A grande bobagem do debate comunista no Brasil.
Por Abdon C. Marinho*.
QUANDO li o “O nome da Rosa”, magistral obra do italiano Umberto Eco, ainda em meados dos anos oitenta, fi-lo na perspectiva, tão somente, de uma obra literária, era um adolescente que lia tudo e com uma enorme voracidade, muitas vezes pegava um livro que se “punha de pé” e lia-o de uma só assentada. Foi assim com a obra em referência.
Anos depois, já no final dos anos noventa ou início dos anos dois mil, debatia com o amigo Walter Rodrigues sobre tal obra e sobre outras e ele me mostrou uma outra perspectiva da obra. Segundo ele, a obra era uma referência a diversas outras obras, cada personagem tinha uma razão de ser, por exemplo, o bibliotecário cego seria uma homenagem ao poeta, escritor e crítico literário argentino Jorge Luis Borges, o franciscano investigador William de Baskerville, seria uma uma homenagem a obra “O Cão dos Baskervilles”, um dos livros mais famosos de Sir Arthur Conan Doyle.
Pois bem, decorridos tantos anos e após a conversa com WR, peguei o livro novamente para ler. Deu-se que o livro já não era o mesmo e que eu já não também o mesmo. Éramos como dois estranhos que se encontravam pela primeira vez.
Essa lembrança assaltou-me a mente diante da “profusão” de debates em torno da ideia do Brasil vir a tornar-se um país comunista.
Leio, inclusive, que uma pesquisa supostamente séria informa a patuleia que 52% (cinquenta e dois por cento) dos brasileiros acreditam nessa possibilidade, sendo que destes, 72%(setenta e dois por cento) são pessoas que votaram nos candidatos vinculados à oposição.
Para completar o festival de bobagens que tomam de conta do país o presidente da República em discurso recente disse da sua enorme alegria ao conseguir colocar “pela primeira vez na história desse país” um ministro “comunista” na Suprema Corte.
Foi o suficiente para “incendiar” as mentes mais férteis nos dois espectros políticos que “ninguém” conseguem fazer descer do palanque.
De um lado, os esquerdistas “miolos de pote” festejando o fato de termos um ministro “comunista” no STF; de outro a turma direitista, zangada e esfregando as mãos, e dizendo: — eu não disse? Daqui a pouco o Brasil será uma Venezuela.
Como podemos testemunhar, a tolice parece que não escolhe lado.
O nomeado (com data para tomar assento no STF a partir de fevereiro de 2024) tendo saído da magistratura em 2006 para disputar mandato eletivo entendeu de filiar-se no Partido Comunista do Brasil — PCdoB, e sempre sustentou desde então que seria um “comunista, graças a Deus”. Mesmo em debates sérios, entrevistas para imprensa nacional fez questão de sustentar essa contradição histórica de ser (ou ter sido, já que impedido doravante), um “comunista, graças a Deus”, indo além, por assim dizer que o comunismo é um “valor” cristão e tudo mais que vem no combo: Cristo seria comunista, que comunismo é viver em comunhão e tudo mais.
Todas essas bobagens primárias que de tão incongruentes são como se não existentes.
Sempre que me deparo com esse tipo de debate, de determinadas pessoas se dizendo que são (ou foram) comunistas, ainda mais quando completam com o viés cristão, me recordo da Viúva Porcina, do clássico de Dias Gomes, Roque Santeiro, aquela “que era sem nunca ter sido”.
Assim, o efeito que tem ouvir determinadas pessoas dizerem que são comunistas tem o mesmo significado que teria dizerem que são flamenguistas, vascaínas ou botafoguense, etc., quando escuto respondo: — prazer, torço para o Íbis, de Pernambuco.
Foi com esse pensamento na cabeça, como dito, que me assaltou a lembrança dos dois livros “O Nome da Rosa” e dos dois “eus”, pois quando estudei, ainda no primário, sobre o Comunismo como doutrina política e como modelo econômico, o tínhamos como materialista e diabético.
O Comunismo tem como objetivo a construção de uma sociedade igualitária para alcançar esse fim passa-se por alguns “estágios”: o fim da propriedade privada; a coletivização dos meios de produção; a coletivização da produção; o fim da luta de classes; a sociedade sem classes; a extinção do Estado; e o Internacionalismo.
Ora, para alguém se dizer comunista ou para ser considerado um comunista, um defensor de tal ideologia é necessário que defenda, viva ou lute para a implementação dos objetivos acima, pois essa é a essência do comunismo como doutrina política ideológica.
Se não faz nada disso não é comunista coisa nenhuma é apenas tolo.
Não consta em lugar nenhum que esse ou aquele político brasileiro da atualidade defenda tais ideias.
Essa bobagem de que o comunismo seria uma “vertente” do cristianismo é apenas uma tolice que já foi desmentida inúmeras vezes pela Igreja Católica (não sei se as protestantes também o fizeram), inclusive pelo Santo João Paulo II.
E nem precisava.
A doutrina comunista se sustenta no materialismo histórico com todos os acontecimentos da história sendo determinados pelos fatores econômicos.
Ora, o materialismo é o oposto da fé cristã que reconhece a existência da alma humana aberta a transcendência.
E tanto isso é verdade que os seus idealizadores tinham na fé o ópio do povo a impedir a luta de classes e a supressão do Estado com todas suas consequências.
Essas “incompatibilidades” de se dizer comunista e ao mesmo tempo cristão são bem palpáveis nos países que implantaram o comunismo em suas várias vertentes, em todos eles, em maior ou menor escala, tivemos a repressão a fé do povo.
Poderíamos escrever laudas e laudas sobre esse assunto, porém, entendo que não faz qualquer sentido, em pleno século XXI que se retorne a esse tipo de debate no Brasil.
Cogitar ou defender tais ideários não tem cabimento nem como debate acadêmico. Não passa de tolice, como, aliás, já disse mais de uma vez.
Ao meu sentir o país só perde tempo com debates inócuos de ideologismo tolo que não nos leva lugar nenhum. Não contribui com educação, com a saúde, com o crescimento econômico, com as políticas públicas que sirvam para mudar a vida das pessoas.
Abdon C. Marinho é advogado.