A CEGUEIRA DE CADA UM E A POLÊMICA DE SEIS CENTAVOS.
Por Abdon Marinho.
O AMOR É CEGO, pontua um dito popular ao longo dos séculos. O dito, de tão popular, virou filme, virou livro …
O Brasil de hoje é a prova viva de que o dito que escuto desde criança – e o qual nunca questionei –, é a mais clara expressão da realidade.
O ambiente de cegueira coletiva impede as pessoas de enxergarem o que lhes salta aos olhos ou que lhes provam a lógica, para acreditarem e pregarem o que lhes manda o coração – tradução para convencimento pessoal ou paixão pela causa.
O contrário da paixão – bem poderia ser a indiferença –, é o ódio, que, como o amor, também é cego. Poder-se-ia dizer que o ódio é uma especie de amor com o sinal trocado.
O Brasil tem se tornado, repito, o laboratório das paixões mais irracionais.
Aos apaixonados pelo presidente da República mesmo os seus defeitos mais aterradores soam como qualidades – não tardarão a defender a tortura, posto que já defendem a volta da ditadura, o AI-5, fechamento do STF e do Congresso Nacional e, alguns mais radicais, até a eliminação física de ministros –, já para os cegos pelo ódio, mesmo alguma qualidade – rara –, por ventura existente na pessoa ou no governo, soa como defeito.
Aos apaixonados pelos opositores do presidente também acontece o mesmo: não conseguem enxergar além das suas qualidades e preferem “passar por cima” dos defeitos ou ignorá-los.
A semana que finda deparamo-nos com o que acabo de falar.
Todos nós, direta ou indiretamente, estamos sofrendo com o aumento dos preços dos combustíveis.
Não seria diferente, os preços dos combustíveis influência em tudo. Do que colocamos na mesa à ida ao cinema ou ao shopping, sem contar que gasolina a sete reais ninguém merece.
A questão dos preços dos combustíveis não é de difícil compreensão. Isso se você não fosse tratar com os apaixonados, senão vejamos.
Os apaixonados pelo presidente colocam toda a culpa pelos preços dos combustíveis nas alturas nos governadores e dos impostos estaduais.
Já para os apaixonados pelos opositores do presidente ou pelos que lhe nutrem ódio, a culpa é somente daquele.
Por estes dias o governador do Maranhão, senhor Flávio Dino, publicou nas suas redes sociais – e fez repercutir por todos os seus apaixonados –, o seguinte textos: “Criminosos estão espalhando que eu autorizei o aumento de alíquota de imposto sobre gasolina no Maranhão. Isso é MENTIRA. Coisa de bandidos. Problema de preços de combustíveis é nacional.
Criminosos que estão mentindo sobre aumento de combustíveis no Maranhão deveriam saber que não existe “tabelamento de preços” de combustíveis. O governo do Estado não tem poder de fixar preços de combustíveis. O imposto previsto na Constituição incide sobre o preço de mercado”.
O governador subiu nas “tamancas” após a divulgação de que o SEFAZ (governo estadual) solicitou, e o CONFAZ autorizou uma alteração no preço médio ponderado ao consumidor final no Estado Maranhão, com ampla repercussão negativa nas redes sociais e explorado à exaustão por seus adversários tradicionais e pelos “novos” adversários.
Diante disso o governador veio com essa manifestação que não explica, objetivamente, o que se deu e qual a sua participação na elevação dos preços.
Não se preocupem que vou explicar o que o governador ocultou com sua “manifestação para enganar trouxas”.
Antes, porém, vou tratar da elevação dos preços dos combustíveis de uma forma geral, aquilo que os devotos e apaixonados pelo presidente fazem questão de ignorar e/ou ocultar.
Como sabemos, o petróleo é uma commodity que tem seu preço determinado pelo mercado internacional e cotado em dólar.
Isso quer dizer que se o preço do barril de petróleo aumenta lá fora aqui sofreremos as consequências.
A outra variante a influir no preço dos combustíveis aqui é a variação do dólar. Ou seja, se a nossa moeda se desvaloriza em relação ao dólar as consequências são as elevações de preços aqui dentro.
