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O DESAS­TRE CIV­I­LIZA­TÓRIO BRASILEIRO.

Escrito por Abdon Mar­inho

O DESAS­TRE CIV­I­LIZA­TÓRIO BRASILEIRO.
OUTRO DIA ouvi alguém dizer que Brasil é um país que envel­he­ceu sem pas­sar pela fase do amadurec­i­mento. Referia-​se, pois ao fato de não ter­mos aproveitado a imensa pop­u­lação eco­nomi­ca­mente ativa para igualar-​se a out­ras nações dos chama­dos países em desen­volvi­mento.
O Brasil, com tan­tas condições nat­u­rais favoráveis e, até, com uma pop­u­lação que poderíamos dizer «na medida certa», não saiu do lugar, tendo retro­ce­dido em diver­sos setores. O país tem ficado para trás.
A India, uma nação com desafios bem maiores que os nos­sos, seja pelas imen­sas desigual­dades, por uma cul­tura de cas­tas, por uma enorme pop­u­lação, quase seis vezes a nossa, com prob­le­mas sérios para ali­men­tar a todos, com base ter­ri­to­r­ial menor e diver­sos prob­le­mas climáti­cos, não faz muito tempo bateu um recorde na cor­rida espa­cial ao colo­car mais de uma cen­tena de satélites em órbita simul­tane­a­mente, feito nunca alcançado pelas nat­u­rais «super­potên­cias».
Não bas­tasse a crise moral e ética que tomou de conta do Brasil nos últi­mos anos, com quadrilhas incrus­tadas nos mais altos escalões da República, o ano de 2017, teve iní­cio com as bar­báries nos presí­dios, com seres humanos aos quais o Estado tomou para si a respon­s­abil­i­dade de cuidar e pro­te­ger, sendo decap­i­ta­dos, esquar­te­ja­dos, exibidos como troféu pelos ver­dadeiros sen­hores dos presí­dios: os chefes das quadrilhas que dão as ordens lá den­tro e aqui, do lado de fora.
E, haverão de dizer: — eram ban­di­dos, não tinha nen­hum inocente por lá, mere­ce­ram e mere­cem tudo que lhes acon­te­ceu e acon­tece.
Pois é, mal se saiu da crise dos presí­dios tive­mos outro esclare­ce­dor exem­plo do que é a sociedade brasileira. O exem­plo nos chegou ao vivo e a cores vindo do estado do Espírito Santo. Lá, por conta do aquar­te­la­mento de poli­ci­ais mil­itares, assistiu-​se a uma espé­cie de faroeste fora de época, com a pop­u­lação tran­cada por mais de uma sem­ana den­tro de casa, já sofrendo, além da pri­vação da liber­dade a pri­vação de ali­men­tos. Lazer, vis­i­tar ami­gos e par­entes seria algo impen­sável, alguns que arriscaram acabaram por pagar com os bens e até com a vida. Vitória e out­ras cidades maiores viveram aquilo assistíamos no cin­ema, no século pas­sado: tornaram-​se cidades sem lei. E o pior ainda estava por vir. Quem pode­ria imag­i­nar que, além dos mar­gin­ais, os «cidadãos de bem» iriam aproveitar a ausên­cia de poli­ci­a­mento para pro­mover saques em lojas de roupas, joal­he­rias, etc.?
