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Ana e todas as mulheres.

Escrito por Abdon Mar­inho

ANA E TODAS AS MUL­HERES.

Por Abdon Marinho.

QUANDO nossa mãe mor­reu no parto nor­mal do seu décimo filho ainda na faixa dos trinta e poucos anos, eu o oitavo filho, com pouco mais de cinco anos, pas­sei a sentir-​me como “respon­sável” pelos meus irmãos – éramos uma “escad­inha” que ia de zero a vinte e poucos anos –, por todos, mas, prin­ci­pal­mente, pelos vieram depois de mim, minha irmã Ana, como pouco mais de dois anos, e o caçula, Wan­der­lan, recém-​nascido.

Com a morte de mamãe deu-​se uma espé­cie de “diás­pora” na nossa família, uns irmãos morando com nosso pai, out­ros com os mais vel­hos, tios, como digo, sendo cri­a­dos como o bom Deus cria batatas na beira dos rios.

Somente quarenta anos depois da morte da nossa mãe, em 2013, no aniver­sário de sessenta anos do meu irmão mais velho (na ver­dade, o segundo mais velho), tive­mos a opor­tu­nidade de nos reunir-​nos todos. Nunca estive­mos afas­ta­dos, mas nunca mais havíamos nos encon­tra­dos todos no mesmo ambi­ente.

Nossa mãe era “cumeeira” da casa. Sem cumeeira a casa deixa de exi­s­tir.

O nosso pai, por sua própria cri­ação e for­mação, não era como muitos pais da atu­al­i­dade que na falta da mãe, por morte ou sep­a­ração, assumem aquele papel, eram out­ros tem­pos em que era “cada um por si”.

Tem­pos atrás pedi a uma amiga querida que acabara de perder uma cun­hada que cuidasse mel­hor dos sobrin­hos que dos próprios fil­hos, pois a orfan­dade é a mais solitária das mis­sões, destas em que você se sente soz­inho mesmo cer­cado de pes­soas ou como um intruso na sua própria casa.

Foi em uma mis­são assim, solitária, que pas­sei a infân­cia e juven­tude, não me pre­ocu­pando comigo, pois sabia como estava, mas, com meus irmãos, com os mais novos, prin­ci­pal­mente com Ana e Wan­der­lan. Oh, Deus, será que estão bem? Será que estão ali­men­ta­dos? Será que estão vesti­dos? Será que estão sendo mal­trata­dos?

No “peso” das angús­tias e pre­ocu­pações sem­pre me cau­sou mais inqui­etação a situ­ação da minha irmã, uma cri­ança, uma menina, sendo cri­ada sem o apoio e/​ou a super­visão de uma mãe, sem ter com quem dividir seus medos e sofri­men­tos.

Pelo menos no aspecto metafórico muitas vezes o meu coração san­grou.

Faço estas con­sid­er­ações ini­ci­ais para con­fes­sar que chorei ao ouvir os áudios hor­ren­dos do dep­utado paulista Arthur do Val sobre as mul­heres ucra­ni­anas refu­giadas de uma guerra covarde e sem sen­tido.

Chorei nova­mente ao assi­s­tir a um vídeo de uma ex-​embaixatriz ucra­ni­ana onde ela expressa toda sua revolta em relação à tor­peza dos áudios do já men­cionado par­la­men­tar em relação às suas compatriotas.

E, chorei nova­mente ao lê uma carta do jor­nal­ista Jamil Chade ao par­la­men­tar onde narra com crueza de detal­hes exper­iên­cias de vida como profis­sional sobre as condições de mul­heres, cri­anças e out­ras pes­soas vul­neráveis nos cam­pos de refu­gia­dos ao redor do mundo.

A situ­ação das refu­giadas de guer­ras em qual­quer lugar do mundo está muito longe de ser com­parada a uma “fila de bal­ada” das mel­hores casas do ramo no Brasil ou de qual­quer outro lugar. São pes­soas que, de uma hora pra outra, se viram pri­vadas de suas famílias, dos seus ami­gos, de suas roti­nas e de suas pátrias. São órfãs de tudo, que seguem para qual­quer outro lugar em busca de um pouco de segu­rança.

