RODOVIAS DA MORTE E DO DESPERDÍCIO.
O ASSASSINATO da bailarina e professora Ana Duarte ocorrido no sábado de aleluia, deu discursos aos políticos maranhenses, tanto aqui, Assembleia Legislativa, quanto em Brasília, no Congresso Nacional. Quase todos, ainda que bem intencionados, trataram de fazer seu proselitismo barato pegando carona com a morte na intenção de “se vender” aos incautos. Já no dia do crime, pelas redes sociais, o governador anunciou que determinaria a Procuradoria-Geral o ingresso de ação judicial que permitisse ao estado fazer a recuperação da via com ônus a ser ressarcido pela União ou Denit; depois soube que a ação seria só para obrigar o órgão a fazer a recuperação. De certo, na esteira da tragédia, o DENIT colocou alguns trabalhadores para uma recuperação emergencial nas áreas mais críticos.
Nas casas legislativas os demais políticos se revesaram na cobrança – justa e necessária – da obra de duplicação da BR 135, única via de acesso a capital pelo solo, obra que se arrasta desde 2012, e que, até agora, ninguém diz, com certeza quando vai acabar.
O mais triste e constrangedor de tudo isso é que foi necessário ocorrer uma tragédia para que o assunto fosse colocado na ordem do dia pela classe política – ao menos por uns dias. Já, já esquecem e tudo volta a ser como era antes.
Por que digo isso? O latrocínio ocorrido era uma tragédia mais que anunciada, assim, como quase todo dia ocorrem acidentes naquela BR, os assaltos também já eram uma rotina. Como só notícia quando ocorre uma ou mais morte, poucos, até então, tomaram conhecimento dos riscos que era/é sair da capital em certos horários. Não sabiam, por exemplo que os malfeitores, em bando, se aproveitam da péssima condição da estrada e da necessária redução da velocidade por parte dos motoristas e até, dos acidentes causados pelos buracos existentes, para assaltar os motoristas.
No caso da professora, o latrocínio ocorreu na área duplicada da via, pelo que li, na altura do km 15, já dentro da ilha, mas, assaltos ocorrem, como rotina, em diversos pontos, principalmente, no Campo de Perizes. Já ouvi relatos de que os meliantes ficam escondidos no capim esperando o melhor momento para cometer seus crimes. Tal situação era de conhecimento das autoridades. A própria elucidação do crime contra a professora poucas horas depois é prova de que sabiam onde buscar os culpados. Se já sabiam da rotina de assaltos – ao menos os bandidos com atuação no setor – por que não os prenderam antes? Foi o primeiro delito? Se não, por que estavam soltos?
Uma parcela dos crimes são frutos da oportunidade, a facilidade que têm os bandidos, em consorcio ou não para cometê-los. Embora o ditado “a ocasião faz o ladrão” não esteja correta, o ladrão já está feito, a oportunidade e facilidade o faz agir com desenvoltura.
Quando os políticos, diante do caso concreto, apontaram para falta de conservação e principalmente para a caótica duplicação da via – que não termina nunca e que consome rios de dinheiro – identificam apenas uma parte do problema.
Não tenho dúvidas quanto a importância da duplicação da via e do pouco caso que as autoridades fazem da obra.
Vejamos, essa primeira etapa (Estiva a Bacabeira), com pouco mais de 26 km, tem orçamento previsto de pouco mais R$ 504 milhões – até aqui. Embora a moeda brasileira esteja desvalorizada, trata-se de um valor significativo, um pelo outro, cada quilometro está saindo por mais e R$ 18 milhões de reais. Obras semelhantes ao redor do mundo e em condições mais adversas chegam a custar menos. Também não faz muito sentido tamanha demora numa obra feita em solo. Temos visto obras mais complexas, realizadas em condições bem mais adversas, como na neve, no mar ou locais remotos, ocorrem em menos tempo que esta – só para lembrar, já consumiu mais de quatro anos e ainda não sabem quando entregam.
Quando dizemos que os nossos representantes, diante do caso das manchetes, só apontam parte do problema é porque não vejo discursos ou questionamentos sobre a baixa qualidade das obras realizadas no Maranhão, tanto as sobre a responsabilidade da União como as realizadas sobre os auspícios do estado e dos municípios.
Só pode haver um propósito – que não deve ser dos melhores – nisso tudo. Não poucos os amigos já me confessaram (já tratei disso noutras oportunidades), preferir viajar pelos estados vizinhos, ainda que tendo que fazer um percurso maior que viajar pelas vias que cortam o estado.
