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A per­ver­são da democracia.

Escrito por Abdon Mar­inho

A per­ver­são da democ­ra­cia.

Por Abdon Mar­inho.

A CON­STI­TU­IÇÃO FED­ERAL, no seu artigo 37, esta­b­elece: “Art. 37. A admin­is­tração pública direta e indi­reta de qual­quer dos Poderes da União, dos Esta­dos, do Dis­trito Fed­eral e dos Municí­pios obe­de­cerá aos princí­pios de legal­i­dade, impes­soal­i­dade, moral­i­dade, pub­li­ci­dade e efi­ciên­cia e, tam­bém, ao seguinte:”.

Por sua vez, o pará­grafo primeiro do mesmo dis­pos­i­tivo, com­ple­menta: “§ 1º A pub­li­ci­dade dos atos, pro­gra­mas, obras, serviços e cam­pan­has dos órgãos públi­cos dev­erá ter caráter educa­tivo, infor­ma­tivo ou de ori­en­tação social, dela não podendo con­star nomes, sím­bo­los ou ima­gens que car­ac­ter­izem pro­moção pes­soal de autori­dades ou servi­dores públicos”.

Assim, nos últi­mos trinta anos, tendo os princí­pios e as regras quanto à pub­li­ci­dade como bús­sola, as gestões públi­cas têm, sob o olhar vig­i­lante do Min­istério Público e do Poder Judi­ciário, procu­rado seguir a Constituição.

O longo processo de adap­tação às nor­mas não tem sido fácil e, aqui e ali, encon­tramos pub­li­ci­dade estatal, ainda que indi­re­ta­mente, servido para a pro­moção pes­soal dos gov­er­nantes ou para poten­cializar o pouco que fazem – muitas vezes, o custo da pro­pa­ganda é bem maior que aquilo que feito para a comu­nidade.

Os órgãos de con­t­role, sobre­tudo o Min­istério Público, tem “deix­ado pas­sar” ou fin­gem que não viram quando os desac­er­tos têm como pro­tag­o­nistas o gov­erno estad­ual ou uma grande prefeitura.

Situ­ação bem dis­tinta quando se trata de pequenos municí­pios, quando até a divul­gação da comem­o­ração do aniver­sário da cidade enseja ações de impro­bidade, se da peça, ao juízo do MPE, se vis­lum­bra qual­quer cono­tação de pro­moção pes­soal – ainda que não tenha sido, ainda que o gestor tenha sido sur­preen­dido com a pub­li­ci­dade ou dela, sequer tenha tomado con­hec­i­mento antes da veic­u­lação.

Con­heci – e con­heço –, diver­sos casos em que o MPE movi­men­tou (e movi­menta) a máquina do Poder Judi­ciário pleit­e­ando con­de­nações de prefeitos e ex-​prefeitos porque alguém de sua asses­so­ria teria pub­li­cado em algum jor­nal local notí­cia ou mesmo pub­li­ci­dade paga dando conta do aniver­sário da cidade.

Por anos a fio cor­rem proces­sos de tal natureza com cus­tos para o Estado, sobre­car­regando o Judi­ciário com proces­sos sem quais­quer sen­tido.

Con­heço um ex-​gestor que há mais de dez anos responde a uma ação dessa natureza porque, no dia do aniver­sário da cidade, tiraram uma foto dele cor­tando o bolo, pub­licaram no jor­nal e, por des­cuido, a tesouraria pagou a divul­gação do evento.

O valor gasto com tal pub­li­ci­dade – que, estava longe de car­ac­teri­zar pro­moção pes­soal –, não foi 2 mil reais. O MPE enten­deu que era pro­moção pes­soal e o cidadão ainda hoje responde pela con­duta, gas­tando com advo­ga­dos, o Poder Judi­ciário gas­tando tempo e pes­soal com um processo que pode­ria ter sido resolvido com um acordo ou, sequer, exis­tido.

Como resul­tado disso esse ex-​gestor disse-​me certa vez que quando escuta alguém can­tar “parabéns pra você”, sai cor­rendo; de bolo, nunca mais quis saber.

