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As fake news e a democ­ra­cia – Con­sid­er­ações iniciais.

Escrito por Abdon Mar­inho

AS FAKE NEWS E A DEMOC­RA­CIACON­SID­ER­AÇÕES INICIAIS.

Por Abdon Marinho.

AQUE­LES que acom­pan­ham meus escritos já sabem que fui apre­sen­tado às chamadas “fakes news”, bem antes delas exi­s­tirem como tais. Aliás, antes mesmo da pop­u­lar­iza­ção do próprio termo.

Cor­ria o ano de 1994 quando fomos – eu e o Maran­hão inteiro –, apre­sen­ta­dos a uma espé­cie de avô das hoje chamadas “fake news”. Era, ainda, uma fake news analóg­ica, mas, já com poten­cial alta­mente destru­tivo.

Falo do rumor­oso “Caso Reis Pacheco”, que já foi tratado por mim noutras opor­tu­nidades, aqui mesmo, neste site.

Farei um resumo em pou­cas lin­has e, os mais inter­es­sa­dos, poderão apro­fun­dar no assunto, no site, no meu canal no YouTube ou noutros meios de comu­ni­cação.

Em resumo, deu-​se o seguinte: o grupo adver­sário ao senador Cafeteira, can­didato ao gov­erno do Maran­hão naquele ano de 1994, urdiu uma trama dia­bólica para destruir sua rep­utação.

Alguns anos antes de 1994 o con­sel­heiro do Tri­bunal de Con­tas, Hilton Rodrigues, sogro de Cafeteira, mor­rera vítima de um aci­dente de trân­sito, na antiga Estrada da Raposa, nas prox­im­i­dades do Bairro Araçagy.

O cidadão envolvido no aci­dente de trân­sito que causara morte do sogro do gov­er­nador, de nome Raimundo Reis Pacheco, mudou-​se do estado, para, suposta­mente, apare­cer como um fan­tasma.

No ano da eleição, um falso irmão dele – cri­ado arti­fi­cial­mente, com iden­ti­dade, CPF e endereços fic­tí­cios –, por nome de Ana­cleto, “bateu” as por­tas do Supremo Tri­bunal Fed­eral– STF, com uma rep­re­sen­tação crim­i­nal gravís­sima: acusava um senador da República, Epitá­cio Cafeteira, de haver “deter­mi­nado” a morte do seu irmão.

Às vésperas das eleições, fal­tando pouco mais de uma sem­ana, o senador Sar­ney, na col­una man­tém na capa do jor­nal que fun­dou, assi­nava o texto: “Liber­dade e Reis Pacheco”. Nela ven­dia a “fake news” do falso assas­si­nato, dev­i­da­mente “calçado” na rep­re­sen­tação do irmão fake, ao STF.

Com a “fake news” analóg­ica rever­berando nos meios de comu­ni­cação e na reta final para o segundo turno, os ali­a­dos de Cafeteira tiveram que se “virar” para des­fazer a men­tira, primeiro local­izando a mãe de Reis Pacheco na per­ife­ria de Belém, que lhes disse jamais ter tido um filho por nome de Ana­cleto, e, depois, local­izando o próprio “morto-​vivo”, no Estado do Amapá, que gravou um depoi­mento segu­rando o jor­nal do dia, con­fir­mando que estava vivo.

O mate­r­ial todo, cole­tado pelo dep­utado estad­ual Ader­son Lago e Juarez Medeiros, tam­bém dep­utado estad­ual e can­didato a vice-​governador na chapa com Cafeteira, chegou a tempo de ser usando-​nos último pro­grama eleitoral.

Lev­ado ao ar, aquele último pro­grama, prati­ca­mente, só teve audiên­cia na cap­i­tal. No resto do estado, ou as repeti­do­ras tiveram alguma falha téc­nica que as tiraram do “ar” jus­ta­mente no momento em que o pro­grama repunha a ver­dade e reti­rava a pecha de assas­sino do can­didato oposi­cionista; ou eram prob­le­mas de falta de ener­gia em vários pon­tos do estado.

Pelo tele­fone, única forma de mon­i­tora­mento disponível naquela época, acom­pan­hava a angús­tia e tris­teza dos ali­a­dos de Cafeteira infor­mando que o pro­grama não pas­sara; ou fora cor­tado; ou fal­tara energia.

