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Bem Vindo a Pagina de Abdon Marinho, Ideias e Opiniões, Quinta-feira, 21 de Novembro de 2024



A palavra é o instrumento irresistível da conquista da liberdade.

Escrito por Abdon Marinho


TRINTA ANOS DE UMA CAMPANHA MEMORÁVEL V.

Episódio 5 - Aventuras de Dom José Farsante.

Por Abdon C. Marinho.

— GRANDE EXPEDIENTE. Com a palavra o deputado Juarez Medeiros. Assim o deputado Manoel Ribeiro, presidente da Assembleia Legislativa, anunciava o último pronunciamento daquele que fora um dos mais brilhantes tribunos daquela Casa. Era o dia 12 de janeiro de 1995, quinta-feira.

A assembleia legislativa fora convocada para apreciação das primeiras medidas do governo Roseana Sarney. 

Com a serenidade que sempre lhe foi característica, Juarez inicia seu pronunciamento desculpando-se por ocupar, sobretudo, as pessoas que ocupavam as galerias da Assembleia com assuntos que não seriam suas pautas mais urgentes, como emprego, saúde, educação. E, ao longo de bem mais trinta minutos, exibindo, vídeos, matérias de jornais, documentos diversos, exibe para os deputados, funcionários e todos os presentes, a série de fraudes cometidas nas eleições de 1994, muitas das quais sob o comando direto do ex-presidente José Sarney. 

O discurso que guardo há quase trinta anos (e que tentarei compartilhar com os leitores de alguma forma) não faz justiça aquele momento em que os presentes, como ele próprio disse, só não puderam aplaudir, mas, em um silêncio inusual, assistiram aos desnudamento de tudo que  foram capazes de fazer para “tomarem” aquela eleição de Cafeteira. 

Os pronunciamentos da Assembleia não recebem nomes, mas esse, em especial, foi escrito e montado previamente por seu autor e recebeu o nome que é o título deste episódio “Aventuras de Dom José Farsante”. 

No dia anterior, no Pequeno Expediente, Juarez havia lido um pequeno poema sobre Anacleto e o “seu pai”, no dia seguinte, conforme anunciado, ele iniciou por reproduzir o poema para iniciar o assunto que o levaria ao seu último pronunciamento na Casa de Manuel Bequimão. 

Enquanto ia falando e desnudando as eleições, seus assessores iam mostrando as provas coletadas ainda durante o segundo turno, mas, também depois da eleição ter findado.  

Pois bem, como aqui se trata de um episódio, retornemos aos fatos ocorridos no primeiro turno. O Tribunal Superior Eleitoral - TSE, apontou que naquele pleito houve 1.146.626 votos nominais (63,10%), 555.651 votos em branco (30,58%) e 114.902 votos nulos (6,32%) totalizando o comparecimento de 1.817.179 eleitores (68,48%).

Essa informação é relevante para fazermos um “batimento” com o resultado do segundo turno. 

Como vimos anteriormente, a chapa Roseana/Zé Reinaldo obteve 541.005 votos (47,18%); a chapa Cafeteira/Juarez Medeiros obteve 353.032 votos (30,79%); a chapa Jackson/Jomar Fernandes obteve 231.528 votos (20,19%); a chapa Francisco Nascimento/Francisco Alves da Cruz obteve 21.061 (1,84%). 

O outro concorrente daquelas eleições, que não nos referimos nos episódios anteriores foi Ricardo Murad, na época travava uma “guerra” contra Manoel Ribeiro pelo comando do PSD. Essa “guerra” teve de tudo, inclusive acampamento na porta do Tribunal Regional Eleitoral. Ricardo Murad era muito forte eleitoralmente, havia sido presidente da Assembleia Legislativa e era tido como um dos “herdeiros” políticos de Sarney. Seu irmão Jorge, esposo de Roseana era/é o homem de “confiança” do ex-presidente Sarney. 

Essa confiança era de tal monta que durante o governo Sarney o genro era tido como uma das  eminências pardas da República. 

O certo é que essa briga pelo comando do partido e também familiar fez com que o registro da candidatura de Ricardo Murad pelo PSD não avançasse e ele aparecesse no resultado final das eleições no primeiro turno com 0 (zero) votos. 

