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Ah, as estradas.

Escrito por Abdon Mar­inho


AH, AS ESTRADAS.

Por Abdon Marinho.

POR OCASIÃO da visita do pres­i­dente da República ao Maran­hão, o gov­er­nador do estado declarou que, o pres­i­dente, tinha pouco ou quase nada mostrar, as condições das BR’s que cor­tam o estado são pés­si­mas além de ser “pouquinho” inau­gu­rar 5 km de estradas em dois anos de gov­erno.

Que as condições das estradas que cor­tam o estado do Maran­hão são pés­si­mas, não é seg­redo para ninguém, tanto assim que os maran­henses que moram na zona de fron­teira pref­erem fazer suas via­gens através das rodovias dos esta­dos viz­in­hos. Eu mesmo já con­tei a história do “ceguinho” que acos­tu­mado a fazer o per­curso For­t­aleza (CE) – Belém (PA), sabe, sem que ninguém lhe diga, quando entra e quando sai do estado.

Con­heço as estradas do Maran­hão, desde que me fiz advo­gado que as per­corro rotineira­mente, pelo menos uma vez ao mês, para aten­der meus clientes.

Sem­pre me per­gun­tei por quais motivos nos­sas estradas são tão ruins, por quais motivos pade­cem de obras intermináveis.

Era sobre estradas, desta vez estad­u­ais, que iria tratar no “tex­tão” do fim de sem­ana quando a “boio­lagem” de Bol­sonaro se impôs.

Mas, com um pouco de atraso, faço agora.

Como disse, pelo menos uma vez por mês, desço para inte­rior. Sem­ana pas­sada o des­tino foi o extremo norte do estado, Luís Domingues e Caru­ta­pera. No cam­inho fui “tirando reisado”, enco­stando aqui e ali, almoçamos em Santa Helena e paramos para cafez­inho da tarde, em Mara­caçumé, no “Café na Fazenda”, de D. Claú­dia.

Já era pelas 17 horas quando cheg­amos às Qua­tro Bocas, povoado dis­trito do Junco do Maran­hão, que dá acesso ao des­tino final da viagem.

Lá chegando encon­tramos a MA 206 inter­di­tada. Era um protesto dos moradores dos municí­pios da região (Amapá do Maran­hão, Caru­ta­pera, Luís Domingues, God­ofredo Viana é Cân­dido Mendes) con­tra as pés­si­mas condições da estrada.

O protesto já con­sumia um dia inteiro. Fui avisado, aliás, antes mesmo de pegar o ferry boat, as 10 horas da manhã.

Ao chegar­mos, no fim da tarde, encon­tramos um clima tenso com a polí­cia no local, ambulân­cia e uma fila de car­ros de ambos os lados, sem con­tar aque­les que já haviam desis­tido de chegarem aos seus des­ti­nos e voltado para casa.

Emb­ora sabendo do protesto com ante­cedên­cia – desde a sem­ana ante­rior –, não desisti da viagem por saber que provavel­mente não teria tempo de voltar a fazê-​la antes da eleição, a esper­ança de que quando chegasse lá o movi­mento já tivesse se dis­si­pado, e, tam­bém, porque no man­i­festo de inter­dição tinha um item que dizia que per­mi­tiriam a pas­sagem de pes­soas com neces­si­dades espe­ci­ais.

Chegando lá encon­tramos os moradores ainda irre­dutíveis, inclu­sive, no que refe­ria a per­mis­são de pas­sagem de pes­soas com neces­si­dades espe­ci­ais – o meu caso.

Só depois de muita nego­ci­ação com a polí­cia mil­i­tar e com os man­i­fes­tantes, per­mi­ti­ram a minha pas­sagem. Já em Luís Domingues tomei con­hec­i­mento que depois de per­mi­tirem a nossa pas­sagem, não demorou muito para encer­rarem a man­i­fes­tação de des­ob­struírem a via.