A col­i­gação do can­didato ainda ten­tou junto ao TRE que o pro­grama fosse repetido, mas não obteve êxito. Acred­ito que o tri­bunal só jul­gou o assunto bem depois do pleito.

No meu canal no YouTube tem uma live que fiz com o ex-​deputado Ader­son Lago onde trata­mos deste assunto.

O senador Cafeteira perdeu aquela eleição – muitos sus­ten­tam que gan­hou –, por uma difer­ença ínfima de votos, menos de 20 mil sufrá­gios.

Pas­sa­dos todos estes anos ainda me per­gunto se o resul­tado não teria sido outro sem a farsa do “Caso Reis Pacheco”.

Será que no longín­quo 1994 uma fake news decidiu o des­tino do Maran­hão?

Será que a história de tan­tos mil­hões de maran­henses não teria sido difer­ente sem aquela engen­hosa fake news analógica?

O Maran­hão, o Brasil e o mundo tem um assunto urgente na pauta: o impacto das fakes news nas eleições, nas vidas das pes­soas e nas insti­tu­ições dos países.

Com o advento da inter­net e o avanço dos téc­ni­cas de comu­ni­cação e manip­u­lação de dados, até mesmo da voz e imagem das pes­soas, uma men­tira ganha vida e provoca estra­gos antes mesmo da vítima saber o o está acon­te­cendo.

As men­ti­ras e manip­u­lações de infor­mações podem criar aver­sões e empa­tias, deter­mi­nando, o resul­tado de eleições.

Como as democ­ra­cias vão se pro­te­ger dos efeitos das fake news?

Como impedir que os resul­ta­dos das eleições pos­sam ser manip­u­la­dos por esper­tal­hões, por forças políti­cas e por gov­er­nos estrangeiros?

A dis­cussão alcança, ainda, o impacto das fake news na vida das pes­soas. Os “assas­si­natos” de rep­utações são cada vez mais fre­quentes e comuns.

O Brasil, diari­a­mente, sofre com os ataques de falanges políti­cas con­tra suas insti­tu­ições.

Como ire­mos com­pat­i­bi­lizar liber­dade de expressão com os ver­dadeiros ataques crim­i­nosos à honra e a dig­nidade das pes­soas?

Nos próx­i­mos tex­tos irei – sem a pre­ten­são de ser o dono da ver­dade –, expor meu posi­ciona­mento a respeito destes temas e outro cor­rela­ciona­dos.

Não per­cam os próx­i­mos episó­dios.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

Far­inha pouca, meu pirão primeiro.

Escrito por Abdon Mar­inho

FARINHA POUCA, MEU PIRÃO PRIMEIRO.

Por Abdon Marinho.

DESCON­TADAS algu­mas arrobas que pos­sui a mais, o gov­er­nador do Maran­hão, tal qual a D. Bela, per­son­agem imor­tal de Zezé Macedo na “Escol­inha do Pro­fes­sor Raimundo», do saudoso genial Chico Any­sio, só pensa “naquilo”. Para ele, no caso, “aquilo” é a presidên­cia da República. Espé­cie de sonho e/​ou obsessão que o persegue desde sem­pre.

Os que não con­hecem a história ficam sem enten­der muitos dos seus posi­ciona­men­tos e man­i­fes­tações.

Foi, basi­ca­mente, o que acon­te­ceu com essa rev­e­lação de uma artic­u­lação urdida pelo comu­nista visando a fusão do seu par­tido, o PCdoB com o PSB e/​ou uma espé­cie de “MDB de esquerda”, agru­pando todos os descon­tentes de todas as leg­en­das “de esquerda” para enfrentar o bol­sonar­ismo nas eleições de 2022, son­hando ser ele o grande con­du­tor e can­didato do grupo, con­forme rev­elou “O Globo”, em edição recente.

No mesmo artigo, sua excelên­cia «assina» o ates­tado de óbito da esquerda brasileira e escreve o epitá­fio na sua lápide, avaliando, den­tre out­ras coisas, que as chamadas “esquer­das” não elegerão nen­hum prefeito de cap­i­tal nas eleições munic­i­pais deste ano.

Não é que a avali­ação esteja errada, pelo con­trário, pelas infor­mações que temos, parece cor­reta, é pela forma como se avalia.

Aqui mesmo, no estado que con­duz – e que as pesquisas apon­tam pos­suir apoio majoritário –, não ape­nas cam­in­ham para perder a eleição da cap­i­tal, como, tam­bém, nos municí­pios mais impor­tantes do Maran­hão.