Pois bem, faço essa breve digressão para, den­tro do tema, em com­para­ção ao trata­mento dis­pen­sado aos gestores munic­i­pais, con­frontar o “silên­cio” dos órgãos de con­t­role, sobre­tudo, do Min­istério Público (fed­eral e estad­ual) a uma per­ver­são da democ­ra­cia que vem ocor­rendo no nosso país e no nosso estado.

Já tratei aqui – em tex­tos ante­ri­ores –, dos riscos que corre a democ­ra­cia brasileira ao tornar desigual as dis­putas eleitorais.

Como sabe­mos, além dos recur­sos públi­cos repas­sa­dos aos par­tidos: fundo par­tidário e fundo de cam­panha — quase todo uti­lizado nas cam­pan­has eleitorais dos que já são deten­tores de mandatos, que na ver­dade são os “donos” dos par­tidos, os par­la­mentares brasileiros dis­põem, ainda, de uma outra van­tagem em relação aos demais cidadãos: são execu­tores do orça­mento do país.

Não bas­tasse isso, o fato de dis­porem de mil­hões em recur­sos finan­ceiros para dis­tribuírem nas suas “bases eleitorais”, as excelên­cias, diante do silên­cio obse­quioso dos órgãos de con­t­role, Min­istério Público à frente, têm abu­sado das van­ta­gens e vio­lado sis­tem­ati­ca­mente a Con­sti­tu­ição Fed­eral.

O amigo leitor – eleitor –, já deve ter visto em out­door, bus­door e por diver­sas mídias senadores, dep­uta­dos fed­erais e estad­u­ais faz­erem pro­moção pes­soal alarde­ando que “man­daram” tan­tos mil ou mil­hões para isso ou aquilo, para este ou aquele município.

Outro dia, para o meu espanto, vi foi na tele­visão, em horário nobre, um senador apare­cendo em um com­er­cial de quase um min­uto, na prin­ci­pal rede de tele­visão do estado, mostrando que um emenda sua estava sendo uti­lizada para a reforma de um pré­dio público.

Como assisto pouco tele­visão e quando assisto é mais para ver um filme ou noti­ciário, não posso pre­cisar se o referido com­er­cial foi exibido noutros canais de tele­visão ou noutros horários.

Outra coisa que tam­bém não sei é se o custo destas pro­pa­gan­das em jor­nais, rádios, tele­visões, out­door, bus­door, inter­net, estão sendo custeadas com ver­bas públi­cas, muito emb­ora saibamos que de uma forma ou de outra, no final, quem paga a conta sou eu, é você, somos nós.

Em todo caso, muito emb­ora seja provável que o custo de tais pro­moções este­jam saindo dos cofres públi­cos, dire­ta­mente, o prin­ci­pal é o uso do recurso público, para a pro­moção pes­soal do par­la­men­tar.

O dep­utado ou senador não tirou o din­heiro do bolso dele para real­iza­ção de uma obra, com­pra de um equipa­mento, fazer uma estrada, uma quadra, escola ou mesmo com­prar ces­tas bási­cas para dis­tribuir, estes recur­sos de emen­das par­la­mentares, são recur­sos públi­cos.

Não podem as excelên­cias usarem tais recur­sos para se pro­moverem politi­ca­mente, grace­jar a sim­pa­tia dos eleitores.

Veja que absurdo, os gov­er­nos estad­u­ais e munic­i­pais, devem fazer sua pub­li­ci­dade em obe­diên­cia ao artigo 37 e §1°, da Con­sti­tu­ição Fed­eral, ou seja, sem dela con­star sím­bo­los, ima­gens ou qual­quer outra coisa que possa car­ac­teri­zar pro­moção pes­soal, mas os par­la­mentares podem apare­cer em em todas as mídias, inclu­sive, na tele­visão “estre­lando” com­er­cial divul­gando que man­dou tal emenda para isso ou aquilo e até mostrar o can­teiro de obras, ficar por meses com a cara estam­pada nos out­door, bus­door, blogues, mídias soci­ais, dizendo que fiz­eram isso ou aquilo com a sua cota de emen­das.

Muito emb­ora só agora tenha aten­tado para uso de tele­visão e rádio – que são con­cessões públi­cas –, para esse tipo de absurdo.

Bem ver­dade que usavam, acred­ito que as suas expen­sas, para dese­jarem feliz natal ou ano novo.

