BOLSONARO MIRA SUAS ARMAS CONTRA OS ALEIJADOS.
Por Abdon Marinho.
O SENHOR Bolsonaro, presidente do Brasil, gosta de homens... homens armados.
Sempre que tem uma oportunidade lá está ele defendendo essa turma e a pauta armamentista.
Sempre que pode, usando os poderes que foi investido, lá está ele isentando a turma de impostos, facilitando a compra de armas e munições, aumentando o número de armas e o calibre das mesmas.
Se tivesse talento, o senhor Bolsonaro, poderia estrelar aquele famoso comercial de cigarros, Terra de Marlboro, aquele que dizia: “Terra de Marlboro, onde os homens se encontram”.
Nada tenho contra o direto dos cidadãos se armarem – já disse isso até mais de uma vez.
Assim como nada tenho contra o fato do senhor Bolsonaro preferir se “sentir em casa” em meio a “macharada alfa”.
Cada um sente-se bem onde quiser e tem o direito inalienável às próprias preferências.
O registro que faço é apenas em oposição ao fato de nunca termos visto sua excelência “mover uma palha” na defesa dos deficientes; manifestar-se para facilitar-lhes a aquisição de cadeiras de rodas; próteses ou quaisquer outros instrumentos capazes de lhes facilitar a vida.
Sim, a vida. Não falo de gosto, prazer pessoal ou “hobby”, falo em facilitar-lhes a vida.
E olha que segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas – IBGE, somos cerca de 45 milhões de brasileiros apresentando algum tipo de deficiência.
Que dane-se que não demonstre qualquer apreço ou simpatia por nós, assim como não demonstra qualquer respeito ou solidariedade pelos milhares de brasileiros que já perderam a vida nesta pandemia, muitos deles por culpa e responsabilidade do governo federal, que não foi atrás de vacinas, insumos e tudo mais que deveria ser o papel de governantes fazê-los.
Aliás, apenas para registro, não me recordo de ter visto sua excelência visitando um hospital dedicado ao tratamento das vítimas da pandemia ou mesmo mostrar qualquer solidariedade aos familiares dos mais de 260 mil brasileiros que já perderam a vida nesta tragédia – repito, muitos pela ação e/ou omissão do atual inquilino do Planalto.
Apenas para registro – mais um triste registro –, no dia em que o país somou 260 mil mortos, sua excelência fez foi perguntar quando iam cessar com a frescura, com o “mimimi” e parar o choro. No dia que 260 famílias e amigos choravam a perda de seus entes queridos em um ano de pandemia.
Se escapar até lá – toc, toc, toc, três vezes na madeira –, aguardo para ouvir o que dirá quando atingirmos a triste marca de 300 mil, 400 mil, 500 mil mortos, pela pandemia que ele deveria estar combatendo.
Mas já falamos disso e falaremos outras vezes mais.
Deixemos o presidente hipotecar a sua solidariedade, apreço e utilizar dos favores e benefícios da nação apenas para sua “macharada alfa”.
O texto de hoje é para registrar que sua excelência, o senhor Bolsonaro e o seu ministro da economia, Paulo Quedes, que nunca manifestaram qualquer apoio ou fizeram algo pelos deficientes do Brasil, acharam que era a hora de “sacar suas armas” contra os aleijados.
Com uma medida provisória só, acabaram com uma conquista dos deficientes que já se encontrava em vigor há um quarto de século.
Os gênios que dão show no combate à pandemia, decidiram, por medida provisória, modificar a concessão de isenção relativa ao Imposto sobre Produto Industrializados incidente na aquisição de automóveis por pessoa com deficiência prevista na Lei nº. 8.989, de 24 de fevereiro de 1995.
A lei passou pelo governo de Fernando Henrique Cardoso, pelos governos de Luís Inácio Lula da Silva, Dilma Rousseff e Michel Temer, para chegar ao fim nas mãos de Bolsonaro e Guedes, os mesmos que fazem tudo para facilitar a vida dos que querem adquirir armas.
O espírito da lei, quando instituída há mais de 25 anos, foi possibilitar aos deficientes maior autonomia e dar-lhes mais dignidade.
As modificações propostas pela dupla são: limitar a isenção para aquisição do veículo a R$ 70 mil reais; e aumentar o prazo de isenção para quatro anos.
As duas alterações na lei são descabidas e perversas com os deficientes do país.
Na primeira modificação o governo federal apenas copiou uma “maldade” de diversos estados. Já a segunda foi por inspiração própria.
