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VIO­LÊN­CIA: O TEMA INCONTORNÁVEL.

Escrito por Abdon Mar­inho

VIOLÊN­CIA: O TEMA INCONTORNÁVEL.

Certa vez, há muitos anos (acho que mea­dos dos noventa), per­gun­tei ao jor­nal­ista Wal­ter Rodrigues a razão dele não pub­licar o seu “Col­unão”, na segunda-​feira, à época encar­tado nas edição de domingo, no Jor­nal Pequeno, quando, por algum motivo, o mesmo não cir­cu­lara (alguma prensa que­brada, atraso na entrega, etc).

Como, muitas vezes, dis­cutíamos deter­mi­na­dos assun­tos, ficava curioso para ver a abor­dagem na edição impressa. Aliás, a primeira coisa que fazia todas as man­hãs de domingo, antes mesmo do café, era cor­rer, para ler os jornais.

Respondeu-​me, o grande jor­nal­ista: – Pre­firo deixar para a terça – feira, Abdon. Geral­mente, as edições das segun­das são tomadas por cenas de vio­lên­cia, cor­pos, não gosto de misturar.

Cheguei a fazer uma pil­héria com ele de que as edições de segunda-​feira eram edições de segunda.

Não pre­tendia me ocu­par de falar deste tipo de pauta. Infe­liz­mente, difer­ente daque­les tem­pos, a pauta da matança não ocupa mais os jor­nais só às segun­das, pegando o rescaldo dos fins de sem­ana, mas todos os dias. Tornou-​se incon­tornável, não só para a imprensa, mas para toda sociedade.

Em pleno meio da sem­ana, não con­sigo olhar para a capa de O EMA, lá, amar­rado em um poste, um corpo amarrado.

Era a última vítima de um lin­chamento, na cap­i­tal do estado. O primeiro com vítima fatal deste ano, neste atual governo.

Nos últi­mos anos tive­mos diver­sos casos idên­ti­cos. Lem­bro de ter me repor­tado a mais de um em meus tex­tos. Um dos que nar­rei, com certeza, foi o do ado­les­cente (acho que tinha 15 anos) tru­ci­dado e morto por taxis­tas em um bairro da per­ife­ria da cap­i­tal, em pleno Domingo de Páscoa.

Além do crime em si, da bar­bari­dade, da idade da vítima, o que me fez escr­ever sobre o tema foi esse: era Pás­coa, tempo de ressur­reição, de mod­er­ação, reflexão, entre­tanto, pes­soas, até onde se sabiam, “de bem”, tra­bal­hadores, se ocu­pavam em sujar as mãos – que, talvez mais cedo, tenha car­regado a sagrada hós­tia à boca – com o sangue de um adolescente.

Como não sou mil­i­tante da área jor­nal­ista e sim, um advo­gado que escreve uma vez ou outra, não sei os des­do­bra­men­tos do caso, se o crime foi inves­ti­gado, se os autores foram iden­ti­fi­ca­dos, se alguém foi preso, responde a processo ou se, sim­ples­mente, ficou o feito pelo não feito, o dito pelo não dito.

Descon­heço tam­bém as razões que motivou o EMA a estam­par, em sua capa, foto tão chocante, colo­cando ainda um chama­mento a reflexão, em detri­mento do outro fato ocor­rido não faz muito tempo, tão ou mais grave, quanto o de agora, e dec­re­tar de pronto, a falên­cia total do gov­erno que se instalou em janeiro último.

Claro que o fato é gravís­simo, hor­rendo, inqual­i­ficável. Mas já o era quando fiz­eram o mesmo com o ado­les­cente em plena pás­coa, com os out­ros tan­tos, antes e depois.

Por que só ficaram indig­na­dos, hor­ror­iza­dos, agora?

Talvez aí esteja o cerne da questão.

Os políti­cos, os gov­er­nos, deixaram de se pre­ocu­par com o enfrenta­mento da vio­lên­cia para se ocu­par de polit­icagem, a fazer pros­elit­ismo, enquanto as pes­soas andam assus­tadas nas ruas, com medo de colo­car os pés para fora de casa, com medo de ficarem den­tro de casa, de irem para o tra­balho e não voltarem.

