AbdonMarinho - AS GUERRAS DO BRASIL
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sexta-​feira, 22 de Novem­bro de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

AS GUER­RAS DO BRASIL

AS GUER­RAS DO BRASIL.

Por Abdon Marinho.

O MUNDO trava uma guerra con­tra um inimigo oculto: o novo coro­n­avírus surgindo na China a par­tir de setem­bro ou out­ubro de 2019, e que vem cau­sando pânico em todos os países, já tendo tendo con­t­a­m­i­nado mais de dois mil­hões de pes­soas, e ceifado mais de cento e setenta mil vidas.

E pode­ria ser muito mais, se os maiores cen­tros pop­u­la­cionais não decidis­sem por “fechar as por­tas” e con­fi­nar seus cidadãos den­tro das suas residên­cias, só per­mitindo a saída para ativi­dades essen­ci­ais e nada mais.

À mín­gua de qual­quer trata­mento ou vacina, foi o que lhes restou, para, ao menos neste primeiro momento, tornar menos dramática a per­das de vidas humanas.

Mes­mos nações poderosas como os Esta­dos Unidos, que já reg­is­tra mais 40 mil mor­tos; Reino Unido, que se aprox­ima de 20 mil mor­tos; Itália e Espanha que já pas­saram de tal pata­mar, quedaram-​se à força do inimigo oculto.

Lá atrás, diante da gravi­dade da situ­ação, a Orga­ni­za­ção Mundial da Saúde — OMS, declarou situ­ação de pan­demia global.

Uma situ­ação de pan­demia não com­porta dis­cussão sobre quais­quer out­ras pau­tas que não o com­bate ao inimigo comum.

Com um ou outro encam­in­hamento dis­tinto, uma ou outra crítica aos encam­in­hamen­tos pro­pos­tos pela OMS, é isso que tem feito o resto do mundo – pelo menos a parte do mundo que aprendeu-​se a recon­hecer como sendo civilizado.

No momento em que o resto mundo trava uma luta uni­forme con­tra o inimigo da humanidade, o Brasil resolveu que é a hora de travar diver­sas “guer­ras” para­le­las, inclu­sive, ante­ci­par o debate sobre uma eleição que vai ocor­rer daqui a três anos.

O gov­erno fed­eral guer­reia entre si, ora por espaço ou para se tornar majoritária no “comando” da nação.

O pres­i­dente da República ora, sim e na outra tam­bém – fato sabido desde o iní­cio do gov­erno –, sab­ota e estim­ula “frit­uras” de seus próprios min­istros e até os ameaça ou os demite, na even­tu­al­i­dade de um ou outro se sobres­saírem mais do que ele nas suas pastas.

Os exem­p­los estão aí à vista de todos. Foi assim com o Paulo Guedes, quando este propôs as refor­mas estru­tu­rais necessárias ao país.

A reforma da pre­v­idên­cia social que todos sabiam ser necessária e urgente saiu um arremedo do pode­ria (e dev­e­ria) ter sido, por culpa da ingerên­cia do chefe do governo.

Foi assim com o Sér­gio Moro – a quem foi prometido ampla liber­dade para con­tin­uar e ampliar o com­bate à cor­rupção no país ou não lem­bram que o pres­i­dente disse que enquanto o ex-​juiz com­ba­tia a cor­rupção com uma vara de pesca no seu gov­erno iria com­bater com uma rede? –, que foi ceceado, desautor­izado, humil­hado, dimin­uído e sab­o­tado quando ten­tou aprovar seu pacote “anti­crime” ou mesmo diver­sas out­ras medidas.

O pacote até saiu. Mas bem menor e, apre­sen­tando, em alguns casos, diver­sos retrocessos.

A des­culpa do pres­i­dente era que estava pre­ocu­pado com a gov­ern­abil­i­dade e não que­ria criar atri­tos com os out­ros poderes.

Foi assim com o Luís Hen­rique Man­detta quando este começou a “apare­cer” mais do que o pres­i­dente da República por conta do com­bate à pan­demia do coro­n­avírus.

Está sendo assim com a min­is­tra da agri­cul­tura Teresa Cristina – que começa a sofrer um processo de frit­ura –, por conta do sucesso à frente da pasta.

Essa “sab­o­tagem” interna, essa des­fun­cional­i­dade do gov­erno, rev­ela a falta de capaci­dade de gov­ernar o país e tem cau­sado enormes pre­juí­zos para o Brasil, que está ver­gonhosa­mente sendo saque­ado por par­la­mentares e/​ou por gov­er­nadores ao argu­mento de com­bate à pan­demia.

Serão bil­hões e bil­hões dos quais nunca mais ter­e­mos notí­cias. Isso porque o gov­erno cen­tral tem se mostrado inca­paz de con­duzir o processo.