Qual­quer ser humano com um mín­imo de sen­si­bil­i­dade sabe que não existe lugar pior para se estar do que no meio de uma guerra.

Agora mesmo, na guerra da Ucrâ­nia, ouço o relato de uma médica em choque que disse ter tomado con­hec­i­mento de uma cri­ança de oito anos que fora estuprada por diver­sas vezes por diver­sos homens. Este é ape­nas um recorte den­tre tan­tos out­ros que uma guerra traz.

Esta­mos vendo cri­anças sendo entregues por seus pais a estran­hos para que con­sigam fugir; out­ras fug­indo soz­in­has para países estran­hos onde só poderão con­tar com a sol­i­dariedade das pes­soas de bem.

Ape­sar de viver­mos em um mundo conec­tado é muito provável que muitas destas pes­soas, inclu­sive cri­anças, se per­cam defin­i­ti­va­mente dos seus pais ou entes queri­dos – por os perderem na guerra ou por não terem mais como os encon­trar.

Quando ouvi o áudio pre­datório e nojento do “rep­re­sen­tante do povo”, numa situ­ação de extremo deses­pero para o povo ucra­ni­ano, além de ver­gonha, nojo e indig­nação por som­a­ti­zar toda a situ­ação, lembrei-​me da minha própria irmã, órfã e pobre, o que na visão do par­la­men­tar a tornaria “fácil”.

Qual­quer outro “humano” lem­braria tam­bém das irmãs ou fil­has ou mães ou qual­quer outra pes­soa só sexo fem­i­nino.

Hoje minha irmã, na casa dos cinquenta, com dois fil­hos, uma já for­mada médica e o outro em for­mação na mesma profis­são, já se ocupa de esperar a aposen­ta­do­ria e pajear os netos, cer­ta­mente nem deve ter ouvido ou “dado bola” para as infâmias do dep­utado estad­ual paulista sobre as mul­heres ucra­ni­anas e que são exten­si­vas a todas as out­ras.

Chega a ser ina­cred­itável que em pleno século XXI ainda ten­hamos que con­viver com este tipo de coisa.

No mês e na sem­ana ded­i­cado as mul­heres vimos um dep­utado referir-​se a elas como “fácies por serem pobres”, um pres­i­dente da República que achou a fala do men­cionado dep­utado “asquerosa” dizer que “as mul­heres estão prati­ca­mente integradas à sociedade” e um procurador-​geral da república “hom­e­nagear” as mul­heres dizendo que as mes­mas já podem escol­her a cor do esmalte para pin­tar as unhas ou o sap­ato que podem calçar.

Pois é, parece que volta­mos no tempo.

Assisto aos “amigu­in­hos” de movi­mento do dep­utado diz­erem que o mesmo não deve ser cas­sado pelos áudios nojen­tos porque não roubou o din­heiro público e que vão se mobi­lizar con­tra os pro­ced­i­men­tos que pedem sua cas­sação.

Uma das estraté­gias para “fulanizar” qual­quer debate é fazer com­para­ção de coisas dis­tin­tas e colocá-​las em escalas de val­ores. É isso que ten­tam fazer ou diz­erem que o que o dep­utado disse é grave mas que é mais grave é roubar o din­heir­inho do con­tribuinte.

Como dizia o outro, uma coisa é uma coisa outra coisa é outra coisa.

Acho que os ladrões do din­heiro público devem ser cas­sa­dos, mas isso não inval­ida que ocor­ram out­ras cas­sações antes destas ou que só cassem o dep­utado boçal, falas­trão e vagabundo depois que cas­sarem o dep­utado ladrãoz­inho.

Uma coisa nada tem a ver com a outra.

Um dos Crimes mais hedion­dos, ren­táveis, cruéis e fre­quente­mente é trá­fico de seres humanos, prin­ci­pal­mente mul­heres para a explo­ração sex­ual ou mesmo servirem como escravas. Ocorre em todo mundo e é tratado como um crime menor.

Isso ocorre sobre­tudo dev­ido às condições econômi­cas destas pessoas.

O estereótipo do dep­utado de que são “fácies por que são pobres” ainda que cun­hado em um papo pri­vado de “boleiros” rev­ela que o mesmo pode até ser outra coisa e não sofrer qual­quer repri­menda na esfera cível ou penal, porém é incom­patível com o decoro que deve ter um rep­re­sen­tante do povo.

