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O ERRO DE PEN­SAR QUE O BRASIL É O MARANHÃO.

Escrito por Abdon Mar­inho

O ERRO DE PEN­SAR QUE O BRASIL É O MARAN­HÃO.
Por Abdon Mar­inho.
O TÍTULO, uma clara rem­i­nis­cên­cia a famosa matéria que atestou o naufrá­gio da can­di­datura de Roseana Sar­ney à presidên­cia da república no iní­cio dos anos dois mil, desta vez, parece-​me muito mais apro­pri­ado que seja usado em refer­ên­cia ao atual inquilino dos Leões.
O atual gov­er­nador tem cometido o erro de pen­sar o Brasil a par­tir do que ocorre no Maran­hão e colhe nesta reta final de ano uma inigualável saraivada de críti­cas por isso de parte da imprensa nacional.
Pou­cas vezes, aliás, a chamada grande mídia pegou tão “pesado” com uma autori­dade quanto pegou com o sen­hor Dino por conta da entre­vista con­ce­dida à Folha de São Paulo.
Mas, registre-​se, a culpa por isso é mais do gov­er­nador (e seus asses­sores) que da imprensa. Esta, a imprensa, está fazendo o seu papel de ques­tionar o posi­ciona­mento das autori­dades em relação aos temas pos­tos.
Ocorre que as autori­dades maran­henses – e isso já acon­te­cia no gov­erno Roseana Sar­ney – não estão habit­u­a­dos a serem ques­tion­a­dos por ninguém. Lem­bro que a ex-​governadora con­vo­cava cole­ti­vas onde os jor­nal­is­tas (só os “dela”) sequer per­gun­tavam algo, só ouviam. Uma ino­vação: “cole­tiva” onde só a entre­vis­tada falava.
Com o atual gov­er­nador, as cole­ti­vas (tam­bém para os seus) não mudaram muito, ainda que haja algu­mas per­gun­tas, estas são cer­cadas de cer­tos pudores, quase pedindo des­cul­pas por per­gun­tar.
Não se tem notí­cia de ninguém ques­tio­nando sobre as incon­sistên­cias ide­ológ­i­cas ou temas igual­mente espin­hosos, como as oper­ações na saúde, aluguéis cama­radas, obras exe­cu­tadas por empre­sas lig­adas a agio­tas. Nem para que o gov­er­nador tenha a opor­tu­nidade de negar, lhe são feitos os ques­tion­a­men­tos.
Este é o cam­inho do desas­tre. Para o jor­nal­ismo e para as autori­dades.
As críti­cas sofridas pelo gov­er­nador do Maran­hão por conta da entre­vista à Folha é o retrato disso: os jor­nal­is­tas que a comen­taram, prin­ci­pal­mente, na rádio Jovem Pan, só explo­raram algu­mas con­tradições do que disse o entre­vis­tado, e nem foram muito longe.
Fiz­eram o pre­visto. Lem­bro que bem antes da can­di­datura do sen­hor Dino ao gov­erno do estado, em 2014, o aler­tava para os diss­a­bores que teria de enfrentar por ser fil­i­ado ao Par­tido Comu­nista do Brasil — PCdoB, um par­tido que, den­tre out­ros exo­tismos, defende as ditaduras norte-​coreana, cubana e a venezue­lana, como mod­e­los de sociedade, inclu­sive com doc­u­men­tos ofi­ci­ais sobre o tema.
Este embaraço ide­ológico e as próprias con­tradições de se dizer comu­nista pas­sou ao largo das dis­cussões políti­cas no ano eleitoral.
O despreparo dos adver­sários e mesmo o cansaço com o longevo sane­y­sismo deu-​lhe a vitória. O poder, fez com que pas­sasse até aqui dizendo e fazendo todo tido de insanidade político-​ideológicas, sem sus­ci­tar ques­tion­a­men­tos de ninguém.
Este foi o erro. Pelo que soube o gov­er­nador ini­ciou a entre­vista da Folha afir­mando “ser comu­nista graças a Deus”.
A frase, em si, já é de uma tolice sem tamanho.