O Brasil vive um estranho para­doxo pois enquanto temos um pres­i­dente notada­mente inca­paz – ainda que pesquisas de opinião pública digam o con­trário – temos uma maio­ria de par­la­mentares – dep­uta­dos fed­erais e senadores –, que, notada­mente, se rev­e­lam capazes de tudo.

Não tenho qual­quer dúvida de que o pres­i­dente da Câmara e, tam­bém, o do Senado não tra­bal­ham com foco estrito no inter­esse público, tra­bal­ham, com certeza nos próprios inter­esses e para aumen­tar o seu poder na nação.

E, fazem isso “avançando”, de todas as for­mas, sobre as com­petên­cias con­sti­tu­cionais do Poder Executivo.

Existe um clima de chan­tagem explícita con­forme bem assen­tou o gen­eral Augusto Heleno em um áudio indisc­re­ta­mente cap­turado de uma con­versa pri­vada.

Ape­sar de restar claro que o con­flito exis­tente entre os poderes ocorre pela ganân­cia desen­f­reada de muitos par­la­mentares por pedaços do orça­mento, con­forme já trata­mos aqui diver­sas vezes, o pres­i­dente da República está longe ser inocente nesta história.

Ele, com sua atu­ação errática, fal­ado três bobagens a cada duas palavras, favore­ceu esse tipo de coisas e frag­ili­zou sua gestão.

Deixou-​a tão frágil que hoje exerce o poder sob a tutela dos mil­itares.

E, pior, atra­palha até os mil­itares quando estes querem fazer um tra­balho sério, téc­nico e voltado aos inter­esses da nação.

Outra coisa, não temos qual­quer dúvi­das de que muitos gov­er­nadores, desde que o atual gov­erno assumiu, tra­bal­ham de forma incan­sável e explo­rando as frag­ili­dades do atual pres­i­dente, para “crescerem” em cima dele.

A tragé­dia oca­sion­ada por este novo coro­n­avírus ao invés de arrefe­cer estes com­por­ta­men­tos belig­er­antes e de inter­esses escu­sos, fez foi acirrá-​los ainda mais.

Exem­p­los deste despu­dor, para nossa ver­gonha, foram – e ainda são –, pro­tag­on­i­za­dos pelo gov­er­nador do Maran­hão.

Até bem pouco tempo, sua excelên­cia se ocu­pava – indifer­ente a tanto sofri­mento cau­sado pelas mortes e por suas próprias cir­cun­stân­cias –, em con­tar os óbitos ocor­ri­dos por conta da covid-​19 e atribuí-​los ao pres­i­dente da República.

Fez isso, pes­soal­mente, através de suas redes soci­ais, até o dia em que um sen­horz­inho de mais setenta anos, o gen­eral Augusto Heleno, lhe fez uma durís­sima admoes­tação, disse-​lhe o gen­eral: “sem­pre acred­itei, pelo pas­sado histórico, que comu­nistas são seres alien­ados, son­sos, insen­síveis e insen­satos. Ati­tudes como essa con­fir­mam esse perfil”.

Depois disso, emb­ora con­tinue “aprontando” todas, a última foi espal­har que a capaci­dade dos hos­pi­tais pri­va­dos para aten­der às víti­mas da covid-​19 havia se exau­rido – o que foi pronta­mente des­men­tido pelos três prin­ci­pais hos­pi­tais da cap­i­tal –, sua excelên­cia pas­sou o ofí­cio de “con­ta­dor de óbitos” para algum adu­lador de plan­tão e deixou de atribuí-​los ao presidente.

Por der­radeiro, ten­tou mais uma pro­moção pes­soal – dizendo ter driblado Trump e Bol­sonaro –, numa neb­u­losa impor­tação de mate­r­ial hos­pi­ta­lar da China.

Havia alguma ameaça real da carga ser pirateada pelo gov­erno amer­i­cano ou brasileiro? Qual a razão para ence­nação deste filme de espi­onagem de quinta cat­e­go­ria?

Além da “guerra” travada den­tro do próprio gov­erno; da “guerra” travada entre poderes; da “guerra” travada entre o gov­erno e os gov­er­nadores que querem se pro­mover politi­ca­mente explo­rando a tragé­dia do vírus, a oposição enten­deu que é hora de der­rubar o governo.

Ao Brasil – e aos brasileiros –, já basta não lidar com tan­tos prob­le­mas, tan­tas vaidades, tan­tos inter­esses e tan­tas mortes, tem que lidar, tam­bém, com uma oposição que “entende” ser o mel­hor momento para der­rubar o gov­erno é durante uma pan­demia.