Na tele­visão, em horário nobre, pas­savam um com­er­cial do gov­erno estad­ual onde ele vende que está fazendo o maior pro­grama rodoviário do estado e ainda ajuda, desde 2015, os municí­pios a asfal­tar as vias urbanas.

Ape­sar do protesto con­tra as pés­si­mas condições daquela MA ter durado desde as primeiras horas da manhã até a noite, na cap­i­tal ou nos demais rincões do estado ninguém ficou sabendo, exceto os moradores daquela região e as pes­soas que, even­tual­mente, ten­ham sido prej­u­di­cadas pela inter­dição.

No mais o que resta pre­sente é a pro­pa­ganda mas­siva e enganosa de que o mel­hor lugar para se viver é den­tro dos com­er­ci­ais do gov­erno estad­ual.

Voltando ao protesto, por mais que seja con­tra esse tipo de ação, por enten­der que não se pode restringir o dire­ito de loco­moção dos cidadãos, forçoso não recon­hecer que é justa causa daque­les que foram inter­di­tar a via em protesto.

E não é a primeira vez que fazem isso. Esse último já foi o ter­ceiro ou quarto protesto dos moradores da região con­tra as pés­si­mas condições das MA’s 206 e 101.

Desde o iní­cio do atual gov­erno, ou seja, há seis anos, que vejo obras de reparos nas vias, e desde sem­pre que vejo que são reparos tão mal feitos que não duram nada, que desa­pare­cem na primeira chuva ou no próx­imo inverno.

A impressão que fica é que tanto aquela rodovia como diver­sas out­ras rodovias do estado que o gov­erno diz está recu­perando não pas­sam, na ver­dade, de “obras de morder”, onde todo mundo morde um pedaço, drenam os recur­sos públi­cos e as obras nunca ficam prontas.

É como se o estado apli­casse na prática o con­ceito do “Manto de Pené­lope”, que con­hece­mos da imor­tal obra de Homero, a Odis­seia.

Na volta da viagem, na quarta-​feira, final da tarde, dei uma carona, até Mara­caçumé, para D. Claú­dia, do “Café na Fazenda”, e perguntei-​lhe sobre as condições da estrada até Cen­tro Novo.

Com a sin­ceri­dade de sem­pre ela respondeu-​me: — ah, doutor, se as BR’s já não prestam, o sen­hor já imag­ina como estão as MA’s.

Ainda assim, resolvi ir fazer essa visita ao Cen­tro Novo do Maran­hão, um dos mais prósperos municí­pios do estado. E, com de onde nada se espera é de onde nada vem, pude con­statar que a estrada de ape­nas 22 km, encontra-​se em petição de mis­éria, como, aliás todas as out­ras.

Cos­tumo dizer que umas das prin­ci­pais rodovias estad­u­ais é a que sai do Cujupe, Alcân­tara e vai até Gov­er­nador Nunes Freire, que leva as municí­pios da baix­ada, da BR e, até para o Pará. Entra ano sai ano, entra inverno sai inverno e situ­ação da estrada é de buraque­ira e de inter­mináveis obras que nunca ficam prontas. De tão malfeitas, antes de rece­berem a mar­cação de sinal­iza­ção já estão pre­cisando de refor­mas.

Ao longo destas rodovias estad­u­ais, prin­ci­pal­mente as piores, cos­tu­mamos avis­tar cri­anças ou mesmo adul­tos colo­cando terra ou pedras nos prin­ci­pais bura­cos para facil­i­tar o tráfego, em troca de alguns tro­ca­dos. Apelidei-​os, por motivos óbvios, de DINOIT’s.

Já com troça meus com­pan­heiros de via­gens dizem ao avistá-​los: — olha, doutor, lá está um “dinoit”.

Ao pas­sar­mos por eles agrade­ce­mos e às vezes, se temos, lhe damos alguns tro­ca­dos.