A dout­rina comu­nista é essen­cial­mente mate­ri­al­ista, incom­patível com os dog­mas fé reli­giosa. Aliás, todos sabem, o comu­nismo com­pete com a fé ou a aniquila pelo fer­vor e favores do povo.
A questão se agrava na even­tu­al­i­dade do gov­er­nador ser um cristão católico. Por alto, acred­ito que exis­tam mais dez Encícli­cas papais afir­mando – e reafir­mando – a incom­pat­i­bil­i­dade do comu­nismo com a fé católica e mesmo com o cris­tian­ismo.
Assim, se o gov­er­nador se diz católico (ou mesmo cristão) não pode, a menos que esteja “enganando” a igreja dizer-​se comu­nista. E vice-​versa.
Doutri­nar­i­a­mente, ou é uma coisa ou outra.
Essa ideia de comu­nismo cristão é alguma invenção de quem não tem o que fazer ou de quem descon­hece a história. Pois a incom­pat­i­bil­i­dade é tam­bém histórica.
A ascen­são dos regimes comu­nistas no mundo, perseguiu, como pouco se viu, as igre­jas cristãs (e todo tipo de igreja). Em muitos países os tem­p­los reli­giosos foram pos­tos abaixo, por ordem de seus líderes, e o patrimônio das igre­jas expro­pri­a­dos. Não pouparam nem pré­dios de valor histórico e arquitetônico extra­ordinário, no afã de apa­gar a fé da memória do povo.
Na antiga União Soviética, isso se deu por ordem direta de Lenin e Stálin.
Ainda hoje, no que restou de comu­nismo no mundo, a religião é restringida (ou proibida). Os casos de prisões e bani­men­tos pelo fato das pes­soa pro­fes­sarem uma fé ou, sim­ples­mente, pos­suírem uma bíblia são cor­rentes.
Uma pes­soa dizer que defende um régime, como o norte-​coreano, e dizer-​se cristão não faz sen­tido pois são situ­ações inc­on­cil­iáveis.
Mais. Depreende-​se da entre­vista a FSP a infor­mação de que o gov­er­nador man­tém no seu gabi­nete ima­gens de diver­sos san­tos. Antes ape­nas São Fran­cisco orna­men­tava o gabi­nete, agora são diver­sos.
Pois bem, esse apreço por ima­gens de san­tos – e digo isso com a sin­ceri­dade de quem tem enorme admi­ração pela arte sacra –, é incom­patível com a cena que vi (e não acred­itei) do gov­er­nador (que estava junto com o prefeito da cap­i­tal), prostrado, sob chuva tor­ren­cial durante um culto evangélico.
Veja, qual­quer um pode pro­fes­sar a fé que queira e da forma que quiser, mas não faz sen­tido – e isso não tem nada a ver com desprestí­gio à fé de ninguém –, você prostrar-​se diante de um pas­tor se você não é evangélico, se você não respeita na essên­cia aquilo que aquela fé defende, sem lhe respeitar os dog­mas.
Um dos princí­pios do protes­tantismo é a não idol­a­tria.
Já vimos até pas­tores evangéli­cos destru­indo ima­gens de sacras. E, para nossa tris­teza, mesmo cidadãos comuns, por conta destes dog­mas – e tam­bém insanidade –, van­dalizarem igre­jas católi­cas.
Assim, não faz nen­hum sen­tido, você prostrar-​se como o mais fiel dos devo­tos diante de um pas­tor (e o que me chamou a atenção: sob chuva tor­ren­cial) e man­ter uma san­taria em casa ou no tra­balho como forma de pro­teção.
Quem está enganando quem?
Além dIsso tudo ser incom­patível entre si, o é com a dout­rina comu­nista. Pois esta é, repito, essen­cial­mente, mate­ri­al­ista, anti-​religiosa e anti­cler­i­cal.
Não sou eu que digo isso, é a história, são os exem­p­los do dia a dia.
Do mesmo modo, chega às raias da bizarrice o fato de muitos, no Maran­hão e no Brasil, se diz­erem comu­nistas e pos­suírem ver­dadeira ado­ração pelo din­heiro, pelo luxo, pela osten­tação.
E aqui é o que mais tem.