Não precisa ser um gênio para perceber a razão. Vejam a principal rodovia que corta o estado, a BR 135, a maior parte parece uma tábua de pirulito, em que pese as fortunas gastar anualmente em obras de recuperação. Até mesmo no milionário trecho já duplicado, em alguns lugares a pista apresenta defeitos. Este é o principal exemplo, mas os outros não ficam muito atrás. As BR’s 222 e 316, estão sempre sofrendo reformas e todos os anos os buracos estão lá a desafiar a engenharia. Quantas vezes não foi recuperado o trecho entre Miranda do Norte e Santa Luzia? Quem viaja por lá não tem boas referências. O trecho Santa Luzia Açailândia que acho nem foi integralmente concluído e a buraqueira já inferniza a vida dos motoristas. A mesma situação, em maior ou menor grau das demais rodovias.
O que dizer das rodovias estaduais?
O Maranhão contraiu bilhões de reais em empréstimos para obras rodoviárias. Já nos anos que antecederam as eleições de 2014, anunciava-se a interligação de todas sedes dos municípios por vias asfaltadas. Dissemos na época que este tipo de obra era bem-vinda, mas alertava, diante dos exemplos que já cansamos de externar, para o risco da falta de fiscalização destas obras. Não precisamos ir muito longe para ver a qualidade destas obras.
Se não me engano a previsão era gastar mais de bilhão em obras rodoviárias e mais um bilhão em obras dentro das sedes dos municípios.
Não preciso dizer que a maior parte deste asfalto e, por consequência, deste dinheiro, foi embora junto com o o inverno.
A vantagem das previsões que fazemos no Maranhão sobre estas coisas é que não corremos o risco de errar. Podemos apostar, sem medo de perder, que as obras realizadas serão mal feitas e demoradas.
Desde que me entendo por gente, como se dizia lá no meu interior, que leio e vejo obras de recuperação da MA 014, uma das mais importantes da Baixada maranhense, por estes dias vi que está em curso mais uma recuperação. Em 2012/13 esta mesma via estava sendo recuperada. Ninguém é responsabilizado pelo fato da reforma anterior não ter durado dois anos?
A falta de durabilidade das obras se espalham por todas. Não faz muito tempo o próprio governador anunciou a recuperação do trecho Cujupe – Pinheiro, passei lá outro dia e estavam recuperando a recuperação.
Um texto sobre obras mal feitas não ficaria completo se não falássemos da milionária duplicação da MA 203, a famosa Estrada da Raposa, uma mísera obra de 3 km ao custo de R$ 30 milhões de reais, isso mesmo, dez milhões de reais por quilometro, dentro da ilha de São Luís. Esta obra se arrasta desde 2014, estamos no terceiro ano e obra não mostra sinais de conclusão. Pior que isso, a qualidade é de fazer vergonha a qualquer pessoa, até mesmo a nós contribuintes. Passando por lá duas vezes ao dia, não consigo acreditar que uma obra naquele padrão custe tanto aos cofres públicos.
O que dizer, ainda, da infinita reforma que fazem fazem na MA 201, a Estada de Ribamar, onde a buraqueira inferniza a vida dos cidadãos que precisam percorre-la todos os dias para trabalhar, estudar, lazer ou mesmo para ir rezar? O estado lastimável das MA’s que cortam a ilha é um retrato de todas as demais no resto do Maranhão, uma vergonha.
Por estas e por tantas outras, não vislumbro a possibilidade do governador Flávio Dino concretizar uma de suas promessas de campanha mais interessante: transformar a MA 006 na via de integração do Maranhão. Uma via ligando o estado de norte a sul transportando nosso povo e nossas riquezas.
Infelizmente, Alto Parnaíba e Apicum-Açu só estão próximos na disposição dos nomes dos municípios quando os colocamos em ordem alfabética. No mundo da geografia real, são mais de 1000 km (1.202) de estradas a serem feitas e recuperadas. No ritmo, no custo e na qualidade em que são feitas as obras no estado, este é um sonho para a posteridade.
O Brasil, sobretudo, o Maranhão, precisa, com urgência ímpar, criar mecanismo de controle de obras públicas que estabeleça um “seguro” contra a má qualidade e demora com a responsabilização pecuniária e penal dos espertalhões que entregam gato por lebre.
Se outros países conseguem construir vias que duram décadas, muitas já estão até centenárias, como é que aqui, principalmente, no nosso estado, não conseguimos? Qual é o mistério?
Será que ninguém se pergunta a razão destas obras durarem tão pouco? Será que ninguém indaga a razão de serem tão caras? Será que ninguém pergunta o que acontece com o dinheiro público?
Tantas perguntas.
Abdon Marinho é advogado.