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MEU QUERIDO INIMIGO.

Escrito por Abdon Mar­inho

MEU QUERIDO INIMIGO.

Por Abdon Mar­inho.

FOI o gênio de Fer­nando Pes­soa que cun­hou as belas palavras que seguem abaixo no poema “Autopsicografia”:

O poeta é um fin­gi­dor.

Finge tão com­ple­ta­mente

Que chega a fin­gir que é dor

A dor que dev­eras sente.

E os que lêem o que escreve,

Na dor lida sen­tem bem,

Não as duas que ele teve,

Mas só a que eles não têm.

E assim nas cal­has de roda

Gira, a entreter a razão,

Esse com­boio de corda

Que se chama coração.

Quando o poeta nos brindou com tais ver­sos não con­hecia o poder de fin­g­i­mento que acomete os políti­cos brasileiros de uma forma geral e aos maran­henses em espe­cial.

Agora mesmo vejo dois lados da política maran­hense se diglad­iando, din­istas e roseanistas ou sar­ne­y­sis­tas, com ataques mútuos e críti­cas recíp­ro­cas, fin­gem uma antipa­tia que de fato não sen­tem. Pelo con­trário, ambos, os gru­pos, até se admi­ram e pode­riam, por vezes até demon­strarem mais afeto se não fosse a neces­si­dade de fin­gir, como aliás, vimos recen­te­mente, o coman­dante do Par­tido Comu­nista do Brasil — PCdoB, sen­hor Már­cio Jerry, com “capo” do Sis­tema Mirante de Comu­ni­cação e irmão da pré-​candidata Roseana Sar­ney, Fer­nando, num agradável colóquio com dire­ito a efu­sivo abraço no velório do ex-​senador Epitá­cio Cafeteira.

Só não digo que tudo que comu­nistas e sar­ne­y­sis­tas mais que­riam nesta quadra política era o con­fronto entre eles, porque do lado dos atu­ais donatários do poder foi aca­len­tada a ideia de que pode­ria vencer a eleição por WO, ou seja, sem adver­sários, chapa única, com adver­sários só para dar o verniz da legit­im­i­dade, como, aliás, registre-​se, é a prática em todos os regimes autoritários que se prezam.

Os comu­nistas maran­henses son­haram e tudo fiz­eram (ou fazem) para afas­tar os demais con­cor­rentes da dis­puta, não se podendo aferir o nível do “con­venci­mento” que empregam e/​ou mesmo sua legit­im­i­dade em face do mod­elo de democ­ra­cia que vive­mos.

Espal­haram a não mais poder que fulano, sicrano ou bel­trano não seriam can­didatos, que seriam “con­ven­ci­dos” a não dis­putar.

Fora o mod­elo da can­di­datura única – com a ver­tente do adver­sário de “men­tir­inha” ou para con­star –, tudo que eles dese­javam era a can­di­datura de Roseana Sar­ney, pedi­ram isso diver­sas vezes e vice-​versa.

O grupo Sar­ney tam­bém era e é dese­joso deste con­fronto. Querem fazer a con­frontação dos gov­er­nos de Roseana com o do atual gov­erno do sen­hor Dino, a quem acusam de pouco ou nada fazer

São os “queri­dos inimi­gos”. A ambos inter­essa o dis­curso da “encruzil­hada do atraso” entre Sar­ney e Anti-​Sarney que, como mostrei em tex­tos ante­ri­ores, só tem lev­ado o Maran­hão para insignificân­cia e para a mis­éria do povo, ape­sar de ser, dos esta­dos da fed­er­ação, um dos mais ricos.

Este é o debate que querem travar e que, sabe­mos, não inter­essa ao Maran­hão e ao nosso povo. O debate para saber quem é o respon­sável pela mis­éria e quan­tos mis­eráveis cada um gerou. Se nos gov­er­nos da sen­hora Roseana foram ger­a­dos mais mis­eráveis que no atual gov­erno do sen­hor Dino; se a vio­lên­cia era maior lá ou agora; se a cor­rupção era maior ou menor, e por aí afora.

Ora, sabe­mos o que foram os gov­er­nos da sen­hora Roseana e esta­mos vendo o que é o gov­erno do sen­hor Dino.