A própria região met­ro­pol­i­tana, onde a pre­sença do gov­erno estad­ual é mais sen­tida, até pela influên­cia das mais vari­adas mídias, as “chamadas esquer­das” não devem eleger ninguém.

O curioso é que em muitos municí­pios, inclu­sive na região met­ro­pol­i­tana, temos o gov­erno estad­ual fazendo “parce­rias” con­tra os can­didatos da esquerda, até mesmo con­tra o próprio par­tido do gov­er­nador, o PCdoB.

Outro dia expus a curiosa parce­ria que ocorre entre o gov­erno estad­ual é um pré-​candidato de Paço do Lumiar, um dos municí­pios mais impor­tantes do estado.

A impressão que fica é que o gov­er­nador, para jus­ti­ficar a sua “análise” de que a esquerda brasileira não elegerá nen­hum prefeito de cap­i­tal – e acres­cento, de municí­pios impor­tantes –, “torce” e/​ou até “tra­balha” para o fra­casso dos par­tidos do seu campo, para depois dizer: “eu não disse”, e apresentar-​se como o grande tim­o­neiro do tal pro­jeto do “MDB da esquerda”.

Há alguns dias, um fato político me chamou a atenção: um impor­tante secretário do gov­erno estad­ual, fil­i­ado ao par­tido do gov­er­nador, foi à imprensa dizer que estava “fechado” com um outro can­didato que não era o do seu par­tido.

Achei o gesto muito estranho. Não entro no mérito sobre a qual­i­dade do can­didato que escol­hera, com certeza um exce­lente nome.

O meu estran­hamento foi pelo fato em si.

Ora, con­heço o PCdoB, pes­soal­mente, desde que voltaram a legal­i­dade, em mea­dos de 1985. Ape­sar de não ser fil­i­ado a par­tido – ainda era ado­les­cente –, par­tic­i­pava de dis­cussões com diver­sos comu­nistas por conta da orga­ni­za­ção do movi­mento estu­dan­til e, ainda que com menos assiduidade, nunca perdi o diál­ogo com algu­mas pes­soas do par­tido, nem quando, em 1994, fiz­eram um acordo “secreto” com o grupo Sar­ney e não apoiaram as forças políti­cas da oposição.

Em todos estes anos – e depois, com o apro­fun­da­mento dos estu­dos da história a par­tir da rup­tura dos dis­si­dentes com o Par­tido Comu­nista Brasileiro, o antigo PCB, nos anos 50 do século pas­sado, jus­ta­mente por aquele par­tido ado­tar revi­sion­ismo con­tra as práti­cas stal­in­istas, mas isso é assunto para outro texto –, sem­pre soube que um dos pilares do par­tido era o chamado “cen­tral­ismo democrático”.

O que sig­nifi­cava (ou sig­nifica) que podiam dis­cu­tir, “se matar” na base, mas cumpririam, rig­orosa­mente, as decisões do par­tido. Nas vezes que ques­tionei isso, os ami­gos diziam que era pela “causa” maior. Nunca soube que causa era essa.

Quando vi um secretário do gov­er­nador, mais que isso, um “comunista-​raiz”, declarar que estava “fechado” com outro can­didato, entendi que havia “uma causa maior” pelo meio e que o can­didato ofi­cial do par­tido comu­nista seria “cris­tian­izado”, ou seja, para constar.

Os mais jovens não devem saber mas o termo “cris­tianizar” remonta a eleição pres­i­den­cial de 1950 do século pas­sado, quando o PSD lançou um can­didato, Cris­tiano Machado, mas com o avançar da dis­puta, e mesmo no iní­cio da mesma, prati­ca­mente todos os líderes do par­tido o aban­do­nou.

O Cris­tiano Machado ficou foi longe de gan­har as eleições, mas o fol­clore da política nacional gan­hou um novo termo: “cris­tianizar”.

Como vêem, Abdon Mar­inho tam­bém é cul­tura. Rsrsrs.

A certeza que o can­didato ofi­cial seria “cris­tian­izado” ficou mais patente quando diver­sos out­ros secretários de esta­dos, “da con­fi­ança do gov­er­nador”, ainda que de par­tidos políti­cos difer­entes, ao invés de guardarem dis­crição, expuseram pub­li­ca­mente suas can­di­dat­uras.