O cidadão se diz comu­nista e mora nos mais exclu­sivos endereços da cap­i­tal, pos­sui os mais valiosos aparta­men­tos ou man­sões, car­rões impor­ta­dos e muito din­heiro nas con­tas bancárias.
E nem se fale da forma pouco repub­li­cana como tais patrimônios foram obti­dos.
Con­forme alertei, desde sem­pre, estas con­tradições, emb­ora todos fin­jam não ver por aqui – e talvez não vejam mesmo, pois não sabem o que é uma coisa ou outra ou ainda por acharem que tudo que sai da boca do rei é ver­dadeiro e dog­mático –, mais cedo ou mais tarde, cer­ta­mente, não pas­saria des­perce­bida no restante do país.
Foi o que se deu quando o sen­hor Dino, pen­sando falar para o público interno – parte dele com­posto por sub­or­di­na­dos –, começou a falar sandices para a imprensa nacional.
O Brasil pos­sui bons jor­nal­is­tas, capazes de enten­der o que está dito e o que ficou oculto nas palavras, como a inter­pre­tação que deram à defesa que faz de Lula e o temor de Bol­sonaro.
Inter­pre­taram que o gov­er­nador maran­hense pos­sui pouco ou nen­hum apreço pela democ­ra­cia –emb­ora fale tanto em povo –, pois no mesmo pará­grafo em que defende a can­di­datura de um con­de­nado pela Justiça – chegando a insul­tar as decisões do Poder Judi­ciário –, rev­ela que, se pudesse, impediria a can­di­datura do seu prin­ci­pal opo­nente, quando esta decisão – certa ou errada –, per­tence ao povo.
A esta imprensa restou claro, em um ou dois pará­grafos, que o gov­er­nador dos maran­henses tem um pendão pelo autori­tarismo bem semel­hante do posto em prática pelas ditaduras comu­nistas, das quais quer­e­mos dis­tân­cia e das quais não sen­ti­mos saudades.
As con­tradições em si, com a história, com os princí­pios jurídi­cos ou democráti­cos, fiz­eram da entre­vista de estreia do gov­er­nador na mídia nacional foi algo próx­imo do desas­tre.
E olhem que foi só a “inter­pre­tação da entre­vista”. Pode­ria ser bem pior, se fosse sub­metido a uma cole­tiva onde ques­tionassem estes e out­ros por­menores.
Cer­ta­mente iriam pen­sar que somos gov­er­na­dos por alguém que pos­sui a con­sistên­cia ide­ológ­ica de um cole­gial do século pas­sado.
Espera-​se que aprenda com a entre­vista e que, antes de uma nova incursão no cenário nacional, enfrente estas e tan­tas out­ras con­tradições.
O Brasil não é o Maran­hão.
Abdon Mar­inho é advogado.

A BUSCA PELA IMPUNIDADE.

Escrito por Abdon Mar­inho

A BUSCA PELA IMPUNIDADE.
QUANDO menino, lá no sertão, ouvia dizer que nos “fins dos tem­pos” iriam acon­te­cer coisas estra­nhas, difer­entes. Na minha inocên­cia ficava atento a tudo para saber se o fim estava próx­imo. Um formigueiro fora de tempo ou de lugar, um pás­saro can­tando fora de hora era motivos para pre­ocu­pações.
O tempo pas­sou e o mundo não acabou. Não como temia.
Por estes dias voltou-​me as pre­ocu­pações com o fim dos tem­pos. Sinais claro começam a se avis­tar.
Outro dia mesmo vi diver­sos int­elec­tu­ais, advo­ga­dos e mes­mos autori­dades con­sti­tuí­das recla­mando da «celeri­dade da Justiça».
Vejam que este é um fato extra­ordinário, inusi­tado. Mil­i­tando há anos nesta seara, o que sem­pre ouvi foram recla­mações sobre a lentidão da Justiça pátria. E, não vem de hoje. O saudoso Rui Bar­bosa já nos idos do Império e princí­pio da República dizia que a justiça tar­dia não era senão a injustiça man­i­festa.
O fato inédito é por conta da mar­cação do jul­ga­mento, em segunda instân­cia do ex-​presidente, Lula.
