AbdonMarinho - Cotidiano
Bem Vindo a Pagina de Abdon Marinho, Ideias e Opiniões, Sexta-feira, 22 de Novembro de 2024



A palavra é o instrumento irresistível da conquista da liberdade.

Escrito por Abdon Marinho


CRÔNICAS DA ESTRADA COM MAX HARLEY.

Por Abdon C. Marinho*.

CHEGAMOS em Luis Domingues por volta de 1:30 horas da quarta-feira, dia 15 de março. Embora ache agradável viajar à noite pois as estradas estão geralmente vazias e a passagem por nossas cidades remeta-me às lembranças da infância e adolescência, há muito tempo deixei de fazer isso. As condições das estradas e a violência, cada vez mais presente por onde quer que passe, acabou por me fazer preferir as viagens diurnas, só viajando à noite, e, assim mesmo, cercado de cautelas, quando absolutamente necessário. 

Surgiu a necessidade. Uma semana antes, aproximadamente, Max me pergunta se não queria ir a Luis Domingues, pois em razão de um compromisso dele em outro município aproveitaríamos para fazer uma viagem só. 

Achei bom. Como há algum tempo a prefeitura municipal encontra-se em reformas já fazia um bom tempo que não ia lá, sendo que amigos e servidores do município já estavam ligando e perguntando que dia iria. 

Max também tinha que ir em razão do “fechamento” das prestações de contas para encaminhar para o TCE. 

Dois dias depois ele me liga: — doutor, o compromisso que tinha agendado para o outro município, em razão do congresso de prefeitos promovido pela FAMEM, foi deslocado de quarta-feira, 15, para a sexta-feira, 17. 

Tivemos que reorganizar a viagem. 

As passagens já compradas para o domingo, à tarde, com retorno na quarta-feira, final do dia, tiveram que ser remarcadas para terça-feira à noite (após o encontro dos prefeitos) com retorno para a sexta-feira, no fim da tarde. 

Por sorte, sempre tenho uma ou duas passagens “sobrando” na pasta, o que facilita a troca. 

Excessivamente prevenido, o que, às vezes irrita os que viajam comigo, pois gostam de chegar “em cima” da hora, sai do escritório pouco depois das 15 horas. 

Apanhamos o Max que já estava de prontidão nos aguardando e seguimos para o terminal. 

Conseguimos “pegar” um ferry-boat extra que sairia as 16:30 horas. 

Chegamos a Pinheiro pouco depois das 19 horas, jantamos, e por volta das 20 horas, seguimos viagem noite a dentro. 

Enquanto ouvíamos a trilha sonora preparada pelo outro companheiro de viagem, Alison Fernando, especialmente para a viagem íamos conversando sobre os “causos” já vivenciados, eu nestas quase três décadas, Max, já passando das duas. Max diz que quando participa ou sabe de algum causo engraçado tenta ao máximo guardar, com todos os seus detalhes, para contar-me ou contar ao seu pai, Dr. Zé Maria, outra pessoa boa de causos. 

Noite de terça, as cidades por onde íamos passando ou se preparavam para adormecer ou já estavam adormecidas, aqui ou ali, em alguma porta algumas pessoas ainda conversando, acolá, a vigília de um velório. 

Papo vai, papo vem, Max rememora um dos causos do seu tio Luis – e que ficou de fora da crônica escrita na vez anterior. 

O Dr. Luizinho, seu tio, tinha problemas com bebida, um caso típico de dupla personalidade, em que quando sóbrio se é uma pessoa, absolutamente centrada e trabalhadora, mas que quando bebe perde totalmente o bom senso. 

Ele tinha consciência disso, tanto que quando sóbrio entregava todo dinheiro que tinha para a mãe de Max e sua cunhada (D. Marineia, de saudosa memória), com a recomendação de que não lhe devolvesse de forma alguma quando estivesse bêbado. 

Tudo combinado, dinheiro entregue e guardado, na hora que bebia lá ia ele para casa de Max fazer escândalo e chamar a mãe dele de ladra: — devolve meu dinheiro, sua ladra! E por aí vai.

A narrativa acima é apenas para que conheçam a figura. 

O episódio a merecer figurar na nossa coleção de crônicas de estrada é outro, que se encerra com um mistério. 

Deu-se na cidade de Miranda do Norte, fins dos setenta ou início dos oitenta, noite de chuva intensa, em um cabaré “daqueles” bem populares, madrugada avançada, já quase “comendo”  o dia, um som mais alto se sobrepõe sobre os burburinhos das mesas e do som ambiente, é a dona do cabaré dizendo: — doutor Luizinho tenha um pouco mais de respeito no meu estabelecimento. 