São gov­er­nos que não apon­taram e não apon­tam um futuro de desen­volvi­mento para o estado. Eles não têm pro­je­tos de desen­volvi­mento e não pos­suem a capaci­dade de ouvir quem tenha. Admin­is­traram e admin­is­tram com per­spec­tiva do “arroz com fei­jão”, das obras públi­cas que são próprias de gestores munic­i­pais e não de gov­er­nos que têm a respon­s­abil­i­dade com o cresci­mento econômico do estado, a ger­ação de empre­gos e renda, obras estru­tu­rantes capazes de ele­var a econo­mia estad­ual de pata­mar.

Um dos maiores prob­le­mas do estado é a falta de emprego para os jovens, para os pais de família e, já vimos – e esta­mos vendo –, as ini­cia­ti­vas dos atu­ais “cor­diais adver­sários”, não foram capazes de apre­sen­tar soluções.

O quadro político atual só não se apre­senta pior diante da ter­rível per­spec­tiva, que se afig­urou, e que foi ven­dida, da can­di­datura única. Fora isso, o quadro do debate dicotômico entre comu­nistas e sar­ne­y­sis­tas é a segunda pior opção.

Extraio de pos­i­tivo do anún­cio de que a ex-​governadora Roseana se apre­senta para a dis­puta, ape­nas a pos­si­bil­i­dade de que seu ingresso incen­tive a par­tic­i­pação de out­ros políti­cos, com out­ras pro­postas de gov­erno para o debate. E que isso nos prive do debate ver­gonhoso de quem gerou mais mis­eráveis e mor­tos.

O Maran­hão pre­cisa que out­ros quadros políti­cos – já tes­ta­dos ou não –, entrem no debate político apre­sen­tando suas pro­postas para sair­mos do final da fila do desen­volvi­mento. Pre­cisamos de pro­postas de gov­er­nos auda­ciosas e que apon­tem para o desen­volvi­mento, para o cresci­mento econômico, com ger­ação de emprego e renda para os jovens; pre­cisamos inte­grar pro­je­tos de infraestru­tura nas diver­sas regiões do estado.

Para que isso ocorra é necessário que as pes­soas que têm ideias, além do debate dicotômico Sarney-​Anti-​Sarney, se apre­sen­tem, par­ticipem do debate político, dis­putem a eleição que se aviz­inha. Quem não se apre­sen­tar agora não terá qual­quer legit­im­i­dade no futuro.

Chega a ser patético que já tendo avançado tanto no século 21, a nossa pauta ainda seja da mis­éria, das estradas que se des­man­cham nas primeiras chu­vas, da vio­lên­cia que assom­bra a família.

Este é o debate da ver­gonha. Os brasileiros/​maranhenses não temos estí­mulo para votar num quadro que se afigura tão desalen­ta­dor.

Pre­cisamos que sur­jam mais nomes, com tra­balho, pro­je­tos, história de vida limpa, que nos apre­sen­tem soluções para os prob­le­mas do estado como per­spec­tiva de desen­volvi­mento real. Os nomes que se apre­sen­tam, pelo mostraram e mostram estão longe de rep­re­sen­tar alguma novi­dade neste que­sito.

O Maran­hão não avançará se insi­s­tirem no debate de “comadres” que ensa­iam. Pre­cisamos ir além disso e este é o momento.

E exis­tem out­ras pos­si­bil­i­dades de trazer o desen­volvi­mento para o estado, uma delas é o pro­jeto da Zona de Expor­tação do Maran­hão — ZEMA, que o senador Roberto Rocha encampa desde que ini­ciou seu mandato; tam­bém o pro­jeto do polo aeroe­s­pa­cial de Alcân­tara, que tem o dep­utado José Reinaldo, como um dos pre­cur­sores. Além disso faz-​se necessário con­hecer os pro­je­tos de desen­volvi­mento de out­ros políti­cos, como da pré-​candidata Maura Jorge que se coloca na dis­puta ou até mesmo de out­ros políti­cos, como por exem­plo, o dep­utado Pedro Fer­nan­des; Eduardo Braide, e out­ros que devem apare­cer mas que não me ocorre lem­brar no momento. O debate político atual é tão ordinário que nem nomes para lem­brar temos.

