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A BAR­BÁRIE, A IMPUNIDADE E O SUPREMO.

Escrito por Abdon Mar­inho

RECOR­DAR É VIVER:
SOBRE O CUMPRI­MENTO ANTE­CI­PADO DA PENA.
O BRASIL exper­i­menta dias de rad­i­cal­is­mos por conta da decisão rela­cionada ao Habeas Cor­pus do ex-​presidente Lula, con­de­nado em primeira e segunda instân­cia.
Naquela opor­tu­nidade escrevi o texto que segue abaixo:
A BAR­BÁRIE, A IMPUNIDADE E O SUPREMO*.
Por Abdon Mar­inho.
– Agora las­cou.
Com estas palavras, me alcança um amigo, na madru­gada seguinte à decisão do Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF, que deliberou, em um caso con­creto, sobre a pos­si­bil­i­dade do con­de­nado em primeira e segunda instân­cias da justiça, ini­ciar o cumpri­mento da pena, ainda que com recur­sos pen­dentes nos tri­bunais supe­ri­ores.
Na tarde do mesmo dia, enquanto aguar­dava o jul­ga­mento de um processo no Tri­bunal Regional Eleitoral — TRE/​MA, foi a vez de um jovem colega indagar-​me e cobrar que opinasse sobre o tema.
A decisão da Corte Suprema talvez tenha sido o ápice uma sem­ana excep­cional­mente per­tur­badora para mim e que me faz pen­sar sobre o quê aguarda a humanidade.
Duas notí­cias vin­das do inte­rior do Maran­hão – que ainda custo em acred­i­tar – remete-​nos a um mundo de bar­bárie que pen­sava não mais exi­s­tir ou que estivesse muito longe da nossa real­i­dade.
A primeira, de São Bernardo, municí­pio de menos de 30 mil habi­tantes, nos dando conta que “pop­u­lares» invadi­ram e seques­traram pre­sos acu­sa­dos do homicí­dio de um empresário, torturaram-​nos e os mataram. Os blogues do estado divul­garam as ima­gens do fato – que não tive cor­agem de assi­s­tir.
A segunda, vinda de Col­i­nas, cidade com pouco mais de 40 mil habi­tantes, narra que ladrões “estouraram” uma agên­cia bancária, uma refém foi vítima de “bala per­dida” ou exe­cu­tada. Quando os ban­di­dos fugi­ram do local deixando a vítima nas ime­di­ações de onde ocor­rera o delito «pop­u­lares» cor­reram para o banco para pegar e se apro­priar dos maços de din­heiro deix­a­dos pelos ban­di­dos. Mais que isso, algu­mas fontes nar­ram que fes­te­jaram a “sorte” que tiveram com a empre­itada.
Os dois episó­dios nada têm, em princí­pio, com a decisão tomada pelo STF, mas rev­ela aspec­tos inter­es­santes da sociedade em que vive­mos. No caso de São Bernardo, pop­u­lares, suposta­mente, incré­du­los com a ação do Estado em punir malfeitores a ponto de tor­tu­rarem e exe­cutarem aquele(s) que come­teram um crime hediondo. Fazendo isso pub­li­ca­mente, à luz do dia, alguns exibindo o rosto às claras e sem receio.
Já no episó­dio de Col­i­nas, tais pop­u­lares não demon­straram tanto pesar pelo perec­i­mento de uma vítima inocente da ação dos facíno­ras, pelo con­trário, acharam opor­tuno tirar uma van­tagem pes­soal de uma ação odi­enta, indifer­entes ao sofri­mento da vítima e de sua família se locu­ple­taram, tam­bém eles, do roubo.
Se chegarem aos autores dos fatos de São Bernardo, estes, con­fronta­dos com a Justiça decerto que dirão que agi­ram em nome da justiça, con­tra a impunidade, etc.
Já os de Col­i­nas dirão que foram capazes de roubar o banco igno­rando a vítima por que viram “out­ros” fazendo o mesmo.
Em ambos os episó­dios a questão de fundo é a impunidade. Uns dizendo que agem con­tra a impunidade e out­ros na certeza que aquilo que fiz­eram sairá impune.
Aqui, os três episó­dios con­fluem: os bár­baros acon­tec­i­men­tos do inte­rior da Maran­hão e a decisão do Supremo. Todos têm por móvel a impunidade.
