AbdonMarinho - Cotidiano
Bem Vindo a Pagina de Abdon Marinho, Ideias e Opiniões, Sexta-feira, 22 de Novembro de 2024



A palavra é o instrumento irresistível da conquista da liberdade.

Escrito por Abdon Marinho

A HUMANIDADE FRACASSOU?

Sempre que nos deparamos com atos que só a bestialidade humana é capaz de produzir, acabo por me fazer a pergunta do título:  a humanidade fracassou?

Há algum tempo assisti a um vídeo de Ariano Suassuna (1927 – 2014) onde ele contesta a Teoria da Evolução de Charlie Darwin. Dizia o dramaturgo, romancista, ensaísta e poeta brasileiro, não caber em sua cabeça que o homem tenha evoluído do macaco. Cita como exemplo da genialidade humana uma invenção simples como um prendedor de roupa, fazendo uma demonstração com ele. Conclui, em linhas gerais, dizendo que se o macaco não consegue criar algo como o prendedor de roupa quanto mais algo como a Nona Sinfonia de Beethoven (1770 – 1827).

 Concordando ou não com qualquer pensamento sou admirador e apreciador de um raciocino bem feito, uma ideia bem exposta, ainda que um sofisma, desde que bem apresentado, é merecedor do meu respeito.

Assisti a este video do autor de “O auto da compadecida” umas duas ou três vezes, em todas fiquei encantado com exposição feita. 

Não duvido da imensa genialidade do homem nas artes, na música, pintura, escultura, arquitetura, quantas coisas maravilhosas e que atravessam séculos, milênios ainda hoje nos encantam? Como ficar indiferente ao que produziu Beethoven, Wagner (1813 – 1883), Leonardo da Vinci 1452 – 1519), Michelângelo (1475 – 1564), tantos outros? Como deixar de reconhecer os avanços da medicina?  Como não se encantar com um Shakespeare 1564 – 1616), um Vieira (1608 – 1697)  um Queiróz (1845 – 1900)? Como ficar indiferente a um Suassuna e a sua capacidade de nos fazer rir?

A humanidade, em todos os campos do conhecimento, das artes, está repleta de bons exemplos, de altruísmo, de atos heróicos e de dedicação ao próximo.

Noutra quadra, esta mesma humanidade nos lega as maiores barbaridades.

Quantos milhões de vidas não foram ceifadas apenas nas duas grandes guerras (I e II Guerra Mundial)? Quantos outros pereceram antes e depois delas por conta da intolerância, do ódio, da não aceitação do próximo com suas qualidades e defeitos? A quem e por quem foi dado o direito dizer ou repudiar alguém por pensar, viver e ter uma fé diferente da que professamos?  

Agora mesmo a humanidade está diante de inúmeros conflitos em escala global, são milhões de pessoas sendo desalojadas de seus lares, peregrinado a esmo em busca de refúgio. Famílias jovens, mulheres, velhos, crianças que marcham conduzidos e cercados por tropas de segurança em busca de alguém que os aceite receber. São pessoas que perderam tudo e se agarram à esperança derradeira de conseguirem recomeçar suas vidas em terras estranhas onde quase sempre são mal recebidos ou vistos com desconfiança pelas populações locais. 

Além das guerras e conflitos a dizimando populações inteiras, causados por motivações políticas, religiosas, há ainda a corrupção, sobretudo, nos países mais pobres, desviando os recursos das nações e condenando o povo ao obscurantismo da falta de educação, à morte pela proliferação de diversas doenças que com muito pouco recursos seriam controladas e vencidas.  

Em busca do lucro, das riquezas e dos bens materiais a humanidade destrói sua própria casa, o Planeta Terra. Que outra categoria de ser é capaz de destruir seu próprio habitat? Que loucura, o homem é a cada dia que passa, trabalha na destruição do planeta, faz isso sem se dar conta que não temos outro planeta substituto, de reserva. 

Determinado pensador (não me recordo, agora, qual) disse que a humanidade deveria temer pela existência de vida extraterrestre, pois estes, caso viessem até o nosso planeta, fariam isso na condição de conquistadores  e iria nos escravizar, pois, certamente, seriam/são bem mais evoluídos que os humanos. 

Não duvido que tal pensamento esteja certo. 

A humanidade, apesar do tanto que evoluiu e se desenvolveu materialmente ao longo de milênios é capaz de gestos tão mesquinhos como matar civis inocentes, expulsar de seus lares famílias inteiras, cidades inteiras, escravizar mulheres, jovens, crianças. 

Agora mesmo estamos diante de mais um atentado terrorista que ceifou em ataques sincronizados, mais de uma centena de vítimas, civis inocentes que apenas saíram de casa na intenção de se divertir e se confraternizar com os amigos. O que move tais ataques terroristas, seja na Europa ou no Oriente Médio senão a intolerância e a incapacidade de conviver e aceitar as diferenças?  Evoluímos tanto e não conseguimos aceitar que o nosso semelhante seja diferente de nós, que professe outra fé e que faça coisas diferentes das que fazemos? Que evolução é essa?

Ainda no calor dos atentados de Paris ouvimos até pessoas inteligentes e cultas dizerem que se deve restringir ou barrar a circulação de islamitas pela Europa, fazendo com que a pena passe além daqueles que cometeram os atos repulsivos. Outros vão além,  falam em fechamento de fronteiras, em deixar morrer à mingua os que baterem às suas portas. 

Com certeza defendo apuração e punição  dos responsáveis por este e por tantos outros atos de terror, inclusive que respondam como ato de guerra à humanidade. Por outro lado, não podemos responder a intolerância com mais intolerância, responsabilizar todo um povo, toda uma religião ou fé, por atos que são de poucos. 

Não podemos permitir que o terror nos tire a civilidade que resta aos bons pois é isso que buscam. 

Não podemos ceder-lhes essa vitória. 

Devemos, sim, derrotá-los, responsabilizar e punir exemplarmente os culpados,  apenas a eles.

Responder com ódio e intolerância é atestar o fracasso da humanidade.

Ainda menino, lembro de ter lido que certo conquistador europeu fora recebido por um chefe tribal africano. Durante a conversa, este chefe tribal inquiriu-lhe sobre os belos festins que haviam feito com os milhões de mortos que fizeram na II Guerra Mundial. O europeu respondeu-lhe: – Não comemos os nossos semelhantes. Foi a vez do chefe tribal demonstrar seu espanto: – Ué, então por que os matam!?

Seria bom refletirmos sobre isso.

 

Abdon Marinho é advogado.