Vendo sua excelên­cia, o gov­er­nador do estado, criticar o pres­i­dente da República que está há dois anos no poder, pelas pés­si­mas condições das BR’s – que são mesmo pés­si­mas –, fico com a impressão que ele (o gov­er­nador), ou não con­hece as rodovias estad­u­ais (ou só as con­hece pelos seus com­er­ci­ais regia­mente pagos), de sua respon­s­abil­i­dade, ou quer “tomar” o emprego de piadista do sen­hor Bol­sonaro, aquele que virou “boiola” ou maran­hense ao tomar um refrig­er­ante cor de rosa.

O descon­t­role é tamanho nas obras rodoviárias estad­u­ais que outro dia li – mas con­tinuo pen­sando que se trata de fake news –, que um engen­heiro que tra­balha na inter­minável obra da MA 103, a nossa estrada da Raposa, no Araçagy, teria declar­ado não mais saber o que estão fazendo ali, de tan­tas idas e vin­das.

Eu custo acred­i­tar que isso seja ver­dade, muito emb­ora tenha rece­bido tal infor­mação de mais de uma fonte.

Isso ocorre nas “bar­bas do gov­erno”, com a imprensa, oposição, com­er­ciantes e “todo mundo” crit­i­cando diari­a­mente os transtornos e a demora na con­clusão do empreendi­mento.

Final­izo dizendo que em mea­dos do mês que findou o gov­erno estad­ual recapeou a nossa Estrada da Mata. O serviço foi tão malfeito que no dia 16 de out­ubro filmei um tre­cho da obra só para guardar como prova o prazo de duração do serviço pois mal se foram 15 dias e os defeitos já bro­tam. Uma típica obra eleitor­eira, como tan­tas.

Pois é, sujos e mal lava­dos falam para suas legiões enquanto o povo padece no sofri­mento eterno.

Abdon Mar­inho é advogado

Da trans­vi­adônica de Lula à “boio­lagem” de Bolsonaro.

Escrito por Abdon Mar­inho

DA TRANS­VI­ADÔNICA DE LULA À BOIO­LAGEM DE BOLSONARO.

Por Abdon Marinho.

se pas­saram mais de trinta anos desde que o ex-​presidente Lula, em visita a Pelotas, no Rio Grande Sul, sug­eriu que aquela cidade seria um pólo expor­ta­dor de “vea­dos”. O áudio cap­tado indisc­re­ta­mente (parece-​me que ele não sabia que o micro­fone estaria lig­ado) daria conta que o então político sem mandato ainda pro­pusera a con­strução de uma rodovia lig­ando a cidade gaúcha à cidade de Camp­inas, em São Paulo, a “trans­vi­adônica”.

Depois da “trans­vi­adônica”, dos tem­pos que o político ainda son­hava em ser pres­i­dente da República, depois de sê-​lo – acho que em 2017 ou 18 –, quando acos­sado por inves­ti­gações poli­ci­ais da chamada oper­ação Lava jato, o ex-​presidente Lula, nova­mente cap­tado em áudios indis­cre­tos, desta vez autor­iza­dos pela justiça, sug­eriu que colo­cassem mil­i­tantes do sexo fem­i­nino na linha de frente de protestos, referindo-​se a elas como sendo “mul­heres do grelo duro”. Até hoje não sei o que sig­nifica isso.

Ainda naquela opor­tu­nidade por conta de uma oper­ação na sede do Insti­tuto Lula e nas casas de alguns dos membros/​funcionários, sug­eriu que deter­mi­nada secretária ao vê os poli­ci­ais “invadindo” sua casa pen­sou tratar-​se de um atendi­mento de uma prece. Induzindo que a mesma gostaria de ser “ata­cada” por aque­les homens.

Durante todos esses anos a mil­itân­cia política lig­ada ao ex-​presidente Lula sem­pre se esqui­varam ou ten­taram jus­ti­ficar as falas homofóbi­cas e/​ou pre­con­ceitu­osas, desprovi­das de edu­cação e respeito do seu líder.

