E ASSIM, AVACALHAM O BRASIL.
O livreiro, conhecido de longas datas, passou no escritório na intenção de vender-me uns livros. No meio da conversa diz: – Dr., avacalharam o Brasil. Não lembro de ter visto, em toda minha vida, um clima de desmoralização maior que esse que estamos vivendo. Acho que no resto do mundo as pessoas devem pensar que somos uma piada. O senhor viu essa do juiz passear no carro do Eike Batista? Como é que pode isso, doutor?
Entre tantas notícias ruins nos últimos dias – dólar nas alturas, mais um rebaixamento da Petrobras, os bandidos vestidos de mocinhos chamando para briga –, a cena mais enigmática, foi, sem dúvidas, a do juiz dirigindo o veículo que mandara apreender do empresário Eike Batista. A cena representou, com louvor, a crise ética pela qual passa o país. Nenhuma desculpa, por mais verossímil que seja, será capaz de desfazer a imagem do absurdo e amainar a mancha que ficou no Poder Judiciário. O magistrado pilotando o veículo sintetizou no imaginário popular a famosa frase “batom na cueca”, para a qual não há desculpa plausível. Sobre ela, aliás, tenho um amigo, que meu costuma dizer: – Abdon, fora batom na cueca, o resto eu justifico tudo. O batom na cueca é aquilo para qual não temos desculpas. O juiz no veículo do réu, o piano na casa do amigo, é o batom na cueca do judiciário. Ou, como costumo dizer, a piada pronta.
Embora “avacalhado» o Brasil, tem uma vantagem: somos capazes de rimos e fazer humor com nossas próprias desgraças. E, enquanto todos estávamos, ainda, incrédulos com a ousadia do magistrado (eu, no primeiro momento, cheguei a pensar que fosse mentira, alguma armação da defesa do réu), os humoristas se fartavam em produzir charges e piadas sobre o fato. Apareceu de tudo: charge do juiz dirigindo o carro e dizendo que estava conduzindo os “autos do processo”, o juiz vestido com roupas íntimas da ex-esposa do réu e até mesmo usando uma coleira com o nome do empresário, que quando usada pela atriz Luma de Oliveira (a ex-esposa), num dos carnavais da vida, acredito que há quase vinte anos, gerou uma polêmica sem fim na mídia e nos seguimentos feministas.
O gesto do juiz, impensado, tolo, infantil ou do que quer que queiram chamar, até fez alguns pensarem que o cidadão Eike Batista é uma inocente vítima da situação, um pobre coitado, o que não é verdade. Ao longo dos anos esse cidadão vendeu ilusões e destruiu o patrimônio de muitas pessoas. Na eminência de quebrar passou a se desfazer dos bens, sendo público e notório que fez doação de gordas fatias do patrimônio aos filhos e, segundo dizem, a outras pessoas do seu círculo íntimo. Está, portanto, muito longe de ser inocente de alguma coisa, na verdade, muito se aproxima de um espertalhão, que com empréstimos generosos de bancos públicos, informações privilegiadas dos corruptos que lhe davam guarida e sem qualquer escrúpulo, fez fortuna e enganou a todos, com a falsa ideia de que era um gênio dos negócios.
A trapalhada do juiz não retira dele a condição processual em que se colocou, devendo o Poder Judiciário, ficar atento para não servir de inocente útil ao empresário e sua defesa, perdendo de vista tudo que cometeu em sua meteórica e curta carreira nos negócios. Os prejuízos causados, têm as autoridades, o dever de buscar a reparação, já que não tiveram ou foram omissos no dever de vigilância. Não é porque um juiz não resistiu à tentação da ostentação, que devem ser esquecidos, os supostos crimes ou fraudes. Vou além, a corregedoria que afastou o juiz do caso, antes de anular todos os atos praticados pelo magistrado trapalhão, deveria era nomear um ou dois juízes para examinar os os mesmos, e só aí, anular, os que porventura, estejam eivados de vícios, convalidando os que estiverem corretos e motivados.
Entendo que é o interesse da sociedade, da economia popular que devam ser preservados. Não é possível que se jogue fora tudo que foi feito até aqui, seja a investigação, seja o processo em si. Alguém se dá conta de quanto custa movimentar a máquina pública para investigar e processar alguém? Claro que não. Tudo é lançado nos ombros do infeliz contribuinte.
Diante de fatos com o protagonizado por este juiz, meu pai, com sua sabedoria de analfabeto diria: – é um povo que não se dar o respeito, meu filho. É verdade, trata-se de um povo que não possui mais o respeito próprio, que não respeita os demais colegas (quantos justos não pagarão pela vaidade deste juiz?), ou a instituição que serve e que a todos deveria impor respeito.
Entretanto, também estas instituições não são vítimas. São anos e anos fazendo vistas grossas, fazendo imperar o corporativismo, acobertando os “malfeitos”, os vícios. Por conta disso, país inteiro está assim, neste clima de avacalhação, nesta desordem permanente.
No carnaval, num raro momento em que vi as notícia li sobre um entrevero de juiz estadual maranhense com um oficial da PMMA. A notícia bizarra dava conta que o oficial com o dedo em riste para o magistrado o “mandava” retirar dois trios-elétricos que colocara para tocar numa cidade do interior.
Não acreditei na noticia logo que vi. Juro. Pensei que fosse erro ou se tratava de árbitro de futebol. Lembro que li a manchete e pensei: que p… é essa?
Primeiro: desde quando juiz de direito é promoter de eventos? Qual a razão para está provendo bailes carnavalescos?
Segundo: o oficial da polícia militar estava em serviço? cumprindo ordens de qual autoridade? Estava impondo sua autoridade pela força bruta ou das armas?
Pelo li e pude concluir, tudo estava errado neste fato. Tudo fora de ordem. Ainda assim, não tomei conhecimento de nenhum esclarecimento das corregedorias. Seja do TJMA, seja da PMMA ou da Secretaria de Segurança. Todo mundo silenciou como o fato não tivesse existido. Como se condutas assim não não comprometessem o bom nome das instituições, como se os membros estivessem, nos momentos de folgas, livres para fazer o que lhes viesse a cabeça.
Ninguém, nem as associações de classe, apareceram para se manifestar sobre o fato. Nem para dizer que esse ou aquele estava certo ou errado. O que seria difícil, pois razão, a qualquer dos lados passou foi longe.
A imensa capacidade de produzir escândalos não fica apenas neste tipo de coisa. Outro dia li, num jornal de grande circulação, que em determinadas causas judiciais existem verdadeiros leilões, passando a ter razão que oferecer a melhor proposta aos mercadores de decisões. A notícia dada, até citando caso concreto, não sofreu qualquer embargo ou questionamento. Ficou o dito pelo não dito.
Como ninguém diz nada. Impera o mutismo é como se estivessem livres para continuar e a perpetuar os erros. Uma licença para continuarem a avacalhar o país. Mais ainda.
Abdon Marinho é advogado.
(A ilustração foi colhida da internet).
E ASSIM, AVACALHAM O BRASIL.
Escrito por Webmaster
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