Excesso de democ­ra­cia ou movi­mento combinado?

A situ­ação ficou tão con­strange­dora que outro dia “virou notí­cia” alguém do PCdoB declarar apoio for­mal ao can­didato do par­tido. É sério.

E, por último, o vati­cino do gov­er­nador do estado – emb­ora falando para a política nacional –, de que a “esquerda” não elege­ria nen­hum prefeito de cap­i­tal, o can­didato do par­tido dele, obvi­a­mente, incluso.

Quem con­hece política sabe que nen­hum gesto é em vão.

Raposa velha neste ter­reiro, o pai do can­didato do par­tido do gov­er­nador já avi­sou que no seu dicionário não con­sta a palavra desistên­cia. Talvez querendo dizer não aceitar ser deix­ado para trás, como tantos.

Reca­dos dados de todos os lados resta saber o resul­tado de tudo isso.

O jabuti está em cima da árvore e duas per­gun­tas se fazem necessárias: quem o colo­cou e por que o colo­cou.

A mim soa estranho que um gov­erno que “se vende” como tendo o apoio de quase 70% (setenta por cento) de apoio pop­u­lar, com uma forte pen­e­tração na mídia, não con­siga trans­ferir esse apoio para o “seu” can­didato.

Mais estranho, ainda, que o gov­er­nador já tenha “ven­dido” der­rota do “seu” can­didato ao país inteiro.

A situ­ação fica mais esquisita quando sabe­mos que o can­didato do par­tido do gov­er­nador – até onde sabe­mos, repita-​se –, não pos­sui qual­quer mácula no cur­rículo, nunca se envolveu em escân­da­los, pos­sui família estru­tu­rada, e quem con­vive com ele, diz que é boa praça, exce­lente pes­soa, etc.

Diante disso, não podemos deixar de per­gun­tar, até porque, per­gun­tar não ofende, por qual motivo e tão pre­mat­u­ra­mente o par­tido já o “cris­tian­i­zou” e o gov­er­nador já pub­li­cou que ele não se elege?

Só lem­brando, aqui mesmo na cap­i­tal, muitas can­di­dat­uras, antes de suas escol­has em con­venções, saíram para dis­puta com per­centu­ais infe­ri­ores ao can­didato do PCdoB e sagraram-​se vito­riosas.

Daí soar estranho tamanho desin­ter­esse pela can­di­datura ofi­cial do par­tido a ponto de sua maior lid­er­ança, o gov­er­nador, já ter “recon­hecido” a der­rota antes mesmo de entrar no ringue. E por nocaute.

Quer me pare­cer que, em nome de sua “causa maior” o gov­er­nador queira “dá um cav­alo de pau” na sua estraté­gia política.

Como disse no iní­cio – e em diver­sos out­ros momen­tos –, sua excelên­cia só pensa “naquilo”, na presidên­cia.

Desde que pôs os pés nos Leões que sua ener­gia – e o poder do estado –, é dire­cionada para este propósito, já se vão quase sete anos nisso.

Lá atrás, se não me falha memória, em 2012 ou 2013, alertei, sua excelên­cia, para o risco de candidatar-​se pelo PCdoB ao gov­erno do estado, um par­tido arraigado em dog­mas e posi­ciona­men­tos difí­ceis de serem com­pat­i­bi­liza­dos com à sociedade brasileira.

Não deu bola, e a vitória nas urnas – moti­vadas prin­ci­pal­mente pelo cansaço do povo com o grupo Sar­ney e, tam­bém, porque não tinha como deixar de gan­har do opos­i­tor –, fez foi achar que estava no cam­inho certo e que o povo brasileiro aceitaria ser gov­er­nado por um par­tido com o histórico do Par­tido Comu­nista do Brasil — PCdoB.

Depois de tanto tempo, parece que sua excelên­cia viu que a briga lá em cima é para “cachorro grande”, e que o seu par­tido, con­forme já aler­tou o próprio Lula, num “chega pra lá” ele­gante, é a sua prin­ci­pal desvantagem.

Nesse tempo todo, em entre­vis­tas para uma imprensa dócil, o gov­er­nador já negou os duzen­tos anos do comu­nismo, já des­disse a maio­ria dos seus dog­mas, já o ten­tou “casar com o Cris­tian­ismo” e tan­tas out­ras coisas.