Todas as out­ras modal­i­dades de pro­moção pes­soal, ferindo a Con­sti­tu­ição, vêm de longe.

Até aqui, não tive notí­cias de ações de impro­bidade admin­is­tra­tiva pro­postas pelo sem­pre vig­i­lante Min­istério Público.

Se exis­tem, desde já me pen­i­ten­cio, mas tal notí­cia não é de con­hec­i­mento da pat­uleia.

Já as ações con­tra os “prefeit­in­hos” que, por des­cuido, deixaram que jor­nal divul­gassem uma fotografia sua cor­tando o bolo de aniver­sário da cidade, exis­tem no quilo; ações porque não pub­licaram uma lic­i­tação ou con­trato como o MPE entende que deva ser feito, é só o que tem.

O que vem ocor­rendo no Brasil – não é ape­nas no Maran­hão –, é uma grave vio­lação aos princí­pios democráti­cos, ouso dizer, que um “aten­tado” à própria democracia.

Per­vert­eram à democ­ra­cia brasileira a tal ponto que não podemos mais falar em igual­dade no processo eleitoral.

Como um cidadão comum vai pleit­ear um mandato pop­u­lar con­tra um deten­tor de mandato que na maio­ria das vezes é o “dono” de um par­tido? Que recebe mil­hões de recur­sos públi­cos para custear suas cam­pan­has? Que dis­põe de out­ros tan­tos mil­hões em emen­das par­la­mentares obri­gatórias? Que dis­põe de recur­sos públi­cos para pro­moção pes­soal e que, diante do silên­cio dos órgãos de con­t­role, se pro­movem através das mais vari­adas mídias, divul­gando a apli­cação dos recur­sos?

E, nem fale­mos do “caixa” pes­soal que o atual for­mato da política brasileira tem pos­si­bil­i­tado.

Como um cidadão comum, sem vin­cu­lação a qual­quer esquema político, pode dis­putar com os atu­ais deten­tores de mandatos?

Como fica a tal igual­dade entre os brasileiros ou dire­ito que tem qual­quer cidadão de pleit­ear um mandato pop­u­lar?

O cidadão comum não tem condições de dis­putar. O cidadão comum está ali­jado do dire­ito de tomar parte nos negó­cios do Estado que garante a Con­sti­tu­ição Federal.

A democ­ra­cia brasileira agon­iza à vista de todos.

A democ­ra­cia brasileira é quase um cadáver insepulto.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

Tragé­dia e crime: Autori­dades unem-​se a vírus para matarem brasileiros.

Escrito por Abdon Mar­inho

TRAGÉ­DIA E CRIME: AUTORI­DADES UNEM-​SE A VÍRUS PARA MATAREM BRASILEIROS.

Por Abdon Marinho.

UMA das frases mais infamantes da história da humanidade é atribuída a Josef Stálin (18781953) e diz: “uma única morte é uma tragé­dia. Um mil­hão de mortes é uma estatís­tica”.

O dita­dor, se não cun­hou tal frase, pode­ria tê-​la feito – e prat­i­cado –, diante dos mil­hões de mortes, que, por ação ou omis­são, provo­cou nas pop­u­lações sob sua influên­cia.

Uma das maiores matanças de Stálin foi a per­pe­trada con­tra o povo ucra­ni­ano con­hecida como Holodomor que é a palavra ucra­ni­ana para “deixar mor­rer de fome” ou “de inanição” e serve para des­ig­nar o ocor­rido entre os anos de 1931 e 1933 naquele país.

Emb­ora pouco fal­ado, o mas­sacre do povo ucra­ni­ano por Stálin, além de ser o resul­tado direto da política econômica por ele imple­men­tada na URSS, foi, tam­bém, uma decisão ide­ológ­ica, e tam­bém por isso, car­ac­ter­i­zada como genocídio.

Desde que instalou-​se no Brasil a pan­demia que aler­ta­mos as autori­dades para os riscos de ori­en­tações des­en­con­tradas para a con­tenção da doença e para tragé­dia anun­ci­ada que seria a poli­ti­za­ção e a ide­ol­o­gismo numa questão de saúde pública e san­itária.