O que reputo como impor­tante é que saiamos deste dueto de uma pro­posta só. A pro­posta do atraso.

Até fin­gem que são pro­postas diver­sas mas no fundo, tem o mesmo viés e não apon­tam para lugar algum que de fato inter­esse aos cidadãos, aos jovens, aos sen­hores e sen­ho­ras, pais de famílias que pre­cisam fechar as con­tas no final do mês.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

CAFETEIRA E SAR­NEY: O QUE DEIXARAM DE DIZER.

Escrito por Abdon Mar­inho

CAFETEIRA E SAR­NEY: O QUE DEIXARAM DE DIZER.

Por Abdon Mar­inho.

EXTINTO o ex-​governador Epitá­cio Afonso Pereira Cafeteira, às vésperas de com­ple­tar seu 94º aniver­sário, no último 13 de maio, não foram pou­cas as man­i­fes­tações que rece­beu dos ami­gos sin­ceros e dos opor­tunistas – sem­pre pre­sentes nes­tas horas na expec­ta­tiva de reti­rar alguma van­tagem das exéquias fúne­bres.

Em se tratando do Maran­hão, como não pode­ria deixar de acon­te­cer, a visão da morte e do morto é retratada con­forme o inter­esse do freguês ou o lado politico do autor da per­oração: se con­tra ou a favor de Sar­ney.

O apreço aos fatos, a ver­dade e a história pouco interessa.

O próprio ex-​presidente embar­cou nesta visão dicotômica das coisas.

Ao fazer um belo texto de elo­gio ao morto – como con­vém as boas regras de con­vivên­cia –, fê-​lo não ape­nas ocul­tado os defeitos do morto, até porque os mor­tos não têm defeitos, mas, sobre­tudo, ocul­tando os seus próprios defeitos e a sua par­tic­i­pação na história.

E, assim agindo, deixou de col­her o mais deli­cioso dos fru­tos: o recon­hec­i­mento. Este é o defeito da história con­tada em fatias con­forme as con­veniên­cias dos contadores.

O ex-​presidente traz a luz os primeiros anos na política de ambos: Cafeteira e a sua e, após con­sid­er­ações diver­sas sobre as várias eleições, encerra por colo­car, com justiça, o morto no pan­teão dos grandes políti­cos maran­henses, como Clodomir Mil­let, Alexan­dre Costa, La Rocque, Neiva Mor­eira, Odylo Costa, filho, Manuel Gomes, Nunes Freire, Luís Rocha, Alarico Pacheco, Lino Machado, Gené­sio Rêgo, Clodomir Car­doso, Satu Belo e tan­tos out­ros, a quem, nas suas palavras, o tempo, tam­bém, consumiu.

Em tom saudoso exalta a velha polit­ica de um tempo em que o ódio e as perseguições ainda não con­sumira as relações. Seria uma alusão aos dias atuais?

Com o igual propósito de hom­e­nagear o ex-​governador, no dia seguinte à pub­li­cação do texto de Sar­ney, foi a vez do Jor­nal Pequeno, em matéria do não menos com­pe­tente jor­nal­ista Manoel San­tos Neto, trazer a luz um dos episó­dios mais nefas­tos da história polit­ica do Maran­hão: o Caso Reis Pacheco.

O jor­nal­ista desnuda a trama artic­u­lada pelo ex-​presidente e senador da República José Sar­ney, para incrim­i­nar o senador Cafeteira com uma denún­cia falsa no Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF, onde um falso irmão, de um falso morto, apontando-​o como o respon­sável pela morte de “Reis Pacheco” que, anos antes teria se envolvido num aci­dente de trân­sito que viti­mou seu sogro, o con­sel­heiro Hilton Rodrigues.

