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A TER­A­TOLO­GIA, O APAR­EL­HAMENTO E O QUINTO.

Escrito por Abdon Mar­inho

A TER­A­TOLO­GIA, O APAR­EL­HAMENTO E O QUINTO.

Por Abdon Mar­inho.

INDE­PEN­DENTE do “Fla x Flu” pre­sente em todos os aspec­tos da vida do país, difi­cil­mente você encon­tra alguém que ache a decisão do desem­bar­gador Rogério Favreto, de soltar o ex-​presidente Lula, con­de­nado em duas instân­cias, cor­reta. Ao con­trário, já existe uma quase una­n­im­i­dade – exceto pelos alu­a­dos –, que estão con­vic­tos em tachá-​la de ter­a­tológ­ica, ou seja, absurda, con­trária à lóg­ica, ao bom senso.

E, à medida que o tempo passa e vão se descorti­nando os basti­dores da “estu­dan­tada” que con­strangeu o país, o que, ape­nas pare­cia uma decisão a ser inscrita nos man­u­ais dos cur­sos de dire­ito como exem­plo de ter­a­tolo­gia, vai gan­hando con­tornos de algo mais: crime. Ou mel­hor, uma trama crim­i­nosa, mili­met­ri­ca­mente artic­u­lada e envol­vendo diver­sos atores.

A trama, segundo leio em pres­ti­gia­dos veícu­los de comu­ni­cação, teria surgido a par­tir de uma ini­cia­tiva do próprio desem­bar­gador, que, através de amigo comum, avis­ara a um dos impe­trantes da ordem, que seria o plan­ton­ista do TRF4, fazendo enten­der que expe­diria o alvará de soltura do ex-​presidente, bas­tando que lhe fosse pedido e a que argu­mento fosse – ainda que visse com uma receita de bolo.

Ainda, segundo a fonte, toda a alta cúpula do par­tido e os advo­ga­dos do con­de­nado – e até o próprio –, sabiam o que estava sendo planejado.

Os fatos lev­an­ta­dos durante o domingo e nos dias seguintes ates­tam serem ver­dadeiras estas infor­mações.

Para Curitiba acor­reram impor­tantes fig­uras do par­tido, dep­uta­dos, senadores, lid­er­anças de movi­men­tos soci­ais, etc.; assim como vídeos saudando a soltura e man­i­fes­tações de lid­er­anças políti­cas.

Não tenho motivos para descon­fiar que um aten­tado tão grave à dig­nidade da justiça, com tan­tos prepar­a­tivos prévios não con­tasse com a ciên­cia do desem­bar­gador plan­ton­ista. Até porque, a con­cessão da ordem de soltura, desafi­ava (e desafia) o orde­na­mento jurídico: não ape­nas o Reg­i­mento Interno daquele tri­bunal, mas a expressa recomen­dação do Con­selho Nacional de Justiça.

Isso quer dizer, sim­ples­mente, que a autori­dade era abso­lu­ta­mente incom­pe­tente. Um juízo plan­ton­ista não pode­ria pas­sar por cima de decisões de órgãos cole­gia­dos que já decidira a matéria. Mais que isso, que a matéria já estava fora da alçada do tribunal.

A incom­petên­cia do desem­bar­gador plan­ton­ista era patente, não admitindo qual­quer juízo de dúvida. E foi isso que a pres­i­dente do Supe­rior Tri­bunal de Justiça — STJ, deixou claro a afir­mar a incom­petên­cia e dizer “estran­har” que o plan­ton­ista tenha acatado tal pedido.

Assim, não restam dúvi­das de que se tra­tou de avil­tante aten­tado à democ­ra­cia brasileira, com o claro propósito de desmor­alizar o Poder Judi­ciário.

Não pre­cisa de muita inda­gação, a matéria é de fácil com­preen­são, qual­quer pes­soa – até mesmo aquela com ape­nas um neurônio –, é capaz de enten­der que um plan­ton­ista não pode­ria con­ceder uma ordem, pas­sando por cima de decisões cole­giadas do mesmo tri­bunal, sobre­tudo, diante da certeza que de que idên­ti­cos pedi­dos já foram rejeita­dos por instân­cias supe­ri­ores da Justiça e pelo próprio tri­bunal.