Não ouvi­ram a mim – que não sou ninguém –, nem tan­tos out­ros mil­hares de aler­tas sobre a gravi­dade do que vinha ocor­rendo no país, facil­mente iden­ti­ficável por qual­quer um que não enx­er­gasse o que passá­va­mos com o viés do inter­esse político ou ide­ológico.

Lem­bro que até o ex-​presidente Don­ald Trump – que não é con­hecido por ser arguto –, chamava a atenção para o agrava­mento da situ­ação no Brasil. E fazia isso quando a situ­ação no país pre­si­dido por ele – e por sua respon­s­abil­i­dade –, batia todos os recordes no número de con­tá­gios e de mor­tos diários.

Em 14 de junho do ano pas­sado escrevi um texto com um título provoca­tivo: “Quem ‘her­dará’ os mor­tos da pan­demia?”.

Naquela época o número de mor­tos pela pan­demia já pas­sava dos 40 mil e as autori­dades se atri­tavam sobre o for­mato de divul­gação do número de mor­tos; sobre, se os hos­pi­tais estavam cheios; se as pes­soas estavam mor­rendo – houve até quem pro­pusesse um censo dos mor­tos, achei irônico porque jus­ta­mente no ano pas­sado não con­seguimos fazer o censo dece­nal “dos vivos” –; se have­ria iso­la­mento social; e tan­tos out­ros assun­tos lat­erais, muitos de cunho mera­mente ide­ológico, enquanto as pes­soas estavam mor­rendo.

O debate ainda incluía inda­gações sobre a morte das pes­soas: de COVID? Com COVID? Por COVID? Como se o prin­ci­pal não fosse a morte em si e sim o “for­mato” da morte.

Naquela época, já está­va­mos na décima segunda ou décima ter­ceira sem­ana de pan­demia e muitos países, com seus erros e acer­tos já tin­ham mais ou menos um roteiro a seguir, já desen­volviam imu­nizante ou se pro­gra­mavam para comprá-​los enquanto que por aqui o que se via – e con­tin­u­amos a ver –, era a briga sem trégua pelo poder.

Mesmo a vaci­nação em massa – que é um con­senso entre os espe­cial­is­tas para pro­te­ger a pop­u­lação –, aqui foi motivo de guerra política e ide­ológ­ica.

Enquanto os out­ros países cor­riam para adquirirem o máx­imo de imu­nizante para a pop­u­lação e pro­moviam iso­la­mento social, aqui, o gov­erno tratava o assunto com des­dém, fazia cam­panha con­tra, “tor­cia” para o insucesso da vacina e sab­o­tava tudo que era rela­cionado ao iso­la­mento.

Ape­sar da gravi­dade da situ­ação nos Esta­dos Unidos, Trump tinha razão em manifestar-​se pre­ocu­pado com Brasil.

Essa sem­ana reg­is­tramos a trág­ica marca de 300 mil mor­tos.

No dia que isso acon­te­ceu – final­mente –, as excelên­cias que coman­dam o país acharam que era a hora de se reunirem para tratar de um comitê para acom­pan­har a pan­demia. Assim mesmo, sem ninguém saber como será, deixando de fora os gov­er­nos estad­u­ais e municipais.

Em resumo: con­tin­uam no propósito eleitor­eiro enquanto as famílias são diz­imadas.

O Brasil já é o epi­cen­tro da crise san­itária. Já somos os campeões em número de mortes diárias e em número de con­t­a­m­i­na­dos. Daqui a pouco será a vez de superar os Esta­dos Unidos no número de mor­tos nom­i­nais.

Em quase todos os demais países, graças a ação dos gov­er­nos, já é pos­sível ver­mos uma mel­hora no quadro de com­bate à pan­demia, ape­nas no Brasil a curva de con­tá­gios e mortes con­tinua apon­tada para cima em um ângulo de quase noventa graus, tendo céu como lim­ite.

Os EUA, que antes rival­izava com Brasil no critério descon­t­role da pan­demia, hoje reg­is­tra menos da metade do número de mor­tos que reg­is­tramos aqui; já aplicaram mais de 100 mil­hões de doses de vaci­nas – enquanto por aqui não cheg­amos a 15 mil­hões –, e agora, o pres­i­dente amer­i­cano, Joe Biden, resolveu dobrar a meta: aplicar 200 mil­hões de doses até 30 de abril, quando com­ple­tará 100 dias de gov­erno.