A trama tem as indeléveis dig­i­tais do ex-​presidente que uma sem­ana antes do segundo turno das eleições de 1994, em 06 de novem­bro, escreveu o famoso artigo “Liber­dade e Reis Pacheco” –que pode ser lido na edição do Jor­nal Pequeno –, onde ques­tiona o slo­gan da cam­panha de Cafeteira: Liber­dade. Dizendo que o can­didato que­ria a liber­dade para expulsá-​lo do Maran­hão, pro­mover desvios. E vai além, com a insin­u­ação enviesada de que Cafeteira teria feito “sumir” com Reis Pacheco.

Naque­les últi­mos dias de cam­panha os coor­de­nadores tendo Ader­son Lago, can­didato a dep­utado e Juarez Medeiros, can­didato a vice-​governador na chapa de Cafeteira, tiveram que se des­do­brar entre São Luís, Belém e Macapá, para encon­trar o falso morto e des­man­char a maior história de fraude da política maran­hense, na qual se ignorou todos os lim­ites, até então con­heci­dos.

Quando con­seguiram apu­rar e com­pro­var toda armação só restava o último pro­grama de pro­pa­ganda eleitoral.

No dia de sua veic­u­lação, pas­sando a limpo toda história, só tín­hamos a notí­cia de que emis­sora de tele­visão respon­sável saíra do ar em diver­sos lugares, noutros foi a ener­gia que fal­tou. Naquela noite, e no dia seguinte, choveram os tele­fone­mas infor­mando isso. Lem­brando que não haviam celu­lares, a inter­net engat­in­hava, nem se usava ainda. A comu­ni­cação era toda através do rádio, tele­visão e tele­fones fixos.

Além do res­gate do assunto feito pelo Jor­nal Pequeno na edição já referida, um outro doc­u­mento é impre­scindível para a com­preen­são do assunto: o mem­o­rável dis­curso feito pelo dep­utado estad­ual Juarez Medeiros, na Assem­bléia Leg­isla­tiva do Maran­hão.

O dis­curso apel­i­dado de “Sar­ney é Mar­ginal”, onde o dep­utado diz ser o senador e ex-​presidente um mar­ginal, no sen­tido de, à margem da lei, ter sido capaz de urdir uma trama que nem os mais reno­ma­dos escritores e cineas­tas tin­ham ousado no campo fic­cional e ele colo­cara em prática.

Muito antes da mod­ernidade ter nos trazido o con­ceito do que hoje se chama “fake News”, um quarto de século antes, um ex-​presidente, escritor, senador da República, não ape­nas o con­hecia como já o exerci­tava com inve­jável desen­voltura e falta de pudor.

Poder-​se-​ia dizer que o ex-​presidente é uma espé­cie de bisavô das tais “fake News”, tão em voga nos nos­sos dias.

Uma mácula, mas, bem mais do que isso, parte da história política do estado.

Entre­tanto a história de Cafeteira e de Sar­ney não pode ser exam­i­nada ape­nas tendo como refer­ên­cia o nar­rado pelo ex-​presidente em seu artigo-​homenagem ou tendo com refer­ên­cia o res­gate feito pelo jor­nal­ista Manoel San­tos Neto, do Jor­nal Pequeno, ela é bem maior.

Pre­cisa con­sid­erar as condições políti­cas do Brasil que per­mi­tiu a união dos dois nas eleições de 1986, aquela que na visão de Ader­son Lago, foi a mel­hor cam­panha da qual par­ticipou, um ver­dadeiro “pas­seio”, onde tudo se tinha com abundân­cia e a tempo; ou as condições em que ocor­reu a rup­tura em 1990.

Lem­bro que quando tra­bal­hava na cam­panha de 1994, mais de uma vez ouvi Cafeteira dizer que cumprira com o com­pro­misso que assumira em 1986. E acres­cen­tava: — eu, com mais de oitenta por cento de aprovação pop­u­lar, estava lá, na descida da rampa do Palá­cio do Planalto, com Sar­ney, que tinha mais oitenta por cento de rejeição.

Depois da eleição de 1998, não lem­bro de ter encon­trado muito com o ex-​senador Cafeteira, sabia dele, ape­nas através de ami­gos comuns, como Chico Branco, Ader­son Lago, Bened­ito Ter­ceiro e out­ros.

Não par­ticipei ou soube como se deu a aprox­i­mação entre Cafeteira e Sar­ney nas eleições de 2006, quando elegeu-​se Senador na chapa da ex-​adversária de duas cam­pan­has, Roseana Sar­ney.

