AbdonMarinho - Bolsonaro mira suas armas contra os aleijados.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Domingo, 22 de Setem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

Bol­sonaro mira suas armas con­tra os aleijados.

BOLSONARO MIRA SUAS ARMAS CON­TRA OS ALEIJADOS.

Por Abdon Marinho.

O SEN­HOR Bol­sonaro, pres­i­dente do Brasil, gosta de homens… homens arma­dos.

Sem­pre que tem uma opor­tu­nidade lá está ele defend­endo essa turma e a pauta armamentista.

Sem­pre que pode, usando os poderes que foi investido, lá está ele isen­tando a turma de impos­tos, facil­i­tando a com­pra de armas e munições, aumen­tando o número de armas e o cal­i­bre das mesmas.

Se tivesse tal­ento, o sen­hor Bol­sonaro, pode­ria estre­lar aquele famoso com­er­cial de cig­a­r­ros, Terra de Marl­boro, aquele que dizia: “Terra de Marl­boro, onde os homens se encon­tram”.

Nada tenho con­tra o direto dos cidadãos se armarem – já disse isso até mais de uma vez.

Assim como nada tenho con­tra o fato do sen­hor Bol­sonaro preferir se “sen­tir em casa” em meio a “macharada alfa”.

Cada um sente-​se bem onde quiser e tem o dire­ito inalienável às próprias preferências.

O reg­istro que faço é ape­nas em oposição ao fato de nunca ter­mos visto sua excelên­cia “mover uma palha” na defesa dos defi­cientes; manifestar-​se para facilitar-​lhes a aquisição de cadeiras de rodas; próte­ses ou quais­quer out­ros instru­men­tos capazes de lhes facil­i­tar a vida.

Sim, a vida. Não falo de gosto, prazer pes­soal ou “hobby”, falo em facilitar-​lhes a vida.

E olha que segundo o Insti­tuto Brasileiro de Geografia e Estatís­ti­cas – IBGE, somos cerca de 45 mil­hões de brasileiros apre­sen­tando algum tipo de deficiência.

Que dane-​se que não demon­stre qual­quer apreço ou sim­pa­tia por nós, assim como não demon­stra qual­quer respeito ou sol­i­dariedade pelos mil­hares de brasileiros que já perderam a vida nesta pan­demia, muitos deles por culpa e respon­s­abil­i­dade do gov­erno fed­eral, que não foi atrás de vaci­nas, insumos e tudo mais que dev­e­ria ser o papel de gov­er­nantes fazê-​los.

Aliás, ape­nas para reg­istro, não me recordo de ter visto sua excelên­cia vis­i­tando um hos­pi­tal ded­i­cado ao trata­mento das víti­mas da pan­demia ou mesmo mostrar qual­quer sol­i­dariedade aos famil­iares dos mais de 260 mil brasileiros que já perderam a vida nesta tragé­dia – repito, muitos pela ação e/​ou omis­são do atual inquilino do Planalto.

Ape­nas para reg­istro – mais um triste reg­istro –, no dia em que o país somou 260 mil mor­tos, sua excelên­cia fez foi per­gun­tar quando iam ces­sar com a fres­cura, com o “mim­imi” e parar o choro. No dia que 260 famílias e ami­gos choravam a perda de seus entes queri­dos em um ano de pan­demia.

Se escapar até lá – toc, toc, toc, três vezes na madeira –, aguardo para ouvir o que dirá quando atin­gir­mos a triste marca de 300 mil, 400 mil, 500 mil mor­tos, pela pan­demia que ele dev­e­ria estar com­bat­endo.

Mas já falamos disso e falare­mos out­ras vezes mais.

Deix­e­mos o pres­i­dente hipote­car a sua sol­i­dariedade, apreço e uti­lizar dos favores e bene­fí­cios da nação ape­nas para sua “macharada alfa”.

