A DEMOCRACIA DO TACAPE.
Por Abdon Marinho.
ALGUÉM chega me conta uma coisa a propósito do quadro político neste segundo turno; e mais um e mais outro.
Depois me perguntam o que acho.
Confesso que resisto em acreditar na maioria das coisas que me contam.
As mais elevadas autoridades do estado, seguindo orientação expressa do governador, escolheram um dos candidatos e o governo estadual inteiro virou uma extensão da campanha. Não posso acreditar.
Secretário de estado ameaçando com o inferno de Dante aqueles que não seguirem a orientação do governador e apoiar o seu candidato. Um absurdo!
Distribuição de centenas de milhares de cestas básicas nas escolas da rede estadual ou na periferia da cidade, com o propósito de captar votos. Um crime!
Ameaças e chantagens aos servidores ocupantes de cargos comissionados, de chefia ou contratados, caso estes não plotem seus carros ou declarem voto no candidato chapa-branca. Inaceitável!
Reuniões e mais reuniões, com verificação de frequência dos servidores, em louvação ao candidato. Uma vergonha!
Pagamento dos servidores públicos coincidindo com a véspera das eleições municipais;
O governador do estado, em pessoa, passeando e posando “sentadinho” no banco da praça com o candidato oficial. Nojento!
O governador “investido” no papel de “cabo eleitoral” arregimentando apoios e negociando varejos as expensas do cargo e do governo com vereadores e ex-candidatos derrotados no primeiro turno em apoio ao “seu” candidato. Degradante!
O vice-governador, também investido no papel de cabo eleitoral, ameaçando publicamente lideranças politicas do estado e as chamando de “desertores”. Viva Vitorino!
O próprio candidato em áudio que não sei recente – mas que contraria o discurso da nova política –, pedindo que se descobrisse de quem seria a indicação do terceirizado que vigia a repartição pública ou do zelador do prédio para poder “cobrar” depois. Asqueroso!
O próprio candidato, segundo denúncias, teria feito campanha sabendo-se contaminado pelo vírus da covid-19, por 05 (cinco) dias, contaminando ou colocando em risco de contaminação dezenas, centenas ou milhares de pessoas, isso em plena pandemia. Hediondo!
O secretário de estado da saúde e o próprio governador que determinou o “confinamento” de toda a população por meses, omissos diante de tal crime contra a saude pública e, pior, apoiando e pedindo votos para quem foi capaz de um crime tão hediondo. Inacreditável!
Ainda em plena pandemia e quando a mesma volta a ganhar força, o próprio governador se rejubilando com as aglomerações promovidas pelo “seu” candidato. Inaceitável!
Informação de contratação de cem mil “bocas de urnas” para atuar no dia pleito – um disfarce para a compra de votos explicita. Chamem a policia!
A minha resistência em acreditar neste tipo de coisa – e nisso reside minha ingenuidade –, é que não me recordo de ter visto aqueles a quem combatemos politicamente durante tantos anos serem capazes de gestos tão torpes e em tamanho volume quanto aos que somos apresentados agora.
E, lá atrás, lembro-me muito bem, dizíamos que queríamos uma mudança de comportamento das autoridades.
O que ganhamos foi isso? Foi para isso que ficamos, por quase cinquenta anos combatendo o sarneísmo? Para termos um governo com práticas mais arcaicas ainda?
Até agora não consegui assimilar, por exemplo, como o governador e seus auxiliares diretos, principalmente da área da saúde – que passaram os últimos meses na cantilena do “fique em casa”, "mantenha distanciamento”, “não faça aglomeração”, etcetera –, saúdem as aglomerações do seu candidato e, pior, apoiem um candidato acusado de haver, sabendo-se, infectado, mantido uma campanha por dias seguidos, ignorando a saúde dos cidadãos.
Será que estas autoridades não deveriam explicar essa situação direitinho? Inclusive se aconteceu ou não, apesar das provas abundantes.
Calam-se por vergonha ou por indiferença aos que confiaram nas autoridades?
Como é que fica isso? Nada têm a dizer a população que se trancou em casa? Aos empresários que perderam seu patrimônio – e continuam perdendo –, por conta da pandemia?