Tudo que foi ten­tado não deu o resul­tado esper­ado, por isso é sabedor da sua enorme desvan­tagem, ainda mais que o “mote” do atual pres­i­dente – e do bol­sonar­ismo –, para as eleições de 2022, será o com­bate à “ameaça comu­nista”.

Ciente disso, o gov­er­nador e seus ali­a­dos, den­tro do par­tido, ten­taram “inven­tar” um tal de movi­mento 65, que, efe­ti­va­mente, até parece coisa de movi­mento, mas, estu­dan­til, e não de quem pre­tende diri­gir o país.

Sair do par­tido – como já foi ensa­iado algu­mas vezes –, não pegaria bem, pas­saria a impressão de opor­tunismo.

Sem con­tar con­tar que os próprios cama­radas do par­tido pode­riam se sen­tir “traí­dos”.

A estraté­gia política que mel­hor se apre­senta para sua excelên­cia é apos­tar – e mesmo torcer, talvez “tra­bal­har” –, para o insucesso dos par­tidos de esquerda nes­tas eleições munic­i­pais, para quedá-​los a aceitar a “sua ideia” da fed­er­ação de par­tidos, o tal de “MDB de esquerda”.

Só reg­is­trando que tal ideia nem é orig­i­nal. O MDB orig­i­nal, quando surgiu, foi como uma “fed­er­ação de diver­sas forças políti­cas colo­cadas na clan­des­tinidade pela ditadura.

Ele, como “pai” da ideia à frente, para dis­putar as eleições pres­i­den­ci­ais, já sem o estigma do comu­nismo e com o apoio de todas as forças políti­cas de dire­ita, cen­tro até a extrema esquerda.

Esse é o jabuti. Na tradução lit­eral do que já dizia minha avó: “— far­inha pouca, meu pirão primeiro”.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

A ver­dade que alvoroça a caserna

Escrito por Abdon Mar­inho


A VER­DADE QUE ALVOROÇA A CASERNA.

Por Abdon Marinho.

ALGU­MAS sem­anas, com o alas­tra­mento da pan­demia do novo coro­n­avírus e aumento do número de mor­tos, escrevi um texto no qual fazia a per­gunta essen­cial no seu título: “Quem her­dará os mor­tos da pandemia?”.

Nos últi­mos dias o país foi tomado por uma imensa polêmica envol­vendo uma fala do min­istro Gilmar Mendes, do Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF, que crit­i­cava a con­dução do gov­erno no con­t­role da pan­demia e dizia, entre out­ras coisas, que as Forças Armadas estariam se asso­ciando a um genocí­dio.

Foi o que bas­tou para o “mundo” vir abaixo.

Os coman­dantes das Forças Armadas, através do Min­istério da Defesa, emi­ti­ram notas de protestos, mil­itares far­da­dos e de pija­mas deram declar­ações de repú­dio, e, até entraram com uma rep­re­sen­tação con­tra min­istro na Procuradoria-​Geral da República, para que esta ado­tasse as medi­das “necessárias” con­tra o min­istro por suas colo­cações que, suposta­mente, feririam a Lei de Segu­rança Nacional, a famosa e temida LSN.

O próprio min­istro, diante da reper­cussão da fala, veio com expli­cações, fazendo uma espé­cie de “mea culpa”, dizendo que, emb­ora tenha fal­ado através da rede mundial de com­puta­dores – uma live –, suas colo­cações se diri­giam ao ambi­ente acadêmico e, pelo con­trário, tin­ham a intenção de preser­vação das Forças Armadas, exces­si­va­mente envolvi­das com o gov­erno do sen­hor Bolsonaro.

Desde que resolvi escr­ever min­has impressões sobre os fatos que vive­mos – e, ape­sar de recente já são quase mil tex­tos –, sem­pre tive um posi­ciona­mento crítico a respeito dos min­istros falas­trões da nossa Corte Suprema.

Acho que não com­porta a jul­gadores – ainda que em pre­juízo do livre exer­cí­cio da cidada­nia –, emi­tirem opiniões fora dos autos que jul­gam. É o ônus que têm de pagar pela escolha profis­sional que fiz­eram.

O posi­ciona­mento público ou político tem a única ser­ven­tia de enfraque­cer as insti­tu­ições que par­tic­i­pam e a própria democracia.

