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UMA NOVI­DADE DO SÉCULO PASSADO.

Escrito por Abdon Mar­inho

UMA NOVI­DADE DO SÉCULO PASSADO.

DESDE que, suposta­mente, Mar­garet Thatcher, então Primeira-​ministra do Reino Unido, disse que o “social­ismo dura enquanto durar o din­heiro dos out­ros”, ou algo semel­hante, os assim chama­dos gov­er­nos pro­gres­sis­tas têm se des­do­brado para provar que ela estava certa.

Eles partem do pres­su­posto de que não existe riqueza hon­esta. Se você pros­perou – não importa as pri­vações que pas­sou, se acor­dou de madru­gada ou se foi dormir tam­bém na madru­gada por está tra­bal­hando incansavel­mente –, tem que pagar mais e mais impos­tos para sus­ten­tar aque­les que nunca tiveram dis­posição para o labor. Impres­siona que se dizem defen­sores dos “tra­bal­hadores”. A bem da ver­dade há um ind­is­farçável pre­con­ceito con­tra aque­les que os tra­bal­ham, con­tra aque­les que pro­duzem alguma coisa e que faz o país crescer.

Agora mesmo, por ocasião da dis­cursão sobre o lim­ite de gas­tos do poder público ou da urgente e necessária reforma da pre­v­idên­cia não são poucos os que atribuem aos empresários a respon­s­abil­i­dade pelo infortúnio do país. Exigindo maior cobrança de trib­u­tos e fim de todos e quais­quer incen­tivos fis­cais. Uns mais auda­ciosos chegam a dizer que um dos respon­sáveis pelo descon­t­role das finanças públi­cas e prev­i­den­ciária seria decor­rente da cri­ação do “sim­ples» uma modal­i­dade de cobrança para peque­nas e médias empre­sas, com deter­mi­nado fat­u­ra­mento, que pas­saram a pagar seus impos­tos através de uma única guia. Segundo os sábios esse tipo de incen­tivo rep­re­sen­taria para os cofres públi­cos um pre­juízo de 80 bil­hões de reais.

Trata-​se obvi­a­mente de uma insanidade. Os tra­bal­hadores e empresários do país já pagam trib­u­tos em excesso. São quase seis meses por ano tra­bal­hando só para arcar com a carga trib­utária e nem se fale nos demais pre­juí­zos decor­rentes da buro­c­ra­cia excepcional.

Se há dis­torções – e acred­i­ta­mos que exis­tam – elas pre­cisam ser cor­rigi­das, mas a classe pro­du­tiva não pode sofrer com a ele­vação da carga trib­utária, mais uma vez.

Os gov­er­nos têm o pés­simo hábito de só enx­er­gar no aumento de impos­tos a solução para resolver suas inefi­ciên­cias. Os gov­er­nos ditos pro­gres­sis­tas têm essa verve ainda mais acen­tu­ada pelo pre­con­ceito que trata­mos acima.

Vejamos um exem­plo dos nos­sos dias. O gov­erno “comu­nista» do Maran­hão resolveu ele­var os trib­u­tos e taxas. Só a alíquota de ICMS de alguns pro­du­tos pas­sou de 12% (doze por cento) para 18% (dezoito por cento); de 25% (vinte e cinco por cento) para 27% (vinte e sete por cento). Isso sig­nifica dizer, por exem­plo, que o cidadão que, numa conta de luz – que atinge todo mundo –, se paga R$ 12,00 (doze reais) na conta de R$ 100,00 (cem reais) pas­sará a pagar R$ 18,00 (dezoito reais), são R$ 6,00 (seis reais) que vai sair do pai de família que pre­cisa ali­men­tar a família. Isso num momento em que país exper­i­menta a crise mais aguda dos últi­mos anos, com o desem­prego alcançando quase 12 mil­hões de brasileiros.

O aumento do ICMS alcança os com­bustíveis, o que sig­nifica aumen­tará o custo de pas­sagens, ali­men­tos e tudo que dependa de trans­porte, ainda que digam que aumento não alcança o diesel, sabe­mos que ainda indi­re­ta­mente esse aumento virá.

Ficare­mos ape­nas nestes dois exem­p­los para ver­i­ficar o quanto é absurdo esse aumento de impostos.