Como compreender que autoridades, governador, vice-governador, secretários e tantas outras, ameacem e chantageiem cidadãos livres por estes não aceitarem a votar em um candidato que não reúne as condições mínimas para o exercício de qualquer cargo, porque este foi imposto pelo capricho pessoal de apenas uma pessoa?
Como que estes apoiadores nada dizem diante de áudios e vídeos em que revelam o candidato externando, em linguajar chulo, toda sorte de preconceitos e indigência moral?
Uma outra informação de extrema gravidade é a que narra a possível contratação de 100 mil “bocas de urnas”, ou no linguajar comum, compra explícita de votos.
Acredito que as autoridades ligadas à Justiça Eleitoral, ao Ministério Público Federal e a Polícia Federal, devem ficar atentas e apurarem se tal informação é verdadeira ou não.
Trata-se de algo muito grave e com potencial para desequilibrar o pleito.
Mais grave ainda, por sugerir a participação de elevadas autoridades públicas do estado no delito.
E esse é apenas um possível abuso, diante de outros que já estão em curso.
Como aceitar como normal que o governo estadual use as forças de segurança do estado para fazer distribuição, a rodo, de cestas básicas para as pessoas carentes até na véspera do pleito eleitoral, em ato que caracteriza de forma cristalina, o abuso de poder, a compra de votos, e principalmente, a falta de limites dos donatários do poder, enquanto, às escâncaras, pedem votos?
Vejam, ainda que digam que se trata de programa regular, não é verdade.
Estão distribuindo milhares cestas básicas, explorando a miséria do povo, para cooptar a simpatia do povo para o governo e, por extensão, ao candidato oficial.
Uma vergonha que usem, inclusive, a alimentação escolar das crianças carentes.
A escala de serviços da corporação estabelece como datas para a distribuição das cestas básicas os dias 25, 26 e 27 de novembro.
Qual a razão de não terem distribuído antes?
Qual o motivo para não deixarem para distribuir depois do pleito?
A mesma distribuição está ocorrendo noutros municípios inclusive naqueles onde a miséria, infelizmente, é mais premente?
A exploração da miséria como barganha politica é uma vergonha, é uma ignomínia, deveria ser algo para aqueles que a praticam se envergonharem de se olharem no espelho.
Entretanto, isso parece não envergonhar as autoridades supostamente envolvidas, e, pelo contrário, parece ser motivo de orgulho.
As pessoas de bem não podem – e não devem –, aceitar esse tipo de coisa, não foi pelo que estamos vivenciando que entregamos os melhores anos de nossas vidas.
Ouvi um áudio em que o candidato “oficial” do governo procura saber de quem é a indicação de um terceirizado da segurança ou da zeladoria para “cobrar depois” e fico imaginando se esse tipo de coisa que ocorria ou ocorre em um órgão de terceiro ou quarto escalão, não acontece nos demais órgãos ou secretarias de governo.
De um governo que quando assumiu, frise-se, tinha como compromisso primeiro a não utilização do aparelho estatal para perseguir os mais fracos e os menos favorecidos.
Foi isso que o governador prometeu no seu discurso de posse.
Esse áudio e tantos outros, até onde sei nunca foram desmentidos e ainda assim, nunca ouvimos do governador ou de outras autoridades, se aquele tipo de cobrança e procedimento era “padrão” do governo que tinha como mote a liberdade pregada no discurso de posse.
Acredito que ao dizer aquelas tão belas palavras – que contrasta com tudo que estamos assistindo –, sua excelência, as proferiu ao vento, para serem levadas e sem qualquer serventia.
As palavras, assim como o governo, nada mais eram do que uma triste caricatura da verdade real, o retrato final de Dorian Gray, que o gênio de Oscar Wilde tão bem exprimiu.
Não devemos desanimar, a liberdade ainda não chegou ao Maranhão, nosso povo continua escravizado por caprichos pessoais e sendo humilhados, mas, certamente, algum dia ela vai chegar. Tudo chega.
O caminho para isso é o repúdio veemente aos abusos, aos crimes e ao vale-tudo eleitoral.
É dizermos que não aceitamos e que estamos cansados de manipulação, mentiras e engodos.
Abdon Marinho é advogado.