ami­gos que con­tam uma história de vio­lên­cia envol­vendo um outro amigo, um par­ente, um con­hecido… descam­bar para latrocínios, estupros, etcetera era algo que acon­te­ceria mais cedo ou mais tarde e que, infe­liz­mente, voltarão a acontecer.

Outro dia – até já escrevi aqui –, ouvi a nar­ra­tiva ater­ror­izante de um amigo-​vítima da vio­lên­cia naquele bairro. Ced­inho, por volta das 6 horas, ele saiu de casa para deixar a esposa na parada de ônibus e voltar para levar a filha no colé­gio. No retorno, quando abria o portão, os ban­di­dos o abor­daram e o ater­rorizaram, pas­sou os piores momen­tos da sua vida temendo pelo que pode­ria lhe acon­te­cer como à sua filha. Segundo ele – para encur­tar a con­versa –, só está vivo para con­tar a história, por causa da filha. Foi isso que lhe deixou claro os ban­di­dos: que só não o matavam para não deixar trauma­ti­zada a cri­ança que, ater­ror­izada, assis­tia a tudo.

Em resumo: após este episó­dio aban­do­nou a casa que lhe con­sumira anos de inves­ti­men­tos na con­strução e foi morar num aparta­mento.

E, são tan­tos os episó­dios de vio­lên­cia, o aban­dono do bairro pelas autori­dades, a falta de infraestru­tura básica, que pas­saram a lhe apel­i­dar de “Araçag­iquistão”, uma refer­ên­cia a vio­lên­cia naque­les países do Ori­ente Médio e out­ros do entorno.

Em que pese as estatís­ti­cas ofi­ci­ais – e que não temos como con­tes­tar – diz­erem que esta­mos indo muito bem, obri­gado!, o que vemos nos bair­ros, sobre­tudo os mais pobres e nas per­ife­rias dos municí­pios da ilha, rev­ela uma outra real­i­dade.

A morte da cri­ança na troca de tiros ou o assalto que cul­mi­nou com a ten­ta­tiva de homicí­dio do empresário na porta de casa são ape­nas os exem­p­los mais gri­tantes.

O Bairro de Fátima sem­pre teve um histórico de vio­lên­cia, mas as pes­soas, até mesmo de fora, con­seguiam cir­cu­lar livre­mente, o mesmo acon­te­cendo no Anil, na Liber­dade, Coroado, Vila Isabel Cafeteira, Vila Litorânea, Div­inéia, Sol e Mar e Luizão.

Eu mesmo can­sei de cir­cu­lar por estes bair­ros com a mesma desen­voltura que cir­culava pelo cen­tro de São Luís, hoje, nem no cen­tro. Não há, nes­tas local­i­dades, uma viela, uma rua, uma quadra ou mesmo o bairro inteiro que não esteja sob o domínio de uma facção crim­i­nosa.

São elas (facções) que deter­mi­nam até se o cidadão deve cir­cu­lar com os vidros dos car­ros fecha­dos ou aber­tos.

Os muros estão cheios de inscrições avisando a pop­u­lação quem é que manda na área e pas­sando instruções aos moradores.

Diante de tais situ­ações, ainda que tenha havido (e não tenho como aferir isso) uma redução nom­i­nal no número de homicí­dios, con­forme fes­te­jado pelo gov­erno, a real­i­dade mostra que aumen­tou a área de domínio das facções crim­i­nosas em toda ilha – com todas suas nefas­tas con­se­quên­cias –, sem que o poder público mostre que, efe­ti­va­mente, tem domínio da situação.

O certo é que teve pouca valia a leitura do texto gov­er­na­men­tal exul­tante com a redução da vio­lên­cia para aque­les que estavam no mesmo dia em que o lia, velando seus mor­tos, torcendo pela resistên­cia de seus feri­dos ou para aque­les que vive o dia a dia sob o domínio do medo.

Abdon Mar­inho é advogado.