A despeito disso era sabido que tinha força política e densidade eleitoral para somar na campanha de Cafeteira. 

A eleição do segundo turno estava marcada para 15 de novembro. E os dias seguintes após o primeiro turno foram de grandes transformações no Comitê do Sítio Leal. Se antes apenas eu, Chico Branco e Roberto estávamos permanentemente no comitê, agora já achávamos que tinha gente em excesso. Todos que sabiam não terem “chance” num eventual governo Roseana estavam tentando seu espaço de poder numa vitória de Cafeteira. 

As transformações foram também físicas. Como os deputados eleitos e não eleitos poderiam se dedicar integralmente a campanha de Cafeteira precisavam de espaço para trabalhar. Passamos a dividir os quartos transformados em salas e a fazerem outras adaptações em caráter emergencial.

Os marceneiros trabalhavam sem parar. A área da piscina foi transformada em escritórios ocupados basicamente por pessoas do PSB; a área onde ficava a sinuca é que nas tardes ociosas do primeiro turno Cafeteira nos brindava com suas piadas e tiradas, foi transformada em escritórios para a equipe de Ricardo Murad. 

Continuava com meu “caderno” fazendo os contatos. Mas a campanha já estava noutro patamar. Era Aderson Lago, Benedito Terceiro, Juarez Medeiros, Zé Costa, Conceição Andrade, que tratavam da articulação política, das conversas de bastidores. 

A cada hora chegava a informação de que um contato com um prefeito ou liderança havia sido interceptado e que Sarney, que comandava a campanha da filha chegara antes. 

Era certeza que a campanha de Cafeteira sofria espionagem e tinha as conversas telefônicas grampeadas. 

O jogo era bruto também nos meios de comunicação. O Sistema Mirante é o Jorna O Estado do Maranhão, os veículos de comunicação com maior alcance do estado, não tinha dia que não trouxesse uma notícia contra Cafeteira em destaque ainda que fosse para no dia seguinte colocar uma notinha escondida em um canto de página. 

Também eram célebres as charge da página 3, ora era Cafeteira retratado como um ratão preto, ora era Aderson retratado como um ratinho gordinho e branco.  

A rede desinformação era estruturada e envolvia diversos agentes e setores da sociedade e do governo. 

Quando percebiam que a cizânia que tentavam espalhar não funcionaria bem se saísse primeiro nos seus veículos de comunicação faziam uso de outros veículos locais e até mesmo nacionais. 

Um dos fetiches era a tentativa de “intrigar” Cafeteira com Jackson, o que conseguiram de determinada maneira. 

Se pudéssemos comparar, diria que aquele segundo turno foi uma espécie de “Game of Thrones”, versão para adultos.  

Antes de existir o conceito e o debate sobre as fake news, no Maranhão, um falso morto e um irmão inexistente foram utilizados para decidir a eleição estadual. 

A chamada farsa Reis Pacheco, pelo seu grau de engenho e de destemor dos seus autores a coloca entre as primeiras do Brasil. 

Foi, principalmente, isso que foi denunciado naquele pronunciamento de Juarez Medeiros em 12 de janeiro de 1995.

Por sua importância esse será o tema do nosso sexto episódio. 

Apesar de todos os abusos cometidos Segundo o Tribunal Superior Eleitoral houve 1.489.742 votos nominais (94,27%) que, somados aos 20.383 votos em branco (1,29%) e 70.113 votos nulos (4,44%), totalizaram o comparecimento de 1.580.238 eleitores (60,42%).

A chapa Roseana/Zé Reinaldo sagrou-se vitoriosa com 753.901 votos (50,61%) já a chapa Cafeteira/Juarez obteve 735.841 votos (49,39%). 

Para os que estão com preguiça de fazerem a conta, apenas 18.060 votos foram diferença entre os ganharam e os que perderam o governo do estado.

Não existe pessoa séria que desconheça que aquela eleição foi conquistada de forma ilícita pelos vencedores. Como se um pai entregasse um presente a um filho, conforme bem ilustra a charge do amigo Cordeiro Filho que esteve lá e foi um dos que se divertiram naquela campanha e que choraram conosco aquela derrota. 

Nem antes nem depois houve no Maranhão uma eleição como aquela. 

Hoje todos confraternizam juntos. Festejam mesmo o que?

Abdon C. Marinho é advogado.