Ape­nas para efeito de ilus­tração, li em algum lugar que a defesa do con­de­nado, ape­nas neste processo, para o qual cumpre a pena de doze anos e um mês, já inten­tou mais de uma cen­tena de recur­sos, ape­los, embar­gos e o que os valha, sendo todos nega­dos. Outro dia, inclu­sive, cheguei a obser­var que o ex-​presidente já pediu tanta coisa à Justiça que logo mais não teria nada a pedir.

Pois bem, assim como qual­quer um, bas­tando um pouco de bom senso, seria capaz de com­preen­der o despropósito da decisão do desem­bar­gador plan­ton­ista, ele, mais ainda, tenho certeza, sabia que a sua ação era descabida.

Por isso mesmo, entendo que esta­mos diante de um caso claro de um juiz que foi “sequestrado” por um mil­i­tante.

Isso mesmo, o desem­bar­gador do TRF4, que pas­sou quase duas décadas como fil­i­ado e mil­i­tante ativo do Par­tido dos Tra­bal­hadores — PT, esque­ceu – ou quis esque­cer –, que recebe do con­tribuinte para servir a Justiça e ao país e não para prestar serviço ao antigo patrão. Talvez, aqui uma mera espec­u­lação, um agradec­i­mento por estar onde jamais chegaria por esforço próprio.

A decisão do plan­ton­ista não foi uma decisão de alguém que ocupa uma digna função de mag­istrado, mas sim, a tarefa de um mil­i­tante a o líder máx­imo da seita pelo qual muitos não medem esforço ou con­se­quên­cia. Ainda que em pre­juízo da ver­gonha própria e do con­strang­i­mento da nação.

Assim como o mil­i­tante deu a decisão que não podia, com a mesma ausên­cia de pejo, foi às rádios defender o absurdo que acabara de come­ter e pior, ameaçar a autori­dade poli­cial se aquela não desse ime­di­ato cumpri­mento a ordem ile­gal, imoral e absurda.

Assim, aqui cheg­amos e o país tem desnudo, diante de si, aquilo que sem­pre denun­ciei: o apar­el­hamento do Estado pelo par­tido que ocupou o poder de 2003 a 2016. Durante estes anos foram inserindo os “seus” nas posições chaves do Estado para que, em situ­ações como estas, prestem o serviço ao par­tido e não ao con­tribuinte que lhes pagam os salários.

Esta­mos diante de uma prova inques­tionável de “apar­el­hamento” do judi­ciário por um par­tido político. Tanto que para servir ao par­tido e não a nação, com desas­som­bro inco­mum, bur­lando a própria lei, ten­tou soltar um con­de­nado pelo mesmo tri­bunal onde tra­balha, emitindo no mesmo dia, em espaço de horas, três ordens de solturas, exigindo por tele­fone o cumpri­mento da mesma e ameaçando a todos, e até indo à rádio fazer pros­elit­ismo tosco.

Não duvido se acabasse por com­pare­cer a algum evento para comem­o­rar a soltura do líder e con­frat­er­nizar com o con­de­nado que deter­mi­nara a soltura.

O espetáculo ofer­e­cido pelo desem­bar­gador plan­ton­ista do TRF4, sus­ci­tou, acred­ito que pre­cip­i­tada­mente, ques­tion­a­men­tos quanto à existên­cia do quinto con­sti­tu­cional.

O quinto, para os que não sabem, é a deter­mi­nação con­sti­tu­cional pre­vista no Art. 94, que esta­b­elece: “Um quinto dos lugares dos Tri­bunais Region­ais Fed­erais, dos Tri­bunais dos Esta­dos, e do Dis­trito Fed­eral e Ter­ritórios será com­posto de mem­bros, do Min­istério Público, com mais de dez anos de car­reira, e de advo­ga­dos de notório saber jurídico e de rep­utação ilibada, com mais de dez anos de efe­tiva ativi­dade profis­sional, indi­ca­dos em lista sêx­tu­pla pelos órgãos de rep­re­sen­tação das respec­ti­vas classes”.