Voltei a encontrá-​lo quando me procurou para patroci­nar sua defesa na Justiça Eleitoral.

Os que que­riam tomar-​lhe o mandato, pelo que recordo, ale­gavam que ele não gas­tara quase nada para eleger-​se, que o vol­ume de recur­sos despendi­dos eram incom­patíveis com o vol­ume de votos obti­dos.

Só não con­hecendo o velho Cafifa, nem aquilo tinha gas­tado, fiz­era a cam­panha inteira na “carona” da cam­panha majoritária de gov­er­nador.

O engraçado é que naquela eleição tra­bal­hei no grupo oposto ao que Cafeteira se encon­trava, no primeiro turno na cam­panha de Ader­son e no segundo turno, dando alguma assistên­cia a cam­panha de Jack­son Lago, que veio a gan­har a eleição, além de prestar alguma asses­so­ria ao gov­er­nador de então, José Reinaldo Tavares.

Ape­sar disso, um dia, pela manhã, recebo uma lig­ação de Chico Branco: — Estou indo aí com o chefe. Ele quer falar con­tigo.

Era para que assumisse a sua defesa.

Em princí­pio não entendi bem. Eu estava “do outro lado”. Com ele, com Sar­ney, Roseana, estavam uma infinidade de advo­ga­dos de bril­han­tismo inques­tionável. Até me per­gun­tei a razão de me escol­her.

Quando chegou, desfez-​se a dúvida, disse-​me, com todas as letras: — meu filho, eu con­fio em você para me defender.

Já sabia o assunto é o que dizer ficamos con­ver­sando e tro­cando ideias sobre vários assun­tos. Não lhe per­gun­tei porque tinha ido para o lado do ex-​presidente Sarney.

Entre­tanto, entre uma con­versa ou outra, acabou por dizer que estava bem com o grupo do ex-​presidente e que resolvera esque­cer e per­doar as coisas que acon­te­ce­ram no pas­sado.

Não me recordo se nesta ou noutra opor­tu­nidade, contou-​me que agrade­cia a Sar­ney por ter sido solidário a ele por conta de uma enfer­mi­dade sofr­era. Disse algo, mais ou menos, com estas palavras: — meu filho, eu estava mor­rendo, encontrava-​me nu, enro­lado com um lençol, sobre uma maca de hos­pi­tal e o Sar­ney apare­ceu lá para segu­rar minha mão.

Não sei se nos últi­mos anos o ex-​senador man­tinha o mesmo nível de relação em relação ao ex-​presidente – com o fim do processo e agrava­mento do seu quadro de saúde, perdemos o con­tato –, mas naquele momento em que esteve comigo, seu sen­ti­mento era de amizade e reconhecimento.

Este, tam­bém, é um fato para a história.

Ambos os mis­sivis­tas, o próprio Sar­ney e o jor­nal­ista do Órgão das Mul­ti­dões, talvez por igno­rar ou por con­veniên­cia, abor­daram ape­nas frag­men­tos de uma história bem mais ampla.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

ELEIÇÃO: A ESTRATÉ­GIA DO TER­CEIRO TURNO.

Escrito por Abdon Mar­inho

ELEIÇÃO: A ESTRATÉ­GIA DO TER­CEIRO TURNO.

Por Abdon Mar­inho.

ACOM­PAN­HANDO o processo eleitoral desde a infân­cia, o que rep­re­senta quase quarenta anos de “janela”, con­fesso que tenho difi­cul­dades em fazer uma avali­ação do vem acon­te­cendo neste pleito, no Maran­hão.

Fal­tando pouco mais de qua­tro meses para eleição, os adver­sários do atual gov­er­nador, que, em tese, dev­e­riam cor­rer “atrás do pre­juízo” como no dito pop­u­lar, pare­cem pouco dis­pos­tos para a dis­puta. Não se ouve falar em for­mação de cha­pas, em críti­cas acalo­radas, em embates dire­tos. Até parece que ter­e­mos uma eleição com can­di­datura única, com o atual gov­er­nante gan­hando por WO.