Dito isso, reafirmo a posição – sem­pre exter­nada –, de con­trariedade à fala do min­istro e de qual­quer outro jul­gador que se achar no dire­ito de dar “pitaco” em tudo que acon­tece no país, inclu­sive, sobre os assun­tos que, ao menos em tese, poderá julgar.

Entre­tanto, devo deixar claro, tam­bém, que a crítica que faço à fala do min­istro – e não a fiz antes por estar pre­ocu­pado com a saúde de um dos meus irmãos que esteve inter­nado em unidade de ter­apia inten­siva por conta da covid-​19 –, faço pela pes­soa que se man­i­festou, não pelo conteúdo.

Não fosse o autor das colo­cações, um min­istro da Suprema Corte, não teria prob­lema ou dúvida alguma em subscrevê-​las.

Exceto por uma ou outra ressalva, os ques­tion­a­men­tos estão per­feitos e dev­e­riam, ao invés de atrair críti­cas, atrair a reflexão do gov­erno fed­eral e das próprias Forças Armadas.

O que está ocor­rendo no Brasil, no que se ref­ere ao com­bate à pan­demia do novo coro­n­avírus é algo gravís­simo. Nunca na história do país – pelo menos na história recente –, nos deparamos com uma tragé­dia de tamanha mag­ni­tude.

Enquanto escrevo este texto, nesta tarde de domingo, o número de óbitos por conta da pan­demia se aprox­ima – se é que já não ultra­pas­sou –, a casa dos oitenta mil mor­tos, sem que o gov­erno do sen­hor Bol­sonaro tenha uma posição clara e cien­tifi­ca­mente aceita de como deve se com­bater esse vírus mortal.

Difi­cil­mente, para nossa tris­teza, até o final desta tragé­dia, alguma família brasileira escape do sofri­mento cau­sado pela dor da perda de um ente ou um amigo, sem que o gov­erno demon­stre qual­quer sol­i­dariedade, empa­tia ou faça o seu papel de bus­car a mel­hor alter­na­tiva visando sal­var o maior número pos­sível de pes­soas.

Em sen­tido inverso, temos é o gov­er­nante, dia após dia, se envol­vendo em polêmi­cas empíri­cas e/​ou teses exdrúx­u­las que em nada tem aju­dado no com­bate à pan­demia.

Outro erro grave é que esta­mos há mais de sessenta dias sem um min­istro tit­u­lar na pasta da saúde, alguém respeitado pela comu­nidade cien­tí­fica nacional e inter­na­cional, com con­hec­i­mento do assunto ou que, pelo menos, não seja ques­tion­ado pelo descon­hec­i­mento do tema.

A situ­ação torna-​se ainda mais grave – infini­ta­mente mais grave –, quando ao invés de cien­tis­tas, temos o Min­istério da Saúde “tomado” por mil­itares, tanto da reserva quanto da ativa.

Noutras palavras, o min­istro Gilmar Mendes acerta quando pon­tua que esta inde­v­ida “usurpação” por parte dos mil­itares de um min­istério civil e que, por sua natureza, dev­e­ria ser con­duzido por cien­tis­tas, ainda mais durante uma pan­demia, coloca as Forças Armadas como par­ticipes de um genocí­dio.

O alvoroço na caserna, a sus­ci­tar tan­tos protestos, foi cau­sado prin­ci­pal­mente pelo termo genocí­dio uti­lizado pelo min­istro falas­trão.

Com relação a isso (ao termo genocí­dio uti­lizado), menos do que crítica, dev­e­ria ser motivo de agradec­i­mento e de uma reflexão visando uma mudança de rumos no com­bate à pan­demia.

Ora, se o gov­erno fed­eral, ainda que através de nar­ra­ti­vas mais diver­sas, possa com­par­til­har a culpa pela imen­sidão de mor­tos cau­sada pela pan­demia, com gov­er­nadores e prefeitos, o mesmo mesmo não poderá fazê-​lo naquilo que é sua respon­s­abil­i­dade exclu­siva, que é a pro­teção dos povos indí­ge­nas.

Em relação a estes povos, é o gov­erno fed­eral, através de suas fun­dações e órgãos, o respon­sável exclu­sivo, e sabe­mos que ele não tem se desin­cumbido desta mis­são, seja por não impedir a invasão das reser­vas e aldeias por garimpeiros e out­ros explo­radores das flo­restas, provo­cando a con­t­a­m­i­nação daque­las comu­nidades, seja por não dis­pen­sar um trata­mento médico ade­quado aos indí­ge­nas que estão ou pos­sam vir a ser infec­ta­dos pelo vírus.