O Brasil assiste a isso como cachorro em porta de gale­te­ria: com água na boca.

Enquanto os irmãos amer­i­canos têm o dobro de vaci­nas sufi­cientes para vacinarem toda a sua pop­u­lação, as vaci­nas, por aqui, estão a conta-​gota, com o maior Sis­tema Único de Saúde do mundo, o nosso SUS, vaci­nando bem aquém de sua real capaci­dade …porque fal­tam vaci­nas.

Aqui e ali, fala-​se em roubo de vaci­nas, con­tra­bando de vaci­nas, desvios de vaci­nas para alguns priv­i­le­gia­dos, fura-​filas.

Pas­saram a crim­i­nalizar algu­mas destas con­du­tas quando, na ver­dade, dev­e­riam ter por crim­i­noso o gov­erno que não se pre­ocupou no tempo certo de prover vaci­nas para os brasileiros.

Era para o gov­erno brasileiro está “cor­rendo” atrás dos cidadãos para vaciná-​los e não cor­rendo atrás do cidadão que desviou ou con­tra­ban­deou uma vacina para ten­tar sal­var sua vida.

Não, não estou defend­endo que se roubem vaci­nas, que furem filas, que façam con­tra­bando. Mas, antes de irem atrás destas pes­soas, dev­e­riam ir atrás dos gov­er­nantes que não “fiz­eram o dever de casa”.

Dizia há quase um ano – e posso con­tin­uar a dizê-​lo –, os gov­er­nantes brasileiros erraram em tudo e além do que podiam errar.

O resul­tado da polit­i­calha rasteira é o sofri­mento de mil­hares de pes­soas, são as mais de 300 mil vidas per­di­das – número que sabe­mos, emb­ora queiramos nos enga­nar, ainda vai crescer muito mais –, são os danos psi­cológi­cos e a exaustão dos profis­sion­ais de saúde que tra­bal­ham sem des­canso todo esse tempo, é o colapso do sis­tema de saúde, público e pri­vado, é angús­tia de toda uma pop­u­lação, que sabe quem será o próx­imo escol­hido nesta roleta-​russa da morte.

É certo que o vírus matou mil­hares de brasileiros, mas out­ros mil­hares foram – e estão sendo –, mor­tos pelas as autori­dades. Por suas ações ou omis­sões.

E algum dia pre­cisamos fazer o ajuste de con­tas com estes respon­sáveis.

Chega a ser ultra­jante que ape­nas um ano após o iní­cio da pan­demia, com a conta dos cidadãos que perderam a vida pas­sado de trezen­tos mil, as autori­dades falem em criar um comitê de crise. Este sim­ples ato diz muito sobre o senso de urgên­cia destas pes­soas.

Onde estava o pres­i­dente da República? Onde estava o Con­gresso Nacional? Onde estava o Poder Judi­ciário?

Lá atrás, quando até o Trump dizia temer pelo o nosso futuro, no iní­cio da pan­demia, não pode­riam ter se reunido? Cri­ado o tal comitê de acom­pan­hamento de crise? Terem feito algo, além de tratarem dos próprios inter­esses, enquanto vidas eram ceifadas?

Desde março do ano pas­sado mor­reram mais de 300 mil brasileiros. Os primeiros 100 mil em 148 dias; os segun­dos 100 mil em 152 dias; os out­ros 100 mil em ape­nas 75 dias. Jus­ta­mente agora, quando as autori­dades – até assistindo o exem­plo de out­ros países –, dev­e­riam saber como pro­ceder, avoluma-​se o número de mor­tos no país, prova cabal de que não apren­deram nada e que são inca­pazes de lidarem com os desafios de gov­ernar.

Quan­tas mil­hares de famílias a mais terão que pran­tearem seus entes queri­dos até que con­sig­amos superar essa pan­demia?

Em um cál­culo matemático sim­ples, con­siderando mil­hões de brasileiros temos que vaci­nar; quan­tas doses de vaci­nas dis­po­mos e o tempo pro­gra­mado para aplicá-​las e a con­dução da pan­demia pelas autori­dades, cheg­amos a con­clusão que ainda temos um longo e doloroso calvário pela frente.