Enquanto isso os nos­sos políti­cos se ocu­pam de fazer pros­elit­ismo, angariar votos com suas posições: reduzir ou não a maior­i­dade penal? Punir ou não os que come­tem crimes?

Tudo é debatido sob a égide da busca de votos, de angariar sim­pa­tia dos gru­pos de pressão.

Quando defendo, como cidadão, um endurec­i­mento da leg­is­lação penal, o faço na con­vicção que a impunidade tem sido um dos motores da crim­i­nal­i­dade, quando defendo a punição con­forme o crime cometido, não impor­tando quem seja o autor (desde que tenha capaci­dade de dis­cernir), o faço na certeza que o atual mod­elo é muito mais prej­u­di­cial à sociedade, jovens, mul­heres, cri­anças, vel­hos, não porque quero agradar este ou aquele.

O Brasil não pode mais sac­ri­ficar vidas enquanto os políti­cos dis­cutem olhando para o umbigo.

Os atos de lin­chamento que viti­maram um ado­les­cente e um adulto, ambos ladrões, tendo o adulto per­dido a vida de forma hor­rível, servi­ram, mais uma vez, de com­bustível a uma tola batalha ide­ológ­ica, com dep­utado chamando maran­henses de psi­co­patas (como se lin­chamen­tos não estivessem cada vez mais fre­quentes em cada canto país), com out­ros fazendo analo­gia entre um quadro retratando um negro no troco sendo chicoteado (no tempo que pre­cedeu a lei Áurea, em 1888, e que na ver­dade, emb­ora fatos reais, ten­ham ocor­ri­dos, a imagem retratada é ape­nas um quadro, bem famoso, por sinal) e o ladrão tru­ci­dado no poste.

São coisas abso­lu­ta­mente dis­tin­tas, não vejo sen­tido na analo­gia, nem em tan­tas out­ras teses, que se dis­cute diante do fato, inclu­sive das que querem trans­for­mar a sociedade em psi­co­pata e o ladrão em vitima indefesa.

Fico com a clara impressão que os políti­cos brasileiros habitam um mundo para­lelo. Pois se ocu­pam de dis­cu­tir a vio­lên­cia em abstrato enquanto a vio­lên­cia que mas­sacra a sociedade brasileira diari­a­mente é algo bem con­creto. Ocorre, toda hora. É uma guerra, em que a sociedade, os homens de bem estão em clara desvan­tagem, perdendo.

Claro que não é des­culpável, sob qual­quer aspecto, a sociedade tomar para si o papel de estado, sobre­tudo para pren­der, jul­gar, con­denar e aplicar a pena que achar dev­ida, inclu­sive a de morte (inex­is­tente no dire­ito penal, mas bem real no dia a dia), pelo con­trário, acho que os respon­sáveis pre­cisam ser iden­ti­fi­ca­dos, proces­sa­dos, jul­ga­dos e punidos.

Por outro lado, a sociedade, entre os quais aque­les que fazem «justiça» com as próprias mãos, assim agem, diante da omis­são cada vez pre­sente do Estado.

O Brasil cam­inha para o caos, para a mais com­pleta des­or­dem, e os gov­er­nantes não se dão conta disso. O que mais tenho ouvido de pes­soas de bem, cidadãos tra­bal­hadores, pagadores de impos­tos, é que não hora que for pos­sível, deixarão o país, deixarão, seus famil­iares, suas raízes.

Não é para menos.

Com base na pub­li­cação “Mapa da Vio­lên­cia”, edi­tado por um dos organ­is­mos da ONU, estimo que Brasil, ocor­reram 1.300.000 (um mil­hão e trezen­tos mil) homicí­dios, de 1980 até 2014.

Trata-​se de um número astronômico diante de qual­quer análise que se faça. Nem nações em guerra se mata tanto quanto no Brasil no seu dia a dia.

A coisa fica mais mais feia, quando percebe­mos que quase metade destes homicí­dios (cerca de 600.000) ocor­reram nos últi­mos 12 anos, durante as gestões do Par­tido dos Tra­bal­hadores — PT, o qual vende, interna e exter­na­mente, a ideia dos seus grandes inves­ti­men­tos e feitos na área social, e que, por­tanto, ao menos no plano teórico, fariam diminuir os índices de violência.