Con­siderando que muitos destes povos já estão restri­tos a um número reduzi­dos de mem­bros, caso ven­ham a pere­cer toda uma etnia estare­mos, sim, diante de um genocí­dio.

Vamos torcer para que isso não acon­teça, mas as políti­cas gov­er­na­men­tais, tendo à frente o Min­istério da Saúde – e o mundo inteiro está assistindo –, con­duz para que o pior acon­teça.

Quando tudo isso pas­sar, caso o pior acon­teça, o com­por­ta­mento de cada gov­erno será avali­ado, e caso, infe­liz­mente, seja com­pro­vado o genocí­dio de povos indí­ge­nas, o gov­erno brasileiro e seus agentes fatal­mente dev­erão respon­der per­ante as Cortes Penais Inter­na­cionais –, isso, se não respon­derem, tam­bém, per­ante a Justiça brasileira.

A forma de com­bater a pan­demia foi – e está sendo –, uma posição política de cada gov­erno.

Quem agiu certo e no tempo ade­quado, colhe os mel­hores resul­ta­dos. Os que, pelo con­trário, se deixaram cegar pelos seus próprios con­ceitos, amargam os piores resul­ta­dos e algum dia serão chama­dos para rece­ber a suas her­anças.

As Forças Armadas do Brasil, que têm um papel bem definido na Con­sti­tu­ição Fed­eral, ao aceitarem sair da sua mis­são para exercerem car­gos – muitos ainda na ativa –, em um gov­erno civil, absur­da­mente ide­ol­o­gizado, dev­e­ria saber o risco que cor­re­ria – e que está cor­rendo, inclu­sive, o de perder o prestí­gio que tanto se esforçou para con­quis­tar nas últi­mas décadas.

Os mais jovens talvez não lem­brem, mas, quando a pop­u­lação com­preen­deu que o movi­mento de 1964 implan­tara uma ditadura no país, de lá até 1985, ou seja, por vinte e um anos, as Forças Armadas pas­saram a ser vis­tas como as Forças Armadas da ditadura. Com o retorno do poder aos civis a par­tir de 1985, pas­saram a ser vis­tas com descon­fi­ança pela pop­u­lação, tanto assim que temiam alguma espé­cie de revan­chismo por parte dos gov­er­nos civis.

Os anos do pós ditadura têm sido para as Forças Armadas se recom­porem com a sociedade brasileira.

Somente em tem­pos recentes pas­saram a ser vis­tas como essen­ci­ais ao país e a con­quis­tar a sim­pa­tia da pop­u­lação e é isso que se arriscam a perder.

As diver­sas ten­ta­ti­vas do atual gestão – calçado na tol­erân­cia obse­quiosa de alguns mil­itares e no saudo­sismo de alguns gen­erais de pijama –, de “mil­i­ta­rizar” o gov­erno ou de se sus­ten­tar usando as Forças Armadas, tem o efeito deletério de dividir a nação e devolver àquela insti­tu­ição todo o desprestí­gio e descon­fi­ança dos anos de ditadura e das primeiras décadas pós o régime de exceção.

As Forças Armadas não pre­cisam ficar alvoroçadas com as colo­cações “inde­v­i­das” do min­istro Gilmar Mendes, pre­cisam, sim, com­preen­derem o seu papel con­sti­tu­cional numa sociedade democrática, mantendo-​se equidis­tantes de con­tendas políti­cas ou de par­tic­i­pação de estraté­gias toscas de gov­erno, sob pena de perderem não ape­nas o respeito den­tro da nação, mas, tam­bém, no âmbito inter­na­cional, e, inclu­sive, respon­derem per­ante as cortes inter­na­cionais na even­tu­al­i­dade de se com­pro­var genocí­dio con­tra os povos indí­ge­nas do Brasil.

Devem refle­tir sobre isso e enten­derem que fiz­eram e fazem muito mal a si mes­mas e à nação, deixarem uma posição de Estado para se posi­cionarem politi­ca­mente a favor de uma facção política.

Demor­aram muito para con­quis­tar um respeito que têm colo­cado em risco ao longo do último ano e meio. Não tar­darão a ouvir o velho bor­dão do tempo da ditadura: mil­itares, de volta aos quar­téis!

Abdon Mar­inho é advo­gado.