AbdonMarinho - É ensurdecedor o silêncio que vem lá do Rangedor.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sexta-​feira, 22 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

É ensur­de­ce­dor o silên­cio que vem lá do Rangedor.

É ENSUR­DE­CE­DOR O SILÊN­CIO QUE VEM DO RANGE­DOR.

Por Abdon Mar­inho.

CERTA vez vi uma not­inha, emb­ora séria, escon­dida em uma col­una de fofoca. Insin­u­ava que um dep­utado estad­ual suposta­mente tendo ingerido bebida, medica­men­tos ou out­ras dro­gas, fora apan­hado pela polí­cia que, ao invés de levá-​lo para “des­cansar” em uma cela, fez foi servir-​lhe de motorista e conduzi-​lo até sua casa, com dire­ito a segu­rança pri­vada for­mada por bate­dores da corporação.

O nar­rador do fato, tratou-​o com incon­tido humor.

Tem­pos depois, tam­bém, de forma enviesada tomamos con­hec­i­mento que uma outra excelên­cia cul­ti­vava o hábito de pas­sar a roupa da esposa com ela dentro.

Zumbidos daqui ou dali, de certo que o par­la­men­tar acabou por ter­mi­nar o mandato sem ser impor­tu­nado.

Quem parece não ter gostado muito da história foi a pat­uleia que o reprovou nas urnas na eleição seguinte.

Não muito dis­tante deste período tomamos con­hec­i­mento de um outro fato igual­mente per­tur­bador, aquele par­la­men­tar da primeira história deste texto, envolveu-​se em idên­tica situ­ação em um estado viz­inho, que acabou detendo-​o, se não me falha a memória, por desacato e/​ou ameaças diver­sas aos agentes da lei que cumpri­ram com o seu dever.

Mais grave que a mon­u­men­tal con­fusão na qual envolveu-​se a excelên­cia, foram as palavras que teria pro­ferido, segundo diver­sos veícu­los de comu­ni­cação.

Teria dito (ou con­fes­sado) sua excelên­cia: “Vocês são polí­cia, né? A gente mata gente”. Mais: “Eu sou, eu sou mais que tu. Eu sou dep­utado, e sou rico. Vou man­dar te matar, vagabundo. Vou te pegar, eu te mato. Sou filho do ****. Per­gunta quem é ****. Eu vou te matar. Vou man­dar te matar”. E ainda: “Tá morto ele. Per­gunta quem é ****. Esse cara tá morto”, completou.

Tratei deste assunto no texto “Um bode invisível na Alema”.

Ape­sar da gravi­dade da situ­ação e, sobre­tudo, das declar­ações “dadas” por sua excelên­cia – ainda que diga que quem as pro­feriu foi o Mr. Walker, John­nie Walker –, nada lhe acon­te­ceu. Uma con­fis­são pública de que seria depen­dente químico foi o sufi­ciente para arrefe­cer, se por­ven­tura ocor­reu, qual­quer sen­ti­mento de resposta à sociedade por parte dos seus cole­gas de par­la­mento.

É fato que a dependên­cia química é uma doença que merece, e pre­cisa, ser tratada. Entre­tanto, se o par­la­men­tar, legí­timo rep­re­sen­tante do povo que­ria mesmo a expi­ação de sua culpa dev­e­ria bus­car o trata­mento clínico ade­quado.

Noutra quadra, o que disse, sobre a “tradição” de matar gente, dele e da família, não pode­ria ter pas­sado em bran­cas nuvens. Passou.

Ao invés de repri­menda ou, pelo menos inves­ti­gação, o que vimos foi o par­la­men­tar “tirar onda” com a ban­deira da pre­venção à dependên­cia química e estam­par outdoor’s e busdoor’s por toda a cidade com sua foto e suposta ini­cia­tiva. Tudo, obvi­a­mente, pagos com recur­sos dos nos­sos impos­tos.

Trata­mento às maze­las da doença que dev­e­ria com­bater, não se sabe se bus­cou, tanto que, mais uma vez, se ouve buchi­cho de que envolveu-​se em um grave episó­dio de vio­lên­cia domés­tica, tendo sido, inclu­sive, proibido de aproximar-​se da(s) vítima(s). A famosa medida pro­te­tiva pre­vista na Lei Maria da Penha.

Como disse, são “buchi­chos”, uma vez que a imprensa local, ape­sar do assunto envolver o inter­esse público, trata o assunto como algo extrema­mente pri­vado.

Não me recor­dando, sequer de ter lido ou visto em algum canal de rádio, tele­visão ou mesmo nos grandes jor­nais nada sobre assunto.

Em sendo ver­dade, alcança-​nos a exdrúx­ula situ­ação de ter­mos um par­la­men­tar que não pode “chegar perto” da esposa ou dos fil­hos, mas que pode fazer leis de inter­esse de toda a sociedade, fis­calizar os atos do Poder Exec­u­tivo e gozar de todas as benesses que lhe con­fere o con­fere o mandato par­la­men­tar.