Pois bem, em janeiro de 2019, quando o atual presidente assumiu o comando do país a cotação do dólar era 1 dólar = 3,735 reais, hoje a cotação é 1 dólar = 5,309 reais.
Como podemos perceber a moeda brasileira perdeu cerca de 30% (trinta por cento) de seu valor. Não foi o dólar que se valorizou foi o real que perdeu valor, estamos, praticamente com uma moeda podre.
Essa semana a Apple divulgou seus lançamentos. Os preços dos seus produtos variam de US$ 399 dólares a US$ 999 dólares, um ou outro chega US$ 1,079 dólares. É praticamente o mesmo preço de 20 anos atrás quando lançaram o primeiro iPhone.
Só que se antes, se o cidadão podia comprar um bom aparelho pagando 5 ou 6 mil reais, já com a carga tributária escorchante, hoje esse mesmo aparelho não sai por menos de 15 mil reais.
Nenhum país do mundo – me refiro as democracias em ascensão –, registrou tamanha perda no valor de sua moeda.
Mesmo durante a pandemia o que vi de desvalorização não chegou a 4% (quatro por cento) – o que já é muito.
Ora, se olharmos para realidade do Brasil e para de outros países nas mesmas condições que o nosso não existe justificativa para tamanha desvalorização da nossa moeda – mesmo com a pandemia o país registrou recorde na produção agrícola, apresenta sinais de recuperação consistentes e com vacinação já estamos quase saindo da pandemia –, que não uma política econômica equivocada.
Outro fator a justificar tamanha desvalorização é a instabilidade política, as declarações estapafúrdias do presidente e dos integrantes do governo.
Em outras palavras, o aumento do preço dos combustíveis, num primeiro momento, devemos debitar ao governo federal e em particular ao senhor presidente, que tem contribuído, sobremaneira, para a desvalorização da nossa moeda.
Como o governo federal tem sido incapaz de proteger o real e por consequência as economias dos cidadãos, passou a terceirizar as responsabilidades pelo aumento dos combustíveis com os estados, apontando a elevada carga de ICMS como a causa do aumento dos mesmos.
É verdade que o ICMS dos estados é elevado – gira em torno de 30% –, mas quando o litro da gasolina custava menos de R$ 1,00 (um real), não reclamávamos dos centavos que pagávamos a título de ICMS. aliás, nem nos preocupávamos em fazer tais contas.
Como diz um amigo meu, dez por cento de nada é nada, já dez por cento de um milhão é algo significativo.
O mesmo vale para os trinta por cento dos combustíveis. Embora fosse pouco quando o preço era baixo, a medida que o preço se elevou começou a fazer diferença.
E assim chegamos à razão da “zanga” do sua excelência, o governador do Maranhão com as “acusações” de que elevara os preços dos combustíveis no estado.
A menos que me provem o contrário, é fato que o governo estadual através da SEFAZ solicitou a alteração do preço médio ponderado ao consumidor final, de R$ 5,7160/litro para R$ 5,9200/litro. Não vejo motivo para discutir porque as portarias estão publicadas no diário oficial.
O que essa alteração significa para o consumidor? Significa que o valor do ICMS no caso da gasolina (mas a alteração se aplica a outros combustíveis) passa de R$ 1,74338 para R$ 1,8056 ou seja, para cada litro de gasolina nós, cidadãos, iremos pagar SEIS CENTAVOS a mais. Se de todo litro de gasolina que colocávamos no carro R$ 1,7433 já ia para o cofre do governo estadual, agora, deste mesmo litro irá para o cofre do estado R$ 1,8056, essa é a conta.
Sim, é verdade que não houve aumento da alíquota como os bolsonaristas mais afoitos espalharam ou insinuaram – pois a ninguém parece interessar a verdade é sim a versão –, mas, sim um aumento na base de cálculo.
Isso significa dizer que mesmo que o dono do posto queira vender um litro de gasolina abaixo de R$ 5,9200/litro, ele pode fazer, mas arcando com o prejuízo pois o ICMS será cobrado sobre aquele valor.
É isso apaixonados do Brasil e do Maranhão, quando pararem no posto para abastecerem seus veículos não esqueçam de dizer: — muito obrigado, senhor presidente! — muito obrigado, senhor governador!
Abdon Marinho é advogado