Sem dis­cu­tir os méri­tos das políti­cas soci­ais, necessárias e urgentes, os números mostram que elas, soz­in­has, sem a mão forte do Estado, não têm o condão de debe­lar a vio­lên­cia, que não adi­anta, tratar crim­i­nosos como viti­mas e a sociedade como culpada.

Vou adi­ante, políti­cas soci­ais e repressão estatal, não são, como querem fazer crer os ilu­mi­na­dos da int­elec­tu­al­i­dade brasileira, coisas que se excluem.

Não é porque se faz esco­las que os presí­dios são desnecessários, como dizem a cansar: mais edu­cação, menos cadeias.

Isso é só tolice.

Pre­cisamos de mais saúde, mais edu­cação de qual­i­dade, mais assistên­cia social e tam­bém de um sis­tema penal que fun­cione, com uma polí­cia forte e capac­i­tada para iden­ti­ficar cul­pa­dos, um Min­istério Público que cumpra seu papel, um Judi­ciário que os con­dene e um sis­tema pri­sional que os façam cumprir as penas.

Pre­cisamos de leis penais, mais rígi­das, que iniba a prática crim­i­nosa, que faça o cidadão ten­tado pelo lucro fácil do crime, pen­sar duas ou três vezes antes de come­ter o crime.

Ah, aos que defen­dem a impunidade dos crimes cometi­dos por menores, se o IPEA estiver certo, os crimes desta natureza, chegam a 10% (dez por cento), se ape­nas pegar­mos os homicí­dios ocor­ri­dos nos últi­mos doze anos, temos algo em torno de 60.000 (sessenta mil), cerca de 5 mil/​ano.

Como as estatís­ti­cas não são con­fiáveis, e há quase uma una­n­im­i­dade em dizer que nas ações crim­i­nosas os chama­dos “menores» são os mais bru­tais, acred­ito que sejam números bem maiores, ainda que seja o diz o IPEA, não são números desprezíveis.

Aos políti­cos, mil­i­tantes ide­ológi­cos, aos que não têm o com­pro­misso de resolver os prob­le­mas que afligem a sociedade, os números nada rep­re­sen­tem, para os que per­dem um ente querido, um filho, um irmão, um primo, um amigo, é bem mais que isso. Talvez essa seja uma das razões da forra arbi­trária, despro­por­cional, sem­pre que surge uma oportunidade.

Um ato bár­baro pode ser ape­nas um pedido de socorro de uma sociedade exausta com tanto descaso.

Abdon Mar­inho é advogado.

O BRASIL E A DEMOC­RA­CIA SEM POVO.

Escrito por Abdon Mar­inho

O BRASIL E A DEMOC­RA­CIA SEM POVO.

Logo depois do ciclo mil­i­tar, dois vel­hos coro­néis da política maran­hense, acos­tu­ma­dos com eleições no bico de pena, na car­retilha, no mapismo e noutras modal­i­dades eleitorais típi­cas do inte­rior, se encon­traram e pas­saram a dis­cu­tir o quadro.

– É com­padre, as coisas agora tão mais difí­ceis. Todo mundo tem dire­ito, todo mundo ques­tiona tudo. Só se fala agora nesta democracia.

– Pois é, meu com­padre, as coisas não estão fáceis. Até que não reclamo, muito, da tal democ­ra­cia. Até acho que ela é boa, só não é mel­hor por causa do povo.

A situ­ação acima – que talvez seja ape­nas mais uma do vasto arquivo de «cau­sos» políti­cos do Maran­hão –, cabe como uma luva para retratar o atual momento político brasileiro.

A democ­ra­cia, tal como apren­demos na escola, vem do grego demokra­tia, e significa

  1. Gov­erno do povo; sobera­nia pop­u­lar; democratismo.
  2. Dout­rina ou régime político baseado nos princí­pios da sobera­nia pop­u­lar e da dis­tribuição equi­tativa do poder, ou seja, régime de gov­erno que se car­ac­ter­iza, em essên­cia, pela liber­dade do ato eleitoral, pela divisão dos poderes e pelo con­t­role da autori­dade, i. e., dos poderes de decisão e de exe­cução. (Definição do dicionário Aurélio)

Durante muitos anos os par­tidos esquerdis­tas, enti­dades soci­ais, artis­tas e int­elec­tu­ais ditos pro­gres­sis­tas, diziam falar em nome do povo, da democ­ra­cia, do estado democrático de dire­ito, nos dire­itos da pop­u­lação, da sociedade civil, etc.