Não são as palavras em si, mas sim o tipo de con­cepção que pos­sui o cidadão sobre situ­ações com­plexas de gravi­dade ímpar que rev­e­lam o seu desprezo pelas condições humanas e o seu despreparo para rep­re­sen­tar o povo.

Isso nada tem a ver com fato de ser hon­esto ou não.

Vejamos o pres­i­dente da República, sen­hor Bol­sonaro, ele “veste” uma gra­vata rosa suposta­mente para hom­e­nagear as mul­heres e diz que elas, a maio­ria da pop­u­lação brasileira, que “ralam” diari­a­mente em duas ou três jor­nadas de tra­balho, que cuidam da casa, dos fil­hos e até dos mari­dos, que estão “prati­ca­mente integradas à sociedade”.

Ora, quem estão prati­ca­mente inte­gra­dos à sociedade são as min­has carpas, quando chega alguma visita aqui em casa eu as chamo para mostrar a ela; quem está prati­ca­mente integrada à sociedade é a cadela de um amigo que ele trata com mais cuidado que um humano; quem está prati­ca­mente integrada a sociedade são os gatos de uma amiga, e por aí vai.

Dizer que as mul­heres estão “prati­ca­mente integradas à sociedade” é algo tão asqueroso quanto a falá­cia do dep­utado.

As mul­heres são a sociedade.

Já a fala do sen­hor Augusto Aras, procurador-​geral, que dev­e­ria procu­rar o que fazer, talvez lavar um tanque de roupas, são tão infan­tis que talvez só mereça que se diga é que ele, Aras, é uma espé­cie de poo­dle do Bol­sonaro, mas com a ressalva de que está quase inte­grado à sociedade.

A Ana e a todas as mul­heres, meu sin­cero respeito e apreço, pela pas­sagem do seu dia e por todo o sem­pre.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

O come­di­ante, o covarde e o idiota.

Escrito por Abdon Mar­inho

O COME­DI­ANTE, O COVARDE E O IDIOTA.

Por Abdon Mar­inho.

CAR­NAVAL, enquanto o som de bom­bas apa­vo­ram uma pop­u­lação que não pediu uma guerra; enquanto mil­itares e civis são mor­tos; enquanto mul­heres, idosos, defi­cientes e cri­anças, numa tragé­dia sem prece­dentes fogem para os países viz­in­hos em busca de segu­rança, deixando para trás seus lares, patrimônio e, por assim dizer, suas vidas surge o idiota como uma das declar­ações mais entup­i­das ditas em qual­quer tempo e mais grave em tempo de guerra: “o povo ucra­ni­ano con­fiou a um come­di­ante os des­tino da nação”.

Algo mais ou menos assim em um dialeto entrecor­tado próx­imo do por­tuguês.

A frase do idiota depois copi­ada e “mes­mer­izada” por uma legião de seguidores “idi­o­ti­za­dos” “gan­hou” as redes soci­ais, inclu­sive com algu­mas ilus­trações e/​ou fotos dos dois pres­i­dentes e suas biografias onde se lia abaixo do ucra­ni­ano que fora ator, come­di­ante, etc., e, abaixo do russo sua car­reira como espião da KGB, campeão disso ou daquilo.

Como todo idiota é geral­mente um machista mis­ógino é como se dissesse: uma mul­her den­tro da sua casa com vestido curto está pedindo para ser vio­len­tada.

O BRASIL tem uma vasta rep­utação de bons come­di­antes, ver­dadeiros gênios que mesmo nos momen­tos de maiores difi­cul­dades, como nos duros tem­pos da ditadura, das suces­si­vas crises finan­ceiras, con­seguiam com sua inteligên­cia e per­spicá­cia nos fazer rir de nos­sas próprias des­graças.

Quem não traz na memória os céle­bres per­son­agens de Chico Any­sio, de Jô Soares ou de tan­tos out­ros?

Um bom come­di­ante até pode fin­gir ser um idiota, já o idiota jamais con­seguirá ser um bom come­di­ante.