Por estes dias, em visita ao Maran­hão, o atual pres­i­dente da República, sen­hor Bol­sonaro, tam­bém gravado indisc­re­ta­mente repetiu a “graça” do ante­ces­sor feita há trinta anos, ao ser apre­sen­tado ao guaraná Jesus, disse: “Agora eu virei boiola. Igual maran­hense, é isso?”, disse o pres­i­dente entre risos. “Guaraná cor-​de-​rosa do Maran­hão aí, quem toma esse guaraná aqui vira maran­hense”, com­ple­tou mostrando a bebida.

Em tem­pos de inter­net, com a reper­cussão à fala gan­hando o mundo, inclu­sive sendo objeto de debates nas redes de tele­visão, à noite o pres­i­dente, na sua live sem­anal e vestindo a camisa de um pop­u­lar time maran­hense, “emen­dou” um pedido des­cul­pas tomando nova­mente o guaraná Jesus e dizendo que “não sen­tiu nada”. Tudo isso entre mux­oxos e piad­in­has.

Acred­ito que a des­culpa tenha até saído pior que a ofensa ini­cial.

Existe alguma difer­ença entre dizer que “Pelotas é um grande polo expor­ta­dor de vea­dos” ou a refer­ên­cia às “mul­heres do grelo duro” e “agora virei boiola. Igual maranhense”?

Talvez a única difer­ença seja que as duas primeiras tenha sido pro­feri­das pelo sen­hor Lula antes e depois do mesmo ser pres­i­dente, já a última, a fala do sen­hor Bol­sonaro, tanto em solo maran­hense quanto aos mux­oxos e piad­in­has durante a live se deram em pleno exer­cí­cio do cargo.

Vive­mos tem­pos de ineditismos. Acred­ito ser a primeira vez que um pres­i­dente da República se refira a pop­u­lação inteira de um estado, inclu­sive, muitos seus ali­a­dos e defen­sores como “boio­las”.

Idên­tico, tam­bém, é o com­por­ta­mento dos “fac­ciona­dos” de ambos os lados.

Assim como os lulis­tas estão há anos fin­gindo que nunca houve tal ofensa ou fazendo pouco caso das mes­mas, o mesmo ocorre com os bol­sonar­is­tas, que acharam lindo o que o seu líder disse e defen­dem nas redes soci­ais e meios de comu­ni­cação a sua fala.

Dizem: — o Bol­sonaro falou de diver­sas coisas, só reper­cu­ti­ram isso; — o pres­i­dente falou dos mil­hões em inves­ti­men­tos para Maran­hão; — o pres­i­dente fez mais pelo guaraná Jesus do que qual­quer outra pes­soa.

Out­ros até se saíram com a inusi­tada tese de que o pres­i­dente chamou os “maran­henses de ‘boio­las’ de forma car­in­hosa”.

E por aí vai. Morro e entendo o com­por­ta­mento de “mili­ton­tos” que são capazes de

‘pas­sar o pano’ para tudo que seus líderes dizem ou fazem. Chega ser engraçado que todos estes que se calaram ou jus­ti­ficaram todas as asneiras do Lula durante anos agora virem cen­sores do Bol­sonaro, não que ele não mereça sev­era cen­sura, mas porque nunca dis­seram nada ante­ri­or­mente.

Já disse por diver­sas vezes que não dev­e­ria ser con­sid­er­ado ofen­sivo dizer que alguém é homos­sex­ual, gay, etc.

Os últi­mos tex­tos que abordo o assunto, que lem­bro foram: “A ofensa gay”, onde trato de um entrevero entre os hoje senadores Roberto e Wev­er­ton Rocha, onde o primeiro referiu-​se ao segundo e ao pres­i­dente do seu par­tido como um casal e fechava a pub­li­cação dizendo que “dese­java feli­ci­dades ao casal” e por ocasião do rece­bi­mento de uma queixa ofer­tada pela esposa do senador Wev­er­ton con­tra o senador Roberto, pelo mesmo fato, no Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF. O título do texto é “Insin­u­ação de ‘viadagem’ aflora pre­con­ceitos até no Supremo”.