Nos últi­mos tem­pos, ao que parece, há um divór­cio se consumando.

Estas pes­soas já não falam mais em nome do povo. Isso temos clara­mente na rep­re­sen­tação política no Con­gresso Nacional.

Na votação da PEC que trata da redução da maior­i­dade penal – assunto que tratei num texto ante­rior –, deu para perce­ber o quanto as pau­tas da sociedade são dis­tin­tas destes par­tidos e movi­men­tos. Enquanto, quase noventa por cento da pop­u­lação, defende a redução da maior­i­dade penal, temos as rep­re­sen­tações destes segui­men­tos defend­endo o contrário.

Pior do que defender é apon­tar para a sociedade (só noventa por cento da pop­u­lação) acusando-​a de con­ser­vadora, rea­cionária, de dire­ita, racista, igno­rante e até homofóbica. Um amigo me falou de um texto pub­li­cado e que cir­cula na inter­net, de um destes nos­sos sábios, dizendo que o povo não pos­sui capaci­dade de dis­cernir o que é bom ou ruim. E que apoiaria até pena de morte. Não li este de que falou, mas li out­ros que cam­in­ham no mesmo sentido.

E é este o ponto.

Os out­rora defen­sores ardorosos da democ­ra­cia, agora pre­gando a democ­ra­cia sem povo. Democ­ra­cia onde, os suposta­mente sábios, deci­dam pela maio­ria da pop­u­lação, que seria igno­rante para saber os males que lhe aflige. Não é por nada não, mas é jus­ta­mente disso que recla­mava um dos dos coro­néis do nosso inte­rior, na visão dos nos­sos pro­gres­sis­tas, o que atra­palha a democ­ra­cia é o povo.

Estas pes­soas – muitas até com biografias valiosas –, estão, tão desconec­tadas da real­i­dade, que pro­movem o surg­i­mento de pes­soas que nem pos­suem uma história de vida elogiável, como é o caso do dep­utado Eduardo Cunha, pres­i­dente da Câmara dos Dep­uta­dos. O grosso da pop­u­lação brasileira está ao lado dele nesta questão da maior­i­dade penal e con­tra os seus eleitos «progressistas».

Caso esse apoio se estenda a out­ros aspec­tos, isso se dará pela falta de com­preen­são e leitura da real­i­dade brasileira por parte destes par­tidos e movi­men­tos, que pref­erem cul­par o povo.

Na questão especí­fica da maior­i­dade penal, a pop­u­lação quase toda com­preende que não tem jus­ti­fica­tiva para que crim­i­nosos menores não paguem por seus crimes.

Isso acon­tece porque a pop­u­lação quase toda já foi vítima da vio­lên­cia prat­i­cada por estes menores criminosos.

Não adi­anta nos­sos int­elec­tu­ais apontarem para os pro­gra­mas sen­sa­cional­is­tas como respon­sáveis pelo apoio quase maciço da pop­u­lação ao endurec­i­mento da leg­is­lação penal.

Os pro­gra­mas que vivem da explo­ração do crime só os divul­gam, não os comete. E só os divul­gam porque crimes acon­te­cem, numa veloci­dade tão grande que até nos confunde.

A pop­u­lação brasileira não é – difer­ente do que afir­mam muitos dos nos­sos int­elec­tu­ais –, rea­cionária, é ape­nas vítima diária de uma vio­lên­cia, para a qual os gov­er­nantes não apre­sen­taram uma pro­posta con­sis­tente que a resolva. O cansaço se estende aos supos­tos pro­gres­sis­tas que estão no poder há doze anos e meio e que nada fizeram.

Há, por todo país, mil­hares de pais de família chorando a morte de seus fil­hos (pois essa é uma dor que nunca cessa), o estupro de suas fil­has e mul­heres, lamen­tando a perda de seus bens.