Quando muito poderá con­tar alguma piada sem graça em que a audiên­cia rir-​se-​á mais dele do que da suposta piada.

Em exer­cí­cio de retórica, imag­ino que o nosso país estaria muito mel­hor posi­cionado no mundo se em algum momento de sua história tivesse sido con­duzido por um come­di­ante e não por boçais, imbe­cis e idio­tas.

Esta­mos assistindo isso “ao vivo”, enquanto um idiota tenta fazer piadas com o sofri­mento alheio e se equi­li­bra entre a covar­dia e ado­ração por um macho alfa, temos um come­di­ante na dis­tante Ucrâ­nia resistindo à invasão do seu país numa guerra injusta, cruel e covarde.

O come­di­ante de quem os idio­tas fiz­eram e fazem pouco caso é inspi­rador e inspi­rado por uma pop­u­lação que luta e resiste a numa guerra desigual.

Quase que diari­a­mente assis­ti­mos um profis­sional da comé­dia não fazendo graça, mas pedindo e pas­sando força para que o seu povo resista à tomada do seu país por uma potên­cia estrangeira.

O come­di­ante não fugiu ao ouvir as ameaças e o barulho das bom­bas que caíram e caem sobre o seu país, fez o oposto disso.

É a cor­agem e resil­iên­cia de um come­di­ante que tem inspi­rado a resistên­cia den­tro da Ucrâ­nia e mobi­lizado a sociedade civil ao redor do mundo con­tra uma guerra de expan­são, injusta e abso­lu­ta­mente deslo­cada no tempo.

Não tenho dúvi­das que o pode­rio mil­i­tar de uma super­potên­cia mundial em algum momento vai se sobre­por à garra e deter­mi­nação do povo ucra­ni­ano na defesa da sua pátria.

Mas ainda assim, quando isso ocor­rer, quem terá “ven­cido” a guerra será a Ucrâ­nia e não a Rús­sia.

O mundo inteiro já tem con­vicção que o covarde de Moscou é o agente provo­cador da guerra e que mesmo uma vitória pelas armas jamais o trans­for­mará em um vence­dor, mas, ape­nas em um inva­sor e/​ou ocu­pante de uma nação sober­ana.

Essa con­sci­en­ti­za­ção cole­tiva sobre a guerra de expan­são provo­cada pelo covarde de Moscou con­tra a Ucrâ­nia e a con­se­quente repulsa dos povos do mundo a ela só está sendo pos­sível por conta da resistên­cia firme e cora­josa de um come­di­ante que é inspi­rado e inspira toda uma nação.

Caso fosse um covarde ou idiota e tivesse fugido do país ao estampido das primeiras bom­bas cer­ta­mente o seu país já estaria anex­ado à potên­cia agres­sora e o mundo, sequer, ainda estaria falando da guerra.

Até aqui temos visto um come­di­ante se por­tar como o mais altivo dos coman­dantes de guerra não ape­nas no plano da resistên­cia interna, mas, prin­ci­pal­mente, reti­rando o mundo de sua cos­tumeira apa­tia e indifer­ença ao mostrar que a guerra que ocorre e destrói o seu país é uma guerra de toda sociedade civ­i­lizada con­tra a bar­bárie.

Assim tem con­seguido gal­va­nizar os sen­ti­men­tos con­trários à guerra da pop­u­lação, dos gov­er­nos e das empre­sas – nunca tín­hamos visto tan­tas empre­sas e tan­tas mar­cas se posi­cionarem con­tra uma guerra quanto agora.

Até aqui já vimos o come­di­ante emo­cionar e arran­car lágri­mas e aplau­sos do Par­la­mento Europeu, debater com o Con­gresso Amer­i­cano e todos os dias ser con­sul­tado e gan­har a sol­i­dariedade de gov­er­nantes do mundo inteiro.

Se sair vivo desta guerra não duvido que con­quiste o Nobel da Paz e seja req­ui­si­tado como um pop Star por onde quer que passé.

Enquanto isso o covarde de Moscou segue cada dia que passa mais iso­lado.

Como trunfo para ser ouvido por alguém usa a ameaça do Armage­dom nuclear.