A visão mais escan­car­ada da incivil­i­dade brasileira foi exibida em redes soci­ais e de tele­visão, para os resto do país é do mundo. Mas esse lado nefasto do brasileiro é mais comum que se possa imag­i­nar. De norte a sul do país, basta um cam­in­hão de mer­cado­rias (seja o que for) ameaçar tombar para que «pop­u­lares», «cidadãos de bem» avancem sobre a carga com gri­tos de «perdeu», «perdeu».
Que país é esse onde a pop­u­lação ao invés de indignar-​se com rou­bos – mesmo naque­les –, com víti­mas fatais, faz é achar nor­mal?
Mas tem coisa bem pior. Os com­er­ci­ais na tele­visão aler­tam, mas tam­bém é pos­sível con­statar no dia a dia a grave e crim­i­nosa explo­ração sex­ual de cri­anças. Dizem que são mais de 500 mil meni­nas e meni­nos explo­rados anual­mente no país. Isso não ocorre ape­nas nos grandes cen­tros. É sabido que ocorre em todos os lugares, mesmo nos menores municí­pios temos notí­cias deste tipo explo­ração. Esta sem­ana, numa reunião da qual par­ticipei, o pro­mo­tor da Comarca de Caru­ta­pera e Luís Domingues, pedia ao prefeito apoio para o enfrenta­mento desta questão neste último. Um municí­pio que tem pouco mais de 6 mil habi­tantes, onde todo mundo se con­hece enfrentando prob­le­mas desta natureza. Até bem pouco tempo demorava-​se décadas para que se reg­is­trasse um ato de vio­lên­cia.
Que tipo de sociedade faz vis­tas grossas ou admite a explo­ração de suas cri­anças?
Mas, se há algo pior que a explo­ração de cri­anças em si, esse algo pior é a explo­ração dar-​se por patrocínio ou conivên­cia ou incen­tivo dos pais ou de par­entes próx­i­mos, aque­las pes­soas que têm o dever ético e moral de protegê-​las.
No Brasil de agora nada mais abstrato que os con­ceitos de pater­nidade ou mater­nidade. Os pais não querem e não sen­tem quais­quer respon­s­abil­i­dades por aque­les que troux­eram ao mundo.
O desas­tre civ­i­liza­tório brasileiro, como temos visto, vai muito além da falta de edu­cação, do furar a fila em tudo que é ambi­ente, do desre­speito aos idosos, cri­anças, defi­cientes, do esta­ciona­mento em locais proibidos, do parar em fila dupla, tripla, da ten­ta­tiva de tirar van­tagem em tudo, do ofer­e­cer ou solic­i­tar «uma cerve­jinha» para se livrar de uma multa ou agilizar um doc­u­mento numa repar­tição.
A sociedade brasileira é a cúm­plice maior de todas as nos­sas maze­las. É ela que acha nor­mal o político des­on­esto fazer for­tuna roubando os cofres públi­cos, desde que este alcance lhe traga alguma van­tagem de caráter pes­soal. É isso que temos visto ao longo dos tem­pos. A cada eleição assis­ti­mos o quadro político se dete­ri­o­rar. Can­di­da­mente mil­hões de eleitores fin­gem descon­hecer o caráter dos seus rep­re­sen­tantes, suas fol­has cor­ri­das, seus pas­sa­dos.
Se bem anal­is­ar­mos, o brasileiro não vota mal. Ele vota nos seus iguais. Esse é nosso desas­tre maior.
Durante anos me iludi pen­sando que nosso maior prob­lema fosse a edu­cação. Não, não é. Nosso maior prob­lema é a civ­i­liza­ção – a falta dela.
Abdon Mar­inho é advogado.