Li, numa mídia qual­quer, que o gov­er­nador Flávio Dino atribuiu a rejeição à ele­vação da carga trib­utária aque­las pes­soas que são favoráveis ao esta­b­elec­i­mento do teto de gas­tos públi­cos e a reforma da pre­v­idên­cia ou os ladrões do din­heiro público e, ainda, aos que locu­ple­taram a vida inteira e agora perderam a boquinha. Ledo engano. Todos são con­tra o aumento de trib­u­tos implan­tado pelo exec­u­tivo com a conivên­cia da Assem­bleia Leg­isla­tiva, inclu­sive aque­les que defen­dem o teto e a reforma da previdência.

Se tem alguém defend­endo este despautério deve ser aque­les que estão obnu­bi­la­dos pelos encan­tos do poder e não se dão conta dos efeitos nefas­tos para sociedade, sobre­tudo para os mais necessitados.

Ainda não ouvi um amigo meu dizer que chegou ao posto de gasolina e ficou felicís­simo, soltou rojões ao encon­trar o com­bustível mais caro, dez ou quinze cen­tavos. Talvez exis­tam, eu que não os encontro.

Enten­demos que os gov­er­nos pre­cisam reduzir seus cus­tos, prin­ci­pal­mente os da máquina pública, quase sem­pre exces­siva e ine­fi­ciente. Neste sen­tido, o gov­erno do sen­hor Flávio Dino, foi um pri­mor em não seguir as regras bási­cas de um gov­erno enx­uto e eficiente.

Isso se deve à inca­paci­dade de ouvir opiniões de quem quer que seja. Lem­bro que antes mesmo do gov­erno começar e, tam­bém, logo depois, escrevi aler­tando para a crise que se aviz­in­hava e dizia que o gov­erno pode­ria e dev­e­ria fazer refor­mas estru­tu­rais na máquina pública. Tinha tudo para fazê-​las.

Como se dizia lá no inte­rior, o sen­hor Dino começou o gov­erno com a faca e o queijo na mão. Suce­dia a um grupo político no poder por quase 50 anos; elegeu-​se, como se diz na jargão «sem dever nada a ninguém”; sem gas­tos exces­sivos, com estado finan­ceira­mente em ordem. Pode­ria muito bem ter dado uma “limpa» no gov­erno, enx­u­gar toda a máquina pública e ainda, depois de colo­car todos os “seus», sobrar uma infinidade de vagas. O que se sabe é que não tirou quase ninguém e ainda colo­cou os «seus». O resul­tado, segundo dizem, é que o gov­erno do Maran­hão que ia muito bem, obri­gado, “inchou» o estado e, agora, começa a enx­er­gar a crise pelo retro­vi­sor e ela chegando cada vez mais rápido.

Na vã ten­ta­tiva de suprir as neces­si­dades, o gov­er­nador do estado vestiu-​se de Papai Noël às aves­sas: invés de trazer um saco com pre­sentes, nos traz um saco com mal­dades. Pior, ainda cobra sol­i­dariedade da pop­u­lação enquanto lhe enfia a faca nas finanças pes­soais, com a ele­vação de trib­u­tos que nat­u­ral­mente têm efeitos em cascata.

Vejam, até sou com­preen­sivo com gov­er­nos em tem­pos de crise, sei das difi­cul­dades pelas quais pas­sam os gestores, as cobranças, o din­heiro que não rende para nada. Mas no caso do gov­erno do Maran­hão a crise era anun­ci­ada, pre­vista, e ainda assim, não fiz­eram o dever de casa, pelo con­trário, agi­ram como surdos.

Agora, com caldo der­ra­mado, tenta – usando toda mídia que lhe é sim­pática –, impor à sociedade que o aumento de impos­tos é uma coisa muito boa, e que, aque­les que se opõe são os que tiveram inter­esses con­trari­a­dos; que roubaram o estado por toda vida; os antipa­trióti­cos, etc.

Me per­doem a sin­ceri­dade, mas essa ideia é absurda.

As medi­das apre­sen­tadas são ino­por­tu­nas e pouco efi­cazes. A pop­u­lação maran­hense passa por um momento de extrema neces­si­dade não dev­e­ria ser instada a con­tribuir com mais impos­tos, prin­ci­pal­mente quando o gov­erno não foi sufi­cien­te­mente efi­ciente na hora de fazer sua parte.

Como os impos­tos são «impos­tos» não temos como deles fugir. Mas pagare­mos o acréscimo na conta de luz, água, tele­fone e com­bustível, além dos demais, com imensa contrariedade.