Sim­pli­f­i­cando: um quinto das vagas destes tri­bunais são preenchi­das, alter­nada­mente, por mem­bros da Advo­ca­cia e do Min­istério Público, nas condições esta­b­ele­ci­das.

Entendo que o quinto con­sti­tu­cional é uma con­quista da sociedade e, difer­ente do que cer­tos juí­zos pre­cip­i­ta­dos defen­dem, está longe, muito longe, de ser o respon­sável pelas maiores e mais danosas maze­las do Poder Judi­ciário nacional.

Ape­sar de ter­mos assis­tido um claro mau exem­plo de “apar­el­hamento” vindo de alguém que pas­sou a inte­grar o tri­bunal a par­tir do quinto, é certo tam­bém, que out­ros idên­ti­cos ou maiores absur­dos são prat­i­ca­dos por mag­istra­dos de car­reira.

Na maior parte das vezes o que falta é caráter onde sobra ambição e o desejo de enricar do dia para noite.

Não é a forma de ingresso que faz o “dis­tingue”, até porque exis­tem condições obje­ti­vas a serem preenchi­das para que ocorra a investidura.

Se uns e out­ros des­cu­ram de suas obri­gações – tan­tos os ori­un­dos da car­reira quando os ori­un­dos do quinto –, isso ocorre pela falta de fis­cal­iza­ção dos órgãos de con­t­role e a quase certeza da impunidade.

Não pode ser sério um país que pune falta grave dos seus com uma aposen­ta­do­ria com­pul­sória com venci­men­tos inte­grais. Isso, aliás, soa como um acinte aos cidadãos.

Noutra quadra, não temos como descon­hecer que nos últi­mos tem­pos, não ape­nas a investidura através do quinto como tam­bém para as Cortes Supe­ri­ores têm sido per­ver­tidas por manip­u­lações coman­dadas pelos “donos do poder” que, à mín­gua de con­t­role pela sociedade e pelas insti­tu­ições com­pe­tentes, inserem no Poder Judi­ciário pes­soas para servi-​los e não para servir a sociedade.

O maior exem­plo do que digo é a absurda inqui­etação que provoca a assunção ao mais ele­vado cargo da Justiça do país alguém que nunca se com­por­tou como um juiz da nação, mais sim como devoto de uma causa.

A causa dos que não respeitam nem a Justiça nem a Nação.

Queira Deus que não ten­hamos mais dias de tris­teza e sobres­saltos.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

A “ESTU­DAN­TADAQUE CON­STRANGEU O BRASIL.

Escrito por Abdon Mar­inho

AESTU­DAN­TADAQUE CON­STRANGEU O BRASIL.

Por Abdon Marinho.

DOMINGO, 08 de julho de 2018, um dia para o Poder Judi­ciário esque­cer – ou para lem­brar como exem­plo do nunca mais deve ser repetido.

Mal acabara a cor­rida de fór­mula um, meu celu­lar começou a rece­ber men­sagens dos diver­sos gru­pos infor­mando que o Tri­bunal Regional Fed­eral da Quarta Região — TRF4, sedi­ado em Porto Ale­gre, RS, deter­mi­nara a soltura do ex-​presidente Lula, con­de­nado a doze anos e um mês de prisão pelo próprio tribunal.

A primeira impressão que tive, con­fesso, foi que se tratava de “fake news”. Aces­sei os prin­ci­pais sites do país e lá estava a notí­cia com todas as letras: o Desem­bar­gador Rogério Favreto, no plan­tão, aten­dendo a um pedido de três dep­uta­dos do Par­tido dos Tra­bal­hadores — PT, con­ced­era uma ordem de Habeas Cor­pus deter­mi­nando a ime­di­ata soltura do con­de­nado em primeira e segunda instân­cia pelo próprio tribunal.

Sem a pre­ten­são de lecionar nada, acho opor­tuno pon­tuar algu­mas questões.

A primeira questão é a natureza do HC impe­trado.

Qual­quer primeiranista de dire­ito sabe ao se recla­mar pela liber­dade de alguém tem que se iden­ti­ficar quem é a autori­dade coa­tora, ou seja, quem está restringindo a liber­dade do paciente. É isso que deter­mina a com­petên­cia de quem vai con­ceder ou negar a ordem. Essa infor­mação é essen­cial para a con­cessão da ordem e para saber a quem a ordem de soltura se dirige.