O texto de hoje é para reg­is­trar que sua excelên­cia, o sen­hor Bol­sonaro e o seu min­istro da econo­mia, Paulo Quedes, que nunca man­i­fes­taram qual­quer apoio ou fiz­eram algo pelos defi­cientes do Brasil, acharam que era a hora de “sacar suas armas” con­tra os aleijados.

Com uma medida pro­visória só, acabaram com uma con­quista dos defi­cientes que já se encon­trava em vigor há um quarto de século.

Os gênios que dão show no com­bate à pan­demia, decidi­ram, por medida pro­visória, mod­i­ficar a con­cessão de isenção rel­a­tiva ao Imposto sobre Pro­duto Indus­tri­al­iza­dos inci­dente na aquisição de automóveis por pes­soa com defi­ciên­cia pre­vista na Lei nº. 8.989, de 24 de fevereiro de 1995.

A lei pas­sou pelo gov­erno de Fer­nando Hen­rique Car­doso, pelos gov­er­nos de Luís Iná­cio Lula da Silva, Dilma Rouss­eff e Michel Temer, para chegar ao fim nas mãos de Bol­sonaro e Guedes, os mes­mos que fazem tudo para facil­i­tar a vida dos que querem adquirir armas.

O espírito da lei, quando insti­tuída há mais de 25 anos, foi pos­si­bil­i­tar aos defi­cientes maior autono­mia e dar-​lhes mais dignidade.

As mod­i­fi­cações pro­postas pela dupla são: lim­i­tar a isenção para aquisição do veículo a R$ 70 mil reais; e aumen­tar o prazo de isenção para qua­tro anos.

As duas alter­ações na lei são descabidas e per­ver­sas com os defi­cientes do país.

Na primeira mod­i­fi­cação o gov­erno fed­eral ape­nas copiou uma “mal­dade” de diver­sos esta­dos. Já a segunda foi por inspi­ração própria.

A Lei nº. 8.989, de 24 de fevereiro de 1995, já traz lim­i­tação ao tipo de veículo, como por exem­plo, ser de fab­ri­cação nacional, equipa­dos com motor de cilin­drada não supe­rior a dois mil cen­tímet­ros cúbi­cos, de no mín­imo qua­tro por­tas inclu­sive a de acesso ao bagageiro, movi­dos a com­bustíveis de origem ren­ovável ou sis­tema rever­sível de com­bustão.

A pes­soa com defi­ciên­cia para os fins da lei “pes­soa por­ta­dora de defi­ciên­cia física aquela que apre­senta alter­ação com­pleta ou par­cial de um ou mais seg­men­tos do corpo humano, acar­retando o com­pro­me­ti­mento da função física, apresentando-​se sob a forma de para­ple­gia, para­pare­sia, mono­ple­gia, mono­pare­sia, tetraple­gia, tetra­pare­sia, triple­gia, tri­pare­sia, hemi­ple­gia, hemi­pare­sia, amputação ou ausên­cia de mem­bro, par­al­isia cere­bral, mem­bros com deformi­dade con­gênita ou adquirida, exceto as deformi­dades estéti­cas e as que não pro­duzam difi­cul­dades para o desem­penho de funções”.

Como o espírito da lei é garan­tir aos defi­cientes maior autono­mia e dig­nidade, ou seja, pref­er­en­cial­mente, que ele “se vire”, não foi imposto uma lim­i­tação de valor pois muitas das vezes o veículo neces­sita de mod­i­fi­cações mecâni­cas para per­mi­tir a con­dução pelo por­ta­dor de deficiência.

Out­ras vezes, o defi­ciente pre­cisa do automóvel (como no meu caso) para exercer o seu tra­balho, com um mín­imo de con­forto.

Como, nos ter­mos da lei, podíamos adquirir o veículo ape­nas com as restrições potên­cia, optava-​se por abrir mão da isenção dos impos­tos estad­u­ais para pos­suir um veículo, por exem­plo, que pudesse “pegar a estrada” maior con­forto – não luxo –, ou que pre­cisasse sofrer adap­tações que o tor­nava mais caro, porém, mel­hor para o por­ta­dor de deficiência.