Não con­tam com a minha sol­i­dariedade. O Maran­hão não crescerá com o empo­brec­i­mento do nosso povo.

Abdon Mar­inho é advogado.

A REPÚBLICA PERDEU O JUÍZO.

Escrito por Abdon Mar­inho

A REPÚBLICA PERDEU O JUÍZO.

QUANDO da sua demis­são do cargo de min­is­tra do meio ambi­ente, oca­sion­ada por sua dis­cordân­cia com a política para o setor imple­men­tada pelo ex-​presidente Lula e lev­ada a cabo pela ger­ente e depois pres­i­dente Dilma Rouss­eff, a então min­is­tra, Marina Silva, disse uma frase que lem­bro até hoje: «pre­firo perder a cabeça a perder o juízo».

Lembrei-​me desta frase ao exam­i­nar o momento pelo qual passa o país. A impressão que resta, não é que esta ou aquela pes­soa perdeu o juízo, mas que a República perdeu o juízo. Isso em pre­juízo da democ­ra­cia que imag­iná­va­mos tri­un­far no Brasil.

Ao invés disso temos um país em sus­penso, onde o que mais ouve é que esta­mos à beira de um abismo e que exper­i­men­ta­mos a mais grave crise insti­tu­cional dos últi­mos anos, com o enfraque­c­i­mento de todos os poderes.

A agudeza do momento revelou-​se ainda maior quando o Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF viu-​se obri­gado a bus­car uma solução de con­senso – uma meia-​sola, uma gam­biarra inter­pre­ta­tiva da Con­sti­tu­ição – a fim de evi­tar o colapso institucional.

Ape­sar disso ficou ruim para todos: para o STF, para o Senado da República, para Câmara dos Dep­uta­dos, para o Exec­u­tivo, para a democracia.

A vida das gam­biar­ras insti­tu­cionais é curta, só se sus­tenta até a próx­ima crise chegar, maior e mais aguda, o que não demor­ará a acon­te­cer, aliás já está em curso.

A imagem do país é a de uma nação onde os poderes con­sti­tuí­dos não se respeitam e, tam­bém por isso, não têm o respeito da população.

Não me recordo de ter ouvido tan­tos ques­tion­a­men­tos a respeito dos acon­tec­i­men­tos jurídicos/​políticos quanto nos últi­mos dias. Até pes­soas que imag­i­nava total­mente alheias aos acon­tec­i­men­tos das cox­ias dos palá­cios vieram me inda­gar sobre o que achava da decisão fulana ou da reação sicrana e o que viria depois de tudo isso.

A primeira per­gunta que sem­pre fazem é: quem acho que está certo? A resposta que tenho dado até aqui é uma só: todos estão errados.

Vive­mos uma história sem mocin­hos. Não deve­mos nos iludir: a maior força motriz de todos esses per­calços é a vaidade. As autori­dades foram acometi­das pela sín­drome da mari­posa, não con­seguem fugir das luzes, dos holo­fotes das mídias.

A tragé­dia começa com um Min­istério Público Fed­eral – mais do que nunca pre­ocu­pado em se con­sti­tuir em quarto poder da República –, querendo leg­is­lar e apre­sen­tando um con­junto de medi­das que, ressal­vadas os bons propósi­tos de seus ide­al­izadores, acabariam por ferir de morte con­quis­tas sec­u­lares da civilização.

Não temos como con­cor­dar com medi­das que, por exem­plo, limita o alcance do habeas cor­pus, que admite provas ilíc­i­tas em proces­sos, que cria a figura do dela­tor profis­sional ou o bolsa delação, ape­nas para citar estas medidas.

Não temos qual­quer dúvida que neces­si­ta­mos tornar mais efi­ciente o com­bate à cor­rupção, mas esse com­bate não pode ser feito com ofen­sas as garan­tias con­sti­tu­cionais, com a inse­gu­rança jurídica ou com a apli­cação de medi­das do tipo con­dene antes apure depois.

A Câmara dos Dep­uta­dos – emb­ora por motivos de cunho pes­soal, leg­is­lando clara­mente em ben­efi­cio do inter­esse dos seus mem­bros – não agiu, de todo, com desac­erto, ao colo­car um freio nas pre­ten­sões do Min­istério Público.