Quando Stálin mor­reu, em 1953, e seus crimes pas­saram a ser rev­e­la­dos, tomamos con­hec­i­mento de todo o hor­ror que foi per­pe­trado con­tra mil­hões de rus­sos, ucra­ni­anos e tan­tos out­ros povos e por isso é figura de destaque na gale­ria dos geno­ci­das mundi­ais, muito emb­ora só tenha sido jul­gado pela história.

O Brasil não pre­cisa aguardar o jul­ga­mento da história para iden­ti­ficar e punir os respon­sáveis pela tragé­dia que vive­mos atual­mente. Tragé­dia que, registre-​se, não tem ape­nas um único cul­pado – assim como não foi Stálin, soz­inho, o respon­sável pela morte de tan­tos seres humanos –, mas diver­sos, por suas ações e omis­sões.

Quem são os cul­pa­dos pela tragé­dia que acomete o Brasil? Quem são os seus cúmplices?

Pre­cisamos criar um nome para especí­fico para “deixar mor­rer por falta de vacinas”.

Abdon Mar­inho é advo­gado.

Os Municí­pios e a espada de Dâmocles.

Escrito por Abdon Mar­inho

OS MUNICÍ­PIOS E A ESPADA DE DÂMOCLES.

Por Abdon Marinho.

QUANDO o risco é tão imi­nente que o sim­ples fato de acor­dar­mos bem já é motivo de agradec­i­men­tos pelo mila­gre da vida, acabamos por esque­cer de diver­sos out­ros assun­tos menos impor­tantes, porém rel­e­vantes para o cotid­i­ano dos cidadãos.

Desde o ano pas­sado que escrevo, faço vídeos ou “lives”, primeiro sobre o processo eleitoral e, depois, sobre o iní­cio das gestões públi­cas.

Ape­sar disso, como disse, talvez tomado pelo sen­ti­mento de urgên­cia que é estar­mos vivos, acabei por esque­cer de reg­is­trar as difi­cul­dades em série que vem enfrentando, sobre­tudo, os novos gestores, neste iní­cio de gestão.

São exigên­cias e mais exigên­cias do órgãos de con­t­role e fis­cal­iza­ção; suspensão/​anulação de lic­i­tações; recomen­dações, muitas das vezes descabidas ou fora do con­texto da real­i­dade enfrentadas pelos municí­pios, etceteras.

O certo é que muitos prefeitos de “primeira viagem” e com­pro­meti­dos em fazer uma boa gestão, encontram-​se se per­di­dos, muitos com a admin­is­tração “travada”, sem saberem o que fazer, ainda mais diante do fato de estar­mos em plena pandemia.

Uma das primeiras coisas que aprendi na fac­ul­dade de dire­ito foi a tem­per­ança na análise das nor­mas jurídi­cas.

O pro­fes­sor Alberto Tavares sem­pre dizia que as nor­mas eram dire­cionadas pes­soas comuns e, para elas, dev­e­riam pare­cer razoáveis, daí a neces­si­dade de serem anal­isadas “cum grano salis”, no sen­tido de que dev­eríamos analisá-​las e/​ou colocá-​las em prática com prudência.

Diante disso, preocupou-​me a série de lim­inares expe­di­das pelo TCEMA, sus­pendendo e/​ou can­ce­lando lic­i­tações aten­dendo as solic­i­tações dos órgãos de con­t­role, bem como, recomen­dações destes organ­is­mos de con­t­role e do próprio Min­istério Público para que os municí­pios adotem pref­er­en­cial­mente o pregão eletrônico para as con­tratações públi­cas, inclu­sive as de engen­haria inde­pen­dente das fontes de recur­sos públi­cos envolvi­dos, entre diver­sas out­ras coisas.

Sei que estes órgãos de con­t­role e fis­cal­iza­ção fazem essas coisas nas mel­hores das intenções. Sei, tam­bém, que uma parte das exigên­cias – exceto pelas ampli­ações –, tem respaldo na lei, e ainda, que as exigên­cias, recomen­dações, sus­pen­sões e anu­lações visam aten­der o inter­esse público.