O Dr. Luizinho se foi e persiste o mistério até hoje na família Freitas: que tipo de “gosto” o doutor Luizinho tomara em um cabaré de quinta em uma madrugada de chuva torrencial a ponto de causar indignação na dona do estabelecimento? Mistério. 

Causos antigos vão se misturando aos novos. 

São fatos e pessoas que vão passando por nossas vidas com suas graças que nos fazem rir depois ao lembrar. 

Após a relembrança do tio Luizinho foi a vez falarmos sobre um treinamento que dera para uma equipe de um município em outro município acentuando uma das suas companheiras de trabalho achara o nariz de uma das participantes muito bem feito, além dos outros atributos de beleza inquestionáveis. 

Foi a deixa para interrompê-lo para afirmar: — poxa, Max, ela não me deve ter em boa conta. 

Quando perceberam que estava falando do meu avantajado e desarrumado nariz, caíram todos na gargalhada. 

Na manhã seguinte ele mandou-lhe uma fotografia minha com o nariz em destaque e contou-lhe o episódio “estradeiro”. 

Aliás, sobre essa mesma companheira de trabalho, há um outro episódio para coleção de causos. 

Consta que o cidadão que faz entregas de documentos entre os órgãos e pequenos mandados, apareceu pela repartição por volta das 14 horas, tendo um dos servidores questionado: — seu Comandante, aparecendo por aqui depois de uma soneca. 

Ao que ele, sem se atentar, emendou: — na verdade foi uma “f…deca”, mesmo. 

Dona Gil que estava um pouco afastada deu-lhe uma chamada: — seu Comandante, que história atravessada é essa? 

O seu Comandante, todo constrangido balbuciou uma desculpa: — desculpe, dona Gil, não tinha lhe visto. 

Entre causos, lembranças e boa música íamos vencendo as estradas e suas crateras de causar inveja a lua. 

No dia seguinte, após o tradicional almoço na casa do prefeito foi a minha vez de protagonizar um “causo” que será motivo de risos pelas repartições públicas Maranhão a fora. 

Depois do almoço, invariavelmente delicioso, à base de galinha caipira com pirão de descaída e um assado de panela de dá água na boca, arrematado por um creme que atenta contra qualquer dieta, o prefeito pediu que atendesse umas senhoras que ali estavam para ouvir minha opinião sobre determinada causa. 

Achei melhor atendê-las na própria mesa onde fora servido o almoço. 

Max ficou em um canto conversando com as secretárias de saúde e a de finanças e eu, mas para o meio, ouvindo a história das senhoras – mas sem ficar totalmente desligado do outro assunto. Ouvi claramente quando ele, que recusara o creme de sobremesa perguntara se as mexericas na fruteira eram boas, ao que a empregada doméstica disse não saber; não vi, também, que Max se serviu de uma. 

No final do atendimento, aproximei-me de Max e das secretárias, peguei uma mexerica, descasquei-a e ao mastigar o primeiro gomo, mandei: — ah, Max, ela não quis foi te dar. 

Todos à mesa me olharam sem entender pois estavam tratando de outra coisa, e eu ainda tentei completar: — … a mexerica …”.

— Doutor que conversa atravessada foi essa. Atalhou Max, enquanto todos caiam na gargalhada da minha intromissão “fora de hora”. 

Na quinta-feira, ao término do segundo dia de expediente e tendo deixado toda a missão resolvida ou bem encaminhada, pegamos a estrada de volta, ainda com sol, para podermos constatar suas péssimas condições. 

Em Governador Nunes Freire, fizemos aquela “parada obrigatória” na Padaria Alana para tomar um suco e um cafezinho com um pastelzinho. 

Sobre essa “parada obrigatória”, numa vez anterior estava também por lá com Max, quando alguém me liga perguntando por onde estava, sem “papas” na língua, respondi, bem ao meu estilo: — estou em Governador Nunes Freire, tomando um delicioso suco de caju com um pastel de vento. 

Max, corado, foi logo dizendo: — doutor, o que é isso, todos estão ouvido o senhor dizer que que está saboreando “um pastel de vento”. 

Nessa noite, por conta da audiência pública que Max participaria em Turilândia, dormimos em Santa Helena, no hotel do mesmo nome, de propriedade do já amigo Gladiston. 

Na sexta-feira, após a audiência de Max e de uma rápida parada no Jambeiros, onde paramos para ele cumprimentar as autoridades presentes na audiência, partimos para Cujupe, chegando “em cima” da hora para pegar ferry-boat para o qual tínhamos comprado passagem. 

Cheguei em casa, em São José de Ribamar, às 20:30 horas, depois buscar todos os atalhos para vencer um engarrafamento “sem fim” no bairro do Anil. 

Fim da crônica. 

Abdon C. Marinho é advogado.