Não é atoa que os veícu­los de comu­ni­cação trataram a decisão do STF como histórica no com­bate a impunidade, colo­cando na mesma matéria tanto as decisões dos min­istros quanto os casos sím­bo­los de impunidade no país.
O caso de Pimenta Neves que tendo matado a namorada, sendo ré con­fesso, exper­i­men­tou, tar­dia­mente poucos dias na cadeia.
O caso do ex-​senador Luís Estevão que tendo sido con­de­nado pelo roubo de mil­hões de uma obra em São Paulo per­manece solto de recurso em recurso.
O caso do juiz Nico­lau dos San­tos Neto; e tan­tos out­ros casos emblemáti­cos que fazem o cidadão comum crer que a Justiça trata de forma difer­ente uns e out­ros.
Reputo o com­bate à impunidade uma urgên­cia nacional tão impor­tante quanto o com­bate ao mos­quito Aedes Aegypti, mos­quito respon­sável pelas pre­ocu­pações de quase todos os brasileiros. Aliás, a infes­tação de mos­qui­tos se deve ao fato de muitos dos respon­sáveis pelos recur­sos públi­cos estar soltos.
A decisão do STF vai além de “pre­ocu­pante» con­forme manifestou-​se, tim­i­da­mente, a Ordem dos Advo­ga­dos do Brasil — OAB, ela avança sobre umas das garan­tias con­sti­tu­cionais mais caras inseri­das na Con­sti­tu­ição do país.
Está lá no artigo 5º, inciso LVII: ninguém será con­sid­er­ado cul­pado até o trân­sito em jul­gado da sen­tença penal con­de­natória.
Estou con­victo que a decisão, por maio­ria, do Supremo vem ao encon­tro do anseio da larga maio­ria do povo brasileiro que clama pelo fim da impunidade, sobre­tudo, daque­les que sem­pre se mostraram inat­ingíveis pela lei que dev­e­ria ser para todos e, longe, de mim, por outro lado defender a impunidade.
Ape­sar disso, entendo que há algu­mas questões que mere­cem ser respon­di­das:
A primeira delas é que ao Supremo não cabe ree­scr­ever a Con­sti­tu­ição. Por mais que lhe caiba fazer a inter­pre­tação da mesma, não lhe têm os min­istros, o poder de dizer que aquilo que está escrito pode ser inter­pelado de outra forma.
A segunda questão é que, emb­ora a intenção da maio­ria do Supremo seja boa, o com­bate à impunidade, como disse é uma urgên­cia, tenho dúvi­das se não estão come­tendo um mal maior.
Não há for­mas mais efi­cazes de se com­bater a impunidade? Não exis­tem mecan­is­mos que façam a Justiça fun­cionar com mais efi­ciên­cia e rapi­dez?
A sociedade não pode ser con­strangida à escolha de Sofia.
Em nome do fim da impunidade, abrir mão do prin­ci­pio con­sti­tu­cional da pre­sunção da inocên­cia.
O min­istro Celso de Mello, decano do STF, e um dos votos-​vencidos na matéria que dotou país de uma nova ori­en­tação, em entre­vista em rede nacional, trouxe uma questão que con­sidero gravís­sima. Ele, que com­põe aquele cole­giado desde 1989, asseverou que 25% (vinte e cinco por cento) das matérias crim­i­nais que chegam aquela Corte, através de recur­sos extra­ordinários são refor­madas.
O número é espan­toso. Poucos casos chegam ao Supremo, se destes 25% (vinte e cinco por cento) são refor­ma­dos, quan­tos não o são no Supe­rior Tri­bunal de Justiça — STJ, onde os recur­sos chegam com mais fre­qüên­cia e abundân­cia?
Em vigor a nova ori­en­tação, quan­tos inocen­ta­dos pos­te­ri­or­mente, não terão amar­gado o cárcere? Quem pagará por isso? Cri­arão uma tabela dizendo quanto vale cada dia em o cidadão inocente pas­sou preso?
Claro que pre­cisamos averiguar se esse número de decisões refor­madas não é um dos sub­pro­du­tos da impunidade. Mas, ainda que seja menos, o encar­ce­ra­mento de um inocente, por um dia que seja, não pode ser tro­cada por dez, cem ou mil cul­pa­dos soltos.
