UMA TRÉGUA DE NATAL.
Por Abdon Marinho.
UM amigo reclama da ausência dos textões – pois é, tem quem sinta falta. Rsrsrs.
Impus-me essa parada pouco antes do Natal e que deve ir até o Dia de Reis. Fiz isso, não pela falta de assuntos para comentar, pelo contrário. Decidi parar justamente pelo excesso de assuntos de uma pauta política que não encontra um momento de trégua.
O Brasil, entenda-se com isso, o conjunto dos cidadãos brasileiros, parece-me, não saber mais o significado de Natal, Ano Bom, dia de Reis, tudo é politica, tudo é enfrentamento, tudo é guerra ideológica.
A pauta política, como se estivesse acima de tudo e de todos, é o que os guia. Não sabem mais o que significa trégua natalina, essa reta final do ano em que as pessoas – era assim até bem pouco tempo –, se dedica a reflexão sobre o sentido da vida, representado pela comemoração do nascimento do Menino Jesus e a fé em um futuro melhor que se chamava de “Ano Bom”.
Sufocaram o país com os debates extremados e ninguém mais ligou para o sentido do Natal e do Ano Bom.
O que interessa, a única coisa que passou a interessar ao país, é o insano debate político.
Chegamos ao ponto de, na noite de Natal, o presidente da República, ao invés de se dirigir à nação com um discurso de conforto pelo natalício do Deus Homem, ocupou-se, em sua live semanal de fazer proselitismo sobre suas pautas políticas, em especial aquela que lhe parece mais cara: armar a população civil ou a formação de milícias, sob o argumento de que “os bandidos já estão armados”.
Em tese, pessoalmente, não sou refratário a ideia de que o cidadão tem o direito de adquirir armas para a defesa pessoal, entretanto, não acredito que essa deva ser a pauta do país em um momento de tamanha dificuldade para todo mundo por conta de uma pandemia e com o país chegando próximo à estarrecedora marca de 200 mil mortos pela covid-19.
Em um país em a população de pessoas portadoras de necessidades especiais é de quase dez por cento, parece-me um escárnio que se fale em armar a população e zerar as tarifas de importações de armas e, ao mesmo tempo manter tarifas de importação para produtos médicos e/ou ortopédicos.
Ainda mais, que seja esta a pauta a ser tratada na noite de Natal.
Se já era um excesso o discurso armamentista do presidente da República na noite de Natal ou invés de uma mensagem de conforto para uma uma população assombrada pela mais tragédia humanitária deste século, a reação ou contraposição de um governador de estado a tal discurso, comparando o mandatário da nação à “besta fera” e que tal fala seria coisa de “satanás”, apenas comprova a que nível chegou a política nacional.
Em uma nação onde mais de noventa por cento da população se diz cristã, para a principal data da cristandade, o nascimento de Jesus Cristo, autoridades “convidam” para Ceia de Natal, “milícias armadas”, a “besta fera” e “satanás”.
Pois é, para a desgraça da nação, parece-nos que as “autoridades” já não possuem qualque senso de proporcionalidade, de decoro ou mesmo do ridículo.
Será que alguém achou normal que na noite de Natal fossem feitos tais discursos?
O pior é que a população – ou devo dizer, o gado travestido de militância –, achou normal e, na véspera de natal, na própria noite de Natal, ao invés de estarem com suas famílias saudando o nascimento de Jesus, estavam de lado a lado, repercutindo as insanidades de seus líderes.
A insanidade que toma conta da política nacional chegou a esse “estarrecedor” ponto.
Por tudo isso – até porque não tocarei bumbos para malucos dançarem –, resolvi estabelecer uma “trégua natalina”, que, como dito anteriormente, deve durar até o Dia de Reis, data, segundo a tradição cristã, encerra-se o círculo do nascimento de Jesus Cristo.
Essa foi a razão para não ter me manifestado sobre tantos assuntos que os políticos insanos impuseram à população como os mais relevantes para a sociedade.
Tudo isso, repito, passando por cima de toda a tradição de respeito ao período natalino.
Confesso que fique tentado a manifestar-me sobre a “pauta maluca”, mas me contive para não lhes dar esse “gostinho”, como dizíamos anteriormente.
O restante da população deveria fazer o mesmo. Simplesmente ignorar as insanidades protagonizadas pelos líderes da nação pois nenhum deles têm qualquer interesse no bem-estar do povo.
Para eles o povo não merecem qualquer respeito e não passam de “massa de manobra” para os seus projetos de poder.
Essa pauta política que não encontra uma trégua nem na noite de Natal trata-se apenas de briga pelo poder, nada além disso. E, pior, ninguém tem interesse em conquistar e deter o poder em prol do bem comum, mas, apenas dos seus próprios interesses.
A guerra política e o incessante enfrentamento é uma “distração” para manter o povo sectário de ambos os lados e incapazes de enxergarem o que verdadeiramente são: líderes de “pés de barro”, inconsistentes ideologicamente e incompententes nos e exercícios dos mandatos que lhe foram confiados.
Este é um dos motivos para a “guerra política”.
Sem as “distrações” as pessoas terão tempo para examiná-los e, inclusive, perceber as falhas de caráter que possuem.
Por isso que não respeitam as tradições do Natal e de ano bom, pois é importante manter a beligerância entre seus “faccionados”.
Entra dia, sai dia, e as “guerras fakes” inundam as redes sociais, os grupos de aplicativo como se não houvesse qualquer outro interesse do povo enquanto milhares já perderam a vida e outros tantos ainda a perderão. Nem o recesso natalino e de ano são respeitados. Nem mesmo a noite de Natal, conforme assistimos estarrecidos.
Vejam que mesmo em guerras de verdade é comum se observar tréguas de natal.
O exemplo mais tocante neste sentido deu-se no Natal de 1914, na Primeira Guerra Mundial, nas proximidades da cidade de Yprès, Bélgica. Durante meses de intensos combates e em trincheiras próximas, na noite de 24 de dezembro, os combatiam seus inimigos começaram a sair de suas trincheiras desarmados e irem para “terra de ninguém”, onde poderiam ser abatidos por seus inimigos, para desejarem-lhes feliz natal. Naquela noite e no dia seguinte, a trégua de natal foi respeitada. Sem ordens superiores, sem políticos determinando. Apenas homens que entendiam o real significado do Natal.
A guerra depois prosseguiu e, infelizmente, por muitos anos. Milhares de vidas foram perdidas e muitos daqueles soldados e seus superiores punidos. Mas nada tira a grandeza daquela trégua de Natal.
Aqui, nas nossas “guerras fakes” do dia a dia, nem o nascimento de Cristo é capaz de determinar uma trégua.
Não para nós e para os homens de boa vontade.
Temos muitos assuntos a tratar, mas faremos isso no tempo certo.
Abdon Marinho é advogado.