A cena mais patética desta guerra sem sen­tido é ver­mos o covarde sen­hor da guerra sentar-​se à uma dis­tân­cia de vinte met­ros dos seus gen­erais e ministros.

Sem cor­agem sequer para sentar-​se próx­imo aos seus com­pas­sas, manda jovens sol­da­dos, fil­hos de alguém, namora­dos de alguém, netos de alguém, lutarem na “sua guerra”.

Do seu quartel-​general a cen­te­nas de quilômet­ros de dis­tân­cia manda soltar bom­bas sobre cidades, sobre civis, sobre uma nação que sabe ser inca­paz de resi­s­tir ao pode­rio mil­i­tar russo, até porque, vol­un­tari­a­mente desarmou-​se lá atrás diante do com­pro­misso (vio­lado) de que nunca seria alvo de ataques.

O covarde mente descarada­mente para o povo russo ao dizer que não existe guerra – o termo foi, inclu­sive, proibido –, trata-​se de uma “oper­ação mil­i­tar espe­cial” para pro­te­ger cidadãos rus­sos que estariam sendo humil­ha­dos pelo gov­erno ucra­ni­ano.

Como a men­tira não se sus­tenta, impôs-​se a cen­sura com penas durís­si­mas (de até 15 anos de cadeia) para quem ousar divul­gar qual­quer notí­cia que esteja em desacordo com a ver­são ofi­cial do gov­erno.

Os canais de rádio o tele­visão estrangeiros já estão deixando o país; as redes soci­ais estão blo­queadas.

Ainda assim, o covarde enfrenta protestos cada vez mais fre­quentes inter­na­mente.

O povo, ape­sar da cen­sura, das retal­i­ações e opressão de se viver em um régime autocrático começa a ir para as ruas protes­tar ou mesmo manifestar-​se con­trário à guerra.

Em cada protesto ou man­i­fes­tações cen­te­nas de pes­soas são pre­sas, inclu­sive idosos e cri­anças.

O covarde, ainda que mande pren­der todos que protestarem con­tra a “sua guerra”, não con­seguirá escon­der a ver­dade de toda a pop­u­lação que começará a sofrer os efeitos da desval­oriza­ção da moeda, do blo­queio dos seus cartões de crédito, do fechamento ou encer­ra­mento de ativi­dades de quase todas grandes empre­sas que atuam naquele país, sem con­tar a insat­is­fação pela per­das de seus sol­da­dos.

Muito emb­ora este­jam acos­tu­ma­dos a pri­vações diver­sas, desde sem­pre, os rus­sos nas últi­mas três décadas ainda que vivendo sob o jugo de régime autoritário exper­i­men­tou os con­for­tos e como­di­dades da vida mod­erna.

Não acred­ito que vá aceitar com bom grado um retro­cesso para os tem­pos da União Soviética sem qual­quer insat­is­fação, ainda mais sabendo que a guerra só atende aos dese­jos pes­soais de um tirano de um grupo de oli­gar­cas que tem saque­ado a Rús­sia há décadas.

O idiota vis­i­tou o covarde de Moscou e na sua tosca imag­i­nação tornou-​se “amigo de infân­cia” dele.

Con­trar­iando posições históri­cas do nosso país e os mar­cos legais con­ti­dos na Con­sti­tu­ição, o idiota, até agora não man­i­festou sol­i­dariedade a uma nação sober­ana inva­dida e con­de­nou a ação do inva­sor. Para diminuir nossa ver­gonha a diplo­ma­cia brasileira, ainda que titubeante, con­de­nou a invasão.

Con­forme disse em texto ante­rior, o idiota não pre­cis­aria fazer nada além de reafir­mar o que esta­b­elece a Con­sti­tu­ição Fed­eral no que ref­ere à política externa do país. Trata-​se do artigo 4º, da Con­sti­tu­ição. Está tudo lá.

O idiota só pre­cis­aria dizer que a posição dele e do país é a con­tida na Con­sti­tu­ição. Só isso.

Ao fugir da Con­sti­tu­ição como o diabo foge da cruz para postar-​se implici­ta­mente ao lado do covarde russo, alçado à condição de “mel­hor amigo de infân­cia”, além de explici­ta­mente descumpri-​la, sus­peito que tenha vio­lado o artigo 84, que trata dos crimes de responsabilidade.