A Lei nº. 8.989, de 24 de fevereiro de 1995, já traz limitação ao tipo de veículo, como por exemplo, ser de fabricação nacional, equipados com motor de cilindrada não superior a dois mil centímetros cúbicos, de no mínimo quatro portas inclusive a de acesso ao bagageiro, movidos a combustíveis de origem renovável ou sistema reversível de combustão.
A pessoa com deficiência para os fins da lei “pessoa portadora de deficiência física aquela que apresenta alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções”.
Como o espírito da lei é garantir aos deficientes maior autonomia e dignidade, ou seja, preferencialmente, que ele “se vire”, não foi imposto uma limitação de valor pois muitas das vezes o veículo necessita de modificações mecânicas para permitir a condução pelo portador de deficiência.
Outras vezes, o deficiente precisa do automóvel (como no meu caso) para exercer o seu trabalho, com um mínimo de conforto.
Como, nos termos da lei, podíamos adquirir o veículo apenas com as restrições potência, optava-se por abrir mão da isenção dos impostos estaduais para possuir um veículo, por exemplo, que pudesse “pegar a estrada” maior conforto – não luxo –, ou que precisasse sofrer adaptações que o tornava mais caro, porém, melhor para o portador de deficiência.
Muito embora, fosse uma crueldade dos estados impor a limitação de valor, se “deixava passar”, por conta da isenção do IPI, imposto de competência da união.
Quem disse que governadores e presidente não eram capazes de se se unir? Uniram-se agora para maltratar os deficientes.
Copiando a maldade já praticada pelo estados a dupla Bolsonaro/Guedes estenderam a crueldade: a ampliação do prazo de isenção para quatro anos.
Como disse anteriormente, a isenção prevista na lei não era um favor ou um privilégio.
Sempre que trocava de carro e algum amigo dizia que gostaria de ter a mesma isenção, respondia que trocaria a isenção pela saúde nas pernas deles.
Ninguém tem uma deficiência por vontade própria. No meu caso, por exemplo, tive poliomielite por omissão do estado, que, como hoje, não providenciou as vacinas no tempo e modo adequado.
É assim com todos, ninguém, por vontade própria – ainda que por alguma irresponsabilidade –, desejou ficar ou ser deficiente.
Ao Estado cumpre o dever de acolher reabilitar e promover sua integração na sociedade o mais independente possível.
Pois bem, quando digo que a isenção não é um privilégio é porque o Estado brasileiro tem como princípio fundamental a “dignidade da pessoa humana”, artigo 1º., III, da Constituição Federal.
Ao poderem trocar de carro a cada dois anos, no espírito da lei, foi uma forma de permitir que o deficiente, já com os seus custos pessoais elevados, tivesse que gastar o mínimo possível com a substituição do veículo, ou seja, com pouco dinheiro poderia inteirar para comprar outro igual ao que já possui.
Os deficientes só podem (podiam) comprar um veículo a cada dois anos. Eles não estavam montando revendedoras de carros.
Uma outra razão para que o prazo fosse esse (dois anos) é porque neste prazo o veículo ainda se encontra em bom estado, não apresentando defeitos.
Como um dos motivos da existência da lei é garantir a dignidade da pessoa com deficiência, decerto que ninguém, talvez somente os gênios Bolsonaro/Guedes, vai querer que o carro do aleijado “pregue” no meio da pista, sem que ele possa por seus próprios meios, se socorrer.
Foram por tais razões que lei foi feita com tais parâmetros, sem limitação de valores e com dois anos entre uma isenção e outra.
Nunca buscamos privilégios ou benefícios além dos necessários a uma vida digna, honrada e autônoma.
Como dizia meu pai, quem disso usa, disso cuida, talvez o senhor Bolsonaro que se aposentou quase adolescente quando deu baixa do Exército brasileiro e depois disso passou a vida complementando a vida de mandato em mandato, tenha uma ideia equivocada do que sejam direitos e do que sejam privilégios.
A MP da dupla Bolsonaro/Guedes não visa combater privilégios – aliás não entendi o motivo para os fins da isenção aos deficientes vir junto com as medidas ligadas ao mundo financeiro, talvez achem que deficientes e banqueiros sejam a mesma coisa –, ela é apenas cruel.
Mais uma crueldade para a vasta coleção.
Mas é assim mesmo, ano que vem os deficientes do Brasil terão a chance de se reencontrar com o senhor Bolsonaro.
Abdon Marinho é advogado e deficiente físico.