Por outro lado, não podemos deixar de fazer algu­mas pon­der­ações, a história do “cum grano salis”, que apren­demos no primeiro ano de faculdade.

Sem entrar no mérito das decisões já tomadas ou que estão para ocor­rer, me per­mito tecer alguns comen­tários com base no que ouvi.

Um dos motivos para que muitos proces­sos lic­i­tatórios fos­sem sus­pen­sos e/​ou can­ce­la­dos teria sido pelo fato dos mes­mos não sido disponi­bi­liza­dos a tempo e modo no sis­tema de acom­pan­hamento do TCEMA, o tal do SACOP.

Segundo soube, em muitos dos casos, isso se deu por conta da demora do próprio órgão em cadas­trar e disponi­bi­lizar as sen­has de acesso aos gestores e/​ou encarregados.

Noutras palavras, os municí­pios estariam sendo penal­iza­dos por algo que não deram causa.

Um outro prob­lema decor­rente disso e que talvez não tenha se dado conta, é que, com a sus­pen­são dos proces­sos e com demora na emis­são de uma decisão defin­i­tiva, os municí­pios ficam em um impasse: can­ce­lam? Os serviços ou mate­ri­ais presta­dos ou forneci­dos serão pagos?

Ora, tive notí­cia de municí­pios em que o tri­bunal man­dou can­ce­lar mais uma dezenas de lic­i­tações, jus­ta­mente aque­las essen­ci­ais de iní­cio de gestão, sem as quais nada no municí­pio fun­ciona: limpeza pública, medica­men­tos, com­bustíveis, etc.

Tais situ­ações causam enormes transtornos aos municí­pios e pre­juí­zos, talvez bem maiores, do que o inter­esse público que se pre­tende pro­te­ger.

Vejamos um exem­plo: a empresa, no iní­cio do ano venceu a lic­i­tação, que um ou dois meses depois foi sus­pensa pelo tri­bunal, o que impede o empresário de requerer na justiça o recon­hec­i­mento de que houve rup­tura uni­lat­eral do con­trato, bus­car o paga­mento do serviço prestado e/​ou bens entregues e, ainda, pleit­ear lucros ces­santes, paga­mento de hon­orários advo­catí­cios, etc.?

Será que ao tér­mino de tudo não terá sido muito mais prej­u­di­cial ao con­tribuinte do que se não tivessem pleit­eado, sus­penso ou anu­lado tal con­trato? Não seria muito mel­hor para o inter­esse público ape­nas que “vigiassem” a sua execução?

O outro assunto do texto – esse sim, motivo de ver­dadeira pre­ocu­pação –, é a “recomendação/​exigência” para que “tudo” seja con­tratado através de pregão eletrônico.

Quero dizer, de antemão, que mesmo a existên­cia de leis, decre­tos, instruções nor­ma­ti­vas, ou quais­quer out­ros instru­men­tos neste sen­tido estão equiv­o­ca­dos e dev­e­riam ser objeto de mobi­liza­ção visando as suas anu­lações ou revo­gações.

Não ques­tiono que seja uma forma trans­par­ente, efi­caz, e todas out­ras van­ta­gens apre­sen­tadas para os seus defen­sores, acho, inclu­sive, que deve ser o meio a ser ado­tado pelo gov­erno fed­eral e pelos esta­dos, mas não pelos municí­pios, ainda mais do nordeste e do Maranhão.

Explico o motivo.

A maio­ria dos municí­pios – algo próx­imo de cem por cento –, sobre­vivem as cus­tas dos repasses obri­gatórios e/​ou vol­un­tários das out­ras esferas estatais, são estes recur­sos públi­cos que fazem as econo­mias locais “girarem”.

Quando se impõe a exigên­cia de que as con­tratações sejam real­izadas na modal­i­dade de pregão eletrônico, está se abrindo a pos­si­bil­i­dade de empre­sas do país inteiro par­tic­i­parem e gan­harem estes con­tratos com base no critério mel­hor pro­posta financeira.

Noutras palavras, os recur­sos públi­cos que serviriam para ala­van­car a econo­mia local, senão todo, mas pelo menos sua maior parte, vai sair do municí­pio e, até mesmo, do estado.