O alar­ido, por conta disso, foi tamanho que ense­jou ao pres­i­dente do TRF recla­mado por sua «celeri­dade” a se man­i­fes­tar asseverando que os pra­zos estavam den­tro da nor­mal­i­dade e que proces­sos daquela natureza cor­rem, pelo menos a grande maio­ria, neste espaço de tempo.
Tem­pos estran­hos em que mesmo autori­dades, recla­mam, pub­li­ca­mente, e sem con­strang­i­men­tos, do alcance da Justiça.
Na ver­dade as elites, os deten­tores dos foros por pre­rrog­a­ti­vas de função, nunca tiveram qual­quer inter­esse em jul­ga­men­tos jus­tos, na ver­dade sem­pre bus­caram a pre­rrog­a­tiva de ficarem acima da lei.
Os «grandes” acham que as leis não servem para eles.
Isso foi o que disse o então pres­i­dente Lula quanto um dileto amigo foi apan­hado em «malfeitos»: “o Sar­ney não é uma pes­soa comum”.
Agora, com o jul­ga­mento do Lula mar­cado, ten­tam pas­sar a mesma ideia: que a Justiça está perseguindo o Lula; que ele não pode ser jul­gado; que a justiça está “célere” por que quer afas­tar o Lula da dis­puta pres­i­den­cial.
Criam cam­pan­has inter­na­cionais para difamarem a Justiça brasileira.
Em meus vagares indago: que inocente foge ao jul­ga­mento da Justiça do seu país como o diabo foge da cruz?
O sen­hor Lula foi inves­ti­gado pela Polí­cia Fed­eral, denun­ci­ado pelo Min­istério Público Fed­eral, jul­gado e con­de­nado por um juiz fed­eral. Claro que todos estes agentes podem ter errado e cometido uma injustiça con­tra o con­de­nado.
Por conta dos erros a que estão sucetíveis os humanos, temos no nosso orde­na­mento out­ras instân­cias judi­ci­ais, para reverem e, quando for o caso, cor­ri­girem as injustiças, por­ven­tura, exis­tentes.
Não vivêsse­mos tem­pos estran­hos o sen­hor Lula, seus defen­sores, ado­radores e sabu­jos, tão logo saiu a sen­tença do juízo de primeiro grau, teriam cor­rido para bater as por­tas do tri­bunal com­pe­tente pedindo celeri­dade na avali­ação do seu caso pela instân­cia supe­rior.
Incon­for­mado pela injustiça bus­caria com fer­vor que o tri­bunal ates­tasse sua inocên­cia.
Não vimos nada disso. Querem jus­ta­mente o oposto.
Cer­tos dos crimes cometi­dos, bus­cam levar o jul­ga­mento para as cal­en­das. Na instân­cia ini­cial cri­aram todo tipo de embaraço ao anda­mento do processo; jul­gado foram atrás de todo os tipos e recur­sos e, agora, na eminên­cia de terem o processo exam­i­nado, não por ape­nas um, mas por três desem­bar­gadores, ao invés de fes­te­jar a pos­si­bil­i­dade de com­pro­var sua inocên­cia, acusam a justiça de «célere».
E, pela movi­men­tação de basti­dores, pare­cem que não ficarão ape­nas na recla­mação desaver­gonhada.
Preparam, com ajuda de autori­dades, movi­men­tos soci­ais, sindi­catos e out­ros que os val­ham, estron­dosa man­i­fes­tação, em Porto Ale­gre, Rio Grande do Sul, con­tra a Justiça. Trata-​se, como se vivêsse­mos numa republi­queta de bananas, de uma clara ten­ta­tiva de intim­i­dar a Justiça, um ato claro de sedição a aten­tar con­tra a democ­ra­cia brasileira.
Qual a leitura que, sen­sa­ta­mente, podemos fazer destes acon­tec­i­men­tos?
Ao que parece, já trazem con­sigo a certeza de que as provas são con­tun­dentes e que o TRF não terá como refor­mar sen­tença para inocen­tar o con­de­nado.
Se assim não fosse qual o sen­tido de se con­stranger um tri­bunal como se quisesse que tome uma decisão com base na pressão pop­u­lar e não nas provas?