Nestes dois tex­tos os leitores encon­tram com maiores detal­hes o que penso.

Descarto tanto das falas do ex-​presidente Lula quanto do atual pres­i­dente Bol­sonaro a ausên­cia de pre­con­ceitos. Ambas foram man­i­fes­tações de quem vêem os gays como seres humanos infe­ri­ores e ambas foram feitas com intu­itos de ofender as pessoas.

Emb­ora muito comum entre os brasileiros, não con­sigo enx­er­gar graça no chamado “pre­con­ceito recre­ativo”, este em que as pes­soas tiram motivos para riso de situ­ações físi­cas ou situ­ações sex­u­ais de out­ras pes­soas.

O gordo, o magrelo, o negro, o albino, o defi­ciente, o gay, não são motivos de graça para ninguém.

Não é por sua situ­ação que devem ser motivos de cha­co­tas ou dis­crim­i­nações.

No caso do pres­i­dente o caso se reveste de maior gravi­dade, não só pela hon­radez e respeito que o cargo requer, como rep­re­sen­tante de todos os brasileiros, inclu­sive dos gays e dos maran­henses, mas, tam­bém, porque ele pautou sua car­reira política inteira reforçando pre­con­ceitos con­tra as pes­soas, chegando ao ponto de, em deter­mi­nada entre­vista, ter dito que preferiria muito mais um filho morto a um filho gay, muito emb­ora saibamos que todos os seus fil­hos este­jam bem vivos, com a graça de Deus, e um ou outro até ensaie sair do armário de vez em quando. E ninguém tem nada com isso.

Um pres­i­dente da República é pres­i­dente de todos e deve respeito a todos os pre­si­di­dos. Ainda que seja hon­esto, tra­bal­hador, que faça obras impor­tantes e necessárias, isso não lhe dar o dire­ito de ofender os sen­ti­men­tos de nen­hum cidadão. Ainda que traga “bur­ras” de ouro não lhe per­mite dizer asnices.

O Brasil é um país que enfrenta desafios imen­sos, é a econo­mia que não vai bem, com o dívida pública con­sumindo quase a total­i­dade do PIB, é o dólar nas alturas, é o desem­prego com números absur­dos, é a fome que ronda o lares de mil­hões de brasileiros, é a crise ambi­en­tal que se tornou a maior da história, é a edu­cação que não avança, é a saúde que não atende como dev­e­ria, é a cor­rupção que drena os recur­sos públicos.

Com tan­tos prob­le­mas, pre­cisamos de um pres­i­dente da República que se pre­ocupe com os fun­dos da nação e não com fun­dos dos seus cidadãos. Destes, cada um cuida do seu como mel­hor lhe aprou­ver.

Ah, ape­nas encer­rar, o pres­i­dente e seus adu­ladores podem tomar guaranás ou bebidas de qual­quer cor que não cor­rerão o risco de ficarem “boio­las” por conta disso.

Noutra palavras, não poderão usar essa des­culpa se quis­erem “soltar a franga”.

E, para os que não sabem, no Maran­hão não temos “boio­las”, ape­nas “quali­ras” e nen­hum por ter tomado guaraná Jesus.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

Inau­gu­raremos a era dos min­istros capachos?

Escrito por Abdon Mar­inho

INAU­GU­RAREMOS A ERA DOS MIN­ISTROS CAPACHOS?

Por Abdon Marinho*.

O MIN­ISTRO Celso de Mello, do Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF, “pen­durou” a toga por estes dias, mais pre­cisa­mente, no dia 13 de out­ubro, dias antes de com­ple­tar os 75 anos idade, em 1º de novem­bro, data lim­ite para aposen­ta­do­ria com­pul­sória, com 31 anos na Corte Suprema e 50 anos de serviço público ao país – graduou-​se em 1969 e, a par­tir de 1970, através de con­curso, onde foi aprovado em primeiro lugar, pas­sou a inte­grar o Min­istério Público do Estado de São Paulo, de onde saiu para inte­grar o STF.