A grande questão é esta: se vale a pena encar­cerar inocentes em nome do com­bate à impunidade.
Na minha opinião nada é mais impor­tante que a liber­dade de um inocente, ainda que para garan­ti­mos essa liber­dade ten­hamos que tol­erar alguns cul­pa­dos soltos.
No dia seguinte após a decisão do Supremo, ten­tando encon­trar algo de pos­i­tivo na mesma, dizia a um colega: – agora, os jul­gadores de primeira e segunda instân­cias, diante da tamanha respon­s­abil­i­dade que é man­dar um inocente para cadeia, tomarão muito mais cuidado na hora de jul­gar, verão se de fato o crime foi cometido, de forma e por quem.
Con­hece­dor de mais coisas que eu, ele me des­en­co­ra­jou: – para os inocentes, as coisas ficarão bem mais difí­ceis.
Será que o que nos espera é mesmo a bar­barie?
Abdon Mar­inho é advo­gado.
* Texto pub­li­cado em 2016, por ocasião da decisão do STF sobre cumpri­mento da pena após con­de­nação em segunda instância.

REINALDO AINDA APOSTA NA GRATIDÃO.

Escrito por Abdon Mar­inho

ZÉ REINALDO AINDA APOSTA NA GRATIDÃO.
Por Abdon Mar­inho.
O EX-​GOVERNADOR José Reinaldo Tavares anun­ciou aos maran­hense, no Sábado de Aleluia, sua mais arriscada obra de engen­haria política: ser can­didato a senador sus­ten­tado por duas can­di­dat­uras de gov­er­nador do campo oposi­cionista ao gov­erno comu­nista do estado, algo até aqui, nunca tes­tado, pelo con­trário, em vezes ante­ri­ores, o que se viu sem­pre foi uma can­di­datura de gov­er­nador apoiando duas de senador, às vezes três.
Os deveres famil­iares na Sem­ana Santa, afastou-​me, nos últi­mos dias, até mesmo da leitura dos jor­nais, sites e blogues, o que me impediu de acom­pan­har o desen­ro­lar dos fatos, que, con­fesso, deixou-​me sur­preso.
Depois, já na noite do Domingo de Pás­coa, pas­sei a refle­tir mel­hor sobre a estraté­gia do ex-​governador e a con­clusão que chego é que ele decidiu apos­tar todas as suas fichas onde menos sus­peitá­va­mos: na gratidão. Logo ele que, como o Maran­hão inteiro assiste, ainda incré­dulo, foi vítima da mais ines­per­ada das ingratidões, que foi o desprezo e a humil­hação que sofreu da parte do atual gov­er­nador, “feito” na política por ele, José Reinaldo, e que nem os impávi­dos Leões da frente do palá­cio acred­i­taria que fosse ocor­rer da parte dele e de todo seu séquito, como o foi.
Emb­ora sentindo o golpe – a ingratidão é sem­pre difí­cil de ser assim­i­lada –, o ex-​governador, engen­heiro de profis­são, busca, numa “engen­haria política” inusi­tada, recuperar-​se e dar a volta por cima.
Segundo soube, cos­turou o ingresso no ninho tucano direto com o pres­i­dente nacional do par­tido e can­didato à presidên­cia da república, Ger­aldo Alck­min, como uma espé­cie de “carta de seguro” con­tra quais­quer con­tratem­pos da parte dos tucanos locais, por­ven­tura, inco­moda­dos com fato de con­cor­rer ao Senado pelo par­tido já tendo declar­ado pub­li­ca­mente apoio ao can­didato do Par­tido da Mobi­liza­ção Nacional — PMN, Eduardo Braide.
Como podemos ver trata-​se de uma estraté­gia arriscada, entre­tanto, se der certo, trará uma série de lições às atu­ais e futuras ger­ações.
A primeira delas, caso se con­firmem duas can­di­dat­uras apoiando uma de senador, será o espírito de sol­i­dariedade ao ex-​governador demon­strado pelos dois can­didatos ao gov­erno estad­ual, Roberto Rocha (PSDB) e Eduardo Braide (PMN).
Emb­ora pareça esquisito os dois terão muito mais a gan­har que a perder com tal gesto, con­forme explico abaixo.
O senador Roberto Rocha pas­sou os últi­mos anos car­regando a fama de desagre­gador e – no atual gov­erno –, tam­bém, a fama de traidor.