Desproposi­tada foi a reação do MP chegando ao cúmulo de ameaçar o Con­gresso Nacional e a Presidên­cia da República se o pro­jeto lei em questão fosse san­cionado. Mais, ameaçaram renun­ciar, cole­ti­va­mente, aos proces­sos vin­cu­la­dos à Oper­ação Lava Jato.

Causa per­plex­i­dade que pes­soas instruí­das não saibam qual é o seu papel na equação do poder.

Vamos com­bi­nar, não faz qual­quer sen­tido procu­radores da República arvorarem-​se, por uma con­trariedade justa ou não, do dire­ito de chan­tagear os demais poderes.

Nada con­tra a indig­nação, até jus­tas e, afora as críti­cas pon­tu­ais as pre­ten­sões min­is­te­ri­ais – aqui não se dis­cute esse mérito –, o que achei absurdo foi despropósito de sua reação, o chilique institucional.

Por mais inusi­tado que possa pare­cer, nem havíamos nos recu­per­ado do primeiro choque insti­tu­cional, foi a vez, logo na segunda-​feira seguinte, de um min­istro do STF, Marco Aurélio Mello, afas­tar, mono­crati­ca­mente, o pres­i­dente do Senado da República e do Con­gresso Nacional, colo­cando mais lenha na fogueira.

Ora, qual­quer cidadão, que não tenha acabado de chegar de Marte, sabe que motivos exis­tem – de sobras –, não ape­nas para afas­tar o sen­hor Cal­heiros da Presidên­cia do Senado, do cargo de senador, da vida pública e até mesmo para trancafiá-​lo numa cela. Entre­tanto, não temos a menor dúvida que a decisão do min­istro do STF, foi, para dizer o mín­imo, extem­porânea. Não faz sen­tido que um min­istro, soli­tari­a­mente, afaste um pres­i­dente de poder, ainda que seja o velho Renan Cal­heiros de sempre.

Pois é, con­ce­dida a lim­i­nar da dis­cór­dia, con­fesso, pou­cas vezes, desde que acom­panho a vida política no país, assisti tan­tos ques­tion­a­men­tos à uma decisão judi­cial. As dúvi­das e inda­gações sobre a mesma não par­tiam ape­nas de pes­soas lig­adas ao mundo jurídico ou político, até cidadãos comuns, como motoris­tas, donas de casa, servi­dores públi­cos, etc., se acharam no dire­ito de opinar sobre a decisão do min­istro. Muitos para dis­cor­dar ou enx­er­gar moti­vações das mais vari­adas na mesma.

A inusi­tada lim­i­nar gerou des­do­bra­men­tos igual­mente inusi­ta­dos, como a Mesa do Senado, em decisão de duvi­dosa legit­im­i­dade – emb­ora for­mal­mente instruída –, dizer, tex­tual­mente que não a iria cumprir. Não até que o plenário do Supremo Tri­bunal Fed­eral, decidisse por sua val­i­dação. Tem­pos estranhos.

E, ao que parece, à Mesa do Senado assis­tia razão, tanto que o pleno do STF, inovou ao criar a figura do meio-​presidente do Senado da República: aquele que pode exercer a presidên­cia, como pres­i­dente do Con­gresso Nacional, pro­mul­gar emen­das à con­sti­tu­ição, mas que não pode par­tic­i­par da linha sucessória do presidente.

Como se diz em juridiquês, data venia, está tudo errado.

Mas, como tudo que está ruim, o Brasil prova que pode pio­rar, não bas­tou ao STF inven­tar a jabu­ti­caba jurídica, pas­sou à sociedade a impressão de que par­tic­i­para de uma espé­cie de «acordão» des­ti­nado a sal­var a presidên­cia do sen­hor Renan Cal­heiro. Não se trata nem de dis­cu­tir o acerto ou não da decisão, mas sim o grave descrédito que pas­sou a alcançar as decisões da mais ele­vada corte do país.

Quem poderá sentir-​se seguro se acred­ita que a Corte Suprema deixou de ser uma corte de Justiça e pas­sou a ser de política? Quem pode­ria imag­i­nar que uma decisão de um min­istro do STF pode­ria ser mais ques­tion­adas que decisões de uma câmara de vereador de qual­quer rincão, ainda o menor? É uma lástima.

O pior é que o filme de ter­ror parece não ter fim.