Com uma vida inteira ded­i­cada ao Dire­ito, o ex-​decano do STF, pos­sui uma car­reira jurídica sól­ida, tendo se car­ac­ter­i­zado por seus votos den­sos e de inigualáveis con­teú­dos.

Ao ingres­sar no Supremo e com 19 anos de car­reira no MPSP, já era recon­hecido por sua notável capaci­dade jurídica, esta, aliás, um dos pré-​requisitos para o ingresso na corte.

Nunca tive­mos notí­cias de ques­tion­a­men­tos à sua notável capaci­dade jurídica ou, tão pouco, quanto à falta de ilibação de sua con­duta, seja nos trinta e um anos na Suprema Corte, seja nos dezen­ove anos antecedentes no Min­istério Público de São Paulo.

Nas sessões que ante­ced­eram sua saída, na turma e no pleno, vimos em emo­cionadas saudações, os demais min­istros recon­hecerem a sua hon­radez e dig­nidade.

Mesmo o min­istro Gilmar Mendes, que por inúmeras vezes, dis­cor­dou dos posi­ciona­men­tos do ex-​ministro, não con­teve as lágri­mas no dis­curso de des­pe­dida.

Um justo recon­hec­i­mento pelos cinquenta anos de ded­i­cação ao dire­ito e ao serviço público brasileiro.

Mas, como nem tudo são flo­res, nos últi­mos anos, prin­ci­pal­mente desde que se instalou o atual gov­erno, o ex-​ministro vinha sofrendo ataques das hostes gov­ernistas e, prin­ci­pal­mente, da mil­itân­cia par­tidária vin­cu­lada ao pres­i­dente, incon­for­mada com algu­mas decisões e votos e, até, por críti­cas que fez em ambi­ente pri­vado – mas que vieram a público –, ao atual gov­erno, onde com­parou os arrou­bos autoritários dos atu­ais man­datários, com man­i­fes­tações sem­anais con­tra os demais poderes, ao ocor­rido na triste República de Weimar, naque­les anos que pre­ced­eram a tomada defin­i­tiva do poder na Ale­manha pelos nazis­tas e toda a des­graça que a ela se sucedeu.

A sanha detra­tora à guisa de não encon­trar um escân­dalo nos votos ou sus­peita de favorec­i­mento ou cor­rupção ou inter­esses sub­al­ter­nos, foi revolver da página de um livro do ex-​ministro da Justiça do gov­erno Sar­ney, Saulo Ramos, um único episó­dio pouco edi­f­i­cante, jamais des­men­tido – por edu­cação ou pudor –, por Celso de Mello.

O episó­dio nar­rado por Ramos, incerto no livro Código da Vida, dar conta de um diál­ogo havido entre o autor e o ex-​ministro sobre uma votação que inter­es­saria ao ex-​presidente José Sar­ney, que o indicara para o cargo de min­istro e que ele, Mello, votara con­tra.

Ao cobrar os motivos de seu posi­ciona­mento, o ex-​ministro teria respon­dido ao autor do livro que votara con­tra porque o jor­nal Folha de São Paulo ante­ci­para que ele votaria a favor do ex-​presidente Sar­ney e, como este já gan­hara a votação antes de chegar sua vez de votar, votou contra.

No livro, Ramos diz que o chamou de “juiz de merda” e nunca mais lhe dirigiu a palavra.

O livro de Ramos foi ques­tion­ado por algu­mas pes­soas, que dis­seram que o mesmo con­tara a história “causa própria”. O próprio Mello, como dito ante­ri­or­mente, nunca soube ter dito nada sobre o assunto.

Com quase trinta anos de “mundo jurídico”, onde tudo se comenta, como em um salão de beleza, e gozando de boa memória, nunca ouvi falar de nada, exceto este episó­dio, que desabonasse ou pusesse em xeque a con­duta do min­istro recém-​aposentado. Um ato de cor­rupção ou desvio de con­duta, nada.