Pois bem, faço esse breve ret­ro­specto – inclu­sive deixando de citar as out­ras infor­mações que nos chagam sobre nepo­tismo, favorec­i­mento, rachad­in­has, ven­das de emen­das par­la­mentares, agio­tagem, etcetera, porque tais “notí­cias” são “vel­has” e, parece-​me, nunca des­per­taram o inter­esse da imprensa ou mesmo dos eleitores, tanto que sem­pre ou quase sem­pre, elegem os mes­mos de sem­pre –, porque li em algum lugar que deter­mi­nado dep­utado estad­ual que dis­putou a eleição na cap­i­tal tenta uma vaga no Poder Exec­u­tivo, suposta­mente, por temer, um processo de cas­sação na Casa de Manoel Bequimão.

Em sendo ver­dade, sua excelên­cia, deve ter se dado conta, final­mente, da gravi­dade da sua con­duta, ao, suposta­mente, estando con­t­a­m­i­nado pela covid-​19, em plena ascen­são da pan­demia do novo coro­n­avírus, ter per­manecido em cam­panha por diver­sos dias, colo­cando em risco, dezenas ou cen­te­nas, quiçá, mil­hares de vidas humanas, além, claro, de ter desre­speitado decre­tos estad­u­ais que tratam dos pro­ced­i­men­tos a serem ado­ta­dos por conta da pandemia.

Parafrase­ando um antigo filme, é provável que sua excelên­cia saiba o que fez no verão pas­sado.

Pas­sa­dos quase trinta dias desde que fato foi denun­ci­ado, não me recordo de nen­hum posi­ciona­mento ofi­cial da Assem­bleia Leg­isla­tiva sobre o com­por­ta­mento do dep­utado. Nem mesmo para con­fir­mar ou negar o fato divulgado.

Como se o povo, esse con­junto de cidadãos que votam e pagam impos­tos, não tivesse o direto de saber, de fato, o que ocor­reu.

Aliás, como previne o título do texto, a Casa de Bequimão guarda um silên­cio ensur­de­ce­dor.

O que não chega a ser uma novi­dade diante de tan­tos fatos que mal fogem da penum­bra.

O para­doxo da notí­cia é a nar­ra­tiva de que o par­la­men­tar deixaria o cargo por temer a retal­i­ação dos cole­gas. Logo eles que sem­pre foram tão “com­preen­sivos” com tan­tos malfeitos.

Será que final­mente chegaram à con­clusão que passou-​se do ponto?

Em sendo ver­dade, tem-​se que o par­la­men­tar não vai servir ao Poder Exec­u­tivo para con­tribuir com alguma coisa, mas para “homiziar-​se” e fugir de uma rara – e dev­ida –, punição.

Ainda no campo das suposições – como tudo neste texto, já que as infor­mações são sone­gadas, sus­sur­radas –, em sendo com­pro­vado, após reg­u­lar pro­ced­i­mento, que o par­la­men­tar come­teu o delito que lhe é imputado, o mel­hor lugar para fugir de suas respon­s­abil­i­dades e sair ileso é a sinecura per­ante o Poder Exec­u­tivo? A ausên­cia atre­v­ida per­mi­tiria que suas excelên­cias “esque­cessem” o delito praticado?

E, noutra quadra, como o Poder Exec­u­tivo iria (ou irá) fazer para jus­ti­ficar a guar­ida ao infrator? Não foi ele que impôs todo tipo de restrições para impedir que a pan­demia se espal­hasse no Maran­hão? Quan­tos micro e peque­nas empre­sas que­braram por conta das restrições? Quan­tos perderam seus empregos?

Aí, não mais que de repente, um “pro­te­gido” é acu­sado de aten­tar con­tra a saúde da pop­u­lação em plena pan­demia e o mesmo gov­erno que impôs aos cidadãos todas as restrições já lis­tadas, para que o mesmo não seja punido por seus próprios pares, o que faz é premiá-​lo com um cargo de secretário de estado ou algo equiv­a­lente?

E têm cor­agem de nos olhar na cara depois de ter, inclu­sive, colo­cado a polí­cia nas ruas para impedir que saísse­mos de casa sem um motivo justificado?

Vejam onde amar­ramos a nossa égua, não bas­tasse o silên­cio crônico das excelên­cias em relação a tudo, quando há uma pál­ida notí­cia de que alguma coisa final­mente será feita, e por algo efe­ti­va­mente grave e indeco­roso – muito emb­ora todos os out­ros fatos nar­ra­dos sejam de gravi­dade ímpar –, partem para uma “oper­ação” de sal­va­mento do mandato e pre­mi­ação do infrator.

Emb­ora nada mais me sur­preenda, causa-​me estu­por que autori­dades sejam capazes de tais ati­tudes.

É como se nada de grave tivesse ocor­rido, como se tudo fosse nor­mal, como se o respeito ao cidadão fosse algo secundário.

Quem parece ter sido “con­t­a­m­i­nado” pelo silên­cio tam­bém é o nosso val­oroso Min­istério Público. Sobre todos os fatos que rap­i­da­mente nar­rei neste texto e sobre os quais dev­e­ria dizer ou ado­tar alguma providên­cia, ainda que para tran­quil­izar a pat­uleia insana, se disse ou se fez algo é seg­redo tão bem guardado quanto cabelo de freira.

É assim. Que siga o cortejo fúne­bre da ética e da decên­cia, com silên­cio cor­tado pelo rangido das rodas das car­roças.

Abdon Mar­inho é advogado.