E, é aí, neste cenário, que as coisas ficam mais esquisi­tas.

Vejam, a “trupe” gov­ernista não cansa de ocu­par todos os espaços de comu­ni­cação social, inclu­sive as redes “vendendo” a ideia de que a “fatura” está liq­uidada e que a vitória acacha­pante ocor­rerá logo no primeiro turno da dis­puta.

Pois bem, ao mesmo tempo que fazem isso, ven­dem a ideia de vitória por ante­ci­pação, tornam-​se se clientes pref­er­en­ci­ais da Justiça Eleitoral. São diver­sas ações, pelas mais diver­sas con­du­tas ile­gais, pro­postas, não ape­nas pelos opos­i­tores, mas tam­bém, pelo Min­istério Público Eleitoral.

Muitas das ações, pelo que noti­cia a mídia, tem fun­da­mento sólido, tanto que o MPE tem se inco­modado com as con­du­tas prat­i­cadas. E não se pode dizer que o gov­er­nador e seus ali­a­dos descon­hecem as leis. Ele próprio é jurista dos mais respeita­dos – seus ali­a­dos cos­tu­mam dizer que que foi aprovado em primeiro lugar no con­curso em que tam­bém foi aprovado o juiz Sér­gio Moro; seus adu­ladores ainda fecham a sen­tença dizendo que ele “pos­sui OAB” –, foi juiz eleitoral, o gov­erno, segundo dizem com certa troça, “tem mais advo­gado que gente”, ou seja, esta­mos falando de pes­soas ao menos teori­ca­mente com­pe­tentes e con­hece­do­ras da lei.

Assim, é de causar especie que, sem adver­sários fusti­gando, ensa­iando, pelo menos, na gar­ganta, que levará a vitória ainda no primeiro turno, insis­tam em desafiar a Justiça Eleitoral e colo­car em risco a “vitória certa”.

Se é certo que são com­pe­tentes e pro­fun­dos con­hece­dores da lei, fica-​se a dúvida se o desafio a leg­is­lação é per­pe­trado porque se acham acima da lei ou porque não têm tanta certeza da vitória ou, talvez, seja uma “estraté­gia” para levarem a eleição a um ter­ceiro turno.

Mas, perderão para quem? Se os supos­tos adver­sários, até o momento, não mostraram a cara ou dis­seram que irão para o embate.

Talvez, como já disse alguém, sem adver­sários, tra­balhe para perder para si mesmo.

A foto col­hida das redes soci­ais – e que acom­panha esse texto –, é um claro exem­plo do pouco apreço pela leg­is­lação eleitoral ou do receio que têm os inquili­nos de “perderem a eleição que gan­harão no primeiro turno” ou como disse, a prova cabal da “estraté­gia” de levarem a eleição para o ter­ceiro turno.

Na foto, o gov­er­nador e sua chapa apre­sen­tada for­mal­mente a pat­uleia: ele próprio, o vice-​governador e seus dois can­didatos ao Senado, e ainda, um can­didato a dep­utado fed­eral, tam­bém já apre­sen­tado for­mal­mente e dois can­didatos a dep­utado estad­ual, posam em cima de uma máquina de asfalto no lança­mento do pro­grama gov­er­na­men­tal “Mais Asfalto” no Municí­pio de Trizidela do Vale.

Acho que pouca coisa ilus­traria tão bem o “uso da máquina pública” quanto a foto em refer­ên­cia. Lit­eral­mente estavam usando “máquina”.

Vejam: numa sem­ana, em evento público, com dezenas de rep­re­sen­tantes de par­tidos e lid­er­anças políti­cas apre­sen­tam a chapa, dias depois essa mesma “chapa” aparece sobre maquinário de obras públi­cas. Isso tudo a pouco mais de qua­tro meses para o dia da eleição.

Não restam dúvi­das: só pode ser uma estraté­gia para levar as eleições para o ter­ceiro turno. É isso, pois não con­tentes ape­nas com o ato em si, tratam de ampliá-​lo com divul­gação e com­par­til­hamento infini­tos nas redes soci­ais.