Ao aceitar e apoiar o dep­utado José Reinaldo na sua pre­ten­são ao Senado da República, cargo que já declarou, ser dev­ido ao ex-​governador, prin­ci­pal­mente em tais cir­cun­stan­cias, desmisti­fica grande parte da pro­pa­ganda neg­a­tiva imposta pelos atu­ais donos do poder no Estado, através de diver­sos veícu­los de comu­ni­cação alin­hados ao gov­erno.
Uma acusação que não pode recair sobre senador tucano é de que lhe falta per­cepção do quadro politico local. Pelo con­trário, já por ocasião da rup­tura do então gov­er­nador José Reinaldo com o grupo político do senador Sar­ney, na primeira metade da década de 2000, o atual senador foi um dos prin­ci­pais arti­fi­cies daquela cos­tura polit­ica que trouxe o então gov­er­nador para as hostes oposi­cionistas ao grupo político do qual fez parte a vida inteira até ali.
Lem­bro que muitos, naquela opor­tu­nidade, cus­taram a acred­i­tar que a rup­tura do gov­er­nador com o grupo Sar­ney era “para valer” e, por conta disso, perderam espaço no gov­erno. Não foi o que se deu com Roberto Rocha, ele não só acred­i­tou que a rup­tura era para valer como ocupou ou indi­cou pes­soas de sua con­fi­ança para inte­grar o gov­erno, como foi o caso de Pedro Maran­hão, den­tre out­ros.
As vicis­si­tudes da política que os afas­tou – basi­ca­mente o pro­jeto de José Reinaldo em “fazer” Flávio Dino gov­er­nador –, não mais per­sis­tem, pelo con­trário, demon­stram muito mais con­vergên­cias que divergên­cias em seus pro­je­tos para Maran­hão, como os são a Zona de Expor­tação do Maranhão-​ZEMA, de ini­cia­tiva do senador e os pro­je­tos para o Cen­tro de Lança­mento de Alcân­tara, uma luta diária do dep­utado fed­eral.
A vitória do pro­jeto politico traçado em 2006 e só alcançada em 2014, chega para o ex-​governador, em 2018, como o maior dos seus infortúnios. Humil­hado e igno­rado desde os primeiros dias do atual gov­erno, não mere­ceu, por fim, sequer a indi­cação como can­didato do grupo do gov­er­nador ao Senado, cargo que sem­pre alme­jou desde que per­maneceu no gov­erno em 2006 – e com isso per­mi­tiu a primeira vitória do grupo “oposi­cionista”. Pior que isso, assis­tiu o gov­er­nador erguer o braço do seu “favorito” como can­didato na primeira vaga e infor­mar que os demais pos­tu­lantes – entre os quais o ex-​governador – teriam que ir para o “murro” pela segunda indi­cação.
Isso, ape­sar de, mais de uma vez ter man­i­fes­tado o inter­esse de con­cor­rer como inte­grante da chapa do atual gov­er­nador.
Escrúpu­los de con­sciên­cia ou ide­ológ­ica? Que nada, o que mais tem nas cer­ca­nias do poder são ex-​aliados do grupo Sar­ney, sem con­tar a ver­dadeira “guerra” que travaram para con­tar com o apoio do Par­tido Democ­ratas — DEM, no arco de alianças, par­tido que pos­sui um ideário total­mente oposto (e em con­tradição) ao ideário comu­nista.
A segunda lição é que, emb­ora a “engen­haria” seja do ex-​governador, não se pode deixar de recon­hecer o gesto de desprendi­mento do senador tucano em aqui­escer com tal pro­jeto.
Ao fazer isso, no fundo, tam­bém, está dando uma lição ao atual gov­er­nador: a lição da gratidão. Mostra que, enquanto o atual gov­er­nador, por quem Jose Reinaldo tanto fez, lhe vira as costas largas, ele, Roberto Rocha, não coloca obstácu­los em dividir com outro opo­nente, Eduardo Braide, a sua can­di­datura de senador.
Como disse, trata-​se de uma estraté­gia inusi­tada – um can­didato a senador ser apoiado por dois can­didatos a gov­er­nador –, e nada garante que será exi­tosa. Mas, ninguém acred­i­tava que fosse ter êxito a estraté­gia da “coop­er­a­tiva de can­didatos” artic­u­lada em 2006.
