CUSTA PEDIR DESCULPAS?
NA VÉSPERA DO NATAL um amigo conversa comigo sobre a tragédia ocorrida em Balsas e que teve como vítimas duas irmãs, uma, infelizmente, fatal. Este amigo alertava para o fato de até o momento o governo do estado não ter reconhecido o erro e pedido desculpas a vítima que sobreviveu e aos seus familiares pelo perecimento da outra.
Causou-me perplexidade a informação deste amigo, tanto que, embora acreditando na sua palavra, fiz uma busca no site do governo a procura de uma nota, um pesar, uma notícia com um pedido de desculpas formal por parte da autoridade competente, que, no caso, acredito ser o governador do estado. Não encontrei nada.
No site do governo encontramos até notícia sobre a intenção disso ou daquilo, mas nenhuma notícia sobre o ocorrido em Balsas. Aliás, lá persiste o mesmo silêncio já dispensado pela mídia privada ao fato: a morte de um ser humano virou noticia de ontem.
No site da própria secretaria, também não existe um posicionamento oficial sobre o ocorrido. Aliás, a depender das notícias veiculadas por lá, você, sequer, desconfia da tragédia que ocorreu.
Decerto imaginam que pelo fato de não tratarem do caso o mesmo deixe de existir.
Sou defensor contumaz da atividade policial e da instituição policial, reconhecendo o seu papel na defesa sociedade. Por isso mesmo entendo que a estratégia adotada pelo governo é equivocada e presta um desserviço a própria policia.
O fato de tentarem, por todos os meios, ocultar a noticia ou tratar a morte de uma jovem de apenas 23 anos, como algo secundário equivale a um segundo assassinato.
Não resta dúvida que um caso desta magnitude exige uma apuração rigorosa que não permita qualquer tipo de questionamento sobre o ocorrido. Restaurando a confiança da sociedade na sua policia e que esta tenha na mesma uma parceira, que colabore e a ajude quando necessário.
Em tempos de insegurança extrema o que menos interessa a qualquer um de nós é uma polícia que não inspire confiança.
A atitude do governo permite-nos deduzir que ele (governo) tenta atribuir a corporação erros cometidos por uns poucos membros. Aí reside o equívoco: a polícia, como instituição, não pode e não deve ser responsabilizada por atos cometidos por seus integrantes, a menos que tenha partido da corporação a determinação para que agissem em desacordo com os protocolos de segurança. O que não é ocaso.
Não tenho a menor dúvida de que os envolvidos agiram sem obedecer aos protocolos policiais previstos para o tipo de ação o que acabou por provocar a morte da jovem.
Ora, suponhamos que as moças tivessem efetivamente furado a blitz policial.
Imaginemos: lá estava a blitz com carros caracterizados, policiais uniformizados, «giroflex» ligados e tudo mais, e elas, inadvertidamente, tivessem furado o bloqueio policial, e, ainda, tentassem fugir da regular perseguição empreendida por veículos caracterizados da polícia.
Será que isso os autorizaria a desferir dezenas de tiros contra veículo em toda a lataria e vidros? Decerto que não. Acredito, pela formação que receberam, aprenderam que se deve atirar nos pneus do veículo. Ainda que estivesse havendo troca de tiros, a medida mais acertada, inicialmente, seria tentar acertar os pneus e parar o veículo e não, como fizeram, disparar centenas de tiros a ermo, podendo atingir, não apenas os que estivessem no veículo, como qualquer outro desavisado.
Mesmo na situação narrada acima não estaria justificada a opção, como se deu, pelo “metralhamento» do veículo. Se a perícia aponta dezenas de projeteis atingindo o veículo em movimento é porque centenas de outros foram disparados. O que, a primeira vista, caracterizaria o descumprimento dos protocolos serem observados pelos agentes. Entretanto, a conduta individual ou de uns poucos não pode, e não deve, macular uma corporação inteira. Daí a importância de fazer a separação.
Quando policial é formado e posto na rua, tem-se por certo, que está apto a seguir os protocolos para as diversas situações que enfrentará no dia a dia. Ou não foram preparados?
Sob qualquer aspecto que se examine o assunto chegamos à conclusão que a operação policial desobedeceu as regras e essa a causa principal da tragédia que se deu com duas irmãs, sendo uma vítima fatal de imperícia.
Esta é a realidade. E no presente caso a responsabilidade do estado é objetiva.
Com todos estes fatos à vista de todos – e mais aqueles que só as autoridades sabem –, soa incompreensível que o governador do estado, em nome do seu governo e da corporação policial, responsável pelo trágico evento, não tenha se dignado a pedir desculpas aos familiares, amigos e a sociedade em geral, pela desastrosa operação que ceifou a vida de uma pessoa inocente.
Passados mais de dez dias já era tempo de haver um pedido de desculpas formal. É o mínimo que se espera das autoridades. O que estão esperando para reconhecer que falharam.
A vida não pode ser restituída. Aos familiares, amigos, restará o vazio que jamais será preenchido. Uma pouco de solidariedade, um pedido de desculpas, não custa nada.
Abdon Marinho é advogado.