A sociedade moldada numa escala de val­ores.

O primeiro deles é a vida, seguido da liber­dade e daí pra frente.

O idiota não pos­sui hier­ar­quia de val­ores. Acha que um saco de adubo vale mais que uma vida humana. O idiota vai para a tele­visão, em plena guerra, com mil­hares sendo mor­tos, out­ros mil­hares per­dendo tudo para viverem como refu­gia­dos, e diz que o fer­til­izante é sagrado.

O idiota não sabe que a vida é sagrada e não fer­til­izantes.

Era car­naval, enquanto o come­di­ante orga­ni­zava a resistên­cia aos ataques aéreos e por terra do covarde de Moscou, o idiota passeava de jet-​ski.

Já os líderes do mundo solen­e­mente igno­ravam sua existên­cia.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

O hor­ror no leste da Europa é con­tra a humanidade.

Escrito por Abdon Mar­inho


O HOR­ROR NO LESTE DA EUROPA É CON­TRA A HUMANIDADE.

Por Abdon Marinho.

QUAL­QUER pes­soa com dois ou mais neurônios em fun­ciona­mento e com um mín­imo de bom senso sabe que a GUERRA provo­cada pela Rús­sia con­tra a Ucrâ­nia é injusta, descabida, cruel, covarde, injus­ti­fi­cada e desprovida de qual­quer motivo.

Trata-​se de uma guerra, uma invasão que depois se con­vert­erá em ocu­pação ou, na mel­hor das hipóte­ses, na insta­lação de um gov­erno fan­toche que aceite se sub­me­ter a Moscou.

A guerra de Putin con­tra o povo ucra­ni­ano é uma covar­dia, uma vez que o pode­rio mil­i­tar dos rus­sos é infini­ta­mente supe­rior ao daquela nação.

Tão supe­rior que as autori­dades da Rús­sia estran­ham que haja tanta resistên­cia o que coloca em risco a estraté­gia da ocu­pação per­ma­nente ou a imposição de um gov­erno fan­toche.

A guerra de Putin con­tra Ucrâ­nia é cruel. Em meio a uma pan­demia, em pleno inverno, famílias são sep­a­radas, mul­heres, idosos, enfer­mos, defi­cientes para fugir das tropas rus­sas são obri­gadas a andarem quilômet­ros em busca de refú­gio em algum país viz­inho.

A guerra de Putin é descabida porque a Ucrâ­nia não fez nada para ser ata­cada — e não teria como fazê-​lo –, ape­nas, como nação inde­pen­dente, recon­hecida no mundo inteiro, bus­cou exercer a sua sobera­nia den­tro do seu ter­ritório, fazendo suas alianças com quem acha que deve.

A guerra da Putin con­tra con­tra a Ucrâ­nia, con­tra os ucra­ni­anos é uma guerra con­tra a humanidade pois parte do pres­su­posto que uma nação pode pro­mover a invasão e ocu­pação do ter­ritório de out­rem sem qual­quer con­se­quên­cia.

Os cidadãos do mundo inteiro, inclu­sive rus­sos – por isso que digo que esta é uma guerra de Putin –, enten­dem e repu­diam o com­por­ta­mento do líder russo e até cobram dos seus gov­er­nos medi­das mais duras con­tra ele e con­tra a Rús­sia.

E cobram com razão. Em pleno século XXI, em plena Europa não é admis­sível que se pro­mova uma guerra de expan­são como faziam em out­ros tem­pos.

A resposta tímida dos líderes europeus e amer­i­canos á escal­ada bélica de Putin con­tra a Ucrâ­nia em muito se assemel­hou ao com­por­ta­mento dos seus ante­ces­sores quando Hitler ini­ciou o seu pro­jeto expan­sion­ista pela Europa nos anos trinta. Em nome da paz fiz­eram con­cessões que não deviam e acabaram tendo a guerra que temiam do mesmo jeito.

