O RETRATO DE UM BREVE FRACASSO.
Por Abdon Marinho.
TENDO PASSADO mais de uma semana do fim da greve dos caminhoneiros a mídia informa que o abastecimento de hortifrutigranjeiros na capital e nas principais cidades do estado já se encontra quase normal.
Embora coloquem as coisas naturalidade, como se o reabastecimento fosse consequência normal do final do movimento paredista quando isso não é verdade. Pelo menos esconde uma realidade que não querem ou não queiram discutir.
Vamos a ela.
No dia seguinte a deflagração da greve fui a Carutapera de onde retornei apenas na quinta-feira. Pois bem, tanto na ida quando na vinda, não vi nenhum ponto de interrupção do trânsito nas vias estaduais e federais. Também, salvo um ou outro, não tivemos notícia de bloqueio de vias noutras partes do estado.
Outra consideração é que já no fim de semana seguinte ao início da greve o governo anunciava, em tons de vitória, que estava conseguindo mandar combustível para os postos da capital e do interior.
As assertivas acima suscitam uma indagação e redunda numa constatação.
A pergunta é: por que, decorridos tantos dias da total desobstrução das vias (se é que foram bloqueadas algum dia no estado) o abastecimento nas principais cidades do Maranhão não se normalizou?
A constatação, em resposta à indagação é : porque o Maranhão estar produzindo a mesma coisa que produzia no governo anterior, ou seja, nada.
Há quase dez anos faço o desafio da CEASA aos governantes e candidatos. O desafio que é eles, gestores ou políticos se dirijam aquele centro de distribuição para constatarem, com os próprios olhos, a origem dos produtos que abastecem a capital.
O mesmo desafio vale também para o interior. Hoje não apenas a capital ou os maiores centros, mas, quase a totalidade dos municípios são abastecidos de “hortifruti” vindos de outros estados. Os empresários vão buscar na Bahia, no Ceará e, até mesmo, no Piauí esses produtos para distribuirem pelos municípios maranhenses.
Vejam o quão absurda é esta situação. Temos um estado dos mais agricultáveis, ainda com água abundante, mas que não produz nada e tem que importar quase tudo que consome.
Outros estados do nordeste em situação bem inferior a nossa, em termos de recursos naturais, produzem de tudo. Até uvas, já se produz em escala industrial nos estados do semiárido, inclusive para exportação enquanto o Maranhão vem regredindo na sua produção ao longo dos anos.
A crise, provocada pela greve dos caminhoneiros, desnudou a nossa vergonhosa isso. Não haviam bloqueios nas estradas maranhenses que impedissem a chegada de produtos nas gôndolas dos supermercados ou nas bancas das feiras. O desabastecimento se deu – e ainda não estar normal –, porque todos (ou quase todos) os produtos consumidos vêm de outros estados. Esta é a dura realidade.
O Maranhão não produz frutas, não produz verduras; não produz, nem mesmo, hortaliças. O dinheiro que deveria ficar no bolso dos cidadãos maranhenses vai fortalecer a economia dos produtores da Bahia, do Ceará, de Pernambuco e do Piauí.
Será que os governantes maranhenses – e não apenas os atuais –, acham razoável que um estado com tantas condições favoráveis não produza nada? Será que não ficam constrangidos em saber que batata, tomate, cebola, laranja, banana, limão, abóbora, melancia, abacaxi, pimentão, couve e tudo mais, até mesmo cheiro-verde, que poderiam ser produzidos por aqui tenham de ser importadas de outros estados? Será que não sentem vergonha pelo fato da nossa população vir a morrer se, porventura, algum dia fecharem as fronteiras estaduais?
Na atual quadra, numa hipotética situação de fecharem as fronteiras, isso aconteceria. Infelizmente o Maranhão, a despeito de tudo que falamos ao longo dos anos não tem produção em escala para alimentar sua população. Arrisco dizer que não tem produção nenhuma.
A agricultura familiar não consegue produzir o suficiente para a subsistência dos seus próprios integrantes.
Os programas de incentivo estacionaram no tempo ou ficaram no campo das boas intenções nunca concretizadas e os trabalhadores não possuem estímulos, disposição ou assistência suficiente para produzirem qualquer coisa. Não passam de programas para “inglês ver”, sem qualquer relevância para a economia.
A greve revelou que a política destinada a fixação do homem no campo com produção para subsistência e para o abastecimento local e circunvizinhos, passados três anos e meio desde o início do atual governo, não se concretizou. Embora tenham criado até uma secretaria de estado com esta finalidade.
Nos últimos anos tenho percorrido as estradas do Maranhão e desde muito tempo tenho alertado que a qualquer hora do dia que passe nestas estradas vejo dezenas de pessoas dedicadas ao ócio, quando deviam está trabalhando.
Uma grande parcela dos municípios, senão todos, têm a economia vinculada aos programas de distribuição de renda pública, as famosas “bolsas”; a receita vinculada as aposentadorias e pensões; as receitas dos servidores públicos; e as transferências constitucionais, FPM, ICMS. FUNDEB, SUS, etc.
Fora destas, não existem outras, os municípios estão cada vez mais pobres. Se por qualquer motivo, um dia cessarem estas receitas, os maranhenses morrerão de fome.
Na verdade, vivemos uma situação de extrema pobreza. O Maranhão vive um crescente empobrecimento, não é de hoje, são décadas de desestímulo aos arranjos produtivos locais, de abandono em que as políticas públicas são feitas “da boca para fora”.
Sou do interior, meu pai criou mais de uma dezena de filhos com fruto do seu trabalho no campo, éramos pobres, mas na nossa casa nunca faltou o arroz, o feijão, o milho, a macaxeira, a mandioca, a abóbora, bananas de todas as espécies, mangas, as mais variadas, laranjas, tanjas; nunca faltou capões no quintal, galinhas, porcos, cabras e mesmo umas vaquinhas para produzir o leite que consumíamos.
Não era apenas meus pais, eram meus tios, meus vizinhos, todos da comunidade. Não havia família que não possuísse produção de, pelo menos, arroz, feijão, milho, suficientes para durar no mínimo dois ou três anos, na eventualidade da safra não ser muito boa num ano.
Diferente de hoje, as pessoas não viviam nas portas dos políticos ou das prefeituras. As pessoas tinham vergonha de pedir esmola ou de viver dos favores alheios.
Não existe mais nada disso no interior do Maranhão. O que vemos é o abandono e pessoas com idade de trabalho, com a cara para cima esperando as esmolas governamentais e, também, dos políticos inescrupulosos.
Hoje a produção agrícola está centrada no agronegócio, nas monoculturas como a da soja. Outro dia vi o governo festejando os bons números desta produção. Nada contra, mas essa atividade pouco ou nada depende da ação governamental, bem diferente da inexistente agricultura familiar.
O governo festeja um sucesso que não é seu e silencia ante o fracasso das demais atividades agrícolas que deveria incentivar e promover.
Uma pergunta derradeira se faz necessária: até quando teremos de conviver com a falta de planejamento, iniciativa, competência, causas da ampliação da miséria do nosso estado e nossa gente?
Abdon Marinho é advogado.