Foi iden­ti­fi­cado o juízo da 13a Vara da Justiça Fed­eral do Paraná, sub­or­di­nada ao TRF4 e, por­tanto, sub­or­di­nada à juris­dição do desem­bar­gador plantonista.

Além do mais, para con­cessão da ordem seria necessário um “fato novo”, uma vez, como dito ante­ri­or­mente, trata-​se de um con­de­nado em duas instân­cias, que já teve infini­tos recur­sos jul­ga­dos pelas mais diver­sas instân­cias da justiça brasileira, tendo, todas elas, por una­n­im­i­dade (a exceção do STF que decidiu por maio­ria), que a prisão é reg­u­lar e legitima.

Os impe­trantes, advo­ga­dos e dep­uta­dos petis­tas impe­traram a ordem sabendo de antemão que, exceto numa condição de anor­mal­i­dade, a ordem jamais seria con­ce­dida, diante dos obstácu­los legais.

Talvez, por isso, enquanto todos ainda choravam a der­rota da seleção brasileira, meia hora depois de ini­ci­ado o plan­tão do fim de sem­ana, com um rela­tor, que por seus vín­cu­los, sen­sível a tese jurídica dos impe­trantes, bus­caram a soltura do ex-​presidente, a despeito dos obstácu­los legais referidos.

O Reg­i­mento Interno do TRF4 limita a atu­ação do juízo de plan­tão, senão vejamos:

Art. 92. Nos sába­dos, domin­gos e feri­ados, nos dias em que não hou­ver expe­di­ente nor­mal, e fora do horário do expe­di­ente, haverá plan­tão no Tri­bunal, medi­ante rodízio dos Desem­bar­gadores, em escala aprovada pelo Plenário.

§ 2º O plan­tão judi­ciário não se des­tina à reit­er­ação de pedido já apre­ci­ado pelo Tri­bunal, inclu­sive em plan­tão ante­rior, nem à sua recon­sid­er­ação ou reex­ame, ou à apre­ci­ação de solic­i­tação de pror­ro­gação de autor­iza­ção judi­cial para escuta telefônica”.

Não bas­tasse a regra explicita do reg­i­mento interno do tri­bunal, uma res­olução do Con­selho Nacional de Justiça, a de número 71, no seu artigo 1º, repete o que já con­sta no RI: “§ 1º. O Plan­tão Judi­ciário não se des­tina à reit­er­ação de pedido já apre­ci­ado no órgão judi­cial de origem ou em plan­tão ante­rior, nem à sua recon­sid­er­ação ou reex­ame ou à apre­ci­ação de solic­i­tação de pror­ro­gação de autor­iza­ção judi­cial para escuta telefônica”.

Ape­sar de destes obstácu­los explic­i­ta­dos tanto no reg­i­mento quanto na res­olução do CNJ, o desem­bar­gador plan­ton­ista achou opor­tuno con­ceder a ordem de habeas cor­pus sob o argu­mento de que sugira um “fato novo”: o lança­mento da pré-​candidatura do ex-​presidente con­de­nado e que o mesmo pre­cis­aria está livre para par­tic­i­par de reuniões, debates, entre­vis­tas, etc.

Ora, esse “fato novo” é con­hecido desde que o ex-​presidente saiu do gov­erno para dar lugar a sen­hora Dilma Rouss­eff quando frustrada a ten­ta­tiva de ter­ceiro mandato seguido. Quando, em 2014, a sub­sti­tuta se recu­sou a ceder a vaga, foi motivo de stress público. Quando, através do processo de impeach­ment a pres­i­dente caiu, o ex-​presidente pres­i­dente se anun­ciou pré-​candidato, não descendo mais do palanque desde então. Nem mesmo com o processo, a con­de­nação e a prisão o afas­tou do palanque.

Na ver­dade, o con­de­nado, sem­pre usou esse fato, o fato politico, como uma ten­ta­tiva de esmae­cer as graves acusações con­tra ele. Não é sem razão que os críti­cos do ex-​presidente refere-​se a ele como “palanque ambu­lante”.