Será que sur­girá algum áudio com pedi­dos de votos como foi feito outro dia num evento par­tidário divul­gado na rede mundial de computadores?

O que faziam pes­soas que não têm qual­quer lig­ação com aquela comu­nidade par­tic­i­pando de “lança­mento de pro­gra­mas públi­cos”, quê não cam­panha eleitoral? O que faziam pes­soas que não são agentes públi­cos “lançando” obras? O que faziam, inclu­sive autori­dades do primeiro escalão, sua­dos como tampa de chaleira, em comi­tiva, lançando sin­gela obra de asfal­ta­mento num municí­pio que nem é dos maiores, fal­tando tão pouco tempo para a eleição?

Ora, aque­las pes­soas “sobre a máquina” não estavam lá para verem o asfalto ou para oper­arem a máquina. Estavam lá para serem vis­tas pelos cidadãos. Coin­ci­den­te­mente eram as mes­mas pes­soas que estão com as pré-​candidaturas lançadas aos diver­sos car­gos em dis­puta.

Ainda que não façam “comí­cios”, peçam votos durante o ato ofi­cial, suas pre­senças têm o condão de dese­qui­li­brar o pleito. E isso é matéria de inter­esse da Justiça Eleitoral.

Causa espanto que pes­soas tão sábias, cer­ta­mente con­hece­do­ras dos lim­ites da lei; os lim­ites entre o que podem e o que não podem fazer, a linha – que não é tão tênue –, entre o legal e o ile­gal, cometam tan­tos desati­nos.

É isso que não con­sigo enten­der. Pois tanto o gov­er­nador quanto os demais que estiveram naquele ato – e em tan­tos out­ros –, têm plena con­sciên­cia disso, são con­hece­dores da lei. Logo, qual o sen­tido de desafi­arem a leg­is­lação, afrontar a Justiça Eleitoral, levar para a Justiça o resul­tado de uma eleição que, segundo eles mesmo dizem, está tran­quila? Liq­uidada em primeiro turno?

Seria ape­nas o desejo de darem “tra­balho” aos adver­sários? Estimulá-​los a saírem da letar­gia e entrarem na dis­puta? Trazer o Min­istério Público Eleitoral para o cen­tro das dis­cussões políti­cas, aumen­tando sua carga de trabalho?

Fosse eu o can­didato e estivesse tão certo da vitória, con­ven­cido que adver­sário algum me faria frente, jamais come­te­ria qual­quer deslize capaz de sus­ci­tar ques­tion­a­men­tos sobre a legit­im­i­dade do pleito. Pelo con­trário. Faria tudo no sen­tido da obe­diên­cia estrita da lei. Não fazendo e não per­mitindo que qual­quer ali­ado tivesse com­por­ta­mento dúbio capaz de sug­erir con­tro­vér­sias futuras. Estaria cuidando da con­fecção do terno da posse e cor­rendo mil­hares de quilômet­ros na esteira para estar em forma neste dia.

Pois é, estran­hamente, ape­sar de diz­erem que voam em céu de brigadeiro, comportam-​se como náufra­gos em busca da última tábua de sal­vação.

Já vi, noutras eleições, can­didatos que estavam mal posi­ciona­dos ou der­ro­ta­dos, tentarem levar a dis­puta para o ter­ceiro turno, can­didatos, suposta­mente, bem posi­ciona­dos, segundo eles mes­mos dizem, é a primeira vez.

Não tem qual­quer jus­ti­fica­tiva para com­por­ta­mento tão ata­bal­hoado e con­trário à leg­is­lação e ao bom senso.

Como disse, só pode ser uma estraté­gia mili­met­ri­ca­mente plane­jada para levar a eleição para o campo judi­ciário.

Uma outra jus­ti­fica­tiva seria o desejo de afrontar ou colocar-​se acima da lei. Vai enten­der, né? Acred­ito mais que seja uma estraté­gia. Eleição é uma coisa tão boa, mas tão boa, que ape­nas um ou dois turnos são insu­fi­cientes, bom mesmo é um “ter­ceirão” com a par­tic­i­pação das partes, procu­radores, advo­ga­dos e juízes.

Deve ser isso.

Abdon Mar­inho é advo­gado.