A ter­ceira lição que nos socorre – e tam­bém mere­ce­dora de reg­istro –, é o altruísmo demon­strado pelo dep­utado Eduardo Braide, a quem o ex-​governador José Reinaldo já hipote­cou pub­li­ca­mente apoio no pleito majoritário ao gov­erno, em, tam­bém, não colo­car obstácu­los na “engen­haria” mon­tada com vis­tas a favore­cer a eleição do ex-​governador ao Senado. Aposta no futuro. Não no futuro dis­tante, mas no futuro próx­imo.
Esse gesto de desprendi­mento, será mer­cado­ria valiosa que poderá servir para cap­tar inúmeros apoios caso vença a bar­reira do primeiro turno e passé ao segundo, prin­ci­pal­mente se a estraté­gia for exi­tosa e José Reinaldo se eleger senador.
Não bas­tasse isso, o dep­utado ainda é muito jovem, o que sig­nifica, terá uma longa estrada na política. O gesto com o qual agora que ini­cia uma car­reira majoritária estad­ual, vai credencia-​lo junto à uma classe política tão des­gas­tada, como uma pes­soa capaz de ati­tudes grandiosas e não voltadas a inter­esses mera­mente pes­soais.
Além do mais não se pode descar­tar, antes ou depois da eleição, uma união em torno da can­di­datura mais viável, no primeiro ou ape­nas no segundo turno. Tudo pode acon­te­cer.
Por fim, mere­cendo igual recon­hec­i­mento, a “engen­haria” do ex-​governador. Qual­quer outro, enfrentando tan­tas adver­si­dades, traições e ingratidões, inclu­sive a trama urdida covarde­mente, que o impediu de ir para o Par­tido Democratas-​DEM, com quem ini­ciara as trata­ti­vas desde o ano pas­sado, teria esbrave­jado con­tra os seus algo­zes e tartu­fos ou mesmo desis­tido. Ao invés disso, com elegân­cia e argú­cia cos­tura em torno de si uma aliança inédita que pode romper com uma lóg­ica de quase todas as eleições: a de que o can­didato a gov­er­nador vence­dor no primeiro turno leva con­sigo o(s) senador(es).
A “engen­haria” do ex-​governador – sem con­tar os inúmeros apoios de prefeitos, ex-​prefeitos ou mesmo lid­er­anças políti­cas ainda gratas pelo trata­mento dele rece­bido desde quando ocupou os diver­sos car­gos no plano estad­ual ou fed­eral –, pode ser respon­sável pela rup­tura da lóg­ica política traçada até aqui.
Assim sendo, será a vitória da gratidão con­tra o engodo. Em todo caso, acerta ao ainda apos­tar na gratidão.
Abdon Mar­inho é advogado.

A SOCIEDADE E O SUPREMO.

Escrito por Abdon Mar­inho

A SOCIEDADE E O SUPREMO.
Por Abdon Mar­inho.
POU­CAS VEZES vi o Supremo Tri­bunal Fed­eral sofrer tan­tas críti­cas quanto agora. As incon­táveis charges espal­hadas nos veícu­los de comu­ni­cações nacionais – e mesmo além fron­teiras –, mostram o esgarça­mento das relações entre a sociedade e nossa corte Suprema. São achin­cal­hes, críti­cas áci­das, ofen­sas e mesmo protestos.
Vive­mos tem­pos difí­ceis. Quando poderíamos imag­i­nar que enti­dades da sociedade civil iriam con­vo­car protestos de rua con­tra a instân­cia máx­ima da justiça brasileira?
Parece que atingi­mos o fundo do poço. Só não ouso afir­mar isso porque sem­pre são capazes de cavar um pouco mais. O poço da indecên­cia brasileira não tem fundo.
Cer­ta­mente irão dizer: — tudo bem, são ape­nas piadas, charges.
Pode ser, mas nada comu­nica mel­hor o sen­ti­mento de um povo que o satírico, que a piada, que a con­versa infor­mal na mesa do bar.
E tem sido isso o que temos visto: as piadas, as charges, os debates de mesa de bar. O último “bate-​boca” entre os min­istros ren­deu, den­tre out­ras coisas, um inspi­rado samba-​canção e uma poe­sia decla­mada na voz de Maria Bethâ­nia.