Assim, qual­quer pes­soa que exam­ine as coisas com um mín­imo de bom senso chegará a con­clusão de que essa argu­men­tação é absurda, que não faz qual­quer sen­tido.

Mais: faz pare­cer que houve um ten­ta­tiva de fuga tra­mada por ali­a­dos do ex-​presidente, os dep­uta­dos impe­trantes, e que essa “ten­ta­tiva” con­tou com a prov­i­den­cial sim­pa­tia do desem­bar­gador plan­ton­ista, um ex-​militante do par­tido dos tra­bal­hadores, que foi sub­or­di­nado direto de expres­si­vas fig­uras da orga­ni­za­ção par­tidária nos car­gos que ocu­param nos gov­er­nos que coman­daram, inclu­sive, sub­or­di­nado do ex-​presidente.

Numa situ­ação tão com­plexa, era de se esperar de um mag­istrado plan­ton­ista que agisse com cautela. Até porque, é duvi­dosa a com­petên­cia do TRF4, uma vez que a juris­dição já se esgo­tara com a decisão que acol­heu o recurso espe­cial e não acol­heu o recurso extra­ordinário da defesa.

Outra coisa, a decisão que man­dou pren­der o ex-​presidente foi da Oitava Câmara do TRF4. Logo a autori­dade coa­tora, seria aquele órgão judi­ciário e não o juízo da 13ª Vara do Paraná.

Como pode­ria um plan­ton­ista ultra­pas­sar todos esses óbices e man­dar soltar um con­de­nado sob o pálido argu­mento de que seria um pré-​candidato e que pre­cisa fazer sua cam­panha? Será que qual­quer um, nas mes­mas condições, pode invo­car tal argumento?

Outro ponto a mere­cer atenção é a con­duta do juiz Sér­gio Moro.

A defesa e seus críti­cos apon­tam que ele não pode­ria deixar de cumprir a decisão ou que não pode­ria intrometer-​se no assunto por que estaria no gozo de férias.

Vamos por partes. O juízo da 13ª Vara do Paraná foi apon­tado como coa­tor e foi “inti­mado” a prestar esclarec­i­men­tos no prazo de 05 (cinco) dias sobre os fatos artic­u­la­dos na petição ini­cial.

Logo, ainda que se ques­tione o fato de ter sus­pendido suas férias, deci­dido no domingo, ter ques­tion­ado a ordem de soltura.

Resta claro que ele não agiu “de ofi­cio” ou “se atrav­es­sou” no processo, ele foi chamado a se man­i­fes­tar nos autos.

O juiz diante de uma ordem fla­grante­mente ile­gal fez o cor­reto, ques­tio­nou o cumpri­mento através da medida jurídica cabível, dizendo não ser o juízo da 13ª Vara a autori­dade coa­tora, esta­b­ele­cendo, assim, o con­flito de com­petên­cia entre o plan­ton­ista e a Câmara que deter­mi­nou o cumpri­mento da pena.

Ora, ques­tion­ado sobre um pos­sível con­flito pos­i­tivo de com­petên­cia pelo juízo de piso, nada mais nor­mal que o rela­tor da matéria viesse aos autos se man­i­fes­tar.

Visto por este prisma, nada mais comum que o juiz nat­ural do feito no TRF4 “avo­casse” o processo para sus­pender a decisão.

Diante de tanta coisa inusi­tada, a decisão do desem­bar­gador Gebran Neto, numa ten­ta­tiva de “sal­var” a honra do tri­bunal, ainda disse que o mag­istrado plan­ton­ista foi lev­ado a “erro” pelos impe­trantes. Estes rapa­pés são comuns nos meio judiciário.

Inco­mum, o ponto fora da curva, foi, ape­sar da decisão do chamado juiz nat­ural e ainda em face da grave reper­cussão da matéria, o plan­ton­ista insi­s­tir na deter­mi­nação de soltura do con­de­nado, estip­u­lando um prazo de uma hora para a Poli­cia Fed­eral cumprir, sob pena de respon­s­abil­i­dade e desobediência.