A sociedade brasileira que passa quase seis meses do ano tra­bal­hando só para pagar impos­tos – e ape­sar disso –, não tem esco­las que preste, a saúde mata os pacientes na fila, tam­bém não pode colo­car os pés fora de casa pois é assaltada, vio­len­tada, morta.

Os nos­sos int­elec­tu­ais da redoma não se deram conta que todos os anos acon­te­cem no Brasil mais de 50 mil homicí­dios, o mesmo número de estupros. Nem países em guerra mata-​se tanto.

As víti­mas, a maio­ria jovens, eram fil­hos de alguém, irmão de alguém, esposa de alguém. As maiores víti­mas são as pes­soas que eles juram rep­re­sen­tar, pobres, mul­heres, negros, jovens.

São números tão superla­tivos que difi­cil­mente existe alguém que não tem uma história de vio­lên­cia sofrida, dire­ta­mente ou através de um par­ente. As víti­mas são/​eram pes­soas de carne e osso, com famil­iares, ami­gos, deixaram uma lacuna, não podem, não devem, serem tratadas como meras estatísticas.

A sociedade brasileira é a maior vítima da falta de políti­cas públi­cas – ape­sar do muito que paga –, por conta disso está zan­gada, e com razão, com os seus supos­tos rep­re­sen­tantes, que sem­pre enx­ergam a vítima, no estuprador, no assas­sino, no ladrão, e não nos que foram, efe­ti­va­mente, suas vítimas.

Suas excelên­cias pre­cisam enten­der isso, ao invés de acusar a sociedade de con­ser­vadora, racista, intol­er­ante. Sobre­tudo a sociedade brasileira que tem tido muita paciên­cia com os seus governantes.

Outra coisa que pre­cisam enten­der é que, para que ten­hamos uma democ­ra­cia, é necessário ter­mos povo. É necessário que este povo seja chamado a decidir o futuro do nosso país, por mais que isso pareça estranho para muitos.

Em tempo. Vejo muitos destes nos­sos pro­gres­sis­tas apoiando o fato da pop­u­lação grega ter deci­dido não plebisc­ito sobre o ajuste econômico. Enten­dem que foi uma boa decisão, democ­ra­cia legit­ima, um não aos ban­queiros inter­na­cionais e ao FMI. Estran­hamente são os mes­mos que acham que não deve­mos ouvir a pop­u­lação brasileira sobre seus temas cruciais.

Será que democ­ra­cia só boa na Gré­cia? Tem­pos estranhos.

Abdon Mar­inho é advogado.

A INSEN­SATA DEFESA DA IMPUNIDADE.

Escrito por Abdon Mar­inho

A INSEN­SATA DEFESA DA IMPUNIDADE.

«Não matarás».

Aos que crêem este é o quinto man­da­mento do decál­ogo, o con­junto de leis escrita pelo próprio Deus e entregue a Moisés, con­forme nar­rado no livro do Êxodo.

No dire­ito penal brasileiro, este é o delito mais grave. O artigo 121 é tax­a­tivo: Matar alguém. Em seguida trás a pena, logo depois as demais condições que agravam, reduzem ou elim­i­nam a pena.

Alheios à lei dos homens e tam­bém aos man­da­men­tos, estão os crim­i­nosos brasileiros que ainda não com­ple­taram dezoito anos que, aos olhos do nosso orde­na­mento jurídico, não têm a capaci­dade de dis­tin­guir a gravi­dade dos seus atos e, por isso mesmo, pos­suem uma licença espe­cial do Estado para matar quan­tos forem capazes, sofrendo como única con­se­quên­cia, uma inter­nação que não pode ser supe­rior a três anos, que depois de cumprida ou não (a larga maio­ria nunca cumpre o período de inter­nação) pode sair às ruas com a ficha limpa, como se nunca tivesse cau­sado o mal ou a des­graça de nen­huma família. E se ainda menores poderão con­tin­uar sua car­reira de crimes.

Se têm menos de doze anos, ainda que mate mil pes­soas, sequer pode ser detido. Sai pela porta da frente como se nada tivesse feito.

Isso está correto?