Aliás, o ato de con­strang­i­mento explíc­ito, de pressão, até enfraquece uma pos­sível decisão que favoreça o ex-​presidente.
Caso deci­dam por sua inocên­cia quem irá acred­i­tar que foi com base nas provas e não na pressão das ruas?
Noutra quadra acred­i­tam que a Justiça brasileira, em pleno século XXI, se sujeita a rece­ber pressões da turba?
Se for assim, sig­nifica dizer que não merece qual­quer respeito por parte dos juris­di­ciona­dos.
Ora, não temos como olvi­dar aquilo que ver­dadeira­mente querem os donos do poder e seus sabu­jos, sejam eles int­elec­tu­ais, artis­tas, mil­i­tantes ou sim­ples­mente adu­ladores: querem a Impunidade para si e para os seus. Ape­nas isso. Querem ficar fora do alcance da lei.
Os poderosos cumprem o hor­ro­roso rit­ual de se pro­te­gerem. São atra­pal­hos às inves­ti­gações, ao anda­mento dos proces­sos, são os gen­erosos indul­tos.
Lá atrás Lula e Dilma fiz­eram isso, Temer faz o mesmo.
Todos têm medo da Justiça e por isso querem uma só para eles.
Se a Justiça não alcança a todos, indis­tin­ta­mente, para que serve?
Abdon Mar­inho é advogado.

DOIS IDOSOS, DUAS JUSTIÇAS.

Escrito por Abdon Mar­inho

DOIS IDOSOS, DUAS JUSTIÇAS.
QUIS o capri­choso des­tino que, quase simul­tane­a­mente, tivésse­mos o des­fe­cho de dois casos emblemáti­cos um no Brasil e outro nos Esta­dos Unidos, ambos envol­vendo brasileiros anciãos.
No primeiro caso o min­istro Edson Fachin deter­mi­nou o cumpri­mento da pena a que fora con­de­nado o dep­utado fed­eral Paulo Maluf.
No segundo caso a juíza fed­eral amer­i­cana, Pamela Chen, man­dou para a cadeia o car­tola, ex-​presidente da Con­fed­er­ação Brasileira de Fute­bol — CBF, José Maria Marin.
Em comum, o fato de serem idosos, ambos com cerca de 86 anos, e estarem envolvi­dos com escân­da­los de cor­rupção desde muito tempo.
O fato de ambos terem sido pre­sos com difer­ença de pou­cas horas nos pos­si­bilita traçar um para­lelo sobre a situ­ação deles.
O dep­utado Maluf é, talvez, o mais notório cor­rupto brasileiro, desde os tem­pos da ditadura já se ouvia falar dos “malfeitos” por ele prat­i­ca­dos.
Em mea­dos dos anos oitenta, a fama já era tanta que seu nome virou verbo: o verbo “mal­u­far”, como sinôn­imo de cor­rupção e ban­dal­heira. A “gen­tileza” lhe foi con­ce­dida pelo desafeto, não menos notório em malfeitos, Antônio Car­los Mag­a­l­hães, que, enquanto vivo, foi uma espé­cie de vice-​rei da Bahia.
O dep­utado Maluf desde sem­pre – e já se vão mais cinquenta anos de uma car­reira repleta de estrip­u­lias –, investiu em grandes ban­cas de advo­ga­dos e assim tem driblado a Justiça brasileira, levando a maio­ria das imputações que sofreu à pre­scrição enquanto ia/​vai usufruindo o pro­duto do alcance, lépido e fagueiro.
Um breve con­tratempo com a Justiça francesa, no pas­sado, não foi motivo para corrigir-​lhe o caráter, logo estava na pátria-​mãe gen­til gozando das “imu­nidades” par­la­mentares enquanto dili­gentes e com­pe­tentes advo­ga­dos, usando de todos os artifí­cios da lei, o man­tinha a salvo do encon­tro com a prestação de con­tas com a Justiça.
Neste meio tempo, pelas redes soci­ais, ainda tirava sarro dos infortúnios de out­ros políti­cos pegos nos escân­da­los do men­salão, petrolão, e out­ros – o que não falta por aqui é escân­da­los com gente impor­tante envolvida.