Pois este único episó­dio, que já conta com quase três décadas, foi o que bas­tou para uma sór­dida cam­panha dos mil­i­tantes bol­sonar­is­tas con­tra o ex-​ministro, a quem só se refe­riam (ou se ref­erem) como “juiz de merda”. Essa tem sido a can­tilena nos dois últi­mos anos.

Faço tais con­sid­er­ações sobre a vida do ex-​ministro porque o pres­i­dente da República, até com um der­radeiro gesto de grosse­ria por alguém que dedi­cou 50 anos de sua vida ao serviço público, mal o então decano anun­ciara a data da saída, já tinha o nome pronto para ocu­par a vaga. Não esperou a “missa de sétimo dia”, o defunto ainda quente na sala, já o sub­sti­tuto aden­trava ao recinto.

E é sobre este pro­ceder pres­i­den­cial e sobre as suas escol­has que, pro­pri­a­mente, trata o pre­sente texto.

Desde que assumiu – e mesmo antes disso –, o pres­i­dente vem usando as vagas que sur­girão no Supremo, e tam­bém, nos out­ros tri­bunais, como moeda de troca.

Faz isso com tanta des­façatez e “desaver­gonhamento” que por vezes chego a pen­sar que isso é nor­mal. Ape­nas por um momento, logo percebo que nada disso é nor­mal, nem mesmo o “novo nor­mal”, é ape­nas descara­mento diante da omis­são dos poderes con­sti­tuí­dos que teimam em perseguir a própria desmor­al­iza­ção.

Me detendo ape­nas no Supremo Tri­bunal Fed­eral, a Con­sti­tu­ição Fed­eral, no artigo 101, esta­b­elece “Art. 101. O Supremo Tri­bunal Fed­eral compõe-​se de onze Min­istros, escol­hi­dos den­tre cidadãos com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade, de notável saber jurídico e rep­utação ilibada”.

Muito emb­ora, den­tro das bal­izas con­sti­tu­cionais, exista uma vastidão a per­mi­tir a escolha, espera-​se que as escol­has recaíam sobre elas.

Antes mesmo de abrir a vaga ocu­pada pelo ex-​ministro Celso de Mello, o pres­i­dente já havia dito que indi­caria um min­istro “ter­riv­el­mente” evangélico, doutra feita, que indi­caria um min­istro com quem pudesse tomar uma cerveja.

Nada tenho con­tra os evangéli­cos ou os apre­ci­adores de cerve­jas, mas estes não são critérios para se escol­her min­istros de tri­bunais.

Ape­sar das inusi­tadas colo­cações a pat­uleia e, pior, os poderes con­sti­tuí­dos silen­ciam como se fos­sem nor­mais.

Mesmo aquela mil­itân­cia que disse ter votado no atual man­datário numa perseguição à ética per­dida na política, aplaude e acha nor­mal estes despautérios.

E não falo ape­nas daque­les que se deixaram “cegar” pelas escol­has ide­ológ­i­cas, mesmo pes­soas esclare­ci­das, aplau­dem e acham nor­mais esse tipo de coisa.

E, das palavras à ação – prin­ci­pal­mente diante do silên­cio cúm­plice, obse­quioso ou covarde –, é um pulo.

Antes mesmo de aberta a vaga ocu­pada pelo decano, o pres­i­dente, como dis­se­mos, tra­tou logo de indicar para preenchê-​la o desem­bar­gador do Tri­bunal Regional da Primeira Região, Kás­sio Mar­ques, que ingres­sou naquele tri­bunal na vaga do quinto con­sti­tu­cional des­ti­na­dos aos advo­ga­dos, nomeado, em 2011, pela então pres­i­dente Dilma Rouss­eff.

Estran­hamente, segundo noti­cia a mídia, o desem­bar­gador estava em “cam­panha” por uma vaga no Supe­rior Tri­bunal de Justiça — STJ, quando acabou caindo nas “graças” do pres­i­dente e gan­hando a indi­cação para o mais alto degrau da fama.