A maio­ria da pop­u­lação brasileira, quase 90% (noventa por cento), acha que não. Infe­liz­mente, e na mesma pro­porção, este não é o entendi­mento dos seus rep­re­sen­tantes na Câmara dos Dep­uta­dos, quando 30% (trinta por cento) se man­i­fes­taram con­tra a redução da maior­i­dade penal e pela manutenção da licença para matar e para come­ter todo tipo crime, aos menores de 18 e maiores de 16 anos.

Mais do isso, cap­i­tanea­dos pelo gov­erno brasileiro, que atual­mente tem menos de dez por cento de aceitação (será esta uma das causas?) acham que noventa por cento da pop­u­lação não só está equiv­o­cada, como tam­bém é con­ser­vadora, retrógrada, racista, burra e homofóbica (con­forme disse um dep­utado), tudo porque essa larga, estu­penda maio­ria de cidadãos, enten­dem não ser aceitável que deter­mi­na­dos crimes fiquem impunes, que aos seus autores recaia os rig­ores da lei.

Aqui, então, temos um ques­tion­a­mento, que democ­ra­cia é esta em que uma mino­ria tem o poder de impor seu pen­sa­mento à maioria?

O Brasil pre­cisa de mecan­is­mos de con­fir­mação de mandato. Como é pos­sível que um par­la­mento tão dis­tante e dis­so­ci­ado do pen­sa­mento dos eleitores possa ainda per­manecer por mais três anos e meio? Ao meu sen­tir, o par­la­mento brasileiro carece de legitimidade.

Vamos em frente.

Pior que o dis­tan­ci­a­mento dos par­la­mentares do que pensa seus patrões (o povo), é o aço­da­mento raivoso com o que defende estas ideias.

Um estrangeiro que acom­pan­hasse as últi­mas sessões da Câmara, seria ten­tado a pen­sar que a pro­posta de redução da maior­i­dade penal tem por propósito encar­cerar todos os jovem do país ou que a ideia seja man­dar pren­der os sem­i­nar­is­tas do Brasil e não crim­i­nosos pela prat­ica de crimes graves, hedion­dos. Crim­i­nosos que pos­suem uma longa ficha, com rou­bos, estupros, latrocínios, lesão cor­po­ral grave, etc.

Estran­haria mais ainda por saber que as pes­soas que se dizem mais estu­dadas, int­elec­tu­ais, têm na impunidade uma estraté­gia de com­bate à violência.

Trata-​se de uma ino­vação dos trópi­cos. Nen­hum país do mundo reduziu a crim­i­nal­i­dade apo­s­tando na impunidade. Nações civ­i­lizadas, mod­e­los de democ­ra­cia, punem crim­i­nosos que ten­ham cometido crimes até antes dos dos dez anos de idade.

No resto do mundo não há um alvoroço todo por uma coisa que lóg­ica: um crime, uma penal­i­dade, inde­pen­dente de quem os cometa.

Aqui, no nosso país, temos o gov­erno e par­tido da pres­i­dente, cer­rando forças, inclu­sive, com inter­fer­ên­cias inde­v­i­das no tra­balho do par­la­mento, para impedir a a aprovação da redução da maior­i­dade penal.

O min­istro da justiça foi escal­ado para dizer que a aprovação causaria uma caos ainda maior no sis­tema carcerário nacional. Houve denun­cias, ainda, de tro­cas de favores poucos repub­li­canos com os par­la­mentares para que votassem contra.

Alegam, os valentes defen­sores da impunidade, que a solução é maior inves­ti­mento em políti­cas soci­ais, em edu­cação, etc., como se uma coisa inval­i­dasse a outra.

O argu­mento não é ape­nas ingênuo, é tolo.

Os cidadãos que defen­dem a redução não estão dizendo que com a sua aprovação se deva ces­sar os inves­ti­men­tos em políti­cas públi­cas, em edu­cação, em assistên­cia social, pelo con­trário. Políti­cas públi­cas e com­bate a crim­i­nal­i­dade, punição dos deli­tos não são excludentes.

Deve­mos ter esco­las de qual­i­dade e políti­cas públi­cas para os querem estu­dar e cadeia para os que come­tem crimes.

Defender que são coisas que se excluem é um forçoso exer­cí­cio de fal­si­dade intelectual.

