ATIRANDO COM PÓLVORA ALHEIA.
Um amigo costuma dizer que “quem atira com pólvora alheia não toma chegada”. Quer dizer com isso que não tem preocupação com o tanto que gasta, com o desperdício, com o zelo que teria caso estivesse “atirando com a própria pólvora”.
Certamente, esta é a situação daquele grupo que domina a cena política naquele município lá do meu sertão. Um episódio ilustra bem o desperdício com o dinheiro do contribuinte.
Há quase 20 anos inventaram de construir um centro administrativo onde pudesse funcionar todas as secretarias e demais órgãos municipais. Em si, a ideia era excelente, o município, exceto pela prefeitura, centralizaria todos os serviços públicos em um único local, reduziria, substancialmente os custos com água, luz, telefone, com os deslocamentos, e, sobretudo, com os aluguéis, que costumam sangrar as finanças dos municípios maranhenses.
Pois bem, se a ideia era irrepreensível o mesmo não se pode dizer da execução do projeto do centro administrativo. Inaugurado no apagar das luzes de um ano, já “nas primeiras chuvas do ano seguinte” começou a se revelar problemático. Tanto a parte estrutural do centro administrativo municipal quanto as obras complementares, como pavimentação, drenagem, paisagismo e sinalização foram mal feitas, levando a constatação de indícios de lesão ao patrimônio público e ensejando a cobrança de explicações dos responsáveis.
Cabe esclarecer que os gestores do período determinaram a abertura de processos administrativos, embora, pelo que se saiba, até aqui, nenhum tenha chegado à conclusão de responsabilizar e punir aqueles que deram causa a tantos “equívocos”.
O certo é que o intenso agravamento dos problemas detectados desde a inauguração e a comprovada falta de manutenção, tornou o centro administrativo municipal inabitável, com pouco mais de 06 (seis) anos de utilização, voltando as secretarias municipais, aos velhos e lucrativos (para quem aluga, claro), alugueres.
Mudando de lugar conforme o aumento da estrutura e ao sabor dos diversos interesses, as secretarias, estão há cerca de nove anos sem um ponto fisico definitivo.
A reforma prevista para durar menos de um ano demora pelo tempo que durou a Odisseia de Ulisses, bem narrada por Homero, parecendo – e muito – com famoso manto de Penélope, aquele que ela tecia durante o dia e desmanchava durante a noite para fugir ao assédio dos inúmeros pretendentes.
Mas, desgraça pouca é bobagem – para aqueles fornecem a pólvora –, e, quando a dita reforma estiver concluída – o que ainda levará mais um ano, talvez dois, se contarmos com tempo que será gasto para mobiliá-lo –, o centro administrativo, já não cumprirá mais os objetivos para os quais foi projetado. Vinte anos se passaram entre o projeto e nova ocupação. O município cresceu, o número de secretarias, órgãos e servidores, aumentou muito mais.
O resultado certo é que, quando o prédio for novamente entregue à gestão municipal, não comportará mais o número de secretarias e órgãos criados, levando a prefeitura a continuar com sua administração descentralizada e gastando fábulas com alugueres, deslocamentos, energia, telefone, sistema de dados, etc.
Algumas indagações deveriam ser feitas pelos órgãos de controle, Tribunal de Contas, Poder Legislativo e até pelo Ministério Público: A primeira, é como uma reforma leva dez anos (ou mais) para ser concluída? A segunda, é se não teria sido mais vantajoso para administração ter demolido e construído uma nova estrutura, já mais adequada ao crescimento do município e aos número de secretarias e órgãos? A terceira, se seria a razoável o município ter investido na construção de um novo prédio para a prefeitura em detrimento da reforma/manto de Penélope? A quarta, se os responsáveis pelos fatos, inclusive pela extraordinária demora na “reforma” (quase dez anos), serão responsabilizados? A quinta, qual o montante já gasto pelo município com a reforma/manto de Penélope, com as despesas de manutenção das secretarias e com os alugueres estes anos todos?
São perguntas simples com respostas mais simples ainda, é de se estranhar que nunca tenham sido feitas e respondidas à patuleia exausta de pagar impostos.
Algo que causa maior estranheza é o silêncio do valoroso Ministério Público Estadual, tão diligente em fustigar os demais gestores, mantém um silêncio sepulcral. Chega a ser inacreditável que uma obra com que se aproxima da maioridade da inauguração tenha servido ao município apenas pouco mais de seis anos, ficando o resto do tempo em intermináveis reformas, enquanto o poder público pagava e paga polpudos alugueres a os felizes locadores.
A impressão que sobra é a de que o Brasil não tem jeito. E, que o nosso futuro é o abismo profundo.
Abdon Marinho é advogado.