Ainda no dia da decisão em que o STF inau­gurou a jabu­ti­caba jurídica, o min­istro Marco Aurélio de Melo, saiu-​se com uma frase absurda, para dizer o mín­imo, teria dito: «ao menos saí-​me bem per­ante a opinião pública». Chego a duvi­dar que tenha dito tal coisa. Não isso que se espera de um min­istro do STF. O que a sociedade espera da der­radeira trincheira da cidada­nia, não é que fique «bem» per­ante a opinião pública ou gru­pos de pressão ou de quem quer que seja. A única coisa que espera, que se exige, é Justiça, é que ten­hamos uma insti­tu­ição na qual pos­samos deposi­tar nos­sas últi­mas esper­anças. Só isso.

A cada dia que passa esse mín­imo exigível se torna cada vez mais dis­tante. Não tem um dia em que os min­istros do STF não sejam notí­cia nos meios de comu­ni­cação, aliás, que não sejam pro­tag­o­nistas de notícias.

Agora mesmo temos um novo con­flito entre poderes por conta de uma decisão do min­istro Fux que invade a esfera interna do processo leg­isla­tivo, man­dando que deter­mi­nada matéria volte para ser nova­mente apreciada.

E, mais uma vez, temos uma decisão de um min­istro sendo objeto de ques­tion­a­men­tos não ape­nas pelos inte­grantes do Con­gresso Nacional, mas, tam­bém, por expoentes do Poder Judi­ciário, como se deu com o min­istro Gilmar Mendes, ques­tio­nando, pub­li­ca­mente, como já fiz­era ante­ri­or­mente, uma decisão de um colega de tribunal.

E, volto a repe­tir, não se tratar aqui de nos fil­iar­mos a esse ou aquele entendi­mento, mas sim de ques­tion­ar­mos a «fulaniza­ção» das decisões judi­ci­ais. Como podemos con­fiar em min­istros que têm suas decisões sendo ques­tion­adas pub­li­ca­mente, por todos os meios de comu­ni­cação, por seus cole­gas de tribunal?

O que esta­mos viven­ciando no Brasil é algo nunca visto. As autori­dades perderam a noção do rep­re­senta seus destem­peros para a segu­rança da sociedade e o for­t­alec­i­mento de suas instituições.

A República perdeu o juízo.

Abdon Mar­inho é advogado.

SOBRE DITADURAS E OUT­ROS MALES.

Escrito por Abdon Mar­inho

SOBRE DITADURAS E OUT­ROS MALES.

DITA­DORES não me fasci­nam. Tam­bém nunca nutri qual­quer sim­pa­tia por qual­quer ditadura. Seja ela de dire­ita, esquerda, civil ou mil­i­tar. A elas sem­pre reservei aque­les sen­ti­men­tos que certa vez Ulysses Guimarães bem descreveu: ódio e nojo.

Emb­ora mil­i­tante político desde muito cedo – já nos anos oitenta estava envolvido no movi­mento estu­dan­til par­tic­i­pando da cri­ação de grêmios, cam­panha das dire­tas, da con­sti­tu­inte, etc –, nunca me ani­mou a defesa de mod­e­los autoritários. Sem­pre com­preendi que a democ­ra­cia está entre as maiores con­quis­tas da vida civ­i­lizada. A ideia da existên­cia de ditaduras «boas» nunca fez minha cabeça. Ao meu sen­tir ditadura é ditadura e, por isso mesmo, um mal em si.

Defender que con­quis­tas humanas: saúde, edu­cação, amparo social, jus­ti­fi­cam que se abram mão de liber­dades civis, o dire­ito de expressão, de ir e vir, de manter-​se junto aos seus, de tra­bal­har e pos­suir bens nunca me pare­ceu algo razoável.

Sem­pre tive na liber­dade o maior bem do ser humano, maior mesmo que a própria vida. Nunca vi sen­tido na vida sem liberdade.

A restrição à liber­dade em nome de deter­mi­nadas con­quis­tas sem­pre me pare­ce­ram uma cortina de fumaça aos que pre­tenderam ou pre­ten­dem a per­pet­u­ação no poder para come­ter toda a sorte de des­man­dos, vio­lên­cia e apro­pri­ação do patrimônio público, quando não a destru­ição de toda a nação.