E, se foi ques­tionável que tenha insis­tido na deter­mi­nação da soltura do con­de­nado após o alerta do feito pelo juiz de piso sobre uma pos­sível incom­petên­cia, acred­ito que tenha saído um pouco mais do tom, com a insistên­cia, após a man­i­fes­tação do rela­tor orig­i­nal do processo que, como disse na sua decisão, “avo­cou” para si a respon­s­abil­i­dade para delib­erar sobre o HC impe­trado, inclu­sive, com emis­são de opinião, extra autos, através de entre­vista a uma rádio do Rio Grande do Sul.

A tal insistên­cia levou o pres­i­dente daquela corte, aten­dendo a uma solic­i­tação do Min­istério Público Fed­eral, a sus­pender a lim­i­nar con­ce­dida e retornar os autos ao juízo nat­ural, o rela­tor do feito na Oitava Câmara.

Antes de nos per­gun­tar ou apon­tar quem agiu certo, quem agiu errado, quem extrapolou nas suas atribuições, fazem-​se necessários out­ros ques­tion­a­men­tos:

Quem ganha com tamanho tumulto proces­sual? Os advo­ga­dos do ex-​presidente já não estão ques­tio­nando o cumpri­mento da pena após decisão de segunda instân­cia no Supremo Tri­bunal Fed­eral? Não estão com recurso no Supe­rior Tri­bunal de Justiça dis­cutindo a con­de­nação? Será que acham “nor­mal” depois do processo ter per­cor­rido todas as instân­cias, com os mais vari­a­dos recur­sos, com uma “cane­tada” se des­man­che todas as decisões já tomadas?

O mín­imo que se espera do Poder Judi­ciário é cautela, é parcimô­nia, é serenidade.

Ainda que ache, pes­soal­mente, que as decisões do juízo da 13ª Vara, do rela­tor nat­ural e do pres­i­dente do TRF4 este­jam for­mal­mente cor­re­tas e resta­b­ele­ceu a nor­mal­i­dade do curso proces­sual, aquele tri­bunal – e o Poder Judi­ciário, de forma geral –, saem do episó­dio chamus­cado. Entrou naquilo que se cos­tuma dizer: cômico, se não fosse trágico.

Foi um espetáculo grotesco, con­strange­dor para a sociedade e para as insti­tu­ições.

Pior que isso, só se tivesse ocor­rido a soltura do con­de­nado sob a fajuta argu­men­tação de que não se pode negar o dire­ito de um cidadão – ainda que con­de­nado em duas instân­cias, por um crime que o inabilita a con­cor­rer a qual­quer cargo, e ser, por­tanto, duas vezes, “ficha suja” –, fazer sua “pré-​campanha”, e, no dia seguinte, ou poucos dias depois, o juízo nat­ural do processo, deter­mi­nar mais uma vez sua prisão. Sim, pois a menos que esteja tudo errado no dire­ito, a decisão que deter­mi­nou a soltura, ape­sar de todos os obstácu­los, não teria como se sus­ten­tar.

Teríamos de volta toda aquela nov­ela para deter­mi­nar a prisão do cidadão, com dire­ito a comí­cios, man­i­festos, tumul­tos, etc., sem con­tar com o plausível risco de fuga.

Uma inco­mum decisão secun­dadas por out­ras igual­mente inco­muns, num dia inco­mum, leva o país, em sus­pense, ser, mais uma vez, motivo de piadas ao redor do mundo.

Me per­gunto a razão disso tudo. A quem inter­essa ridic­u­larizar a Justiça do Brasil? Quem ganha com o país sendo motivo de cha­cota mundial?

Abdon Mar­inho é advogado.

*A foto que ilus­tra é a capa do Jor­nal Extra do dia 09 de julho de 2018.

POLIOMIELITE: A DES­GRAÇA QUE AMEAÇA O BRASIL ACON­TE­CEU COMIGO.

Escrito por Abdon Mar­inho

POLIOMIELITE: A DES­GRAÇA QUE AMEAÇA O BRASIL ACON­TE­CEU COMIGO.

Por Abdon Marinho.

UMA notí­cia tem me assus­tado e emo­cionado ulti­ma­mente.