Não falo aqui, nem da impos­si­bil­i­dade que muitas empresin­has dos municí­pios terão em par­tic­i­par dos cer­tames, seja por não dom­inarem as fer­ra­men­tas, seja porque a inter­net deixa a dese­jar, seja porque muitas não pos­suem condições de com­pe­tirem com grandes empre­sas.

Uma outra coisa que entendo como equiv­o­cada é que além do cer­tame ocor­rer por pregão eletrônico – aberto à par­tic­i­pação de todos do país –, deve, obri­ga­to­ri­a­mente, ocor­rer por item, ou seja, pode ser que uma empresa do Paraná ganhe para fornecer açú­car, outra do Rio Grande Sul ganhe para fornecer a carne, uma outra de São Paulo, ganhe para fornecer o fei­jão, e por aí vai.

A tudo isso, some-​se a difi­cul­dade para os municí­pios despenderem pes­soal para admin­is­trarem tan­tos con­tratos – a maio­ria não tem pes­soal e, quando tem, falta-​lhes a qual­i­fi­cação –, corre-​se o fun­dado risco de um dia ter um item e não ter o outro.

Mais uma vez, faz-​se necessário exam­i­n­ar­mos tal ideia “cum grano salis”, pois sope­sado tudo é bem pos­sível que o “barato saia mais caro”.

Lem­bro que há alguns anos tentou-​se fazer jus­ta­mente o con­trário: incen­ti­var o poder público a con­tratar nos próprios municí­pios.

Na época, acho que há uns dez anos, fize­mos inúmeras leis de incen­tivos para as micro e peque­nas empre­sas.

Acred­ito que o cam­inho seja esse: “favore­cer” as empre­sas dos próprios municí­pios na con­tratação com o poder público fazendo com que os recur­sos repas­sa­dos pelos entes fed­er­a­dos girem as econo­mias locais, gerem empre­gos, desen­volvi­mento, etc.

Como disse no iní­cio, não ignoro as boas intenções dos que defen­dem como forma de con­tratação do poder público a modal­i­dade do pregão eletrônico, entre­tanto, advogo no sen­tido de que se exam­ine o “filme com­pleto”: as con­se­quên­cias para as econo­mias locais.

Há mais de vinte anos que tra­bal­hamos com municí­pios e sabe­mos que ao longo dos anos eles foram empobrecendo.

Quando os números do IBGE apon­tam que o Maran­hão ficou mais pobre, que esta­mos na rabeira de tudo quanto é indi­cador, eles ape­nas trazem uma con­statação que já vín­hamos fazendo ao longo do tempo: são os municí­pios e as pes­soas que neles habitam que estão mais pobres.

As políti­cas ofi­ci­ais, as leis, os decre­tos, devem se voltar para incen­ti­var as econo­mias locais, a cir­cu­lação dos recur­sos nos próprios municí­pios e não o con­trário, em nome de uma suposta econo­mia de alguns tro­ca­dos ou de uma transparên­cia ou mesmo lisura dos certames.

Ora, basta que fis­cal­izem, que acom­pan­hem de perto.

O que não podem, em nome das mel­hores das intenções, que sei pos­suírem, incen­ti­varem o aniquil­a­mento das já frágeis econo­mias munic­i­pais e ger­arem mais pobreza extrema.

Na minha opinião, tudo que os gestores pud­erem con­tratar den­tro dos seus municí­pios, devem ser estim­u­la­dos a faz­erem – e não o con­trário. Não cobra­dos para facil­itarem que os recur­sos que dev­e­riam geram emprego e renda nos seus municí­pios faça isso em out­ros municí­pios ou esta­dos.

Da com­pra de secos e mol­ha­dos a aluguel de veícu­los, con­tratação de empre­sas de engen­haria para obras públi­cas, etc. devem ser feitas onde gerem renda e empre­gos para os donos dos recur­sos: os cidadãos.

Os órgãos de con­t­role e fis­cal­iza­ção que façam o seu tra­balho, ver­i­fiquem a lisura dos pro­ced­i­men­tos, a exe­cução dos obje­tos e tudo mais que queiram.

O que não podem é, em nome de suas como­di­dades, serem agentes pro­mo­tores da mis­éria do povo.

Abdon Mar­inho é advo­gado.