Negar, negar e negar enquanto os advo­ga­dos “gan­havam” tempo sem foi uma espé­cie de mantra.
A certeza da impunidade o fez mais afoito. A ponto de sug­erir que os seus deli­tos fos­sem jul­g­amos por tri­bunais de peque­nas causas, tendo em vista que o alcance dos out­ros seriam infini­ta­mente maiores que os seus.
A demora gera a audá­cia.
Mesmo o processo que o levou à Papuda (não se sabe por quanto tempo) se arrasta há mais de 20 anos pelos escan­in­hos dos tri­bunais nacionais. E, sua prisão, depois de tan­tos anos e estrip­u­lias, é vista como algo extra­ordinário, algo fol­clórico.
Isso, ape­sar dos males cau­sa­dos. Só neste processo (pelo que li, não sei se está certo) fala-​se em desvios da ordem de 800 mil­hões (de dólares) e cor­re­sponde ao período em que foi prefeito, entre 1993 e 1996.
O encar­ce­ra­mento, agora, depois de tanto tempo em que as pes­soas nem se lem­bram mais do que se trata, chega até a causar uma certa “piedade”, ainda mais com o “artista” fingindo-​se mais alque­brado do que ver­dadeira­mente estar.
O car­tola Marin é outro que desde sem­pre encontra-​se envolvido com a ban­dalha e enri­cou fazendo todo tipo de nego­ci­ata em torno da paixão nacional: o fute­bol.
Em todos estes anos nunca foi molestado pelas autori­dades brasileiras, ainda quando se sabia dos seus malfeitos.
Mesmo, agora, já con­de­nado pela Justiça amer­i­cana não se sabe de qual­quer pro­ced­i­mento nas ter­ras brasileiras con­tra ele e con­tra os demais car­to­las nacionais.
Por isso mesmo estão todos por aqui, livres, leves e soltos, o sen­hor Teix­eira, o sen­hor Del Nero e tan­tos out­ros, enfrentam o único incon­ve­niente de não poderem “pisar” fora do Brasil.
Pois bem, o sen­hor Marin caiu em des­graça em mea­dos de 2015, quando foi apan­hado por uma inves­ti­gação inter­na­cional enquanto des­fru­tava de todo con­forto que o din­heiro pode com­prar num hotel da Suíça e lev­ado aos Esta­dos Unidos.
Após a depor­tação e já em ter­ras amer­i­canas, foi lev­ado a pre­sença de uma Corte de Nova Iorque que arbi­trou uma gorda fiança para que pudesse respon­der ao processo em prisão domi­cil­iar. Tendo pago a fiança ficou num dos mel­hores endereços daquela cidade até a decisão da Justiça o que ocor­reu pouco mais de dois anos após a prisão.
O sen­hor Marin, entrou, na última sem­ana na Corte acom­pan­hado por seus advo­ga­dos, e estes saíram de lá soz­in­hos, prom­e­tendo recur­sos e ape­los, para, ao menos, poder con­tin­uar em prisão domi­cil­iar enquanto aguarda os recur­sos.
A decisão da juíza, que sequer esta­b­ele­ceu o tamanho da pena, mas que pode chegar a vinte anos, é para que comece o cumpri­mento da pena ime­di­ata­mente, numa prisão fed­eral, ainda que não se saiba nem o tamanho dela. Não lhe deu nem a chance de ir fazer mala, já saiu da Corte para a prisão.
Os cidadãos Paulo Maluf e José Marin, um em Brasília e outro em Nova Iorque, ambos con­de­na­dos, dormi­ram na prisão. Um depois de vinte anos “arra­s­tando” processo e após infini­tos recur­sos, jus­tos, injus­tos ou pro­te­latórios, o outro depois de pouco mais de dois anos, após o tri­bunal decidir pela sua cul­pa­bil­i­dade em seis das sete acusações que sofr­era, sem recur­sos, sem ape­los e mesmo sem pena definida.
Dois idosos, duas justiças, crimes diver­sos.
Qual Justiça estará certa?
Abdon Mar­inho é advogado.