Tigre de mentira, miséria de verdade.
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- Criado: Sábado, 22 Fevereiro 2025 13:56
- Escrito por Abdon Marinho
Tigre de mentira, miséria de verdade.
Por Abdon C. Marinho.
EM 2024, na esteira do trigésimo ano de aniversário das eleições de 1994, escrevi uma coletânea de textos alusivos àquela eleição. Uma espécie de memória de quem viveu aqueles de dentro de uma das alas da disputa. Apelidei os seis textos de “Trinta anos de uma campanha memorável” e nominei cada um dos episódios.
Não faz muito recebi de um amigo querido – que também esteve presente naquela campanha –, um filmete da campanha da candidata vitoriosa, Roseana Sarney, onde a mesma aparece em um ambiente de sala de aula para mostrar como iria preparar o Maranhão para o futuro. A candidata cita como exemplo os Tigres Asiáticos como modelo, dizendo que três daqueles territórios (Formosa, Singapura e Coreia do Sul), saíram da pobreza em vinte anos para se transformar em potências econômicas, a partir do investimento em mão de obra e tecnologia. A candidata ainda coloca as representações dos três territórios dentro do mapa do Maranhão para mostrar que eles, somados, possuem uma área bem menor que a do nosso estado e sem os recursos naturais que já dispúnhamos naquela época.
Revendo aquele video trinta anos depois – e sem a tensão daqueles dias –, conclui-se que a candidata até que se saiu bem na apresentação da peça publicitária, apesar dos recursos tecnológicos ainda estarem “engatinhando”, apenas para ficar na referência dos felinos.
O que não foi nada bem foi aquela proposta de transformar o Maranhão em um “tigre do nordeste”. Apesar de ter dito saber como trazer o desenvolvimento para o estado e os caminhos a percorrer para isso, chegamos à conclusão que a candidata apenas foi bem “ensaiada” para passar com tanta convicção propostas que jamais iria colocar em prática.
Roseana “levou” a eleição de 1994, depois, novamente, em 1998, elegeu o sucessor e retornou novamente ao governo em 2008 (ficando até 2014) após um curto período do governo de Jackson Lago, eleito contra ela e colocado para fora do governo em 2008.
O tempo de vinte anos que fez países miseráveis se tornarem potências e econômicas corresponde ao que a então candidata teve praticamente sozinha no poder para implantar ou para, pelo menos, lançar as bases daquele desenvolvimento prometido.
Trinta anos depois vemos os indicadores do estado praticamente no mesmo lugar mantendo o Maranhão “acorrentado” aos grilhões do atraso.
Mais ilustrativo do que qualquer indicador econômico ou social sobre a nossa situação no cenário nacional você encontra no horário nobre da televisão onde passa nos intervalos da programação uma “vistosa” campanha do governo estadual anunciando suas políticas de combate à “extrema pobreza”.
O Maranhão, trinta anos depois de ter sido anunciado como o futuro “tigre do nordeste” não é um estado com uma população pobre é ainda um estado que possui parte de sua população “extremamente pobre”, precisando dos favores do estado para conseguir sobreviver.
Essa dura verdade, com o máximo de sinceridade, nos é dita pelo próprio governo do estado enquanto assistimos o Jornal Nacional ou outra programação qualquer do horário nobre.
Esse texto não é para fazer “desfilar” os números do nosso fracasso – e possuirmos a maior parte da população dependente de bolsa-familia e uma infinidade de outros programas assistenciais –, o seu propósito é nos fazer refletir sobre eles.
Vejam, há trinta anos a candidata vitoriosa já dizia que para transformar o Maranhão em um “tigre do nordeste” deveríamos investir em educação, qualificação de mão de obra, tecnologia, atrair empresas, aumentar exportações … o que fizemos nesse sentido? O que ela fez, já que ficou quase vinte anos no poder? Por que o Maranhão não se tornou ao menos um “gatinho” em matéria de desenvolvimento, se já se sabia o que fazer para chegar ao desenvolvimento?
Faço esse texto com “desalento dos fracassados” pois a minha geração e, também, aquela que nos precedeu, não alcançaremos as “luzes do desenvolvimento”.
Aquele sonho de vermos prédios monumentais nos dois lados da baía de São Marcos, portos dos dois lados carregando e descarregando riquezas ao mesmo tempo em que milhares de turistas virão ao estado conhecer nossas riquezas naturais e os avanços tecnológicos da nossa gente, infelizmente, não veremos acontecer.
O progresso é iluminado. Ainda vivemos as trevas do atraso.
Há quantas décadas ostentamos o título de “estado rico e povo pobre”? Passados tantos anos, além dos pobres, temos os extremamente pobres. A sensação que temos é que estamos crescendo para baixo, como rabo de cavalo ou avançando rumo ao fracasso.
Fico imaginando o que teria acontecido com o estado se há trinta anos aquele comercial de campanha eleitoral tivesse sido além daquilo, além de um chamariz para iludir tolos e, de fato, tivesse sido um projeto de governo a ser implementado nos quatro ou oito anos seguintes. Continuaríamos com cidadãos extremamente pobres?
Desde sempre – e há mais de trinta anos que é um corte temporal significativo –, cobro das nossas autoridades um projeto de desenvolvimento para o nosso estado com começo, meio e fim e que não seja vinculado a esse ou aquele governante.
É dizer, temos as emergências do dia a dia mas, paralelo a elas, precisamos fazer avançar um plano de desenvolvimento para estado que seja “suprapartidário” e que vincule qualquer governo a cumprir as metas pré-estabelecidas.
O mesmo raciocínio vale para os governos municipais, além dos “corres” diários teriam que “contribuir” com um projeto macro para desenvolver o estado.
Acredito que a Assembleia Legislativa, casa mater da representatividade popular, poderia “contratar” uma comissão de especialistas para estudarem o assunto e apresentarem um projeto de desenvolvimento para, por exemplo, vinte anos. Nesses vinte anos todos os governos estaduais e municipais estariam vinculados aquele projeto de desenvolvimento, trabalhando para tornar aquilo realidade. A Assembleia Legislativa iria acompanhar, através de seus órgãos auxiliares, e cobrar se estavam dando seguimento ou não.
Vejo os governos brasileiros – não é um problema só do Maranhão e dos seus municípios –, como “naus desgovernadas” navegando ao sabor dos ventos e/ou das conveniências dos governantes.
Esse tipo de gestão não traz desenvolvimento perene.
Qualquer plano de desenvolvimento econômico necessita, como dizia aquela candidata há trinta anos, de educação de qualidade e qualificação de mão de obra.
Os governos estadual e os municipais precisam compreender essa urgência primordial para o desenvolvimento com a melhoria das condições de ensino. Urge que todas as crianças e jovens tenham uma educação de qualidade e que sejam alfabetizados em pelo menos duas línguas e terem habilidades em tecnologia.
Esse desafio não pode esperar. Estamos falando de algo que é para ontem.
Encerro com a frase do Duende da prosperidade que diz o seguinte: “quando sabemos onde queremos chegar qualquer caminho nos leva lá”.
Os estados e municípios, assim como as pessoas, precisam saber onde querem chegar e trabalhar para alcançar esses objetivos.
Somente com esse nível de consciência é possível romper o ciclo do atraso.
Os tigres podem ser de mentira ou de papel, mas as necessidades são de verdade.
Abdon C. Marinho é advogado.
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