Foi sentindo essa “covar­dia” que no mesmo dia em começou a invadir a Ucrâ­nia uma porta-​voz do gov­erno russo já lançou ameaças de guerra ou ocu­pação mil­i­tar con­tra a Fin­lân­dia e a Sué­cia. Pois é, até con­tra a Sué­cia que todos os anos dis­tribui prêmios aos que se desta­cam nos vários cam­pos do con­hec­i­mento e tam­bém aos que desta­cam na luta pela paz.

Quem serão os próx­i­mos a serem ameaça­dos? A Polô­nia (nova­mente), a Hun­gria, a Romênia …

Claro que se com­preende que se deve sem­pre bus­car todas as alter­na­ti­vas antes de se par­tir para uma guerra sem vence­dores, mas precisa-​se enten­der que a linha que não pode ser cruzada é a linha de fron­teira.

Uma nação não pode invadir outra, muito menos sem qual­quer motivo.

Foi o que a Rús­sia fez.

Os cidadãos do mundo inteiro, nas condições esta­b­ele­ci­das no primeiro pará­grafo deste texto enten­deram isso. Os protestos mundi­ais con­tra a guerra e con­tra Putin são a prova disso.

Os cidadãos enten­demos que não é pos­sível nos ocul­tar­mos por atrás de uma des­culpa qual­quer para jus­ti­ficar o injus­ti­ficável.

Quase todos os gov­er­nantes do mundo – ape­sar dos seus inter­esses com­er­ci­ais ou geopolíti­cos –, apressaram-​se em con­denar a invasão e guerra inten­tada pela Rús­sia con­tra a Ucrâ­nia.

As exceções foram o gov­er­nante da China, que tem inter­esse em ela própria invadir e ocu­par Tai­wan e ocupa desde sem­pre o Tibete; da Bielor­rús­sia, de Cuba e da Venezuela.

O Brasil, con­trar­iando sua longa tradição diplomática “patina” nesta questão.

Ape­sar do embaix­ador brasileiro ter assi­nado uma moção de repú­dio à invasão da Ucrâ­nia pela Rús­sia, até hoje o pres­i­dente brasileiro não fez o mesmo, limitando-​se a dizer que a posição do país é aquela expres­sada nos organ­is­mos inter­na­cionais.

Muito emb­ora veja diver­sos esbir­ros defend­endo esse posi­ciona­mento muitos até jus­ti­f­i­cando o que fez o Putin, trata-​se de um dos maiores absur­dos diplomáti­cos em tem­pos recentes.

Os inter­esses do Brasil no cenário global vão muito além de garan­tir o fer­til­izante russo para a nossa agri­cul­tura, como vi um âncora de um tele­jor­nal defender.

Inter­esses econômi­cos não podem e não devem se sobre­porem ao imper­a­tivo ético-​moral de se con­denar uma injus­ti­fi­cada invasão de uma nação por outra.

O sen­hor Bol­sonaro não ape­nas insis­tiu em vis­i­tar a Rús­sia – e não digo que não o fizesse desde que tivesse o cuidado de aproveitar para vis­i­tar a Ucrâ­nia tam­bém –, como fez questão dizer que estava solidário aquele país. Tudo isso quando estava claro que a invasão era emi­nente. Fez mais: vendeu a fake news que impedira “ter­ceira guerra mundial”, con­fir­mada a invasão e a guerra, gan­hou o “meme” que impediu a ter­ceira guerra mundial mais esque­ceu de “com­bi­nar com os rus­sos”. Parafrase­ando a famosa piada nacional.

Além de não ter tido o cuidado de vis­i­tar e tam­bém prestar “sol­i­dariedade” a Ucrâ­nia até o momento não con­de­nou a invasão russa.

O com­por­ta­mento dúbio do gov­erno brasileiro sus­ci­tou um pedido de reunião dos embaix­adores de diver­sos países e até uma lig­ação do Secretário de Estado Amer­i­cano ao chanceler brasileiro cobrando posi­ciona­mento claro.

Somente depois disso veio a man­i­fes­tação no Con­selho de Segu­rança da ONU.

A mim resta claro que o pres­i­dente brasileiro, a despeito de toda a “macheza” que dia sim e no outro tam­bém diz pos­suir, não con­segue resi­s­tir a um “macho alfa”, antes era ado­rador de Trump, agora de Putin, a quem chama de amigo.