OS MATA­DORES DE SONHOS.

Escrito por Abdon Mar­inho

OS MATA­DORES DE SONHOS.

UMA reportagem exibida por uma rede local de tele­visão chama a atenção para o drama, sem fim, da edu­cação ludovi­cense. Qual­quer pes­soa, com um mín­imo de com­pro­misso com a real­i­dade no seu entorno, não pode deixar de ver o deses­pero de pais, mães de famílias, mesmo os avós, que, acred­i­tando na edu­cação como fator deter­mi­nante para a mudança social, pas­sam noites em filas, bus­cando uma vaga para o filho na rede munic­i­pal de ensino.

Uma mãe, em deses­pero, não deixa de rev­e­lar sua revolta, como cidadã pagadora de impos­tos, pela humil­hação infligida pela admin­is­tração pública. Con­sciente, diz saber ser um dire­ito dos fil­hos a edu­cação sem que tenha que pas­sar dias e noites nas filas para garan­tir uma vaga.

Angús­tia maior é a sen­tida pelos estu­dantes que têm de supor­tar uma pre­ocu­pação que não é sua e, querendo estu­dar, não encon­tram apoio no poder público, como o caso de Maria Luiza já há três três meses fora da sala de aula e sem poder se matric­u­lar no sétimo ano posto que não con­cluiu o sexto ou do estu­dante Maciel Dias que falta con­cluir o sétimo ano do qual deve dois meses do ano de 2016 para ingres­sar no ano seguinte e se rev­ela pre­ocu­pado com a pos­si­bil­i­dade de vir a perder o ano.

Desde muito tempo que critico o desin­ter­esse das admin­is­trações da cap­i­tal (mas que serve para quase todos os municí­pios) com a edu­cação. Esta­mos em 2017 e, em ape­nas dois pará­grafos temos descorti­na­dos prob­le­mas sérios: a falta de vagas e a não con­clusão do ano letivo ante­rior, seja pelas greves – nem sem­pre jus­tas –, dos profis­sion­ais, seja pelas caras e infind­áveis refor­mas da rede de ensino, sem­pre pro­gra­madas – parece que de propósito –, para ocor­rerem quando os alunos dev­e­riam está em sala de aula.

O caos na edu­cação de São Luís parece não ter fim e são de todos os naipes.

Ainda hoje, a cap­i­tal, com mais de qua­tro­cen­tos anos, man­tém, com recur­sos públi­cos, cerca de 100 (cem) escol­in­has comu­nitárias que fun­cionam em pés­si­mas condições, em casas, com quar­tos minús­cu­los, trans­for­ma­dos em salas de aula, sem ilu­mi­nação nat­ural, sem insta­lações hidráuli­cas e elétri­cas cor­re­tas, sem insta­lações san­itárias decentes e suficientes.

Tais “arran­jos”, não podemos chamar isso de edu­cação – com as ressal­vas que sem­pre sabe­mos exi­s­tir –, nada mais são que instru­men­tos de dom­i­nação política que servem tam­bém ao propósito de enricar alguns esper­tal­hões. Muitas destas “escol­in­has» cobram men­sal­i­dade dos pais e ainda recebem recur­sos públi­cos do municí­pio e do gov­erno fed­eral. Pior, recebem, por per capita como se fizessem uma edu­cação de qualidade.

Os gov­er­nos munic­i­pais – a situ­ação não vem de agora pois já moro na ilha há mais de trinta anos e desde que cheguei acom­panho o prob­lema –, têm se mostra­dos inca­pazes de romper com um mod­elo de edu­cação que pode servir a tudo, menos para levar per­spec­ti­vas de mel­ho­ras à vida das crianças.

Deve servir, sim, para o toma lá da cá de pres­i­dentes de asso­ci­ações e vereadores, ao desvio de recur­sos públi­cos, à manutenção de famílias em cur­rais eleitorais e à corrupção.

Só isso jus­ti­fica que, em plena cap­i­tal do estado, em pleno 2017, ainda ten­hamos cerca de cem esco­las comu­nitárias, a maio­ria fun­cio­nando nas condições nar­radas acima servindo a rede pública.

Uma cap­i­tal com mais de qua­tro­cen­tos anos que não con­segue, sequer, ofer­e­cer vagas sufi­cientes aos estu­dantes da sua cir­cun­scrição, só pode ter muitos equívo­cos de gestão, sem con­tar o silên­cio cômodo dos órgãos de controle.

Será os pro­mo­tores de justiça e os procu­radores fed­erais con­hecem a real­i­dade destas esco­las comu­nitárias? Será que fiz­eram alguma visita incerta em algu­mas delas? Será que acom­pan­ham, com o rigor dev­ido, o gasto dos recur­sos públi­cos des­ti­na­dos à edu­cação? Como fun­cionam estas refor­mas sem fim, será que são feitas com qual­i­dades, com os pro­du­tos cer­tos e den­tro dos quan­ti­ta­tivos pagos? Será que os recur­sos são sufi­cientes ou estão sendo bem gastos?