Muito emb­ora, fosse uma cru­el­dade dos esta­dos impor a lim­i­tação de valor, se “deix­ava pas­sar”, por conta da isenção do IPI, imposto de com­petên­cia da união.

Quem disse que gov­er­nadores e pres­i­dente não eram capazes de se se unir? Uniram-​se agora para mal­tratar os defi­cientes.

Copiando a mal­dade já prat­i­cada pelo esta­dos a dupla Bolsonaro/​Guedes esten­deram a cru­el­dade: a ampli­ação do prazo de isenção para qua­tro anos.

Como disse ante­ri­or­mente, a isenção pre­vista na lei não era um favor ou um priv­ilé­gio.

Sem­pre que tro­cava de carro e algum amigo dizia que gostaria de ter a mesma isenção, respon­dia que tro­caria a isenção pela saúde nas per­nas deles.

Ninguém tem uma defi­ciên­cia por von­tade própria. No meu caso, por exem­plo, tive poliomielite por omis­são do estado, que, como hoje, não prov­i­den­ciou as vaci­nas no tempo e modo adequado.

É assim com todos, ninguém, por von­tade própria – ainda que por alguma irre­spon­s­abil­i­dade –, dese­jou ficar ou ser defi­ciente.

Ao Estado cumpre o dever de acol­her reabil­i­tar e pro­mover sua inte­gração na sociedade o mais inde­pen­dente possível.

Pois bem, quando digo que a isenção não é um priv­ilé­gio é porque o Estado brasileiro tem como princí­pio fun­da­men­tal a “dig­nidade da pes­soa humana”, artigo 1º., III, da Con­sti­tu­ição Federal.

Ao poderem tro­car de carro a cada dois anos, no espírito da lei, foi uma forma de per­mi­tir que o defi­ciente, já com os seus cus­tos pes­soais ele­va­dos, tivesse que gas­tar o mín­imo pos­sível com a sub­sti­tu­ição do veículo, ou seja, com pouco din­heiro pode­ria inteirar para com­prar outro igual ao que já pos­sui.

Os defi­cientes só podem (podiam) com­prar um veículo a cada dois anos. Eles não estavam mon­tando revende­do­ras de carros.

Uma outra razão para que o prazo fosse esse (dois anos) é porque neste prazo o veículo ainda se encon­tra em bom estado, não apre­sen­tando defeitos.

Como um dos motivos da existên­cia da lei é garan­tir a dig­nidade da pes­soa com defi­ciên­cia, decerto que ninguém, talvez somente os gênios Bolsonaro/​Guedes, vai querer que o carro do alei­jado “pregue” no meio da pista, sem que ele possa por seus próprios meios, se socorrer.

Foram por tais razões que lei foi feita com tais parâmet­ros, sem lim­i­tação de val­ores e com dois anos entre uma isenção e outra.

Nunca bus­camos priv­ilé­gios ou bene­fí­cios além dos necessários a uma vida digna, hon­rada e autônoma.

Como dizia meu pai, quem disso usa, disso cuida, talvez o sen­hor Bol­sonaro que se aposen­tou quase ado­les­cente quando deu baixa do Exército brasileiro e depois disso pas­sou a vida com­ple­men­tando a vida de mandato em mandato, tenha uma ideia equiv­o­cada do que sejam dire­itos e do que sejam privilégios.

A MP da dupla Bolsonaro/​Guedes não visa com­bater priv­ilé­gios – aliás não entendi o motivo para os fins da isenção aos defi­cientes vir junto com as medi­das lig­adas ao mundo finan­ceiro, talvez achem que defi­cientes e ban­queiros sejam a mesma coisa –, ela é ape­nas cruel.

Mais uma cru­el­dade para a vasta coleção.

Mas é assim mesmo, ano que vem os defi­cientes do Brasil terão a chance de se reen­con­trar com o sen­hor Bol­sonaro.

Abdon Mar­inho é advo­gado e defi­ciente físico.