A noti­cia é que o Maran­hão é o segundo estado do Brasil – atrás ape­nas da Bahia –, em risco de retorno da poliomielite. Impres­siona essa nossa vocação para atrair des­graças.

Segundo informa o Min­istério da Saúde, em mais de 14% (qua­torze por cento) dos municí­pios do estado a cober­tura vaci­nal con­tra a pólio não chegou a 50% (cinquenta por cento). A recomen­dação é que a cober­tura vaci­nal atinja ao menos 95% (noventa e cinco por cento) das cri­anças.

O Brasil que há mais de trinta anos erradi­cou essa molés­tia, agora ver-​se enredado, mais uma vez com o retorno desta e de tan­tas out­ras, a exem­plo do sarampo que já começaram a fazer víti­mas.

Esta­mos diante de uma situ­ação que custo a enten­der.

Quero acred­i­tar que os pais são pes­soas que amam seus fil­hos, por quem, não raro, dariam a própria vida, ainda mais quando esta­mos falando de cri­anças, de zero a cinco anos ou um pouco mais.

Então, como jus­ti­ficar que estas pes­soas não dedique umas pou­cas horas para levar estas cri­anças aos pos­tos de vacina quando se sabe que o ano inteiro podem vaciná-​las con­tra doenças como sarampo ou a poliomielite?

Decerto não é falta de infor­mação. Por onde pas­samos, mesmo nas residên­cias mais humildes, com raras exceções, não se encon­tra uma tele­visão lig­ada a uma antena parabólica. Quando não, um rádio a pilha, um celu­lar. Ou seja, só mesmo em situ­ações abso­lu­ta­mente atípi­cas encon­tramos alguém que viva alheio às infor­mações cotid­i­anas, sem acesso a tele­visão, rádio, jor­nal, notí­cias de qual­quer natureza.

Assim, soa incom­preen­sível que doenças graves este­jam, mais uma vez ameaçando a vida de mil­hares de cri­anças por algo tão triv­ial quanto é a ausên­cia de vaci­nação.

Ainda mais, repito, quando sabe­mos que tais vaci­nas estão disponíveis o ano inteiro nos pos­tos de saúde; quando sabe­mos que, bem ou mal, as pes­soas têm um nível de infor­mação que as tor­nam capazes de enten­der a gravi­dade destas doenças que estavam errad­i­cadas e que ameaçam voltar com todo força pela sim­ples ausên­cia de vaci­nas; não bas­tasse isso, ainda se tem, pro­gra­mas estatais de saúde da família que garan­tem a visita de profis­sion­ais da área nas residên­cias das pes­soas; e, por fim, a exigên­cia de que cer­tos bene­fí­cios só sejam disponi­bi­liza­dos com a com­pro­vação da imu­niza­ção das cri­anças, que muitas das vezes é ape­nas algu­mas got­in­has min­istradas por via oral.

Torna-​se uma urgên­cia nacional iden­ti­ficar onde as fal­has estão ocor­rendo, inclu­sive com a respon­s­abi­liza­ção dos fal­tosos, a fim de se evi­tar maiores con­se­quên­cias àque­les que não têm condições de se defend­erem por si: as cri­anças.

O gov­erno fed­eral pre­cisa, ime­di­ata­mente, esta­b­ele­cer como critério de repasses de recur­sos vol­un­tários da União aos esta­dos e municí­pios, o cumpri­mento obri­gatório de cober­tura vaci­nal não infe­rior ao nível recomen­dado, como forma destes entes fed­er­a­tivos exi­jam dos pais que vacinem seus fil­hos, não ape­nas con­tra a poliomielite, mas tam­bém con­tra as demais molés­tias.

É ina­ceitável que uma doença tão grave, com con­se­quên­cias tão nefas­tas, seja tratada com tanta leniên­cia.

Como podemos admi­tir que municí­pios não vacinem 5% (cinco por cento) das cri­anças quando se é exigido um nível de vaci­nação de 95% (noventa e cinco por cento) para não cor­re­mos o risco da doença voltar? Como aceitar que ninguém responda por tamanho descal­abro?