A cam­panha pela der­rubada do gov­erno é pro­tag­on­i­zada por diver­sos par­tidos de oposição, e tem, inclu­sive, à frente o ex-​presidente Lula, já con­de­nado em dois proces­sos por cor­rupção e lavagem de din­heiro e que só não está preso dev­ido leniên­cia da leg­is­lação penal brasileira.

A estraté­gia de der­rubar gov­er­nos em crises agu­das, his­tori­ca­mente, têm o condão de trazer o caos. Foi assim em todos os países que fiz­eram ou ten­taram fazer isso.

Vejo fal­tar bom senso e pos­tura ética aos opositores.

Por outro lado, o pres­i­dente Bol­sonaro, con­forme já dito ante­ri­or­mente, está muito longe de ser inocente nessa história toda.

Ele “cha­furda” nesta mesma lama fétida que cha­fur­dam os seus opositores.

Todas as ati­tudes do pres­i­dente, inclu­sive, as de inci­tar movi­men­tos con­tra a quar­entena, de apoiar man­i­fes­tantes que pedem por regimes de exceção, e tan­tas out­ras, fazem parte de cál­culo político para a sua pro­moção pes­soal fra­cio­nando a nação.

Quando o pres­i­dente se coloca, iso­lada­mente, con­tra o con­senso mundial de que neste primeiro momento é necessário esta­b­ele­cer uma política de dis­tan­ci­a­mento social para reduzir o con­tá­gio e garan­tir a capaci­dade de atendi­mento dos serviços de saúde, ele está ciente – como todos esta­mos –, da crise que aviz­inha, e quer jogar a respon­s­abil­i­dade para os gov­er­nadores, prin­ci­pal­mente aque­les que fig­u­ram como seus adver­sários no pleito de 2022.

Outro dia foi noti­ci­ado que o pres­i­dente se colo­cara con­tra uma pro­posta de reduzir, durante qua­tro meses dos servi­dores públi­cos no “esforço de guerra”, porque isso rep­re­sen­taria uma perda de mil­hões de votos.

Ora, a um gov­er­nante, pres­i­dente, gov­er­nador, prefeito – ou mesmo a qual­quer um que exerça um cargo público –, não é ético que tome ou se deixe tomar essa ou aquela medida partindo de um cál­culo eleitoral.

A razão de ser do Estado é a pro­moção do bem-​estar comum. Logo, sem­pre que pos­sível, não podemos pre­scindir de pes­soas, sobre­tu­dos, dos mais vel­hos, dos enfer­mos, para “sal­var” a econo­mia.

O Estado tem o dever moral de preser­var prin­ci­pal­mente os mais frágeis.

Essa é uma das razões de sua existên­cia.

Ainda com pre­juí­zos mate­ri­ais graves, o sen­tido da preser­vação da vida e da urgên­cia deve prevale­cer sobre os demais interesse.

Um gov­er­nante, fora das situ­ações extremas, não pode sim­ples­mente per­mi­tir que vidas sejam per­di­das quando, ainda que, com difi­cul­dades, pos­sam ser preser­vadas.

Essa falta de com­preen­são do pres­i­dente sobre o papel do Estado, em qual­quer situ­ação e, sobre­tudo, durante as crises, faz com que perca a capaci­dade de governança.

Capaci­dade de gov­er­nança não tem nada a ver com apoio pop­u­lar ou mesmo legit­im­i­dade, mas, sim, com a capaci­dade de con­duzir os des­ti­nos do país.

Isso se rev­ela claro quando ele não se mostra capaz de agre­gar a nação em busca de uma solução que seja menos danosa aos gov­er­na­dos. Não faz isso porque não sabe, vez que não pos­sui qual­quer “bala de prata” para der­ro­tar o mal que nos aflige.

Nós, brasileiros, não somos espe­ci­ais a ponto do vírus que mata mil­hares ao redor do mundo não nos cause mal algum.

Por conta disso pre­cisamos de gov­er­nantes que ajam com racional­i­dade, método e de acordo com os fun­da­men­tos do que seja Estado.

O com­por­ta­mento dos brasileiros – que se por­tam como se estivessem em guerra de tor­cida –, diante de uma pan­demia não é ape­nas tosco, é irra­cional.

Infe­liz­mente, a irra­cional­i­dade é a tônica destes tem­pos – e vem de todos os lados.

Por isso mesmo, enganam-​se os que pen­sam que o sen­hor Bol­sonaro ou o bol­sonar­ismo sairão menores dessa crise, pelo con­trário – graças a oposição incom­pe­tente que pos­sui –, sairão mais for­t­ale­ci­dos, inclu­sive, com poten­cial de levar o país ao caos.

Mas esse é um assunto para ser tratado em um outro texto.

Abdon Mar­inho é advo­gado.