Tão pouco esta­mos dizendo que a redução é solução para criminalidade.

O que esta­mos dizendo é que a redução tem caráter inibidor da vio­lên­cia, que o cidadão sabendo que o seu ato será punido ele pen­sará duas vezes antes de praticar o crime.

O que acon­tece hoje, é que, com a certeza da impunidade, estes crim­i­nosos menores, são mais vio­len­tos que os crim­i­nosos adul­tos, capazes de atos bár­baros, por isso estão chefiando quadrilhas, matando, estuprando…

A manutenção das coisas como estão servem muito mais ao crime que aos jovens.

A exceção dos gov­ernistas e seus ali­a­dos, qual­quer pes­soa, prin­ci­pal­mente os que já foram víti­mas de vio­lên­cia envol­vendo menores, sabem disso.

Quem não lem­bra a den­tista que foi incen­di­ada viva por um menor? A jovem que foi esma­gada por outro – que depois disse ter pas­sado com o carro sobre ela por que quis? O caso daquele outro que no dia ante­rior ao aniver­sário de 18 anos resolveu matar a namorada? O jovem que voltava da escola e foi assas­si­nado na porta da casa por um menor? O caso de Castelo (PI) em que estupraram, tor­tu­raram, muti­la­ram e ati­raram as qua­tro ado­les­centes de um pen­hasco de mais de 20 met­ros e depois ainda desce­ram para as ape­dre­jar, cau­sando a morte de uma? Os menores envolvi­dos já tin­ham uma longa ficha poli­cial, um, com 15 anos, já reg­is­trava mais de cem passagens.

Vejam que iro­nia, as jovens além de menores são tam­bém mul­heres, entre­tanto a vida da que mor­reu e o sofri­mento e tor­turas das que ficaram vivas é menos impor­tante que a vida dos seus algo­zes. Repito: isto está correto?

Não deixa de ser estranho, tam­bém, o fato do gov­erno e os par­tidos que se colo­cam con­tra a punição de crim­i­nosos cruéis, con­hecerem saberem qual é a solução para o prob­lema e, estando no poder há doze anos e meio não o terem resolvido. Os crim­i­nosos que ten­tam por todas as for­mas pro­te­ger neste momento, mal eram nasci­dos quando estes sábios chegaram ao poder. Por que não impedi­ram que viessem a delin­quir? Por que não implan­taram suas políti­cas que sabem ser a solução para a criminalidade?

Pois é, nada fiz­eram e, se fiz­eram, suas ações não sur­tiram resul­ta­dos. Na ver­dade os resul­ta­dos foram opos­tos. Se pegar­mos os mapas ou añuários da vio­lên­cia vamos ver­i­ficar que nos últi­mos doze anos e meio o cresci­mento da vio­lên­cia foi quase que expo­nen­cial se com­para­dos aos doze anos ante­ri­ores. Basta comparar.

As políti­cas gov­er­na­men­tais nos últi­mos doze anos nunca foram de enfrenta­mento da vio­lên­cia, o gov­erno, o par­tido do gov­erno, seus ali­a­dos e essa gama de «int­elec­tu­ais» que orbitam em torno do do poder, têm uma visão roman­ti­zada do crime. Acham que todo crim­i­noso é vítima da sociedade; que todo crim­i­noso pode ser recu­per­ado; que a sociedade, a classe média, ou os mais ricos, devem sofrer com a ação dos crim­i­nosos. Devem ser punidos por tra­bal­har de sol a sol, por pagarem impos­tos escorchantes.

Não faz muito tempo, ouvi alguém tecendo loas ao assalto a um cen­tro com­er­cial. Igno­ram, estes sábios, que as maiores víti­mas da vio­lên­cia são os mais pobres, são os jovens.

A sociedade brasileira, difer­ente dos seus rep­re­sen­tantes, sabe disso.

Com essa visão dis­tor­cida, muitas das políti­cas foram implan­tadas no sen­tido de enfraque­cer a insti­tu­ição famil­iar, como se o Estado pre­tendesse assumir o pátrio poder dos pais. O desas­tre foi posto.

O resul­tado do que fiz­eram está aí sendo visto e sen­tido por todos.

Abdon Mar­inho é advogado.