Há alguns anos escrevi um texto inti­t­u­lado: “Sou Defi­ciente. E daí?”. Nele esclareço que o fato de ser­mos defi­cientes não nos faz mere­ce­dores de trata­mento difer­en­ci­ado ou pena, e que podemos, com nos­sos esforços, irmos muito além dos espaços que nos são destinados.

Mas, se é ver­dade que podemos ter uma vida com pos­si­bil­i­dades quase ilim­i­tadas, se não nos aqui­etar­mos, tam­bém é ver­dade que ninguém, pelos menos não os com sã con­sciên­cia, “escol­hem” serem defi­cientes, ainda mais quando estas “defi­ciên­cias” podem ser evi­tadas ou pre­venidas.

Estou certo que ninguém escolhe uma vida com dores e lim­i­tações per­ma­nentes.

Há quase cinquenta anos fui acometido pela poliomielite. Eram out­ros tem­pos. Morando no inte­rior do inte­rior, com pais sem nen­huma instrução, não tín­hamos acesso à vaci­nas, aliás, nem sabíamos de tal neces­si­dade.

Quando fui con­t­a­m­i­nado pelo vírus meus pais, par­entes e viz­in­hos, ficaram dias sem saber do que se tratava, o que estava acon­te­cendo, ten­tando a cura com remé­dios caseiros, chás, ben­z­i­men­tos e promessas.

Somente dias depois, quando nada fazia efeito – e não tinha como fazer –, minha mãe saiu, no lombo de um burro, até a cidade mais próx­ima onde pode­ria pegar um outro trans­porte que nos levaria a Teresina, Piauí, onde a doença foi diag­nos­ti­cada e recebi o trata­mento que evi­tou a minha morte e ameni­zou as seque­las. Ape­nas isso, pois tratando-​se de uma doença incurável, o máx­imo que os trata­men­tos con­seguem é amenizarem o sofri­mento dos por­ta­dores que de resto terão que con­viver com ela.

Desde então con­vivo com os efeitos da poliomielite e posso asse­gu­rar que, ape­sar de ser pos­sível a con­vivên­cia, ela nos impõe inúmeras lim­i­tações e dores per­ma­nentes.

Difer­ente de out­ras doenças, ou mesmo um aci­dente, que restringe os movi­men­tos dos mem­bros afe­ta­dos, a poliomielite, faz questão de nos lem­brar sua pre­sença diari­a­mente e não ape­nas através da atrofia dos mem­bros ou seu “afi­na­mento”, mas, tam­bém, através das dores que sen­ti­mos.

São dores nos pés, tornoze­los, não raro chegando até os joel­hos – con­forme a gravi­dade do ataque.

Isso sem con­tar que suas seque­las se tor­nam mais pre­sentes e lim­i­tantes com o pas­sar do tempo.

Quando mais jovem, por exem­plo, tinha mais agili­dade e resistên­cia que tenho hoje, andava para todos os lugares sem qual­quer ajuda. Hoje, já canso mais rápido, não posso ficar tanto tempo em pé e já pre­ciso fazer uso de uma ben­gala. Mas evito pen­sar que possa ainda pio­rar.

Daí minha imensa pre­ocu­pação com o que pode vir acon­te­cer com nos­sas cri­anças pelo desleixo dos pais – e tam­bém pela omis­são das autori­dades –, que, pelo que assis­ti­mos, não se mostra capaz de empreen­der uma cam­panha rig­orosa de vaci­nação, evi­tando que mil­hares de cri­anças mor­ram ou fiquem par­alíti­cas pelo resto da vida, levando uma vida de dores e lim­i­tações.

A poliomielite é uma grave doença com con­se­quên­cias e lim­i­tações que vão bem além do ensina os man­u­ais ou enci­clopé­dias de med­i­c­ina.

O Brasil que já havia errad­i­cado essa des­graça que tanto mal cau­sou a tan­tas pes­soas, não pode admi­tir que ela retorne para fazer novas víti­mas. Fazer pouco caso, ser­mos lenientes é come­ter um grave crime con­tra o futuro deste país.

Podem apos­tar: eu sei do estou falando.

Abdon Mar­inho é advo­gado.