As auto­de­nom­i­nadas «esquer­das» sem­pre tiveram que con­viver com esse para­doxo. Ao momento em que sem­pre cobraram liber­dade e democ­ra­cia nos seus países, silen­ciam de forma obse­quiosa às vio­lações das liber­dades nos chama­dos «países lab­o­ratórios» da exper­iên­cia comu­nista. Mais que isso, defen­dem, em pleno século 21, as restrições às liber­dades (todas elas) com unhas e dentes, jus­ti­fi­cam o mor­ticínio, as prisões políti­cas, o ostracismo e o exílio.

O que con­sidero mais patético de tudo isso é que nen­hum daque­les que vemos como fer­ren­hos defen­sores dos regimes autoritários topariam viver tal exper­iên­cia, muito pelo con­trário, para estes valentes a liber­dade deve ser de forma mais ampla e irrestrita possível.

O que nos levar a crer que ditadura para os países dos out­ros é refresco.

São de tal forma defen­sores da liber­dade de expressão que se acham no dire­ito de defend­erem as restrições às liber­dades como um dire­ito legit­imo de pen­sar difer­ente. Enten­deram? Pois é, eu não entendi a bril­hante con­clusão a que chegou uma impor­tante lid­er­ança polit­ica do nosso estado. Neste raciocínio qual­quer crítica a um mod­elo dita­to­r­ial trata-​se de uma intol­erân­cia a um modo de «pen­sar diferente».

Não deixa de ser curioso ver pes­soas que não con­seguem ficar cinco min­u­tos longe do What­sApp ou afas­ta­dos dos seus smart­phones, defend­erem restrições às liber­dades mais fun­da­men­tais dos seres humanos, den­tre as quais a de se expres­sarem livremente.

Vou além, o Brasil e out­ros países do con­ti­nente exper­i­men­ta­ram a tragé­dia de viver sob ditadura. Estas ditaduras cei­faram mil­hares de vidas dos seus opos­i­tores. No mesmo período, e depois dele, a ilha-​prisão dos irmãos Cas­tro fez o mesmo. Mil­hares de assas­si­natos, uns falam em 20 mil, out­ros em 12 mil, o certo e, não dúvida alguma disso, que mil­hares foram os que pere­ce­ram por sua oposição ao régime, inclu­sive, muitos por crime de opinião, perderam a vida diante dos tris­te­mente famosos «paredóns». Out­ros mil­hares ten­tando fugir da ilha-​prisão.

Seus autores con­fes­saram tais práti­cas em fóruns inter­na­cionais. Os próprios líderes do país caribenho, mataram dire­ta­mente inúmeras víti­mas. Não sou eu que digo. Tem con­fis­são, tem vídeo, tem fotografia.

Há difer­enças obje­ti­vas nas vidas per­di­das? Não. Claro que não. A vida de cada ser humano tem a mesma importância.

Pois é, «nos­sas esquer­das» acham que os brasileiros, argenti­nos, uruguaios que perderam a vida durante os regimes autoritários nestes países valem mais que os os mil­hares que perderam a vida em Cuba, na Coréia do Norte, na URSS, ou noutros países na out­rora cortina de ferro.

A mim, não parece razoável que pes­soas que dizem víti­mas de perseguição, que enfrentaram as auguras de ditaduras, tratem com dois pesos e duas medi­das suas víti­mas. Ou será que as víti­mas do régime cubano que tiveram seus dire­itos vio­la­dos nas últi­mas cinco décadas fiz­eram por mere­cer e por isso foram assas­si­nadas? As mil­hares de famílias apartadas de seus entes queri­dos mere­ce­ram isso? Os crimes que pas­sam da pes­soa do con­de­nado na Cor­eia do Norte ou os cam­pos de tra­balho forçado podem ser recon­hecido como práti­cas legítimas?

Não encon­tro quem esclareça tais contradições.

Aqui, no Brasil, dizem que um processo con­sti­tu­cional que afas­tou a pres­i­dente Dilma foi um golpe, o vice-​presidente, eleito com ela na mesma chapa e com os mes­mos votos, um farsante golpista, mas acham nor­mal que nas vir­tu­osas democ­ra­cias cubana, norte-​coreana ou venezue­lana, o poder vá pas­sando de pai para filho, neto, irmão ou o que o valha, quase sem­pre por des­ig­nação. Talvez con­sid­erem tais proces­sos mais legí­ti­mos que o pre­visto na leg­is­lação brasileira.

Não, meus sen­hores, não rendo hom­e­nagem a dita­dor nen­hum. Ditaduras não me seduzem.

Abdon Mar­inho é advogado.