Só isso para jus­ti­ficar que con­trarie toda tradição diplomática brasileira e até os nos­sos inter­esses nacionais e não se man­i­feste como dev­e­ria con­tra Putin e a invasão russa a Ucrâ­nia.

Ora, se o gov­erno brasileiro acha “nor­mal” a ponto de não con­denar a invasão de uma nação por outra, o que, em tese, impediria que out­ras nações de arvo­rasse do dire­ito de invadir o Brasil e tomar a Amazô­nia? Pode­riam ale­gar, por exem­plo, o inter­esse cole­tivo mundial a um ambi­ente saudável e que o Brasil não estaria pro­te­gendo a flo­resta, “um patrimônio de todos”; pode­riam ale­gar, tam­bém, a falta de pro­teção aos povos indí­ge­nas e o cos­tumeiro con­flito de garimpeiros con­tra essas pop­u­lações.

Não foi com des­culpa semel­hante que Putin ini­ciou a invasão da Ucrâ­nia?

Registre-​se que o pres­i­dente Bol­sonaro não está soz­inho na omis­são de con­denar Putin e Rús­sia pela injus­ti­fi­cada invasão à Ucrâ­nia, o seu prin­ci­pal adver­sário na dis­puta deste ano, o ex-​presidente Lula, tam­bém é outro que covarde­mente se omite de uma con­de­nação vig­orosa a esta guerra sem sen­tido em pleno século XXI.

O seu par­tido, PT, o máx­imo que fez foi emi­tir uma nota “chocha” cheia de vaselina que não diz nada com nada do que inter­essa, sem con­tar que a ban­cada do Senado emi­tiu nota de apoio a invasão, justificando-​a e con­de­nando os Esta­dos Unidos.

Em meio tragé­dia humana que atrav­es­samos não deixa de ser engraçado assi­s­tir Lula, Bol­sonaro e Maduro “pagando pau” para Putin.

Em meio a tan­tos absur­dos que assisto neste episó­dio triste, já vi pro­fes­sor de história dizer que a invasão da Rús­sia “é para pro­te­ger os irmãos ucra­ni­anos”; vi jor­nal­ista dizer que o Brasil não deve dizer nada para “não aumen­tar o preço do nosso arroz com fei­jão”, vi até uma dep­utada que tam­bém se diz pro­fes­sora de dire­ito ten­tar jus­ti­ficar o com­por­ta­mento dúbio do pres­i­dente da República em não con­denar a invasão.

Fiquei com a impressão de que a “con­sti­tu­cional­ista” nunca chegou a estu­dar ou mesmo pas­sar a vista no artigo 4º da nossa Con­sti­tu­ição.

No Brasil tam­bém tem disso: con­sti­tu­cional­ista que não con­hece a Con­sti­tu­ição.

Lá, na Con­sti­tu­ição está claro, basta saber ler, ver­bis:

Art. 4º A República Fed­er­a­tiva do Brasil rege-​se nas suas relações inter­na­cionais pelos seguintes princí­pios: I — inde­pendên­cia nacional; II — prevalên­cia dos dire­itos humanos; III — autode­ter­mi­nação dos povos; IV — não-​intervenção; V — igual­dade entre os Esta­dos; VI — defesa da paz; VII — solução pací­fica dos con­fli­tos; VIII — repú­dio ao ter­ror­ismo e ao racismo; IX — coop­er­ação entre os povos para o pro­gresso da humanidade; X — con­cessão de asilo político”.

As autori­dades do país, prin­ci­pal­mente o pres­i­dente, que fala em nome do país, só pre­cis­aria se man­i­fes­tar na estrita deter­mi­nação do artigo acima. Nada além disso.

Já sabe­mos o resul­tado da guerra: o Ucrâ­nia por mais guer­reira que seja não terá forças sufi­cientes para resi­s­tir ao pode­rio russo, enfrentado soz­inha uma guerra desigual, por isso mesmo os cidadãos de todo mundo deve fazer tudo que puder para repu­diar e con­denar tal agressão.

O inva­sor russo pode ate vencer o con­flito pela força das armas, mas nós, cidadãos e cidadãs de todo o mundo podemos derrotá-​lo com a força das ideias.

Abdon Mar­inho é advo­gado.