Não con­sigo aceitar que um municí­pio do porte de São Luís não pos­sua estru­tura física para aco­modar seus estu­dantes. Há, clara­mente, uma falta de plane­ja­mento e com­pro­misso com a educação.

E esta falta plane­ja­mento e/​ou com­petên­cia é patente até para exe­cu­tar as coisas mais sim­ples da admin­is­tração do sistema.

Vejamos um exem­plo: o gov­erno fed­eral des­ti­nou para a cap­i­tal, segundo soube, 40 (quarenta) creches do tipo 1 e 2; destas, até onde se sabe, só foram lic­i­tadas 24 (vinte e qua­tro); e, destas 24, ape­nas 03 (três) foram ini­ci­adas e ainda assim, estas estão com as obras par­al­isadas por motivos diver­sos, desde a falta reg­u­lar de repasses a ali­men­tação defeitu­osa dos pro­gra­mas de con­t­role do FNDE. Não faz sen­tido algum isso.

Ora, quarenta creches, se não resolvessem o prob­lema, ao menos o amenizaria, e con­tra­partida do municí­pio, pelas regras do pro­grama é ape­nas con­seguir e entre­gar os ter­renos ter­raple­na­dos. O municí­pio não tem se desin­cumbido de um ônus tão sim­ples e que aliviaria, e muito, o prob­lema de mil­hares de famílias.

Se o municí­pio não con­segue rece­ber creches e mesmo esco­las ofer­e­ci­das “de graça” pelo gov­erno fed­eral, sorte mel­hor não tem a rede que gere. As esco­las munic­i­pais, pelo menos uma grande parcela, não pos­suem condições de fun­ciona­mento ou de ofer­e­cer uma edu­cação min­i­ma­mente sat­is­fatória as cri­anças, estão depredadas e muitas estão, estru­tu­ral­mente falando, obso­le­tas e se valem de incon­táveis anexo (casas alu­gadas) para enten­derem a demanda. Em resumo: no improviso.

Nes­tas condições, ainda que muitos pro­fes­sores ten­tem – exis­tem pro­fes­sores com­pro­meti­dos –, a edu­cação não será de qual­i­dade, estará bem aquém de colo­car os estu­dantes em condições de igual­dade com os seus cole­gas da rede pri­vada (que tam­bém não é grande coisa) ou de out­ras partes do país e do mundo.

A política edu­ca­cional brasileira é um fra­casso abso­luto, con­forme ates­tam quase todos os insti­tu­tos que medem a qual­i­dade do ensino, entre­tanto, aqui no Maran­hão, na grande ilha, ela sim­ples­mente não existe, esta­mos na mesma dis­cursão por décadas, enquanto o quadro só piora. Fal­tam vagas, segu­rança, trans­porte, estru­tura, qual­i­dade. Falta tudo. Não tem um ano em que as aulas não sejam inter­romp­i­das por qual­quer motivo. Tudo isso em pre­juí­zos de cri­anças como Maciel, Ana Luiza e tan­tos hoje que insis­tem em acred­i­tar na edu­cação como fatores deter­mi­nantes à mudança em suas vidas, que brigam com todas as forças por um futuro melhor.

Não bas­tasse o descal­abro da falta de estru­tura física, com­pro­me­ti­mento, as pou­cas coisas que se têm, não são colo­cadas para funcionar.

Querem um exem­plo? Cer­ta­mente as pou­cas esco­las da rede em fun­ciona­mento pos­suem lab­o­ratórios de infor­mática. Quan­tos será que funcionam?

Como é que cri­anças sem acesso as coisas mais comez­in­has do mundo poderão se sen­tir val­orizadas, voca­cionadas ou estim­u­ladas a con­tin­uarem seus estudos?

As nos­sas cri­anças e jovens foram (uma grande parte delas) aban­don­adas pelos pais que não se sen­tem na obri­gação de educá-​las; estão sendo aban­don­adas, mais uma vez, pelo Estado que não cumpre seu papel de ofer­e­cer uma edu­cação de qualidade.