Indi­cação feita, exceto por algu­mas fran­jas bol­sonar­is­tas, – e pelos motivos erra­dos –, que cobravam a nomeação de alguém “ter­riv­el­mente” evangélico, a escolha, ao que parece, agradou em “cheio” classe polit­ica, sobre­tudo, aque­les mais encalacra­dos com a justiça, do chamado “cen­trão”, agora prin­ci­pal força polit­ica na base do gov­erno e que, certa vez, um impor­tante min­istro do gov­erno fez o seguinte tro­cadilho: – se gri­tar pega “cen­trão”, não fica um meu irmão; os petis­tas, respon­sáveis, como dito ante­ri­or­mente, pela indi­cação ao TRF1.

A classe polit­ica parece tão sat­is­feita com a nova indi­cação para Suprema Corte que ninguém diz nada, impera o mutismo, em relação as incon­sistên­cias cur­ric­u­lares do indi­cado, aos indica­tivos de plá­gios nas teses defen­di­das e, até mesmo, nas denún­cias – várias –, de que não pos­suiria o notável con­hec­i­mento jurídico e a con­duta ilibada.

É ver­dade que ninguém disse nada, aliás, nem ligou, quando da nomeação pelo gov­erno do Par­tido dos Tra­bal­hadores — PT, para o cargo que ocupa hoje. Como é comum nestes casos.

Entre­tanto, agora, esta­mos falando de uma indi­cação para mais ele­vada corte de justiça do país, onde o escol­hido, com menos de 50 anos, ficará por lá, com o dire­ito de “errar por último”, como os próprios inte­grantes da Corte fazem questão de dizer, por quase trinta anos.

Trata-​se de algo de tamanha importân­cia que dev­e­ria mobi­lizar toda a sociedade.

Assiste-​se, entre­tanto, uma estranha letar­gia diante de uma indi­cação, no mín­imo con­tro­versa, tendo o rela­tor da indi­cação no Senado República adi­antado, diante das incon­sistên­cias cur­ric­u­lares do pos­tu­lante, que o cur­rículo para o mais ele­vado cargo do judi­ciário brasileiro, não tem relevân­cia.

A mim, soa como ina­cred­itável que a classe política e a sociedade civil tratem a indi­cação e escolha de um min­istro para STF com o pouco caso de quem se apeia um bode em uma beira de estrada no Piauí.

Mesmo aque­les que estavam nas ruas, desde o ano de 2013, cobrando moral­i­dade, respeito a coisa pública e o fim da cor­rupção, parece-​me que nada têm a dizer diante da nomeação de um min­istro do STF por um con­vescote de pes­soas de con­duta duvi­dosa.

Quer me pare­cer que nada apren­deram com as con­se­quên­cias de quando o ex-​presidente Lula, indi­cou um mil­i­tante do par­tido e sub­or­di­nado de Zé Dirceu para o Supremo, ainda no seu primeiro gov­erno.

A escolha do novo min­istro parece seguir os mes­mos pas­sos daquela infe­liz escolha, numa ver­são pio­rada.

Ao bater os olhos no indi­cado por seus novos ali­a­dos políti­cos, o pres­i­dente tra­tou de levá-​lo pes­soal­mente para um “acerto” de posições com os notáveis min­istros Gilmar Mendes e Dias Tóf­foli.

Não sat­is­feito, em “bate-​boca” com seguidores nas redes soci­ais, adiantou uma dezenas de votos do futuro min­istro.

Chega a ser desmor­al­izante não só para o min­istro mas para todo o tri­bunal os votos de qual­quer inte­grante da corte seja ante­ci­pado por quem quer que seja.

Como alguém, em sã con­sciên­cia, pode acred­i­tar que esse tipo de coisa está certa? Não, não tem nada certo nisso.

Assim, como Celso de Mello, temo pelo futuro do país. Temo mais ainda quando vejo a comunhão de malfeitores em torno de um mesmo inter­esse.

A certeza é que dias piores virão.

Abdon Mar­inho é advogado.