Além do juridiquês e das falas empo­ladas nas sessões da Corte o que restou claro para a sociedade foi que o tri­bunal não fala a sua lín­gua. Pior que isso, que parte das excelên­cias estavam man­dando às favas quais­quer escrúpu­los de con­sciên­cia e jogando no lixo sua própria jurisprudên­cia do tri­bunal para livrar da prisão um ex-​presidente con­de­nado por cor­rupção e lavagem de din­heiro, com sen­tença con­de­natória con­fir­mada e ampli­ada pela segunda instân­cia.
A sociedade sen­tiu que a Corte Suprema, guardiã maior da sociedade, respon­sável em última instân­cia pela igual­dade, estava, clara­mente, como dito pelo próprio con­de­nado, em con­versa tele­fônica inter­cep­tada por ordem da Justiça, “aco­var­dada”.
E é fato que o Supremo tem se ape­que­nado na dis­cussão sobre a prisão do ex-​presidente. Como se o mesmo, por ser quem é e ter uma claque artic­u­lada – além de respon­sável pela nomeação de muitos deles –, estivesse acima do bem e do mal, inal­cançável pela lei.
Em tudo a sessão que ini­ciou o jul­ga­mento de um habeas cor­pus para livrar o ex-​presidente do cárcere a que se encon­tra con­de­nado, pare­ceu uma pés­sima ence­nação, a começar pela pausa para o cafez­inho que de dez min­u­tos rotineiros virou mais de hora e que cul­mi­nou com um “puxad­inho legal” que deu um salvo con­duto para não ser preso até a con­clusão do jul­ga­mento, já aprazado, ini­cial­mente, para o dia 4 de abril próx­imo.
O cidadão, mesmo aquele que não vive ou cir­cula no meio jurídico, perce­beu, com clareza solar, que a Suprema Corte esta­b­ele­ceu um trata­mento dis­tinto entre os brasileiros.
Afi­nal, nas mes­mas condições do ex-​presidente, quan­tos con­de­na­dos, mesmo pre­sos, teriam um habeas cor­pus exam­i­nado com tanta celeri­dade? A resposta é sabida por todos. Inúmeros são os que não con­seguem chegar até o STF e os que chegam, pela tradição da Corte, não têm seus reclames nem con­heci­dos.
Agora mesmo, quan­tos não são os pedi­dos de pre­sos, até por crimes menores, mesmo faméli­cos, que repousam nos gabi­netes dos min­istros do Supremo sem que ninguém os exam­ine? Estes têm o mesmo dire­ito do ex-​presidente de serem soltos ou não serem guarda­dos pre­sos até que o tri­bunal os exam­ine? Claro que não.
Ouvi na sessão que o paciente não pode­ria ser preso por inér­cia do corte em não con­cluir o jul­ga­mento do seu habeas cor­pus. Mas quan­tos não estão pre­sos nes­tas condições? Não foi o tri­bunal que enten­deu que isso era pos­sível? Que não ofendia a Con­sti­tu­ição? Agora não pode mais?
Acaso, antes da con­de­nação, e pos­te­rior con­fir­mação da sen­tença pela segunda instân­cia do sen­hor ex-​presidente e out­ros graú­dos, havia tanto furor e mobi­liza­ção pela revisão da decisão do STF de 2016 que con­siderou con­sti­tu­cional o cumpri­mento ante­ci­pado da pena? A resposta é não.
Aliás, bem poucos foram o que se colo­caram con­trários aquele entendi­mento, até mesmo, em vir­tude do reduzido número de recur­sos espe­ci­ais que são provi­dos no Supe­rior Tri­bunal de Justiça — STJ, cerca de 0,6% (zero vír­gula seis por cento) e menos ainda os que con­seguem chegar e serem provi­dos no Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF.
Quando naquela opor­tu­nidade me colo­quei ao lado da mino­ria que foi der­ro­tada na dis­cussão ou seja, con­trário ao cumpri­mento ante­ci­pado da pena, foi por enten­der que tal entendi­mento estava em desacordo com a regra con­sti­tu­cional do artigo 5º.: “LVII — ninguém será con­sid­er­ado cul­pado até o trân­sito em jul­gado de sen­tença penal con­de­natória;”.