Sem as per­spec­ti­vas que dev­e­riam obter tanto do núcleo famil­iar quanto do Estado e sofrendo as ten­tações do mundo externo, com o con­sum­ismo, din­heiro fácil, não pre­cisamos ser gênios para desco­brir o futuro que aguarda a sociedade.

O cidadão comum pos­sui pou­cas alter­na­ti­vas na vida para mudar sua vida e ser o sen­hor do seu des­tino, as prin­ci­pais são: a edu­cação e muito trabalho.

O que fazem com a edu­cação tor­nam os gestores públi­cos autên­ti­cos mata­dores de sonhos.

Abdon Mar­inho é advogado.

O PECADO DA HONESTIDADE.

Escrito por Abdon Mar­inho

O PECADO DA HONESTIDADE.

NESTE iní­cio de ano disseminou-​se, prin­ci­pal­mente, por meio das redes soci­ais, mas tam­bém por out­ras mídias, uma espé­cie de cor­rente no qual o mote prin­ci­pal era o fato do pres­i­dente norte-​americano, Barack Obama, encer­rar seus oito anos de mandato sem qual­quer escân­dalo, fosse no campo pes­soal, fosse no campo político. A proeza, desta­cada até por grandes veícu­los de comu­ni­cação, estendia-​se aos famil­iares e tam­bém aos seus auxiliares.

Não resta dúvida que o feito foi extra­ordinário. Um gov­erno con­cluir oito anos de poder sem pon­tif­icar escân­da­los é, de fato, uma bênção, mas, como podemos ver, per­feita­mente pos­sível, tanto que Obama conseguiu.

O que me causa espé­cie é ver a sociedade (não só a brasileira) tratar uma coisa que dev­e­ria ser nor­mal, rotineira em quais­quer gov­er­nos, como algo extra­ordinário, capaz de causar estupefação:

– Olha eles são honestos!

– Hon­estos?!

– Meu Deus, existe pes­soas honestas!

Pois é, esta foi a reação de boa parte da comu­nidade mundial ao fato dos Obama, não terem pon­tif­i­cado escân­da­los. Mas o que dizer num mundo em que aquilo que dev­e­ria ser a regra tornou-​se exceção?

Esta sem­ana mesmo o gov­erno da Romê­nia teve a bril­hante ideia de «anis­tiar» a cor­rupção até deter­mi­nado valor, só voltando atrás na patus­cada após amplas man­i­fes­tações pop­u­lares con­trárias a tal cor­rupção censitária.

No Brasil há quem aposte e defenda pro­posta neste sen­tido. Só que, por aqui, defende-​se anis­tiar o crime, vez que os desvios não encon­tram para­lelo no mundo inteiro, a ideia é esta­b­ele­cer que políti­cos ou par­tidos que rece­beram recur­sos do chamado caixa 2, inde­pen­dente da origem do din­heiro – seja da velha con­hecida cor­rupção ou de out­ras fontes igual­mente espúrias –, não sejam alcança­dos pela lei.

Recen­te­mente con­de­nado o casal de mar­queteiros das cam­pan­has pres­i­den­ci­ais de Lula e Dilma e inúmeros out­ros políti­cos no Brasil e no mundo, assen­taram de forma cân­dida que a cul­tura das cam­pan­has políti­cas era de se fazer os paga­men­tos «por fora», no caixa 2, em con­tas no estrangeiro. Não duvido disso. Ainda hoje, com o lim­ite de gas­tos esta­b­ele­cido para as cam­pan­has, muitos políti­cos gas­tam infini­ta­mente além daquele valor, muito emb­ora na prestação de con­tas nada disso apareça.

O juiz não se con­venceu que o aspecto cul­tural de uma prática crim­i­nosa os inven­tassem de pagar por ela e os con­de­nou a uma pena de oito anos.

Mas a real­i­dade é que vive­mos em um mundo de con­du­tas inver­tidas, onde a hon­esti­dade causa estu­por e os crimes são tidos como aspec­tos culturais.