O STF e muita gente boa enten­deram que bas­taria a con­fir­mação da con­de­nação em segunda instân­cia para que o con­de­nado fosse instado ao cumpri­mento da pena. E que tal medida, con­forme defendeu na época o min­istro Gilmar Mendes, aprox­i­maria o Brasil do mundo civ­i­lizado, uma vez que o Brasil era um dos poucos países onde os con­de­na­dos não cumpriam a pena logo na primeira ou na segunda instân­cia.
Ora, se aque­las pes­soas de notável saber jurídico, que têm a mis­são de inter­pre­tar o texto con­sti­tu­cional, ainda que por estre­ita maio­ria, estavam dizendo que o cumpri­mento da pena pode­ria ocor­rer a par­tir da segunda instân­cia instân­cia, como não aceitar? Ainda que dis­cor­dando, aceitei.
Agora, com os escân­da­los se suce­dendo e um “monte de gente impor­tante envolvida” – como na música da banda RPM –, sendo con­vi­dada a con­hecer as dependên­cias do sis­tema carcerário nacional, as mes­mas excelên­cias que “cri­aram” a regra que vem sendo apli­cada no país inteiro, querem redis­cu­tir a matéria.
Na ver­dade, redis­cussão é um eufemismo, suas excelên­cias querem é mudar a regra com o jogo em anda­mento.
Diante de tudo isso, com as infor­mações cir­cu­lando com uma veloci­dade nunca visto, não é de se estran­har a insat­is­fação da sociedade com a sua Corte Suprema.
A sociedade está acober­tada de razão ao ques­tionar e se inda­gar os porquês de tan­tas oscilações de com­por­ta­mento agora, se decidi­ram, ainda ontem, que estava tudo certo.
Como é pos­sível a instân­cia maior da Justiça brasileira tomar uma decisão e esta mesma decisão não ser cumprida nem pelos seus min­istros? Como é pos­sível que a regra valha para uns e não para out­ros? Como querem que a sociedade entenda isso como nor­mal? Como achar nor­mal que, agora, quando os poderosos estão na eminên­cia de cumprirem o “carma” dos demais mor­tais busquem sub­ter­fú­gios para driblar a regra que cri­aram?
Alertei antes e o faço nova­mente: o STF, a par­tir de suas últi­mas posições cam­inha a pas­sos lar­gos para con­quis­tar sua irrelevân­cia na história; para tornar-​se um tri­bunal sem o respeito da sociedade brasileira; para ser referido como um tri­bunal boli­var­i­ano.
O Brasil que já tem uma classe política hor­ro­rosa – pio­rando a cada dia –, com os poderes leg­isla­tivo e exec­u­tivo com­petindo, entre si, para saber quem comete mais crimes, pas­sar a ter uma Corte Suprema em que a sociedade não possa con­fiar, ter­e­mos a insolvên­cia das insti­tu­ições e o fim da democ­ra­cia. Se é que esta algum dia exis­tiu por aqui. Em todo caso, fin­gíamos que tín­hamos.
Um país com tal nível de descrédito insti­tu­cional não tem como fun­cionar o que leva a ser um campo aberto a todo tipo de opor­tunistas, mila­greiros e crim­i­nosos.
A quadra de inse­gu­rança jurídica em vive o país é inédita, não tem solução fácil e, infe­liz­mente, tem uma “pitada” de pre­sepada do nosso Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF, que não tem para onde ir nem para onde voltar.
Como des­fazer a decisão de 2016 sem cair no mais abso­luto descrédito? Como man­ter a decisão de 2016 sem sub­me­ter todos a ela, inclu­sive os mem­bros da próprio tri­bunal que teimam em não cumprir? Como fica a sociedade? Ao alvedrio de um tri­bunal em que a sorte do juris­di­cionado depende da mesa onde seu processo vai repousar? Uma lei para cada parte?
A atual situ­ação do país é esta. Entre­tanto acred­ito que mais impor­tante que o diag­nós­tico, sejam as causas: como cheg­amos a essa situ­ação de caos insti­tu­cional? Quem são os cul­pa­dos? Esse é o resul­tado do atual mod­elo que temos?
São per­gun­tas que pre­cisamos nos fazer para dar­mos um norte ao país para os próx­i­mos anos. Fora isso, só muita fé em Deus para acred­i­tar que saire­mos cedo de tamanha insta­bil­i­dade.
Abdon Mar­inho é advogado.