Outro dia um amigo, engen­heiro dos mais com­pe­tentes e que fazia tempo que via, apare­ceu pelo escritório. Perguntei-​lhe a razão do desa­parec­i­mento. Explicou-​me que estava tra­bal­hando em deter­mi­nado órgão, mas que naquele dia entre­gara o cargo. Curioso indaguei a razão de ter saído ao que respondeu-​me:

– A razão da minha saída foi o fato de ter impe­dido a san­gria dos cofres públi­cos em mais de 800 mil no inter­valo de ape­nas oito meses. Isso só nos proces­sos que me per­mi­ti­ram fis­calizar. Se tivessem per­mi­tido a fis­cal­iza­ção nos demais proces­sos a econo­mia aos cofres públi­cos seriam de bem mais de 2 mil­hões de reais, neste período.

Com­ple­tou:

– Segundo fui infor­mado estava «atrapalhando».

A real­i­dade do Brasil é esta: as pes­soas hon­es­tas «atra­pal­ham», por isso mesmo não chegam muito longe. São demi­ti­das, difamadas, humil­hadas. Ao con­trário daque­les que são capazes de tudo para aten­der aos mais incon­fessáveis inter­esses. Esses vão longe e se troux­erem no gene o DNA da adu­lação atingem os pín­caros do sucesso.

Certa vez – já faz muito tempo –, um cliente reclamou da minha insistên­cia na obe­diên­cia a lei:

– Abdon quer que eu faça tudo certo. Se for para fazer tudo certo não pre­cis­arei de advogado.

Este, tempo depois veio a agrade­cer por nunca tê-​lo deix­ado fazer o que lhe vinha à cabeça.

Mas a cul­tura da ban­dalha parece ter gan­hado mais adep­tos do que se imag­i­nava a ponto de deter­mi­na­dos órgãos recla­marem da con­tratação de advo­ga­dos sob o argu­mento de que há pouco ou quase nada a ser feito. Não passa pela cabeça de tais gênios que a ausên­cia de demanda ocorre jus­ta­mente pelo fato de que houve um bom tra­balho de assessoria/​consultoria a impedir os equívo­cos ou erros, ou mesmo a delib­er­ada von­tade de se fazer as coisas de qual­quer jeito.

Não faz muito acon­te­ceu algo bem semel­hante. Um amigo com quem tra­bal­hei noutras empre­itada recomen­dava nosso escritório a deter­mi­nado cliente:

– Acho que seria muito bom se pudésse­mos con­tratar o Dr. Abdon, já tra­bal­hei com ele e me sinto muito mais seguro con­tar­mos com a sua assessoria.

O cliente, um amigo de mais de vinte anos virou-​se para ele e respondeu:

– Tam­bém gosto muito do tra­balho do Dr. Abdon, meu amigo de muito tempo. Mas tem um prob­lema, ele é muito «certinho».

O amigo que nunca perde a viagem não se deu por vencido:

– Mas, doutor, nos tem­pos atu­ais, talvez seja hora de con­tar­mos com alguém que nos ori­ente a fazer o certo e não nos deixe errar.

São tem­pos estran­hos estes em que vive­mos quando a hon­esti­dade, o zelo pela coisa pública pas­sou a ser um «defeito», pas­sou a atra­pal­har. Atra­pal­har o que? Que esse ou aquele faça con­luio para saquear o din­heiro que dev­e­ria virar esco­las, pos­tos de saúde ou obras de infraestrutura?

O tempo passa, gov­er­nos mudam, mas a prática, infe­liz­mente, é quase sem­pre a mesma, com os os inter­esses políti­cos e pes­soais sendo colo­ca­dos à frente do inter­esse público.

Dizia Rui Bar­bosa que chegaria o dia em que o cidadão de bem teria ver­gonha de se dizer hon­esto. Para o deses­pero dos bons, esse dia já chegou.

Abdon Mar­inho é advogado.